quarta-feira, 14 de outubro de 2015

Papa dedica catequese às crianças e pede perdão por escândalos.


CATEQUESE
Praça São Pedro – Vaticano
Quarta-feira, 14 de outubro de 2015


Queridos irmãos e irmãs, bom dia! Hoje como as previsões do tempo estavam um pouco inseguras e se previa a chuva, esta audiência se faz ao mesmo tempo em dois lugares: nós aqui na praça e 700 doentes na Sala Paulo VI que seguem a audiência por telão. Todos estamos unidos e os saudamos com um aplauso.

A palavra de Jesus é forte hoje: “Ai do mundo por causa dos escândalos!”. Jesus é realista e diz: “É inevitável que escândalos aconteçam, mas ai do homem pelo qual o escândalo vem”. Gostaria de, antes de começar a catequese, em nome da Igreja, pedir perdão pelos escândalos que foram cometidos nos últimos tempos, seja em Roma ou no Vaticano, peço perdão.

Hoje vamos refletir sobre um tema muito importante: as promessas que fazemos às crianças. Não falo tanto das promessas que fazemos aqui e ali, durante o dia, para fazê-los felizes ou para estarem bem (talvez com qualquer truque inocente: te dou uma bala e promessas similares…) para levá-los a empenhar-se na escola ou para dissuadi-los a qualquer capricho. Falo de outras promessas, das promessas mais importantes, decisivas para suas expectativas nos confrontos da vida, para sua confiança nos confrontos dos seres humanos, para sua capacidade de conceber o nome de Deus como uma benção. São promessas que nós fazemos para eles.

Nós adultos estamos prontos a falar das crianças como de uma promessa da vida. Todos dizemos: as crianças são uma promessa da vida. E também somos fáceis de nos comovermos dizendo aos jovens que são o nosso futuro, é verdade. Mas me pergunto, às vezes, se somos tão sérios com o seu futuro, com o futuro das crianças e com o futuro dos jovens! Uma pergunta que devemos nos fazer muitas vezes é essa: quanto somos leais com as promessas que fazemos às crianças, fazendo-as vir ao nosso mundo? Nós fazemos com que elas venham ao mundo e essa é uma promessa, o que prometemos a elas?

Acolhimento e cuidado, proximidade e atenção, confiança e esperança, são promessas de base que se podem resumir em uma só: amor. Nós prometemos amor, isso é, amor que se exprime no acolhimento, no cuidado, na proximidade, na atenção, na confiança e na esperança, mas a grande promessa é o amor. Esse é o modo mais justo de acolher um ser humano que vem ao mundo e todos nós aprendemos isso, antes mesmo de sermos conscientes. Eu gosto tanto quando vejo os pais e as mães, quando passo entre vocês, trazendo a mim um menino, uma menina pequeninos e pergunto: “Quanto tempo tem? – “Três semanas, quatro semanas…peço a benção do Senhor”. Também isso se chama amor. O amor é a promessa que o homem e a mulher fazem a cada filho: desde quando foi concebido no pensamento. As crianças vêm ao mundo e se espera de ter confirmada essa promessa: espertam-no de modo total, confiante, indefeso. Basta olhar para elas: em todas as etnias, em todas as culturas, em todas as condições de vida! Quando acontece o contrário, as crianças são feridas por um “escândalo”, por um escândalo insuportável, tão mais grave, pois não têm os meios para decifrá-lo. Não podem entender o que acontece. Deus vigia sobre essa promessa, desde o primeiro instante. Lembram o que disse Jesus? Os Anjos das crianças refletem o olhar de Deus e Deus não perde nunca de vista as crianças (cfr Mt 18, 10). Ai daqueles que traem a sua confiança, ai! O seu confiante abandono à nossa promessa que nos empenha desde o primeiro instante, nos julga.

