Por ocasião
dos dois anos de pontificado do papa Francisco, os jovens de uma favela da
periferia da Grande Buenos Aires lhe enviaram uma série de perguntas, pensando
em publicar as respostas do papa no jornal da comunidade. E o papa respondeu.
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Cárcova News
- O senhor fala muito em periferia. É uma palavra que usa muitas vezes. No que
o senhor pensa quando fala de periferias? Em nós, nas pessoas da favela?
PAPA
FRANCISCO - Quando eu falo de periferia, falo de limites. Normalmente, nós
nos movemos em espaços que, de alguma forma, controlamos. Este é o centro. Mas,
à medida que vamos saindo do centro, vamos descobrindo mais coisas. E quando
olhamos para o centro a partir dessas novas coisas que descobrimos, a partir
das nossas novas posições, a partir dessa periferia, vemos que a realidade é
diferente. Uma coisa é ver a realidade a partir do centro e outra coisa é vê-la
do último lugar ao qual chegamos. Um exemplo. A Europa, vista a partir de Madri
no século XVI, era uma coisa, mas quando Magalhães chega ao fim do continente
americano e olha para a Europa, ele entende outras coisas. A realidade é vista
melhor a partir da periferia do que do centro. Também a realidade de uma
pessoa, das periferias existenciais e, inclusive, a realidade do pensamento. Você
pode ter um pensamento muito armado, mas, quando se confronta com alguém que
está fora desse pensamento, de alguma forma tem que procurar as razões do seu
próprio pensar; começa a dialogar, se enriquece a partir da periferia do
pensamento do outro.
Cárcova News
- O senhor conhece os nossos problemas. As drogas avançam e não são barradas;
entram nas favelas e atacam os nossos jovens. Quem deve nos defender? E nós,
como podemos nos defender?
PAPA
FRANCISCO - É verdade, a droga avança e não é barrada. Há países que já são
escravos da droga e isso nos preocupa. O que mais me preocupa é o triunfalismo
dos traficantes. Essas pessoas já cantam vitória, venceram, triunfaram. E isto
é uma realidade. Há países ou regiões onde tudo está sob o domínio da droga. A
respeito da Argentina, posso dizer só isto: há 25 anos, era um lugar de
passagem da droga; hoje em dia, é um lugar de consumo. E não tenho certeza, mas
acredito que também de fabricação.
Cárcova News
- Qual é a coisa mais importante que temos que dar aos nossos filhos?
PAPA
FRANCISCO - O pertencimento, o pertencimento a um lar. O pertencimento se
dá com amor, com carinho, com tempo, de mãos dadas, escutando-os, brincando com
eles, dando a eles o necessário em cada momento para o seu crescimento. Dando a
eles, principalmente, espaço para se expressarem. Se você não brinca com o seu
filho, o priva da dimensão da gratuidade. Se você não dá espaço para que ele
diga o que sente e para que ele possa até discutir com você por sentir-se livre
para isso, então você não está deixando que ele cresça. Mas o mais importante é
a fé. Dói muito, em mim, quando encontro jovens que não sabem fazer o sinal da
cruz. Esses jovens não receberam a coisa mais importante que um pai e uma mãe
podem dar a eles: a fé.