domingo, 25 de novembro de 2012

Como o ar que respiramos



Tem muitas histórias sobre Jesus que ficaram fora dos evangelhos aceitos pela Igreja. Uma delas conta que certo dia, quando Jesus caminhava na beira do mar da Galiléia, um discípulo aproximou-se dele e lhe perguntou:

- Senhor, como posso alcançar a Deus?

Jesus entrou na água com o discípulo e o empurrou completamente para baixo dela por bastante tempo, segurando a sua cabeça. Quando, enfim, o deixou emergir,  perguntou-lhe:

- O que você experimentou?

- Senti a minha vida ir embora. Meu coração começou a bater em disparada. Eu estava louco para respirar e fugir dali.

Então o Senhor lhe disse:

- Você verá o Pai quando quiser isso com a mesma intensidade e força com a qual você desejou respirar e fugir, quando estava com a cabeça de baixo d’água.


Com o domingo de Cristo Rei encerramos o ano litúrgico. Mais uma vez, revivemos os grandes eventos da nossa fé: Natal, Páscoa, Pentecostes, mais as festas de Maria e de tantos outros santos e santas a começar com São José, padroeiro da nossa Diocese. Em outubro, iniciamos também o Ano da Fé que se concluirá, exatamente, daqui a um ano, na mesma ocasião deste domingo.

Após tudo isso, deveríamos poder avaliar um pouco mais a nossa vida de cristãos. Mudou alguma coisa ao longo deste ano?

Podemos dizer que conhecemos melhor o nosso Deus para poder crer e confiar cada vez mais nele?

Ele, nosso Pai, está bem perto de nós. Quis se fazer conhecer pelas palavras e ações de Jesus, seu Filho, feito homem como nós, que “viveu em tudo a condição humana, menos o pecado, anunciou aos pobres a salvação, aos oprimidos, a liberdade, aos tristes, a alegria.” (cf. Oração Eucarística IV). No entanto sempre tem algo de imprescindível para podermos nos aproximar mais de Deus: o desejo de encontrá-lo para conhecê-lo mais! Não é Deus que se esconde ou se afasta de nós, somos nós que o procuramos pouco e o desejamos menos ainda. Temos muitas atrações neste mundo que motivam as nossas buscas, os nossos desejos e anseios. Gastamos muito tempo, muitas energias, forças e inteligência para alcançar as metas almejadas e realizar os nossos sonhos mais ambiciosos.

Estamos tão atarefados com tudo isso que, às vezes, acabamos nos esquecendo de Deus: deixamos de procurá-lo. Ele, porém, não desiste de vir ao nosso encontro porque sempre nos espera, como fez o Pai da parábola que, de longe, viu o filho querido voltar para casa e correu para abraçá-lo. Ainda assim, Deus respeita a nossa decisão. Por isso, é muito difícil encontrar quem não desejamos ou nem procuramos.

Estamos deixando Deus à margem da nossa vida, como se Ele pudesse atrapalhar os nossos planos. Deveríamos caminhar com Ele, ou melhor, deveríamos nos deixar conduzir por Ele. Seríamos assim construtores do seu Reino; conscientes e felizes por colaborar com quem quer a alegria de todos, porque ama a todos e sempre se deixa encontrar por aqueles que o buscam de coração sincero.

Já deveríamos ter entendido que o Reino de Jesus não se compara com os reinos deste mundo, não funciona com as armas do poder nuclear ou econômico que seja; funciona somente com a força do amor e a luz da verdade. Assim Jesus falou a Pilatos:

“Todo aquele que é da verdade escuta a minha voz” (Jo 18,37). É urgente reconhecer esta verdade; não podemos mais perder tempo. Somente Deus pode satisfazer os sonhos bons, os desejos bonitos e os grandes projetos verdadeiramente humanos e fraternos que ainda brotam em nosso coração quando decidimos, uma vez por todas, desistir das nossas maquinações de poder, de ganância, de opressão e de injustiça. Ainda não entendemos que esses planos dividem a humanidade, causam as guerras, condenam-nos a constantes disputas para provar quem é o melhor, mais esperto e mais poderoso entre nós. Continuam gerando morte, lágrimas e revolta. Quantas vezes reclamamos que a vida é um sufoco!