E gostaria de acrescentar outra coisa, com muito respeito por todos, mas também com muita franqueza. A confiança delas (das crianças) em Deus nunca deveria ser ferida, sobretudo quando acontece por motivo de uma certa presunção (mais ou menos inconsciente) de substituir a Ele. A terna e misteriosa relação de Deus com a alma das crianças não deveria nunca ser violada. É uma relação real, que Deus a quer e Deus a protege. A criança está pronta desde o nascimento para sentir-se amada por Deus, está pronta para isso. Não apenas é capaz de sentir que é amada por si mesma, um filho sente também que há um Deus que ama as crianças. 

Homilética: 29º Domingo Comum - Ano B: "Quem quiser ser o primeiro, seja o servo de todos".


Hoje a liturgia gira em torno do serviço, do serviço que Jesus veio inaugurar com a sua vida e o seu ministério. 

A leitura de Isaías nos leva a refletir sobre a missão de Deus de assumir os pecados da humanidade escravizada pelo pecado original. Jesus assumirá nossos pecados, carregará nossos pecados inaugurando um tempo novo, o tempo da salvação. No quarto canto do Servo de Javé, Deus não segue a lógica dos homens. O justo esmagado é que assume e resgata as faltas dos “muitos”. Por isso, Deus o exalta, na figura de Nosso Senhor Jesus Cristo, no Evangelho.

A primeira leitura demostra, uma vez mais, como os valores de Deus e os valores dos homens são diferentes. Na lógica dos homens, os vencedores são aqueles que tomam o mundo de assalto com o seu poder, com o seu dinheiro, com a sua ânsia de triunfo e de domínio, com a sua capacidade de impor as suas ideias ou a sua visão do mundo; são aqueles impressionam pela forma como vestem, pela sua beleza, pela sua inteligência, pelas suas brilhantes qualidades humanas…

Na lógica de Deus, os vencedores são aqueles que, embora vivendo no esquecimento, na humildade, na simplicidade, sabem fazer da própria vida um dom de amor aos irmãos; são aqueles que, com as suas atitudes de serviço e de entrega, trazem ao mundo uma mais valia de vida, de libertação e de esperança.

Irmãos e irmãs, o cenário do Evangelho de hoje(cf. Mc. 10,35-45) é a estrada para Jerusalém. Jesus e os Apóstolos se aproximam da cidade Santa. Dois discípulos queriam sentar-se, um à direita e outro à esquerda, de Jesus. Puro engano! Ainda não haviam compreendido o projeto de salvação de Jesus, que era morrer na Cruz pela salvação da humanidade.

Tiago e João cometeram o pecado de querer ser iguais ao Deus Salvador. Isso é um grave pecado, querer usurpar o lugar do Redentor, porque Tiago e João não poderiam morrer na cruz pela nossa salvação: essa era uma missão privativa do Filho de Deus, que depois subirá ao Céu e se sentará à direita do Pai. Jesus se humilha, fazendo-se servidor e morrendo pelos nossos pecados, para ser glorificado, ou seja, irromper a morte e anunciar a vida eterna. Jesus nos ensina hoje a amar e esperar com fé e esperança a morte.

A Morte de Jesus é para nós muito cara, principalmente quando relembramos que todos nós bebemos do mesmo cálice da salvação e recebemos o mesmo batismo, ou seja, a porta de entrada para sermos associados ao Senhor Ressuscitado, pela salvação.

Todos nós temos muito de João e Tiago: queremos o Reino de Deus, mas não trabalhamos para isso, não fazemos jus a este prêmio eterno. Hoje os homens procuram o poder, a glória, o ter, a honra. O que nós devemos ter é uma atitude de desprendimento, de renúncia, de serviço, é humilhar-se como Cristo, para subir ao céu depois de nossa peregrinação neste mundo!

