Alguns,
romanticamente, pensam que Cristo é contra a guerra, e só querem a
"paz". Uma paz que seria simples ausência de luta, fazendo de Jesus
um pacifista.
Ora, o Evangelho
apresenta uma visão completamente oposta a esse pacifismo sentimental, que é
essencialmente injusto.
Nosso Senhor
preveniu que por causa dEle haveria muitas divisões e lutas.
Já quando Ele
foi apresentado no Templo, quarenta dias após o seu nascimento, o profeta
Simeão disse a Nossa Senhora: "Eis que este menino está posto para ruína e
ressurreição de muitos em Israel, e para ser alvo de contradição" (Luc.
II, 34).
E o próprio
Cristo nos disse:
"Julgais
que vim trazer a paz à terra? Não, vos digo eu, mas a divisão; porque de hoje
em diante, haverá numa casa cinco pessoas, divididas três contra duas, e duas
contra três. O pai contra o filho, e o filho contra o pai; a mãe contra a
filha, e a filha contra a mãe; a sogra contra a nora, e a nora contra a
sogra" (Luc. XII, 51-53).
E em São Mateus
se acha o mesmo texto sobre o qual você me consulta:
"Não
julgueis que vim trazer a paz à terra; não vim trazer a paz, mas a espada.
Porque vim separar o filho de seu pai, e a filha de sua mãe, e a nora de sua
sogra. E os inimigos do homem serão os seus próprios domésticos" (Mt. X,
34-36).
Qual a razão
dessas profundas divisões trazidas pela doutrina de Cristo, que separará até
mesmo os parentes mais chegados?
É que a verdade
atinge o mais profundo do homem. E, da adesão ou repulsa da verdade trazida por
Cristo, nascem essas divisões.
O homem, que
prefere gozar a vida, não tolera a verdade de Cristo, e então procura
combatê-la. Os que querem fazer antes de tudo, a vontade de Deus, aceitam a
verdade anunciada por Cristo, e querem fazer a sua vontade, colocando o servir
a Deus acima até do amor aos parentes. Os que querem fazer a sua própria
vontade rejeitam a verdade ensinada por Cristo, e procuram combatê-la. Daí, as
divisões. Daí, a guerra continua, na História, entre os filhos de Deus e os
filhos do demônio.
Essa é a guerra
trazida por Cristo. Exatamente como foi predito no Gênesis, quando Deus disse,
ao amaldiçoar a serpente:
"Colocarei
inimizades entre ti (o demônio) e a mulher (a Virgem Maria), entre a tua raça
(os filhos do diabo) e a dela (os filhos de Nossa Senhora), e Ele mesma te
esmagará a cabeça" (Gen. III, 15).
Isto é o
contrário do que ensina o liberalismo, triunfante, hoje em dia.
O liberalismo,
seguindo as mentiras pregadas por Rousseau, considera que o homem é bom, sem
ter nenhuma inclinação para o mal e para o erro. Para Rousseau, não haveria
pecado original, e, conhecendo a verdade, o homem a aceitaria sempre.
Ora, é o
contrário disso que acontece.
Normalmente, o
homem não gosta da verdade, porque ela lhe traz obrigações. A mentira é cômoda.
A mentira não nos obriga a nada. Servimo-nos dela como de uma escrava, enquanto
nos é conveniente. Desde que a mentira não nos convenha mais, nós a expulsamos,
denunciando a sua falsidade.
A verdade é
nossa rainha, que nos impõe obrigações. Por isso, resistimos à verdade. E
preferimos a mentira. Dai a verdade de Cristo ter produzido tanto ódio contra
Ele.
Na história,
Cristo estabeleceu a sua Igreja para ensinar a única verdade, e contra ela o
demônio suscita sempre heresias, calúnias e mentiras. Por isso, a Igreja é
chamada militante, e não pacifista.
Por isso, Cristo
instituiu um sacramento, o Crisma -- que nos torna soldados de Cristo. É para
seus soldados, para aqueles que compreendem que o crisma deve ser vivido na
luta pela defesa da Fé que Cristo deixou a espada. E a espada que Ele nos
deixou não é para fazer tricô. É para combater. Porque só o combate para
estabelecer a verdade e a justiça impõe a ordem, e só com a ordem e a justiça
existe a paz. A paz é obra da justiça. Opus justitiae, pax . Justiça e paz se
beijaram (Sl.LXXXIV, 11) por que uma não existe sem a outra. E a justiça só se
estabelece, muitas vezes, com o uso da espada. A espada da verdade.
Hoje só se fala
em paz. Mas é a paz dos maus, fundada na injustiça. Cabe então muito aos que
hoje falam de paz o que o profeta Jeremias dizia dos maus sacerdotes de seu tempo,
que causaram a guerra e a destruição de Jerusalém:
"Eles
curavam as chagas das filhas de meu povo com ignomínia, dizendo: Paz, paz,
quando não havia paz" (Jer. VI, 14).
Porque "Não
há paz para os ímpios, diz o Senhor Deus" (Isaias, XXII, 57, 21).