domingo, 12 de fevereiro de 2017

A palavra de Deus é fonte inesgotável de vida


Quem poderá compreender, Senhor, toda a riqueza de uma só das vossas palavras? Como o sedento que bebe da fonte, muito mais é o que perdemos do que o que tomamos. A palavra do Senhor apresenta aspectos muito diversos, segundo as diversas perspectivas dos que a estudam. O Senhor pintou a sua palavra com muitas cores, a fim de que cada um dos que a escutam possa descobrir nela o que mais lhe agrada. Escondeu na sua palavra muitos tesouros, para que cada um de nós se enriqueça em qualquer dos pontos que medita. 

A palavra de Deus é a árvore da vida, que de todos os lados oferece um fruto bendito, como a rocha que se abriu no deserto, jorrando de todos os lados uma bebida espiritual. Comeram, diz o Apóstolo, uma comida espiritual e beberam uma bebida espiritual. 

Aquele que chegou a alcançar uma parte deste tesouro, não pense que nessa palavra está só o que encontrou, mas saiba que apenas viu alguma coisa de entre o muito que lá está. E porque apenas chegou a entender essa pequena parte, não considere pobre e estéril esta palavra; incapaz de apreender toda a sua riqueza, dê graças pela sua imensidade inesgotável. Alegra-te pelo que alcançaste, e não te entristeças pelo que ficou por alcançar. O que tem sede alegra-se quando bebe, e não se entristece por não poder esvaziar a fonte. Vença a fonte a tua sede, e não a tua sede a fonte, porque se a tua sede fica saciada sem que se esvazie a fonte, poderás ainda beber dela quando voltares a ter sede; se, ao contrário, saciada a sede, secasse a fonte, a tua vitória seria a tua desgraça. 

Dá graças pelo que recebeste e não te entristeças pelo que sobrou e deixaste. O que recebeste e alcançaste é a tua parte, e o que deixaste é ainda a tua herança. O que não podes receber imediatamente por causa da tua fraqueza, poderás recebê-lo noutra altura, se perseverares. E não tentes avaramente tomar dum só fôlego o que não podes abarcar duma vez, nem desistas, por preguiça, do que podes ir conseguindo pouco a pouco.



Do Comentário de Santo Efrém, diácono, sobre o Diatéssaron (1, 18-19: SC 121, 52-53) (Sec. IV)

A morte


A morte é a separação da alma do corpo, como total abandono das coisas deste mundo. Considera portanto, meu filho, que a tua alma deverá separar-se do corpo; mas não sabes se a morte te assalta na tua cama, ou durante o trabalho, ou na rua, ou em outra parte. A ruptura de uma veia, um catarro, uma hemorragia, uma febre, uma chaga, uma queda, um terremoto, um raio, bastam para te tirar a vida. Isso pode acontecer daqui a um ano, daqui a um mês, a uma semana, a uma hora e talvez ao terminar a leitura desta consideração. Quantos se deitaram à noite cheios de saúde e de manhã foram encontrados mortos! Quantos acometidos de algum ataque morreram de repente! E depois para onde foram? Se estava na graça de Deus, felizes deles! Gozarão para sempre. Se, pelo contrário, se achavam em pecado mortal, estão para sempre perdidos. Dizei-me, filho, se tivesses que morrer neste instante, o que seria de tua alma? Ai de ti, se não te manténs sempre preparado! Quem não está hoje preparado para bem morrer, corre grande perigo de morrer mal.

Embora seja incerto o lugar e incerta a hora de tua morte, é porém muito certo que a morte há de vir. Quero esperar que a última hora de tua vida não venha repentinamente ou de modo violento, mas aos poucos e precedida de uma doença comum. Mas há de chegar um dia no qual, estendido numa cama, estarás prestes a passar a eternidade, assistido por um sacerdote que encomendará tua alma, tendo um crucifixo ao lado e uma vela acesa do outro, e derredor os aparentes que choram. Terás a cabeça dolorida, os embaçados, a língua ressequida, a garganta presa, a respiração ofegante, o sangue a arrefecer, o corpo consumido, o coração aflito. E logo que a alma expire, o teu corpo vestido de poucos andrajos será a apodrecer em uma cova. Ai os ratos e os vermes roeram todas as tuas carnes e de ti restaram apenas quatros ossos descarnados e um pó nauseabundo. Abri um sepulcro e vê a que ficou reduzido aquele jovem rico, aquele ambicioso, aquele soberbo. Lê com atenção estas linhas, meu filho, e lembra-te que elas se aplicam também a ti igualmente como a todos os demais homens. Agora o demônio,para induzir-te a pecar, procura arrancar-te deste pensamento e levar-te a escusar a tua culpa, dizendo-te não ser enfim tão grande mal aquele prazer, aquela desobediência, aquela omissão da missa nos domingos; mas na hora da morte descobrir-te-á a gravidade destes e de outros teus pecados, pondo-os diante de ti. E que haverás de fazer tu então, no ponto de te encaminhares para tua eternidade? Ai de quem, se achar em desgraça de Deus naquele momento! 