Caros irmãos, na lógica da “mundanidade” os primeiros são os que têm dinheiro, os que têm poder, os que frequentam as festas badaladas nas revistas da sociedade, os que vestem segundo as exigências da moda, os que têm sucesso profissional, os que sabem colar-se aos valores politicamente corretos…

Em geral como concebe o nosso mundo social e político o uso da autoridade, dos ministérios, dos papéis e das funções? Promoção e honra, ambição e prestígio, domínio e tirania. Megalomania, arbitrariedade, tirania: eis ai a definição de muitos reinos e impérios da história passada: Nero, Sérvio Sulpicio Galba, Vespasiano... Isto é, “quantos súditos tenho para mandar, quantas bombas para disparar, quanto dinheiro para gastar”. Ambição, megalomania, exploração (ditatorial, republicana, democrática...): eis ai a definição de alguns Estados e nações na história contemporânea. Isto é: “quantos tenho que pisar para subir, que impostos impor para emagrecer os que têm e cevar os confrades do partido, quantos azulejos tenho que quebrar e corromper de religião, moral, matrimônio, família, filhos para me manter na poltrona”. E, desgraçadamente, não só no campo social e político, mas também familiar ou comunitário, isto pode acontecer. Está sempre ai a tentação de dominar e tiranizar os outros, se eles se deixam.

E na comunidade cristã? Quem são os primeiros? As palavras de Jesus não deixam qualquer dúvida: “quem quiser ser o primeiro, será o último de todos e o servo de todos”. Na comunidade cristã, a única grandeza é a grandeza de quem, com humildade e simplicidade, faz da própria vida um serviço aos irmãos.

Na comunidade cristã não há donos, nem grupos privilegiados, nem pessoas mais importantes do que as outras, nem distinções baseadas no dinheiro, na beleza, na cultura, na posição social… Na comunidade cristã há irmãos iguais, a quem a comunidade confia serviços diversos em vista do bem de todos. Aquilo que nos deve mover é a vontade de servir, de partilhar com os irmãos os dons que Deus nos concedeu.

Olhemos para Cristo, o nosso exemplo supremo. Não quis prerrogativas, nem ambições. Rebaixou-se, fez-se nada, arregaçou as mangas e lavou os pés. Veio para servir, e não para ser servido. Serviu o seu Pai celestial. Serviu Maria e José, os seus pais aqui na terra. Serviu a humanidade, curando, consolando, dando de comer, pregando a mensagem da salvação. Não quis nada em troca. Veio para dar a vida em resgate por todos. Onde resgate equivale à libertação do pecado e do cativeiro do demônio, mas também libertação das estruturas sociais, políticas, econômicas, religiosas, sindicais... opressoras do homem. Cristo não é um líder divino que abre caminho vencendo inimigos e instaurando um Reino de Deus político, não é um dominador, mas um servidor; não um vencedor, mas um vencido e rendido por amor. 

Não troco a minha fé por outra fé


Sempre, em minha caminhada de Igreja, ouvi questionamentos sobre certas práticas da Igreja Católica, tanto de católicos em dúvidas quanto de alguns evangélicos mal informados ou talvez mal formados (e que buscam comunidades pentecostais onde qualquer formação é deixada de lado). Para ser breve, apresento algumas dessas questões:

- “Por que os católicos têm imagens se a Bíblia as proíbe?”

- “Por que a Igreja Católica usa incenso? Isso não é coisa de bruxaria?”

- “Por que acreditar na ação dos santos?”

- “Por que dizer que Maria é virgem se a Bíblia fala dos irmãos de Jesus?”

Há mais perguntas, mas vamos a estas que já preenchem matéria para mais de uma página.

Sobre as imagens é interessante que há passagens que proíbem a fabricação de ídolos, mas, depois, na construção do templo que Davi desejou construir (e que seu filho Salomão teve o privilégio de concretizar), há orientações bem claras sobre imagens de querubins sobre a arca e estátuas de bois para servir de apoio à bacia usada nos ritos de purificação. Havia imagens no templo, mas ninguém as adorava só por estarem ali. Nenhum judeu cometeu idolatria só porque entrou num templo com imagens de ouro e bronze. Além disso, temos outros episódios emblemáticos, como o da serpente de bronze incrustada em um poste (Números 21,8). Deixo a seguir várias citações bíblicas para que cada um verifique e as guarde para dar respostas a muitos que as desconhecem: proibição das imagens – Êxodo 20, 4; Deuteronômio 5, 8-10; aprovação das imagens – 1Reis 6, 23-29; Êxodo 26, 31-33; Êxodo 25, 18-22; 1Samuel 4, 4; 2Samuel 6, 2; Salmo 98, 1; Êxodo 25, 40.