Precisamos respirar a plenos pulmões o ar puro do Reino do Senhor, reino de paz, de bondade e de união. Precisamos desejar isso com todo o coração, com a mesma intensidade de quando nos falta o ar que respiramos para viver.

Dom Pedro José Conti
Bispo de Macapá

Quando montar a Árvore de Natal e o Presépio?



"Após as primeiras Vésperas do 1º Domingo do Advento é a hora de montar a árvore de Natal, colocar a guirlanda na porta, armar o presépio, e mudar o capacho da frente de casa por um tapete com decoração natalina." (Rafael Vitola Brodbeck).

A árvore não deve ser montada toda de uma vez: o ideal é acrescentar enfeites e adereços aos poucos, durante as quatro semanas do Advento, que é, para nós católicos, tempo de preparação. 

“Durante o Natal, no Hemisfério Norte, todas as árvores perdem as folhas, com exceção do pinheiro. Por isso, a árvore se tornou símbolo da vida, celebrada no Natal com o nascimento do menino Jesus.” 

A preparação da árvore deve ser intensificada durante a última semana que antecede o Natal. “Até 16 de dezembro, tudo ainda é muito sóbrio, mesmo nas leituras feitas nas Missas do advento. É só a partir do dia 17 de dezembro que a Bíblia começa a falar do nascimento de Jesus, e se inicia um momento de maior expectativa. Esse é o momento, portanto, de intensificar a decoração da árvore.” 


A montagem do presépio, também tradicional em tempos de Natal, deve seguir a mesma linha da preparação da árvore de natal. “Aos poucos, pode-se começar a montar a gruta, colocar os animais e os pastores, mas a Virgem Maria, São José e o menino Jesus devem fazer parte do presépio apenas mais próximo da noite do Natal.” 

O presépio, enquanto “encenação”, foi uma invenção de São Francisco de Assis para lembrar a simplicidade e as dificuldades enfrentadas pela Virgem Maria e São José no nascimento de Jesus. A orientação para quem pretende seguir a tradição católica é não sofisticar os presépios com luzes e enfeites. 

“Costumamos dizer sempre também que é muito importante envolver as crianças na montagem dos presépios, e o ideal seria que eles fossem feitos nas próprias casas, pelas crianças, para que eles percebam o real sentido do natal.” 

Hora de desmontar 

Tradicionalmente, o dia de desmontar a árvore de Natal, o presépio e toda a decoração natalina é 6 de janeiro, o Dia de Reis. “É nesse dia que três magos, pessoas sábias, encontram o menino Jesus e ele é então revelado a todas as nações. Termina então o tempo de Natal, o tempo de expectativa, e começa o Tempo Comum para a Igreja.” 

Advento 

Um dos grandes símbolos do Natal para a Igreja é a coroa do Advento. Formada com ramos verdes e em formato de círculo, a coroa simboliza a unidade e a perfeição, sem começo e sem fim. “A coroa representa o nascimento do rei. Em cada um dos quatro domingos do advento uma vela é acesa. Com a proximidade do nascimento de Jesus, a luz se torna mais intensa, e é o Natal enquanto festa da luz que celebramos.”
Por Cleiton Robson.
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Fonte: Pe. Carlos Gustavo Haas (Com adaptações).

Extraído de: http://www.salvemaliturgia.com/2012/11/quando-montar-arvore-de-natal-e-o.html?utm_source=feedburner&utm_medium=feed&utm_campaign=Feed%3A+salvem+%28Salvem+a+Liturgia%21%29 

sábado, 24 de novembro de 2012

Virgindade Leiloada



Eu teria preferido escrever sobre outro assunto nesta semana, mas o leilão da virgindade de uma jovem brasileira, amplamente divulgado pela imprensa, requer uma reflexão. É um fato chocante e, ao mesmo tempo, parece tão banal que, talvez, só chamou a atenção porque o leilão aconteceu de maneira aberta, pela internet, e porque o valor do arremate foi alto. Um jovem russo tentou a mesma façanha; chamou a atenção pelo seu insucesso, pois a oferta foi muito baixa; ele desistiu do leilão e ficou deprimido.