sábado, 11 de fevereiro de 2017

A supremacia da caridade


Por que, irmãos, somos tão pouco solícitos em buscar ocasiões de salvação uns para os outros? Tão pouco cuidadosos em mais ajudarmo-nos mutuamente onde a necessidade for maior em carregar os fardos dos irmãos? O Apóstolo a isto nos exorta dizendo: Carregai os fardos uns dos outros e cumprireis assim a lei de Cristo; e em outro lugar: Suportando-vos reciprocamente na caridade. É esta, na verdade, a lei de Cristo.

Se há em meu irmão – seja por indigência seja por fraqueza corporal ou de educação – alguma coisa de incorrigível, por que não a suporto com paciência, e não a levo de bom grado? Pois está escrito: Seus filhos serão levados aos ombros e consolados no regaço? Não será porque me falta aquela caridade que tudo sofre, que é paciente para suportar e benigna para amar?

Certamente esta é a lei de Cristo, dele que assumiu verdadeiramente nossas enfermidades pela paixão e suportou nossas dores pela compaixão, amando os que carregava, carregando os que amava.

Quem ataca o irmão em necessidade,quem põe armadilhas de qualquer tipo à sua fraqueza, está, sem dúvida alguma, sujeito à lei do demônio e a obedece. Sejamos então compassivos uns pelos outros, amantes da fraternidade, pacientes com as fraquezas, perseguidores dos vícios.

Toda vida que se preocupa sinceramente com o amor de Deus e, por ele, com o amor do próximo, é mais aprovada por Deus, sejam quais forem suas observâncias ou seus usos religiosos. A caridade é aquela em vista da qual tudo se deve fazer ou não fazer, mudar ou não mudar. É ela o princípio e o fim que devem regular tudo. Nada é culpável quando feito por ela e em conformidade com ela.

Oxalá ela nos seja concedida por aquele a quem não podemos agradar sem ela, pois sem ele nada absolutamente podemos, ele que vive e reina, Deus, pelos séculos infindos. Amém.


Dos Sermões do Bem-aventurado Isaac, abade do mosteiro de Stela

(Sermo 31: PL194,1292-1293)                   (Séc.XII)

O que um papa pode ou não pode fazer?


Um grande amigo meu se refere habitualmente ao Wall Street Journal como o “jornal católico favorito” dele; uma extravagância não totalmente sem fundamento, levando-se em conta a receptividade das páginas de opinião do jornal aos sérios pontos de vista da Igreja católica sobre inúmeras questões. Mas o melhor jornal dos Estados Unidos também perde o fio da meada de vez em quando. Há exatos três anos, no dia 2 de janeiro de 2014, por exemplo, o Wall Street Journal perdeu a meada inteira ao descrever assim os motivos pelos quais o papa Francisco era uma das “pessoas em quem ficar de olho em 2014”:

Depois de criar expectativas de mudança de visão sobre a homossexualidade, sobre o divórcio, sobre o meio ambiente e sobre as obrigações da sociedade para com os pobres, espera-se também que o pontífice assuma a reforma burocrática do Vaticano e aumente o papel das mulheres na Igreja”.

Pelas minhas contas, só este parágrafo contém quatro erros, além de uma grave deturpação dos “papéis” eclesiásticos.

Embora seja muito difícil de entender para quem observa o catolicismo com lentes políticas, os papas não são como presidentes ou governadores, nem a doutrina católica é como a política pública. Isto significa que uma mudança de “governo papal” não é, nem pode ser, uma mudança dos “pontos de vista” católicos. A doutrina, como a Igreja a entende, não é uma questão de “pontos de vista” de alguém, mas de entendimentos assentados sobre a verdade das coisas.

