Uma ação
sistemática de ataques e calúnias ao longo das décadas tem pintado o papa Pio
XII como cúmplice da perseguição nazista. Recentemente, no entanto, a névoa do
preconceito covarde, que há muito tempo tenta encobrir a imagem do papa
Pacelli, está começando a se dissipar, graças à pesquisa de historiadores que
vêm estudando o último papa nascido em Roma.
É neste contexto
que surge “O Terceiro Reich contra Pio XII”, do historiador Pier Luigi
Guiducci, que analisou durante sete anos documentos nazistas, alguns inéditos,
conservados nos arquivos de vários países, revelando qual era a ideia que o
nazismo tinha de Pio XII e, mais em geral, do cristianismo.
***
ZENIT –
Prof. Guiducci, como começar a entender a realidade histórica ligada a Pio XII
e ao nazismo?
Com a existência de uma lenda negra ligada ao mundo
nazista. Berlim, por um lado, bloqueou toda a ajuda do Vaticano à Polônia. A
ordem era desviar as ajudas para o exército alemão. Formalmente, os auxílios
deviam ser entregues à Cruz Vermelha alemã, mas este organismo tinha sido
inserido entre as organizações do regime, submetido aos líderes da época. Ao
mesmo tempo, os oficiais nazistas que operavam na Polônia transmitiam
continuamente à população invadida pela Wehrmacht uma mensagem: "O papa se
esqueceu de vocês. O Vaticano não se mexeu. Vocês foram abandonados".
Muitas pessoas se convenceram de que existia essa
passividade do pontífice e até um acordo entre ele e as forças de ocupação.
Essa ideia errônea foi reforçada pela máquina de extermínio nazista (Shoah). A
documentação que pode ser consultada (incluindo as atas do primeiro julgamento
de Nuremberg) mostra que toda mensagem transmitida pela Santa Sé (para a
abertura de canais de assistência humanitária) ou pelos seus representantes era
sistematicamente arquivada. Eu encontrei um informe de um espião para Berlim
dizendo que o papa estava fortemente contrariado porque toda iniciativa do
Vaticano era sempre neutralizada. Mas há também outra lenda negra, ligada ao
mundo comunista. Pio XII tinha recebido no Vaticano um número significativo de
relatórios diplomáticos (além de boletins e informações verbais) que listavam
as sistemáticas ações de demolição do cristianismo na Rússia. Esta realidade,
hoje vastamente documentada, inclusive com gravações em vídeo, se estendeu aos
países-satélites de Moscou até atingir uma presença global. Com essa
documentação, Pio XII reagiu com firmeza ao comunismo. Primeiro, confirmou a
condenação do ateísmo e da sua propaganda. Depois, procurou conter a presença
dos comunistas na Itália e em outros países. Evidentemente, a reação soviética
foi duríssima.
ZENIT – E
como ela se manifestou?
Os serviços secretos da Alemanha Oriental pediram
aos colegas de Moscou que recebessem a cópia de um dossiê sobre Pio XII para
implantar uma estratégia de destruição da sua imagem, especialmente no âmbito
moral. O caso é que eles não encontraram elementos que sustentassem acusações
contra o papa. Por isso, decidiram, no fim, insistir em projetos de
desinformação, inclusive através de publicações e peças teatrais. Essa dinâmica
foi descoberta pelos historiadores após a reunificação da Alemanha, em 1990. Os
arquivos da Stasi foram inseridos num único sistema estatal de conservação (e
acessível para os estudiosos).