Afinal, o que está acontecendo? Pessoas colocam livremente a própria dignidade em leilão em troca de dinheiro? O fato foi acompanhado com curiosidade morbosa e até com torcida, para ver até onde a oferta chegaria. Chocar, por quê? Nas calçadas de certas ruas da cidade e em tantas “casas do amor”, não acontece o mesmo todos os dias, sem que isso chame a atenção, ou cause consternação em ninguém? Há mesmo quem quer legalizar a prostituição, como se fosse uma profissão qualquer. Tudo se resolve no nível econômico, também traficar pessoas, reduzi-las a escravas, vender bebês, comerciar órgãos humanos...

E há quem compre ou venda votos nas eleições, comprando ou vendendo a própria dignidade; e também quem suborne a justiça, pondo em liquidação a própria consciência; há quem compre armas, use contra os outros, faça violência, mate, tudo pela vantagem econômica. E há quem trafica drogas, lucrando com o comércio da morte; e quem, simplesmente, vai roubando o que é dos outros ou de todos: tudo pela vantagem econômica que está em jogo... 

Grande novidade nisso tudo não há; coisas que sempre aconteceram. O novo é que, sem nos darmos conta, estamos assimilando uma cultura do mercado, na qual o fator econômico passou a ser o referencial maior: de uma cultura de valores éticos e morais, para uma cultura do valor econômico; o bem maior parece ser a vantagem econômica, que tudo permite e legitima, amolecendo qualquer resistência do senso moral. Tudo fica justificado, se há vantagem econômica. Onde vamos parar?

Está mais do que na hora de colocar tudo isso em discussão novamente; será que essa tendência cultural vai levar a um aprimoramento das relações humanas? A uma dignidade maior no convívio social? A uma valorização real das pessoas, ao respeito pela justiça e a paz? Provavelmente não. Certamente não. O ser humano, avaliado sobretudo na ótica da razão econômica, deixa de ser pessoa e vira objeto quantificável.

Nisso também não há grande novidade; no passado houve a exploração dos escravos, dos operários, das mulheres. Mas, sob protesto. O preocupante, agora, é que essa maneira de ver e fazer, passe por aceitável e normal e a própria pessoa “objetizada”, outrora considerada vítima, agora seja vista como um sujeito autônomo e livre, que faz o que quer, também com sua própria dignidade; e tudo vai bem assim...

Voltaremos às feiras em que se vendem escravos? Livremente expostos à venda, aliás, ao leilão? O leilão da virgindade, por internet, é um fato que deve preocupar educadores, juristas, filósofos... Da curiosidade morbosa, é preciso passar à reflexão, talvez com um pouco mais de vergonha diante do que está acontecendo. Nossa dignidade comum está sendo leiloada! É deprimente!

Cardeal Odilo Pedro Scherer
Arcebispo de São Paulo (SP)

Jesus é o Senhor


A cena do julgamento foi bem preparada, começando nas tramas e armadilhas urdidas contra Jesus. Tudo serviu para compor o drama, dentro de um quadro bem definido no jogo do poder.

Alguém devia ser eliminado! De fato “os sumos sacerdotes e os fariseus reuniram o sinédrio e discutiam: ‘Que vamos fazer? Este homem faz muitos sinais. Se deixarmos que ele continue assim, todos vão acreditar nele; os romanos virão e destruirão o nosso Lugar Santo e a nossa nação’. Um deles, chamado Caifás, sumo sacerdote naquele ano, disse: ‘Vós não entendeis nada! Não percebeis que é melhor um só morrer pelo povo do que perecer a nação inteira’? Caifás não falou isso por si mesmo. Sendo sumo sacerdote naquele ano, profetizou que Jesus iria morrer pela nação; e não só pela nação, mas também para reunir os filhos de Deus dispersos” (Jo 11,47-51).