Os papas não são livres agentes que governam a seu bel-prazer. Antes da conclusão da constituição dogmática do Vaticano II sobre a Igreja, o papa Paulo VI propôs acrescentar ao documento uma sentença afirmando que o papa é “responsável apenas perante o Senhor“; era um esforço, presumo eu, de proteger a autoridade papal e a sua liberdade de ação diante de possíveis intromissões civis ou eclesiásticas. Mas a comissão teológica do concílio rejeitou a proposta de alteração do papa, notando que “o Romano Pontífice é… obrigado a respeitar a revelação em si, a estrutura fundamental da Igreja, os sacramentos, as definições de concílios anteriores e outras obrigações muito numerosas para serem mencionadas”.

Essas “outras obrigações” incluem honrar a verdade das coisas. Numa conferência acadêmica, vários anos atrás, um distinto filósofo católico proclamou, talvez hiperbolicamente: “Se o papa afirmasse que 2+2=5, eu acreditaria nele”. Um filósofo católico ainda mais distinto deu-lhe uma resposta correta e muito mais católica: “Se o Santo Padre dissesse que 2+2=5, eu diria publicamente: ‘Talvez eu tenha entendido mal o que Sua Santidade quer dizer’. E, em particular, eu rezaria por Sua Santidade”. 

sexta-feira, 10 de fevereiro de 2017

Portugal: Santuário de Fátima apresenta cartaz oficial da visita do Papa


O reitor do Santuário de Fátima apresentou hoje em conferência de imprensa a identidade visual para a visita do Papa à Cova da Iria, nos dias 12 e 13 de maio, elaborada pelo designer Francisco Providência.

O cartaz para a visita tem uma imagem do Papa em fundo, onde se desenha um coração com a inscrição 'Papa Francisco' e 'Fátima 2017', a "assinatura motivacional" 'Com Maria peregrino na esperança e na paz' e o logótipo do centenário das Aparições de Fátima.

Para o designer Francisco Providência, a identidade visual para a visita do Papa a Fátima quer comunicar "o estilo de simplicidade e clareza que o caracteriza", proposta pela escolha dos diferentes elementos que a compõem, nomeadamente a fonte tipográfica.

"No cartaz procuramos valorizar a proximidade física e simpática do Papa que, a sorrir, acena com a mão num gesto de saudação e bênção", acrescenta o texto de explicação da identidade visual para a visita do Papa distribuído pelo Santuário de Fátima , elaborado a partir da nota do autor.

Francisco Providência acrescenta que a visita do Papa foi caracterizada com a ideia do Coração Imaculado de Maria, através de um desenho de coração, que se pudesse vincular mais "ao vazio recetor de Maria, do que à inflamação passional que muitas vezes simboliza, propondo, por isso, a construção geométrica da figura em dupla elipse simétrica e convergente".

"Pretendia-se que o coração (em vez da cruz), pudesse caracterizar mais o amor misericordioso do Pai do que o sofrimento redentor do Filho", sublinha. 

Pôde mais quem mais amou


Escolástica, irmã de São bento, consagrada ao Senhor desde a infância, costumava visitar o irmão uma vez por ano. O homem de Deus vinha encontrar-se com ela num local próximo do mosteiro.


Um dia veio ela como costumava todos os anos, e ao seu encontro veio seu venerável irmão, com alguns discípulos. Passaram todo o dia no louvor de Deus e em santa conversação, de tal modo que já se aproximavam as trevas da noite quando se sentaram à mesa para comer.

No meio da sua santa conversação foi passando o tempo e fez-se muito tarde; a santa religiosa implorou-lhe então com estas palavras: «Peço-te irmão, que não me deixes esta noite, para que possamos continuar até de manhã a falar sobre as alegrias da vida celeste». Mas ele respondeu-lhe: «Que dizes tu, irmã? De maneira nenhuma posso passar a noite fora da minha cela».

Então Escolástica, ouvindo a recusa do irmão, posou sobre a mesa as mãos com os dedos entrelaçados, inclinou a cabeça sobre elas e implorou o Senhor Onipotente. Quando levantou a cabeça da mesa, rebentou uma grande tempestade, com tão fortes relâmpagos, trovões e aguaceiros, que nem o venerável Bento nem os irmãos que com ele se encontravam podiam pensar em sair do lugar onde estavam reunidos.

Então o homem de Deus, vendo que não podia regressar ao mosteiro, começou a lamentar-se, dizendo: «Deus te perdoe, irmã. Que foste fazer?». Ao que ela respondeu: «Vê, eu pedi-te e não me quiseste ouvir. Pedi ao meu Deus e Ele ouviu-me. Agora, se podes, vai-te embora; despede-te de mim e volta para o mosteiro».

