Hoje celebramos o glorioso martírio dos santos Apóstolos Pedro e
Paulo, aqueles “santos que, vivendo neste mundo, plantaram a Igreja, regando-a
com seu sangue. Beberam do cálice do Senhor e se tornaram amigos de Deus”.
Pedro, aquele a quem o Senhor constituiu como fundamento da unidade visível da
sua Igreja e a quem concedeu as chaves do Reino; Paulo, chamado para ser
Apóstolo de um modo único e especial, tornou-se o Doutor das nações pagãs,
levando o Evangelho aos povos que viviam nas trevas. Um pela cruz e o outro
pela espada, deram o testemunho perfeito de Cristo, derramando seu sangue e
entregando a vida em Roma, por volta do ano 67 da nossa era.
Popularmente, a festa de hoje é chamada o Dia do Papa, sucessor de
Pedro. Mas não podemos esquecer que ao lado de Pedro é celebrado também Paulo,
o Apóstolo por, ou seja, missionário, por excelência.
No evangelho, o apóstolo Simão responde pela fé de seus irmãos. Por
isso, Jesus lhe dá o nome de Pedro. Este nome é uma vocação: Simão deve ser a
“pedra” (rocha) que deve dar solidez à comunidade de Jesus (cf. Lc 22,32). Esta
“nomeação” vai acompanhada de uma promessa: as “portas” (cidade, reino) do
inferno não poderão nada contra a Igreja, que é uma realização do reino “dos
Céus” (= de Deus). A 1ª leitura ilustra essa promessa: Pedro é libertado da
prisão pelo anjo do Senhor. Pedro aparece, assim, como o fundamento
institucional da Igreja. Mas, de que modo Pedro é rocha? Como deve realizar esta prerrogativa, que naturalmente não recebeu para si mesmo? O texto de Mateus deixa claro que o reconhecimento da identidade de Jesus proferido por Simão, em nome dos Doze, não provém “da carne e do sangue”, isto é, das suas capacidades humanas, mas de uma especial Revelação de Deus Pai. Também sobressai, forte e clara, a promessa de Jesus: “as portas do inferno”, isto é, as forças do mal, “não conseguirão vencê-la. Na realidade, a promessa que Jesus faz a Pedro é ainda maior do que as promessas feitas aos profetas antigos: de fato, os profetas encontravam-se ameaçados por inimigos somente humanos, enquanto Pedro terá de ser defendido das “portas do inferno”, do poder destrutivo do mal. Jeremias recebe uma promessa que diz respeito à sua pessoa e ministério profético, enquanto Pedro recebe garantias relativamente ao futuro da Igreja, da nova comunidade fundada por Jesus Cristo e que se prolonga para além da existência pessoal do próprio Pedro, ou seja, por todos os tempos.
A Igreja, portanto, não é uma sociedade de livres pensadores, mas é a sociedade, ou melhor, a comunidade daqueles que se unem a Pedro em proclamar a fé em Jesus Cristo.
Todavia, doravante, não se poderá estar verdadeira e plenamente na Igreja, como pedra viva, se não se está em comunhão com a fé de Pedro e sua autoridade ou, ao menos, se não se procura estar. Santo Ambrósio escreveu uma palavra forte: “onde está Pedro, ali está a Igreja. ” Isto não significa que Pedro seja, sozinho, toda a Igreja, mas que não pode haver Igreja sem Pedro. A Igreja sem o Papa seria um barco sem timoneiro! O Papa é o representante de Cristo na terra ( seu Vigário) , o fundamento da unidade da Igreja.
Paulo aparece mais na qualidade de fundador carismático. Sua vocação
se dá na visão de Cristo no caminho de Damasco: de perseguidor, ele se
transforma em apóstolo e realiza, mais do que os outros apóstolos inclusive, a
missão que Cristo lhes deixou, de serem suas testemunhas até os extremos da
terra (At 1,8). Apóstolo dos pagãos, Paulo torna realidade a universalidade da
Igreja, da qual Pedro é o guardião. A 2ª leitura é o resumo de sua vida de
plena dedicação à evangelização entre os pagãos, nas circunstâncias mais
difíceis: a palavra tinha que ser ouvida por todas as nações (v. 17). Não
esconder a luz de Cristo para ninguém! O mundo em que Paulo se movimentava
estava dividido entre a religiosidade rígida dos judeus farisaicos e o mundo
pagão, cambaleando entre a dissolução moral e o fanatismo religioso. Neste
contexto, o apóstolo anunciou o Cristo Crucificado como sendo a salvação:
loucura para os gregos, escândalo para os judeus, mas alegria verdadeira para
quem nele crê. Missão difícil. No fim de sua vida, Paulo pode dizer que
“combateu o bom combate e conservou a fé/fidelidade”, a sua e a dos fiéis que
ele ganhou. Como Cristo – o bom pastor – não deixa as ovelhas se perderem,
assim também o apóstolo – o enviado de Cristo – conserva-lhes a fidelidade.
Pedro e Paulo representam duas dimensões da vocação apostólica,
diferentes mas complementares. As duas foram necessárias, para que pudéssemos
comemorar hoje os fundadores da Igreja universal.
Agradeçamos a Deus por pertencermos à Igreja fundada por Cristo que é “Una, Santa, Católica e Apostólica, edificada por Jesus Cristo, sociedade visível instituída com órgãos hierárquicos e comunidade espiritual simultaneamente (…); fundada sobre os Apóstolos e transmitindo de geração em geração a sua palavra sempre viva e os seus poderes de Pastores no Sucessor de Pedro e nos Bispos em comunhão com ele; perpetuamente assistida pelo Espírito Santo” (Paulo VI, Credo do Povo de Deus).
Também S. Paulo é hoje apresentado na cadeia (2 Tm 4, 6-8. 17-18), na sua última prisão que terminará com o seu martírio. O Apóstolo está consciente da sua situação; porém, as suas palavras não revelam amargura, mas a serena satisfação de ter gasto a sua vida pelo Evangelho: “aproxima-se o momento de minha partida. Combati o bom combate, completei a corrida, guardei a fé. Agora está reservada para mim a coroa da justiça…” (2 Tm 4, 6-8). Repassando os escritos do Apóstolo dos Gentios, descobrimos que a imagem da espada se refere a toda a sua missão de evangelizador. Por exemplo, quando já sentia aproximar-se a morte, escreve a Timóteo: “Combati o bom combate” ( 2 Tm 4, 7 ); aqui não se trata seguramente do combate de um comandante, mas daquele de um arauto da Palavra de Deus, fiel a Cristo e à sua Igreja, por quem se consumou totalmente. Por isso mesmo, o Senhor lhe deu a coroa de glória e colocou-o, juntamente com Pedro, como coluna no edifício espiritual da Igreja.
E qual será, hoje, o bom combate? Como no tempo de Pedro e Paulo, uma
luta pela justiça e a verdade em meio a abusos, contradições e deformações e à
exploração desavergonhada, que até se serve dos símbolos da nossa religião.
Assim, rezemos hoje pelo Papa. E acompanhemos nossa oração com um
gesto concreto: a esmola, o óbolo de São Pedro, aquela contribuição que no dia
de hoje os católicos do mundo inteiro devem dar para as obras de caridade do
Papa por todo o mundo. Assim, com as mãos e com o coração rezemos pelo Santo
Padre, o Papa: Que o Senhor nosso Deus que o escolheu para o Episcopado na
Igreja de Roma, o conserve são e salvo à frente da sua Igreja, governando o
Povo de Deus, de modo que o povo cristão a ele confiado possa sempre mais
crescer na fé.