Jesus está diante de Pilatos (Jo 18,33-37), a multidão pede sua morte, as autoridades conspiram. Prefere-se Barrabás a Jesus. E este Jesus se proclama Rei! Aos olhos de todos, é um rei bufão. Está vestido com um manto vermelho certamente esfarrapado, sobre a cabeça uma coroa de espinhos e seu cetro é uma cana. Ridículo! Terão dito os passantes! No entanto, ele diz ser Rei e que seu Reino não é deste mundo! Há que se posicionar a favor do trono representado por Pilatos, ou daquele que, sendo Rei parece apenas fazer parte de uma comédia de mau gosto.

Mesmo distantes da cena, demos um jeito de entrar no palco ou na plateia. Ali, há dois mil anos os homens e mulheres de todas as línguas, povos e nações, podem participar e passar da comédia à tragédia, desta às ruas, dali à crua realidade do Calvário, diante do abandonado crucificado, para aguardar ansiosos a manhã da Ressurreição e proclamar que Ele é Rei e Senhor. Ninguém fique de fora.

De quem foi a vitória entre o Reino de Jesus e o Reino representado por Pilatos? Muitos poderes se iludiram nestes mais de vinte séculos, ao pretenderem escrever a palavra “fim” no processo chamado “Jesus”, pensando tê-lo liquidado culturalmente ou politicamente. Reinos políticos ou filosofias se alternaram na tentativa de reduzi-lo a personagem marginal da história, mas a pedrinha profetizada por Daniel (Dn 2,34s) não cessa de atingir, uma depois da outra, as muitas estátuas de argila que são os impérios terrenos, e estes ruíram estrondosamente (cf. Raniero Cantalamessa, La Parola e La Vita, Città Nuova, Roma 1990, Pág. 353). Sem adesão a ele, mais cedo ou mais tarde todos caem!

O confronto continua e não é possível buscar uma conciliação fácil e superficial entre Jesus, que é Rei e Senhor, com o espírito do mundo. Seu Reino continua não sendo do mundo, mas ele veio para ser Rei, para dar testemunho da verdade e provocar todas as pessoas, a fim de que escutem sua voz e tomem partido da verdade. Quando Pilatos lhe perguntou, em meio a distraído muxoxo, “que é a verdade?”, nem suspeitava que em Jesus se realizasse a palavra: “foi-lhe dada a soberania, a glória e a realeza. Todos os povos, nações e línguas hão de servi-lo. Seu poder é um poder eterno, que nunca lhe será tirado e sua realeza é tal, que jamais será destruída (Dn 7,14)!

Aquele que era ridicularizado pelas autoridades e pela multidão dali a pouco, Cordeiro imolado, abriria o Livro da Vida. Ele “fez de nós um reino de sacerdotes para seu Deus e Pai, a ele a glória e o poder, pelos séculos dos séculos. Amém. Ele vem com as nuvens, e todo olho o verá – como também aqueles que o traspassaram. Todas as tribos da terra baterão no peito por causa dele.

Sim. Amém! ‘Eu sou o Alfa e o Ômega’, aquele que é, que era e que vem, o todo-poderoso’ (Ap 1,6-8). Na oferta de sua vida, que tem nome de salvação, quis incluir a todos: “Pai, perdoai-lhes. Eles não sabem o que fazem” (Lc 23,34). E depois um dos ladrões lhe disse: ‘Jesus, lembra-te de mim, quando começares a reinar’. Ele lhe respondeu: ‘Em verdade te digo: hoje estarás comigo no Paraíso’ ”(Lc 23,42-43). De fato, Jesus nos ama e nos libertou com o seu sangue. Esta é a Verdade oferecida a todos os homens e mulheres de todos os tempos, mesmo aqueles que o traspassaram ou os que carregam o fardo de seus muitos pecados!

quarta-feira, 21 de novembro de 2012

Cristo Rei



O Ano Litúrgico, constituído por diversos ciclos, termina com a Festa de Cristo Rei. Jesus nasce com o título de Rei e é agora proclamado pela Igreja como Rei do universo. É o cume de um reinado que foi manifestado num amor extremo, selado na cruz e na glorificação eterna.