E Bento, que não quisera ficar ali espontaneamente, teve de ficar contra vontade. E assim passaram toda a noite em vigília, animando-se um ao outro com santos colóquios sobre a vida espiritual.

Não nos admiremos que aquela mulher tenha tido mais poder do que ele: se na verdade, como diz João, Deus é amor, é razoável sentença que tenha tido mais poder aquela que mais amou.

Três dias mais tarde, encontrando-se o homem de Deus na sua cela com os olhos levantados ao céu, viu a alma da sua irmã, liberta do corpo, em figura de pomba, dar entrada no interior da morada celeste. Então, contente com a glória tão grande que a ela tinha sido concedida, deu graças ao Deus Onipotente com hinos e cânticos de louvor, e enviou alguns irmãos a buscar o corpo e trazê-lo para o mosteiro, onde ficou depositado no túmulo que ele tinha preparado para si. E assim, nem o túmulo separou aqueles que sempre tinham estado unidos em Deus.



Dos Diálogos de São Gregório Magno, papa (Liv. 2, 33: PL 66, 194-196) (Sec. VI)

Os mortos não estão dormindo...


No Antigo Testamento, antes da Vinda do Cristo, pensava-se que quem morria ficasse no sheol (mansão dos mortos), à espera da Vinda do Senhor, quando se dariam a Ressurreição dos mortos e o Juízo Final. Até lá, o sheol era igual para todo mundo, bons e maus: era o reino da morte para todos! Os mortos ficavam numa situação letárgica de espera até à consumação final. Aos poucos, porém, foi nascendo a idéia de que, mesmo no sheol, havia diferença entre os bons e os maus; basta pensar na parábola do rico epulão e do pobre Lázaro: os dois estão no sheol (no seio de Abraão), mas um está feliz enquanto o outro pena (cf. Lc 16,19-26). Em resumo: segundo os textos mais antigos do Antigo Testamento, os mortos ficavam “dormindo” no sheol até a ressurreição final, quando o Messias viesse; nos textos mais recentes, os judeus já não pensavam que os mortos ficassem dormindo, mas num estado de espera, bom para os justos e tormentoso para os maus, até que o Messias viesse para o julgamento definitivo.


No Novo Testamento, com a chegada do Messias, tudo muda! Com Cristo, que é o Messias esperado, os mortos não mais ficarão esperando, pois chegaram os últimos tempos, os tempos definitivos, que inauguram o Reino prometido nas Antigas Escrituras, trazido por Cristo e que desabrochará em plena glória no final dos tempos! Recordemos aquela passagem de Lucas 23,42s, do bom ladrão: “E falou: ‘Jesus, lembra-Te de mim quando vieres como Rei’. E Jesus lhe respondeu: ‘Eu te asseguro: ainda hoje estarás Comigo no paraíso’”. O ladrão, como os judeus da época de Jesus, esperava a Ressurreição no final dos tempos, quando o Senhor viria em glória: “Lembra-Te de mim, quando vieres com Teu Reino!” Mas, o Reino já chegou, com a Ressurreição de Jesus chegaram os tempos finais! Por isso mesmo, Jesus responde: “Hoje mesmo estarás Comigo!” Agora que Ele chegou, que venceu a morte, não há mais o que ficar esperando: com Cristo, os mortos não têm mais o que esperar: já começou o Dia do julgamento! O futuro esperado torna-se hoje, torna-se presente em Cristo: a salvação definitiva não é uma realidade meramente futura, mas surte efeitos imediatos para quem parte desta vida na comunhão com Cristo; o paraíso, estado final da bem-aventurança, é estar com Cristo, “já”, “agora” - nada: nem a vida, nem a morte nos poderão separar do amor de Cristo (cf. Rm 8,38s). 