Papa reafirma promessa de nova visita ao Brasil em 2017


O Papa quer manter a sua palavra e voltar ao Brasil em 2017. A promessa feita em julho de 2013, diante dos fiéis em Aparecida, deverá ser cumprida, e foi o próprio Francisco a garanti-lo pessoalmente ao Arcebispo de Aparecida, Dom Raymundo Damasceno Assis. O cardeal está participando do Sínodo sobre a Família como Presidente Delegado, motivo pelo qual não pode estar em sua arquidiocese, celebrando a padroeira.

“Com muito pesar, estou ausente da celebração da grande festa da nossa padroeira e rainha do Brasil, Nossa Senhora Aparecida, mas tenho um motivo para justificar a minha ausência: o Papa Francisco me nomeou como um dos Presidentes delegados do Sínodo da Família e por isto estou aqui em Roma, participando do encontro até dia 25. Tive, no entanto, a alegria de participar, e presidir a missa, da comunidade brasileira aqui em Roma, no bairro de Trastevere. Foi uma celebração com uma participação muito grande de brasileiros que vivem em Roma e nos arredores de Roma. Isto me fez, de certo modo, preencher, este sentimento de pesar por não poder participar da celebração de honra e louvor em Aparecida. Estou unido espiritualmente a todos os romeiros, a todos aqueles que estão hoje visitando o Santuário, em peregrinação; estou rezando por todos e pedindo a Deus que, por intercessão de Nossa Senhora Aparecida, que abençoe o nosso Brasil, o nosso povo, que nos dê luzes para podermos seguir o nosso caminho rumo ao crescimento, ao desenvolvimento, sempre na paz e na harmonia, e também na justiça social, onde todos os brasileiros possam usufruir do crescimento e do progresso do nosso país”. 

terça-feira, 13 de outubro de 2015

Cardeal Müller: filtração de suposta “carta” para o Papa Francisco procura dividir-nos


O Cardeal Gerhard Ludwig Müller, Prefeito da Congregação para a Doutrina da Fé, não confirmou nem desmentiu que esteve entre os cardeais que assinaram uma carta, a qual foi entregue ao Papa Francisco – e publicada pelo vaticanista Sandro Magister– através da qual expressam suas preocupações a respeito do Sínodo. Entretanto, afirmou que a difusão do texto procura “dividir-nos”.

Em uma entrevista concedida ao Jornal italiano ‘Il Correr della Sera’, o Cardeal também mencionou o tema do acesso à comunhão dos divorciados em nova união, assim como dos supostos conflitos que acontecem no Sínodo.

A respeito da suposta carta assinada por um grupo de cardeais – quatro deles desmentiram havê-la assinado –, Müller respondeu: “Eu não confesso ter assinado ou não”, mas “o motivo do escândalo foi por terem publicado uma carta privada dirigida ao Pontífice. Isto é um novo vatileaks. Os atos privados do Papa fazem parte da sua propriedade privada e de ninguém mais. Ninguém tinha o direito de publicá-la, não sei se isso aconteceu e quem o fez deveria justificá-lo”.

Vatileaks é o termo com o qual a mídia se referia à filtração dos documentos privados do Papa Bento XVI causada por um dos seus mordomos do apartamento pontifício em 2012 e estes foram publicados em um livro pelo italiano Gianluigi Nuzzi.

Sobre as intenções de quem filtrou a carta enviada ao Papa nesta ocasião, o Cardeal Müller acredita que pretende “semear conflitos, criar tensões. Isto é óbvio”. 