Numa visão, o profeta Daniel contempla o trono de Deus e seu juízo sobre o mundo. Ele vê também alguém como “filho de homem” sobre o trono (Dn 7, 9-14). Nos Evangelhos, a expressão “filho de homem” refere-se a Jesus Cristo, àquele que veio do alto para construir o Reino de Deus.

Devemos entender que não são os poderes do mundo que determinam a história, mas sim, aquele que é o Senhor da história, fazendo triunfar o seu Reino. Isto significa que a última palavra sobre o mundo pertence a Deus. É até uma questão de fé e certeza de que as forças do mundo são meramente passageiras. 

O centro da história é Jesus Cristo, que veio como Rei, caminha como Rei e termina seu ciclo na terra como Rei. É o mesmo que dizer: “aquele que é, que era e que vem”. Ele é o cumprimento da Aliança feita por Deus com Abraão lá no passado, que só acontece no gesto de doação total na prática do amor.

Mesmo dizendo que o Brasil é o maior país cristão do mundo, Jesus continua sendo o grande desconhecido pelo nosso povo. Desta forma, não criamos paixão por Ele e agimos de forma desregrada, sem compromisso social e ferindo a dignidade das pessoas. Não conseguimos perceber que o amor cristão implica defender a vida do outro, que tem o mesmo direito que nós.

Jesus nunca impôs seu poder através do uso da violência desumana, porque não tinha pretensões egoístas. Sua ação ia além dos limites do mundo e passava por uma prática de testemunho coerente e visível aos olhos da sociedade de seu tempo. Com isto Ele instaurou um reinado que contradiz com os poderes mundanos.

Dom Paulo Mendes Peixoto
Arcebispo de Uberaba (MG)

terça-feira, 20 de novembro de 2012

Não mais "Deus seja louvado"?



A atual Constituição Brasileira tem de modo explícito o cuidado do Estado em matéria de liberdade religiosa (cf. Inciso VI do art. 5º), como toda a tradição social jurídica e religiosa do Brasil. Contudo, nesta época de pós-modernidade, com o ressurgimento das formas de laicismo de matiz iluminista, tristemente, tem se espalhado uma visão míope e distorcida do que seja a laicidade do Estado. Surgem, hoje, formas sutis de preconceito religioso ou intolerância; tais atitudes, por vezes, aparecem envoltas em argumentações nada convincentes sobre a laicidade do Estado. O exemplo é o pedido da Procuradoria Regional de Direitos dos Cidadãos (PRDC), de São Paulo, para retirar a frase “Deus seja louvado” das cédulas da moeda brasileira. As argumentações é que o Brasil é um país laico, portanto, não deve estar vinculado a qualquer manifestação religiosa, e a frase citada “constrange a liberdade de religião de todos os cidadãos que não cultuam Deus, como os ateus e os que professam a religião budista, muçulmana, hindu e as diversas religiões de origem africana”.

Logo, a Casa da Moeda informou que cabe ao Banco Central (BC) “não apenas a emissão propriamente dita, como também a definição das características técnicas e artísticas” das cédulas. Já o BC afirmou que o fundamento legal para a existência da expressão “Deus seja louvado” nas cédulas é o preâmbulo da Constituição, que afirma que ela foi promulgada “sob a proteção de Deus”. Diante disso, o Secretário Geral da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), Dom Leonardo Ulrich Steiner, afirma bem que a frase citada nas cédulas de real “não constrange, mas pode incomodar aos que afirmam não crer. As pessoas que vivem a sua fé, em suas diversas expressões, certamente não se sentem constrangidas, pois vivem da grandeza da transcendência. É que fé não é em primeiro lugar culto a um deus, mas relação. Se a frase lembra uma relação, poderia lembrar que o próprio dinheiro deve estar a serviço das pessoas, especialmente dos pobres, na partilha e na solidariedade. Se assim for, Deus seja louvado!”.