A morte de Cristo abre as portas do paraíso, de modo que a morte do cristão é entrada na Vida eterna. Por isso mesmo São Paulo afirma preferir ausentar-se desta vida terrena para ir estar com Cristo: “Estamos, repito, cheios de confiança, preferindo ausentar-nos do corpo para morar junto do Senhor” (2Cor 5,8). Aqui aparece claramente que o término da existência terrena leva imediatamente a habitar junto do Senhor. Não existe mais essa mais perspectiva de ficar dormindo: morrer é ir estar imediatamente com o Senhor... Por isso Paulo prefere morrer logo! Os que morrem neste tempo, antes da Vinda de Cristo na glória, vivem já com o Senhor. O Apóstolo acrescenta, em outra carta: “Para mim viver é Cristo e a morte, lucro. Entretanto, se o viver na carne ainda me permitir um trabalho frutuoso, não sei o que escolher. Estou como que na alternativa. Pois de um lado desejo partir para estar com Cristo, o que é muito melhor” (Fl 1,21ss). Note-se que aqui o importante é que “o viver é Cristo”: a morte não é um lucro em si mesmo, mas somente se for um partir para estar logo com Cristo. Uma morte que fosse separação de Cristo ou que interrompesse a comunhão com ele, não seria “lucro” para Paulo. A morte somente é desejável porque permite a entrada na plenitude da comunhão com Cristo, que constitui o objetivo último da esperança cristã. Em mais sete textos paulinos a expressão “com Cristo” aparece com este significado. Por exemplo: “Se cremos que Jesus morreu e ressuscitou, cremos também que Deus levará com Jesus os que Nele morrerem. Depois nós, os vivos, que estamos ainda na terra, seremos arrebatados juntamente com eles para as nuvens, ao encontro do Senhor nos ares. Assim estaremos sempre com o Senhor” (1Ts 4,14.17); “Pois Deus não nos destina à ira mas à salvação por Nosso Senhor Jesus Cristo, que morreu por nós a fim de que, vivos ou mortos, fiquemos unidos a Ele” (1Ts 5,10). Outros textos são 2Cor 4,14; 13,4; Rm 6,8; 8,32. Estar com o Senhor exprime a firme certeza da comunhão com Cristo logo após a morte! Se o estar com Cristo fosse possível somente na Parusia (= Vinda de Cristo), o melhor para Paulo não seria partir! Partir para ficar dormindo?! Partir somente é bom porque é para estar com Cristo! 

São José Sanchez del Rio


Em 1925, o Papa Pio XI escreveu uma Encíclica sobre o reinado de Jesus, chamada “Quas Primas” e instituiu a festa de Cristo Rei do Universo no último domingo do Ano Litúrgico. O Papa queria abrir os olhos dos cristãos para que escolhessem a Jesus e não aos ditadores que surgiram nesta época, e escolhessem o Evangelho e não a essas ideologias.

Então, o século XX foi o que mais mártires gerou em toda a história da Igreja. E nisto convém recordar que o testemunho impressionante dos mártires do México de 1926 a 1929.

Logo após a independência do México, em 1855, desencadeou-se a revolução liberal maçônica com toda a sua virulência anticristã, quando chegou ao poder Benito Juárez (1855-72). Pela Constituição liberal de 1859, estabelecia-se a nacionalização dos bens eclesiásticos, a supressão das ordens religiosas, a secularização de cemitérios, hospitais e centros beneficentes etc. Seu governo também deu apoio a uma Igreja mexicana, precária tentativa de criar, em torno de um pobre padre, uma Igreja cismática.

O governo decidiu acabar com a fé católica no país, pois achava que o cristianismo era uma invenção dos homens e que se o povo respeitasse e obedecesse os padres, isso diminuiria o poder do governo. O pior presidente foi Plutarco Elías Calles; ele criou leis para fechar todas as igrejas, prender e matar os padres, freiras e até quem trouxesse no peito uma cruz, era a “lei Calles”.

Os católicos perderam seus direitos de ir ao cinema, usar transporte público, os professores perderam os empregos. O Papa Pio XI tentou negociar com o governo, mas de pouco adiantou. Ser Padre era considerado crime e a pena era a morte.

Neste contexto, um garoto chamado José Sanchez del Rio, que era coroinha, viu os soldados comunistas entrarem a cavalo na sua igreja e enforcarem o velho sacerdote. O garoto procurou o movimento dos rebeldes católicos, os “Cristeros”. Eles estavam formando um exército para salvarem os padres, defenderem seu direito de participarem da Santa Missa e ter uma religião. A cristandade mexicana sustentou uma luta de três anos contra os Sem-Deus da época, que haviam imposto a liberdade para todos os cultos, exceto o culto católico, submetido ao controle restritivo do Estado, à venda dos bens da Igreja, à proibição dos votos religiosos, à supressão da Companhia de Jesus e, portanto, de seus colégios, ao juramento de todos os funcionários do Estado em favor destas medidas, à deportação e ao encarceramento dos bispos ou sacerdotes que protestassem. Pio IX condenou estas medidas, assim como Pio XI expressou sua admiração pelos Cristeros.