Carta privada ao Papa enviada por Cardeais foi publicada para “realizar um ato de interferência" não querida pelos signatários, diz o Pe. Federico Lombardi.


Por ocasião do Sínodo da família que está acontecendo no Vaticano, muitas pessoas e instituições escreveram ao Santo Padre Francisco. Entre as cartas há uma carta privada dirigida ao Papa, assinada por vários cardeais, e que foi dada a conhecer por um jornalista de forma ilegítima.

O diretor da Sala de Imprensa da Santa Sé, o Pe. Federico Lombardi, declarou nesta terça-feira que a carta foi publicada para “realizar um ato de interferência" não querida pelos signatários.

Pelo menos quatro cardeais --Scola, Vingt Trois, Piacenza e Erdó-- que estavam entre os signatários já desmentiram, disse Lombardi.

E o cardeal mexicano Norberto Rivera Carrera, Arcebispo da Cidade do México, disse hoje que ele também não a assinou: “Eu nunca assinei a mencionada carta com os conteúdos que alguns mencionam. Ao mesmo tempo, reconheço que o lugar apropriado da discussão é com outros padres sinodais e sob a orientação do Papa, que é a nossa garantia de unidade na Igreja e aquele que tem meu maior respeito e lealdade”. 

Desapego das falsas riquezas leva à vida verdadeira, diz Papa


Angelus
Praça São Pedro – Vaticano
11 de outubro de 2015


Caros irmãos e irmãs, bom dia!

O Evangelho de hoje, extraído do capítulo 10 de Marcos, é articulado em três episódios, inspirados em três olhares de Jesus.

O primeiro episódio apresenta o encontro entre o Mestre e um tal que – de acordo com o trecho paralelo de Mateus – é identificado como “jovem”. Este corre em direção a Jesus, ajoelha-se e o chama de “Mestre bom”. Então, pergunta: “O que devo fazer para herdar a vida eterna?”.

“Vida eterna não é somente a vida do outro lado, mas é a vida plena, realizada, sem limites. O que devemos fazer para alcança-la? A resposta de Jesus reassume os mandamentos que se referem ao amor ao próximo. Sobre isso, aquele jovem não há nenhuma pendência; mas, evidentemente, observar os preceitos não basta, não satisfaz seu desejo de plenitude. E Jesus intui este desejo que o jovem traz no coração; por isso, a sua resposta se traduz em um olhar intenso repleto de ternura e afeto: “Fitando-o, Jesus o amou”. Mas Jesus entende também qual é o ponto fraco do seu interlocutor, e lhe faz uma proposta concreta: dar todos os seus bens aos pobres e segui-lo. Aquele jovem, entretanto, tem o coração dividido entre dois patrões: Deus e o dinheiro, e vai embora triste. Isso demonstra que a fé e o apego às riquezas não podem conviver. Assim, ao final, o ímpeto inicial do jovem se apaga na infelicidade de um seguimento que não advém.

No segundo episódio o evangelista enquadra os olhos de Jesus e, desta vez, trata-se de um olhar pensativo, de aviso: “Então, Jesus, olhando em torno, disse a seus discípulos: “Como é difícil a quem tem riquezas entrar no Reino de Deus!”. Diante do estupor dos discípulos, que se perguntam: “Então, quem pode ser salvo?”, Jesus responde com um olhar de encorajamento – é o terceiro olhar – e diz: a salvação é, sim, “impossível aos homens, mas não a Deus”. Se confiamos no Senhor, podemos superar todos os obstáculos que nos impedem de segui-lo no caminho da fé. 

A escola católica deve ter critérios claros: os da sã doutrina católica.


A perda dos critérios para pensar é a coisa mais grave que está acontecendo na nossa contemporaneidade. A falta de critérios paralisa, impede o pensamento, impossibilita a educação, impossibilita a própria convivência democrática. A falta de critérios para pensar é própria para as ditaduras, os governos totalitários, jamais para as democracias.