É importante também saber que a liberdade religiosa e a correspondente neutralidade do Estado não significam arreligiosidade ou “ateísmo” público. Um ateísmo público não seria neutralidade religiosa, mas um credo de caráter antireligioso. Um “Estado Laico é aquele em que há separação entre duas esferas, com autonomia do Estado e da Igreja, mas de relação de mútua cooperação, respeitada a liberdade religiosa e o pluralismo religioso, sem uma religião estatal, tal como se verifica no Brasil, onde a Constituição Federal de 1988 previu a independência e colaboração entre o Estado Brasileiro e as confissões religiosas existentes no País, com a garantia da liberdade religiosa”. Assim, “quando se fala de Estado Laico, não se pode pensar num Estado avesso ao fator religioso, agnóstico ou ateu, mas num Estado que respeita a liberdade religiosa”. É inaceitável atitudes, a título de preconceito religioso, de excluir dos espaços públicos os símbolos religiosos e retirar a frase “Deus seja louvado” das cédulas da moeda brasileira. Não duvido da disposição e tempo disponível ainda para entrar na justiça com uma ação para descer o Cristo Redentor do Corcovado no Rio de Janeiro, trocar nomes de Estados (São Paulo, Espírito Santo, Santa Catarina), de cidades com nomes religiosos e acabar com os feriados religiosos no Brasil. A questão não é reivindicar privilégios para esta ou aquela religião, nem que o Estado tenha uma religião oficial. Pelo contrário, o Estado não deve impor a religião, nem discriminar cidadãos por causa dela, mas assegurar-lhes plena liberdade religiosa; também àqueles que não têm fé. Enfim, sim, que Deus seja louvado, ontem, hoje e sempre.

Dom Francisco de Assis Dantas de Lucena
Bispo de Guarabira (PB)

A.A. - Alcoólicos Anônimos



Ao longo de minha caminhada pastoral, recebi, aqui e ali, convites para visitar grupos de Alcoólicos Anônimos - A.A. A cada encontro com eles, ao ouvir seus depoimentos e ao testemunhar a amizade que os une, nasce, espontâneo, o desejo de louvar o Senhor por tudo o que posso ver e ouvir. Semana passada, por ocasião da reunião comemorativa do 59º aniversário de A.A. na Bahia, passei novamente por essa experiência.

É importante deixar claro que os A.A. não estão ligados a nenhuma confissão religiosa, nem exigem de seus associados alguma crença em particular. Entre eles, encontramos pessoas de diversas religiões, sem religião e ateus. Embora o programa de recuperação se baseie em determinados valores espirituais, cada um é respeitado em sua crença. Em “Os Doze Passos de Alcoólicos Anônimos”, lemos: “Viemos a acreditar que um Poder Superior a nós mesmos poderia devolver-nos à sanidade. Decidimos entregar nossa vontade e nossa vida aos cuidados de Deus, na forma em que O concebíamos” (2º e 3º passos).
Os A.A. têm um belo ideal, e uma consciência clara dos próprios limites. Sua meta é ajudar aqueles que querem deixar de beber. Longe de montarem grandes organizações, mantêm um mínimo de estrutura, distribuem as responsabilidades entre os próprios membros e evitam a acumulação de patrimônio. O grupo se mantém com as contribuições voluntárias dos que dele participam. Quantos, no mundo inteiro, participam dos grupos de A. A.? É difícil precisar dados, mesmo porque os A.A. evitam registros: calcula-se que haja, atualmente, cerca de dois milhões de membros, em cerca de 97  mil grupos, espalhados em mais de 180 países – o que não deixa de ser significativo para uma associação que começou em 1935. Mas é preciso reconhecer que o trabalho realizado por eles atinge somente uma mínima parte das pessoas que sofrem das consequências do alcoolismo.

Cresce cada vez mais a convicção de que o alcoolismo não é um vício, mas uma doença. O corpo de algumas pessoas tem uma particular reação ao álcool, e elas acabam se tornando dependentes. Assim como um diabético não pode comer açúcar como os outros, da mesma forma 10% dos que bebem precisam evitar a bebida porque, caso contrário, entrarão num campo em que não mais serão donos de seus próprios atos. Eles passarão a sentir uma necessidade compulsiva da bebida, que fará deles verdadeiros escravos. A experiência tem demonstrado que, em situações assim, é difícil sair dessa situação, sem a ajuda de outras pessoas. Aí reside, justamente, a grande força dos A.A.: em suas reuniões, recordando desafios e problemas, contando suas experiências e falando de suas vitórias, cada qual ajuda o companheiro. E, nesse processo de ajuda, também se ajudam, na linha daquele pensamento chinês: “Quem acende uma vela, é o primeiro a ser iluminado por ela”.

