“QUE
VOSSA CARIDADE NÃO SEJA FINGIDA”
O amor cristão
1. Indo às fontes da
santidade cristã
Juntamente
com a chamada universal à santidade, o Concílio Vaticano II também deu
indicações precisas sobre o que se entende por santidade, no que consiste. Na Lumen
gentium se lê:
"Jesus,
mestre e modelo divino de toda a perfeição, pregou a santidade de vida, de que
Ele é autor e consumador, a todos e a cada um dos seus discípulos, de qualquer
condição: «sede perfeitos como vosso Pai celeste é perfeito» (Mt. 5,48) (121).
A todos enviou o Espírito Santo, que os move interiormente a amarem a Deus com
todo o coração, com toda a alma, com todo o espírito e com todas as forças
(cfr. Mc. 12,30) e a amarem-se uns aos outros como Cristo os amou (cfr. Jo.
13,34; 15,12). Os seguidores de Cristo, chamados por Deus e justificados no
Senhor Jesus, não por merecimento próprio mas pela vontade e graça de Deus, são
feitos, pelo Batismo da fé, verdadeiramente filhos e participantes da natureza
divina e, por conseguinte, realmente santos. É necessário, portanto, que, com o
auxílio divino, conservem e aperfeiçoem, vivendo-a, esta santidade que
receberam."(LG 40).
Tudo isso
está resumido na fórmula: "a santidade é a união perfeita com Cristo"
(LG, 50). Esta visão reflete a preocupação geral do Concílio de voltar às
fontes bíblicas e patrísticas, superando, também neste campo, a postura
escolástica dominante durante séculos. Agora é uma questão de tomar consciência
dessa renovada visão de santidade e fazê-la passar na prática da Igreja, isto
é, na pregação, na catequese, na formação espiritual dos candidatos ao
sacerdócio e à vida religiosa e - por que não? - também na visão teológica que
inspira a prática da Congregação dos Santos[1].
Uma das
principais diferenças entre a visão bíblica da santidade e a da escolástica
reside no fato de que as virtudes não se fundamentam tanto na "reta
razão" (a recta
ratio aristotélica), mas no Querigma; ser santo não significa seguir a
razão (muitas vezes, é o contrário!), mas seguir a Cristo. A santidade cristã é
essencialmente cristológica: consiste na imitação de Cristo e, no seu cume -
como diz o Concílio - na "perfeita união com Cristo".
A síntese
bíblica mais completa e mais compacta de uma santidade fundada no Querigma é
aquela descrita por São Paulo na parte parenética da Carta aos Romanos
(capítulos 12-15). No início, o Apóstolo dá uma visão resumida do caminho de
santificação do crente, do seu conteúdo essencial e do seu propósito:
"Eu vos
exorto, pois, irmãos, pelas misericórdias de Deus, a oferecerdes vossos corpos
em sacrifício vivo, santo e agradável a Deus: é este o vosso culto espiritual.
Não vos conformeis com este mundo, mas transformai-vos pela renovação do vosso
espírito, para que possais discernir qual é a vontade de Deus, o que é bom, o
que lhe agrada e o que é perfeito" (Rm 12,1-2).
Na última
pregação, nós meditamos estes versículos. Nas próximas meditações, partindo do
que se segue no texto paulino e completando-o com o que o Apóstolo diz em outro
lugar sobre o mesmo argumento, tentaremos destacar os traços salientes da
santidade, aqueles que hoje são chamados de "virtudes cristãs" e que
o Novo Testamento define como os "frutos do Espírito", as "obras
da luz", ou também "os sentimentos que estavam em Cristo Jesus"
(Fl 2, 5).
A partir do
capítulo 12 da Carta aos Romanos, todas as principais virtudes cristãs, ou
frutos do Espírito, estão listadas: o serviço, a caridade, a humildade, a
obediência, a pureza. Não como virtudes a serem cultivadas por si mesmo, mas
como necessárias consequências da obra de Cristo e do batismo. A seção começa
com uma conjunção que por si só vale um tratado: “Vos exorto, portanto...”.
Aquele "portanto" significa que tudo o que o Apóstolo dirá desse
momento em diante é a consequência do que escreveu nos capítulos precedentes
sobre a fé em Cristo e sobre a obra do Espírito. Refletiremos sobre quatro
destas virtudes: caridade, humildade, obediência e pureza, começando com a
primeira.