Mensagem
do Papa Francisco para o 49º Dia Mundial da Paz
–
1º de janeiro de 2016
Terça-feira,
15 de dezembro de 2015
VENCE A INDIFERENÇA E CONQUISTA A PAZ
1. Deus não é indiferente; importa-Lhe a
humanidade! Deus não a abandona! Com esta minha profunda convicção, quero, no
início do novo ano, formular votos de paz e bênçãos abundantes, sob o signo da
esperança, para o futuro de cada homem e mulher, de cada família, povo e nação
do mundo, e também dos chefes de Estado e de governo e dos responsáveis das
religiões. Com efeito, não perdemos a esperança de que o ano de 2016 nos veja a
todos firme e confiadamente empenhados, nos diferentes níveis, a realizar a justiça
e a trabalhar pela paz. Na verdade, esta é dom de Deus e trabalho dos homens; a
paz é dom de Deus, mas confiado a todos os homens e a todas as mulheres, que
são chamados a realizá-lo.
Conservar as
razões da esperança
2. Embora o ano passado tenha sido caracterizado,
do princípio ao fim, por guerras e actos terroristas, com as suas trágicas
consequências de sequestros de pessoas, perseguições por motivos étnicos ou
religiosos, prevaricações, multiplicando-se cruelmente em muitas regiões do
mundo, a ponto de assumir os contornos daquela que se poderia chamar uma
«terceira guerra mundial por pedaços», todavia alguns acontecimentos dos
últimos anos e também do ano passado incitam-me, com o novo ano em vista, a
renovar a exortação a não perder a esperança na capacidade que o homem tem, com
a graça de Deus, de superar o mal, não se rendendo à resignação nem à
indiferença. Tais acontecimentos representam a capacidade de a humanidade agir
solidariamente, perante as situações críticas, superando os interesses individualistas,
a apatia e a indiferença.
Dentre tais acontecimentos, quero recordar o
esforço feito para favorecer o encontro dos líderes mundiais, no âmbito da
Cop21, a fim de se procurar novos caminhos para enfrentar as alterações
climáticas e salvaguardar o bem-estar da terra, a nossa casa comum. E isto
remete para mais dois acontecimentos anteriores de nível mundial: a Cimeira de
Adis-Abeba para arrecadação de fundos destinados ao desenvolvimento sustentável
do mundo; e a adopção, por parte das Nações Unidas, da Agenda 2030 para o
Desenvolvimento Sustentável, que visa assegurar, até ao referido ano, uma
existência mais digna para todos, sobretudo para as populações pobres da terra.
O ano de 2015 foi um ano especial para a Igreja,
nomeadamente porque registou o cinquentenário da publicação de dois documentos
do Concílio Vaticano II que exprimem, de forma muito eloquente, o sentido de
solidariedade da Igreja com o mundo. O Papa João XXIII, no início do Concílio,
quis escancarar as janelas da Igreja, para que houvesse, entre ela e o mundo,
uma comunicação mais aberta. Os dois documentos – Nostra aetate e Gaudium et
spes – são expressões emblemáticas da nova relação de diálogo, solidariedade e
convivência que a Igreja pretendia introduzir no interior da humanidade. Na
Declaração Nostra aetate, a Igreja foi chamada a abrir-se ao diálogo com as
expressões religiosas não-cristãs. Na Constituição pastoral Gaudium et spes –
dado que «as alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos homens
de hoje, sobretudo dos pobres e de todos aqueles que sofrem, são também as
alegrias e as esperanças, as tristezas e as angústias dos discípulos de
Cristo»[1] –, a Igreja desejava estabelecer um diálogo com a família humana
sobre os problemas do mundo, como sinal de solidariedade, respeito e amor.[2]
Nesta mesma perspectiva, com o Jubileu da
Misericórdia, quero convidar a Igreja a rezar e trabalhar para que cada cristão
possa maturar um coração humilde e compassivo, capaz de anunciar e testemunhar
a misericórdia, de «perdoar e dar», de abrir-se «àqueles que vivem nas mais
variadas periferias existenciais, que muitas vezes o mundo contemporâneo cria
de forma dramática», sem cair «na indiferença que humilha, na habituação que
anestesia o espírito e impede de descobrir a novidade, no cinismo que
destrói».[3]
Variadas são as razões para crer na capacidade que
a humanidade tem de agir, conjunta e solidariamente, reconhecendo a própria
interligação e interdependência e tendo a peito os membros mais frágeis e a
salvaguarda do bem comum. Esta atitude de solidária corresponsabilidade está na
raiz da vocação fundamental à fraternidade e à vida comum. A dignidade e as
relações interpessoais constituem-nos como seres humanos, queridos por Deus à
sua imagem e semelhança. Como criaturas dotadas de inalienável dignidade,
existimos relacionando-nos com os nossos irmãos e irmãs, pelos quais somos
responsáveis e com os quais agimos solidariamente. Fora desta relação,
passaríamos a ser menos humanos. É por isso mesmo que a indiferença constitui
uma ameaça para a família humana. No limiar dum novo ano, quero convidar a
todos para que reconheçam este facto a fim de se vencer a indiferença e
conquistar a paz.