Os trabalhos dos A.A. são também baseados nas “Doze tradições”, fruto de sua longa experiência. Na impossibilidade de enumerá-las, destaco duas: “Nenhum grupo de A.A. deverá jamais sancionar, financiar ou emprestar o nome de A.A. a qualquer sociedade parecida ou empreendimento alheio à Irmandade, a fim de que problemas de dinheiro, propriedade e prestígio não nos afastem de nosso propósito primordial” (6º); “O anonimato é o alicerce espiritual das nossas Tradições, lembrando-nos sempre da necessidade de colocar os princípios acima das personalidades" (12º).

No trabalho com pessoas dependentes do álcool, a dificuldade maior será sempre, sem dúvida, convencer um doente-alcoólatra de que precisa participar dos A.A. Um dos primeiros sintomas da dependência da bebida é justamente a negação do próprio problema. Como já disse um alcoólico anônimo: “O doente não consegue enxergar que a bebida está estragando sua vida e criando enorme sofrimento para as pessoas que ele mais ama”. Nesse caso, será importante a presença em sua vida de um “Simão Cirineu” – aquele que ajudou Jesus a levar sua cruz até o Calvário. Esse irmão ajudará o doente-alcoólatra a encontrar a porta sempre aberta dos A.A.

Dom Murilo S. R. Krieger, scj
Arcebispo de São Salvador da Bahia, Primaz do Brasil

Mártir da não violência!



Estávamos em missão no povoado de Mutuns, a aproximadamente 25km da BR-402. Éramos mais de trezentos delegados vindo das 56 igrejas (comunidades) que constituem a Paróquia São José do Periá de Humberto de Campos, da Forania São Benedito. Durante três dias iríamos refletir na XXII Assembléia de Pastoral daquela região o tema “Missão e Mística na Paróquia de Humberto de Campos” e o lema “É Missão de Todos Nós”.

Fui convidado por padre Bernardo e padre Ribamar para ser facilitador daquele encontro com a finalidade de nos preparar para os 400 anos de evangelização da Igreja no Maranhão. Foi uma oportunidade para estudo do Documento de Aparecida, de juntos redescobrirmos nossa identidade missionária.

No inicio do encontro, dia 19 de novembro, com muita animação e mística, o evangelho teve seu eco nas palavras do Pe. Bernardo. Entre os tambores e atabaques celebramos o Mistério de Jesus Cristo. A alegria e o entusiasmo do neo- presbítero me impressionava, pois aquilo que ele tanto almejou, isto é, ser sacerdote do Senhor, tinha alcançado.

No dia seguinte, celebrávamos o Dia Internacional dos Direitos da Criança e Dia Nacional da Consciência Negra, por lembrar o martírio de Zumbi dos Palmares em 1695. Este dia foi marcado pela manhã com celebrações e animações. Vivemos os últimos momentos com o Pe. Bernardo. Durante a tarde estávamos em espírito de animação quando recebemos a triste notícia... Não sentimos o chão quando recebemos à noite a notícia que Pe. Bernardo havia partido para a casa do Pai, se tornando mártir da não violência. Não queria estar em mim naquele momento...


Então vou falar da alegria de conhecer o padre Bernardo. Eu o conheci em 2002 no seminário cura D´Ars, hoje Seminário de Filosofia da Arquidiocese. Lembro que ao conhecê-lo ele falava para um grupo de colegas vocacionados da sua magnífica experiência entre os jesuítas ao convite do Pe. Luigi Muraro, pois tinha sido seminarista jesuíta por alguns tempos trabalhando junto com os posseiros e agricultores de um dos estados do nordeste que não me recordo no momento.