Menciono aqui a palavra “desconstrução”, que transformou-se num mote da contemporaneidade, uma espécie de senha, um “shibolet” pós-moderno. Desconstruir é, segundo os vanguardistas, desmascarar aquilo que a sociedade nos impõe como “natural”, mas na verdade, segundo eles, é artificial, um mero “construído” social imposto através da força do opressor sobre o oprimido. Muito pouca coisa passa no teste da “desconstrução”: o governo, o chefe, o empresário, o pai e a mãe, o professor, o sacerdote, o policial, a própria identidade pessoal do ser humano, seu sexo, sua aparência, suas necessidades mais básicas, tudo isto estaria “construído”, seria um grande “jogo” de “papéis” (no sentido teatral do termo) que os “poderosos” impõem por cima dos “oprimidos”. Desconstruir, então, seria ir “desmascarando” um a um estes “papéis” para chegar ao ser humano desnudo, simples, imaterial e angelical, absolutamente despido de sentido e conteúdo, que a contemporaneidade acredita que constitui um “eu” - e a quem caberia “refazer-se” sem jamais deixar-se dominar por qualquer externalidade relacional: a liberdade plena coincidiria com o pleno vazio existencial. O ser humano seria, para esses ideólogos que estão no nosso governo, nas nossas escolas, universidades e órgãos públicos de educação, a absoluta solidão que constrói a si mesmo, e desconstrói todo o resto: uma espécie de tirano da sua própria individualidade.

Se toda realidade humana não passa de um construto social que deve ser desmascarado por apresentar-se sob uma falsa capa de “naturalidade”, então não há algo como o “bem”. Mas há uma grave contradição aqui: se não há algo como o “bem”, tampouco se pode dizer que “educar é bom”, porque esta fala pressupõe que o “bem” exista, e que, portanto, seja possível afirmar que “educar” é melhor que “não educar”. Se não há bem, não há nenhuma educação possível!

Assim, estamos na seguinte situação: por um lado, a sociedade demanda mais educação; mas por outro lado, a ideia de “desconstrução” retira qualquer possibilidade de objetividade, de rumo, nessa mesma educação. Isto reflete mais ou menos o que Chesterton prenunciava já no início do século passado:

O homem moderno diz, "deixemos estes padrões arbitrários e abracemos a liberdade." Isto significa, reformulando-se logicamente, "Não decidamos o que é bom, mas consideremos que bom é não decidir isto." Ele diz, "Fora com suas fórmulas morais velhas; Eu sou partidário do progresso." Isto, logicamente dito, significa, "não estabeleçamos o que é o bem; mas estabeleçamos que devemos adquirir mais dele." Ele diz, "Nem na religião nem na moralidade, meu amigo, repousam as esperanças da raça, mas na educação." Isto, claramente expresso, significa, "Nós não podemos determinar o que é bom, mas ensinemo-lo aos nossos filhos."”

Chegamos então na seguinte situação: nossas escolas, hoje, a pretexto de preparar seus estudantes para “isto tudo que está aí”, propõe ensinar os estudantes a “não ter preconceitos” frente à “realidade contemporânea”. Mas acaba simplesmente promovendo, entre seus estudantes, exatamente a desconstrução que alegava estudar. Isto mesmo na rede católica de educação.

Assim, uma escola católica pode, digamos, adotar um livro que as livrarias descrevem como “uma obra que visa desconstruir a noção de família ideal” sob o pretexto de que precisa ensinar suas crianças a conviver com os diversos modelos de família que existem de fato em nossa sociedade contemporânea, como se nenhum critério justo de família pudesse existir, mesmo analogicamente; e muitas vezes o faz com a consciência limpa de quem está rompendo barreiras, preparando para o futuro.