Em Guadalajara, no dia 3 de Agosto de 1926, cerca de 400 católicos armados encerraram-se na igreja de Nossa Senhora de Guadalupe. Eles gritavam: “Viva Cristo Rey e la Virgen de Guadalupe!”. Iniciou-se assim o movimento revolucionário por iniciativa do povo, em defesa de sua fé, que ficou conhecido como “Cristiada” [1926-1931]. José Sanches era um deles. Disse: “Quem é você se não se levanta e se põe de pé, para defender o que acredita?!”

Por ser o menor, José ia a frente dos revolucionários com um estandarte com a imagem da Virgem de Guadalupe. Muitos cristãos morreram em combate. José escreveu à sua mãe: “Nunca foi tão fácil ganhar o Céu.”

Numa dessas lutas, o general dos Cristeros perdeu o cavalo e ia ser capturado. José lhe disse: “Meu general, aqui está meu cavalo, salve-se o senhor, mesmo que me matem! Eu não faço falta, o senhor sim”. Foi dessa forma corajosa que José foi capturado.

Da prisão escreveu à mãe: “Minha querida mãe, fui feito prisioneiro em combate neste dia. Creio que nos momentos atuais vou morrer, mas não importa, nada importa, mãe. Resigna-te à vontade de Deus; eu morro muito feliz porque no fim de tudo isto, morro ao lado de Nosso Senhor. Não te aflijas pela minha morte, que é o que me mortifica. Antes, diz aos meus outros irmãos que sigam o exemplo do mais pequeno, e tu faça a vontade do nosso Deus. Tem coragem e manda-me a tua bênção juntamente com a de meu pai. Saúda a todos pela última vez e receba pela última vez o coração do teu filho que tanto te quer e tanto desejava ver-te antes de morrer”.

Chegaram a chicotear os pés de José e o obrigaram a caminhar por uma estrada de pedras para que renunciasse sua fé, mas o menino permaneceu firme.

Levado até a beira de uma cova que em breve seria a sua, os soldados deram-lhe algumas punhaladas não mortais, para ver se ele apostatava com esse suplício.

Em tom de zombaria e com o intuito de quebrar psicologicamente o herói da fé, o capitão comandante da escolta lhe perguntou se tinha uma mensagem para seus pais. Ele respondeu: “Sim, diga-lhes que vamos nos rever no Céu”. Em seguida, pediu ao capitão para ser fuzilado com os braços em cruz. Como única resposta, este sacou a pistola e lhe disparou um tiro na têmpora. Suas últimas palavras antes de ser fuzilado foram: “Nos vemos no Céu. Viva Cristo Rei! Viva sua mãe, a Virgem de Guadalupe!”.

Sentindo-se ferido de morte, José colheu com sua mão direita um pouco do sangue que lhe escorria abundantemente pelo pescoço, traçou com ele uma cruz na terra e prostrou-se em cima dela, em sinal de adoração.

Assim, na última hora da noite de 10 de fevereiro de 1928, sua alma subiu ao Céu e foi recebida com júbilo por seu querido Cristo Rei e sua amadíssima Mãe, a Virgem de Guadalupe.

Quando o Papa Pio XI soube de José e o que os cristãos estavam sofrendo no México, escreveu: “Queridos irmãos, entre aqueles adolescentes e jovens existem alguns – e eu não consigo segurar as lágrimas ao recordá-los – que, levando nas mãos o rosário e aclamando Cristo Rei, sofrem espontaneamente a morte.”

José Sanchez del Rio foi beatificado em 2005 e o Papa Emérito, Bento XVI, esteve rezando junto às suas relíquias.

No dia 16 de outubro de 2016, o Papa Francisco canonizou o menino São José Luis Sánchez del Río, o padroeiro dos adolescentes mexicanos, que morreu mártir aos 13 anos, quando deu a vida por sua fé na guerra dos Cristeros; suas últimas palavras foram: “Viva Cristo Rey e la Virgen de Guadalupe!”.

É um extraordinário exemplo de fé e amor a Jesus Cristo, Rei do Universo. Que neste dia o eco de suas palavras nos faça pensar: Quem sou eu se não me levanto e não me ponho de pé, para defender o que acredito?!


Alegre-nos, ó Pai, o triunfo de vosso mártir São José Sanchez del Rio ao qual destes a graça de proclamar a paixão e ressurreição do vosso Filho, derramando o sangue em morte gloriosa. Por Cristo, Senhor nosso. Amém.



São José Sanchez del Rio, mártir de Cristo Rei, rogai por nós!