Tive a chance de conviver com o padre Bernardo durante cinco anos no Seminário Santo Antônio. Trabalhamos juntos em dupla missionária entre os anos de 2005 a 2006. Nesse período fizemos nosso estágio pastoral na “Quase Paróquia” de Nossa Senhora de Boa Viagem, área industrial da Ilha de São Luís. Em especial fomos companheiros de pastoral nos bairros: Nova República, Poeirão, Rio Grande, Residencial 2000, Coqueiro e Estiva. Esse tempo fortaleceu nossa amizade, pois o amor pela pastoral e pela Igreja nos fez mais irmãos. Nessa época tínhamos desentendimentos pastorais, mas isso nos deixou mais amigos. Vivemos assim as fortes palavras de Dom Elder Câmara quando dizia “a diferença não me empobrece, mas sempre me enriquece e me enaltece”.  Aprendi várias coisas junto ao padre Bernardo, sobretudo o zelo pela pastoral. Era amigo de todos e como sabia conviver fraternalmente e chamar a juventude para o Senhor! Era verdadeiro com aquilo que fazia, pois sabia que a realidade desafiante da Igreja Particular precisava de homens que fossem verdadeiramente cristãos. Uma das grandes características de padre Bernardo era a de ser articulador e íntegro naquilo que acreditava.

Amava a Igreja Particular do Maranhão, principalmente as paróquias da área rural pelas quais tinha grande carinho e dedicação. Entre os seminaristas, era um dos mais dispostos para o trabalho pastoral. Não encontrava dificuldade com o serviço para o qual era chamado. Estimava a cultura maranhense, em especial tinha um grande amor pelo Boi de Morros, pois nos anos 90 tinha participado como membro. Era o responsável pelo esporte do Seminário, foi um dos melhores jogadores do time SASA (Seminário Arquidiocesano Santo Antônio). Em padre Bernardo era presente aquilo que os gregos diziam “educar o espírito e o corpo”. Vestia a camisa do Flamengo, seu time do coração, e como todo jovem, gostava de comentar sobre futebol.

Por ser verdadeiro, muitas vezes era criticado por seus próprios colegas. Tinha uma “personalidade forte” em dizer aquilo que pensava. Era livre com as palavras e as atitudes, exemplo máximo para aqueles que acreditam que é preciso ser sempre cristão. Em Pe. Bernardo percebemos que para ser padre não há necessidade de muitas coisas extraordinárias ou fabulosas, não é preciso se clericalizar, nem tampouco se europeizar ou se romanizar, mas é preciso apenas ser entranhado na realidade maranhense tão sofrida. É preciso, sobretudo, ser íntegro e verdadeiro com aquilo que a Santa Mãe Igreja nos pede hoje, principalmente com as exigências do evangelho. Padre Bernardo estava em inicio do seu ministério, planejava ficar onde a Igreja lhe enviasse. Se ficasse na capital, planejava se dedicar aos estudos jurídicos, acreditava que isso lhe ajudaria em seu ministério.

Em menos de seis meses a Igreja Particular de São Luís sofre duas grandes perdas: o primeiro de ordenação marcada, MÁRIO DAYVIT. O segundo, um neo- presbítero de dois meses e quinze dias de ordenado, PADRE BERNARDO. Ambos foram vítimas da violência e da falta de segurança pública. A primeira vítima foi na capital, o segundo foi vitima no interior. A violência se alastra em toda sociedade, sejam centros urbanos, sejam nas áreas periféricas ou rurais. É hora de sermos profetas missionários! O sangue desses mártires clama por justiça! Se calarmos, as pedras falarão!

Marcio dos Santos Rabelo
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Hoje, 20/11/2012, faz 2 anos que o Pe. Bernardo partiu para a casa do Pai. Haverá uma celebração com os padres da Arquidiocese de São Luís às 19h na Igreja Matriz da Paróquia Nossa Senhora Aparecida do Munin - Morros-MA. Todos estão convidados!
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Fonte: http://www.arquidiocesedesaoluis.com.br/2011/2/25/martir-da-nao-violencia-1147.htm