Ou seja, já não há distinções claras entre uma educação que ensine e prepare as crianças para viver num mundo que classificará tudo que a criança tem de mais precioso em sua vida – sua família, sua religião, sua identidade cultural – como “imposições sociais a serem desconstruídas”, e uma educação que ensine à criança que este processo existe, que ela deve conviver com ele, que ele inclusive a atingirá e destruirá muitas dimensões preciosas de sua vida, mas que o fato de que a “desconstrução” está vencendo não transforma as coisas que ele busca destruir em coisas más, ou em perdas inevitáveis, ou mesmo necessárias. É assim que muitas escolas católicas estão contribuindo com a ideologia da desconstrução: a pretexto de preparar as crianças para uma sociedade desconstrutivista, ela simplesmente desconstrói, ou melhor dizendo, destrói de antemão, na mente das indefesas crianças, aquilo que a ideologia entende que deve ser desconstruído.

É por isto, por esta confusão, muitas vezes proposital, entre preparar os alunos para um mundo desequilibrado ou promover o próprio desequilíbrio, que escolas, mesmo as mais religiosas, estão ensinando a equivalência – ou a irrelevância – de todas as religiões, a necessidade da supressão da própria ideia de mãe e pai em prol da designação genérica de “genitores”, a “tolerância” frente aos desejos sexuais mais desordenados, ou mesmo o direito infantil ou juvenil de praticá-los, e os pais, assistindo as vezes descontentes esta situação, tendem também a não confiar nas escolas, e reagir com agressividade, seja para defender a desconstrução, seja para se defender dela.

Há diferença entre “educar para uma sociedade que desconstrói” e promover a própria desconstrução através da educação? A dificuldade, para os educadores, de perceber tal diferença fica bem clara da fala de uma educadora numa escola católica, que me foi noticiada por um amigo:

Uma criança veio me perguntar se menina pode beijar na boca de menina, então eu respondi que é para perguntar aos pais. Sabe porque, gente? Cada família educa de uma forma. Eu não posso dizer que sim nem que não."

É hora de sair de cima do muro. Na escola católica não pode. Temos critério. Eventualmente o que não pode acontece, e isto não é o fim do mundo: conversa-se, discute-se, resolve-se. Mas aqui, parodiando um famoso comentarista esportivo, “a regra é clara”. A família que discorda é livre para discordar, mas não é livre para impor à escola católica sua própria opinião; que mude de escola. Ninguém é obrigado a matricular-se ou manter-se numa escola católica, mas ninguém, nem a própria direção da escola, tem o direito de impor à escola católica que aceite deixar de ser católica, traindo a Igreja e aos pais católicos que confiam nela. Não faltam escolas adequadas às famílias que pensam diferentemente.

É preciso que isto fique claro para os alunos, os professores e os pais: aqui, na escola católica, se pensa, se educa e se discute sobre todos os assuntos da sociedade, sobre todas as correntes de pensamento, sobre todos os problemas da contemporaneidade, com toda a liberdade acadêmica. Os alunos são de fato, preparados para lidar com toda a problemática atual, com respeito e abertura, sem falsos temores ou escrúpulos moralistas. Mas há umcritério, há uma visão clara sobre o que é o bem: o critério é a sã doutrina católica. Ou isto fica claro, ou acaba a diferença entre educar para conviver com as ideologias desconstrutoras, por um lado, e promover a própria desconstrução, por outro. Temos uma identidade, e é a identidade católica. Temos o direito de reafirmá-la contra toda tentativa de “desconstrução”, em especial na rede católica de educação. Ou como diz Dom Odilo Scherer em sua recente carta sobre educação católica, “em tempos de liberdade, é salutar que nem todas as universidades [e escolas, acrescentaríamos nós] leiam pela mesma cartilha de liquefação e vaporização do pensamento, das verdades e das referências no convívio humano.”


A primeira regra em educação deveria ser: ninguém deve enganar ninguém. Quem se apresenta como escola católica, que seja católica. Quem procura um colégio católico, que aceite o que encontra. Ou matricule-se em outro lugar.
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