Estamos no penúltimo domingo do Ano Litúrgico. A Palavra de Deus
convida-nos a meditar no fim último do homem, no seu destino além da morte. A
meta final, para onde Deus nos conduz, faz nascer em nós a esperança e a
coragem para enfrentar as adversidades e lutar pelo Advento do Reino.
O Profeta Malaquias fala do juízo final, com acentos fortes: “Eis que
virá o dia, abrasador como fornalha…” (Ml 3, 19)
O texto do Evangelho ( Lc 21, 5-19 ) é uma parte dos famosos discursos
escatológicos de Jesus. Podemos interpretá-lo como anúncio de desventuras: aí
se fala de guerras, revoluções, terremotos, carestias e pestes. Na realidade,
ao invés, é um anúncio de paz. As desventuras – de acordo com o que o
Evangelista Lucas diz à Igreja – continuarão a existir, porque fazem parte
integral da história humana; não foi Jesus que as trouxe, o que Jesus trouxe
foi, antes, a possibilidade de vencê-las mediante a fé em seu nome: “Mas vós
não perdereis um só fio de cabelo da vossa cabeça. É permanecendo firmes que
ireis ganhar a vida!” ( Lc21, 18-19 ).
O texto não pretende incutir medo, falando do “fim do mundo”, mas
fortalecer a esperança em Deus para enfrentar os dramas da vida e da história;
esperança que devemos ter ainda hoje, apesar do que vemos…
São Paulo (2Ts 3, 7-12) fala da comunidade de Tessalônica, perturbada
por fanáticos que pregavam estar próximo o fim do mundo, por isso não valia a
pena continuar trabalhando. Paulo diz: “Quem não quer trabalhar, também não
deve comer…” (2Ts 3, 10). O Apóstolo ressalta a importância do trabalho para a
vida do homem.
A vida é realmente muito curta e o encontro com Jesus está próximo. Isto
ajuda-nos a desprender-nos dos bens que temos de utilizar e aproveitar o tempo;
mas não nos exime de maneira nenhuma de dedicar-nos plenamente à nossa
profissão no seio da sociedade. Mais ainda: é com os nossos afazeres terrenos,
ajudados pela graça, que temos de ganhar o Céu.
Para imitar Cristo, que trabalhou como artesão a maior parte de sua
vida, longe de descuidar as tarefas temporais, os cristãos “estão mais
obrigados a cumpri-los, por causa da própria fé, de acordo com a vocação a que
cada um foi chamado (GS, 43).
Durante séculos, muitos pensavam que, para serem bons cristãos,
bastava-lhes uma vida de piedade sem conexão alguma com as suas ocupações
profissionais no escritório, na fábrica, no campo, na Universidade… Muitos tinham,
além disso, a convicção de que os afazeres temporais, os assuntos profanos em
que o homem está imerso de uma forma ou de outra eram um obstáculo para o
encontro com Deus e para uma vida plenamente cristã. A vida oculta de Jesus
veio ensinar-nos o valor do trabalho, da unidade de vida, pois com o seu
trabalho diário o Senhor estava também redimindo o mundo.
O fiel cristão não deve esquecer que, além de ser cidadão da Terra,
também o é do Céu, e por isso deve comportar-se entre os outros de uma maneira
digna da vocação a que foi chamado, sempre alegre, irrepreensível e simples,
compreensivo com todos, bom trabalhador e bom amigo, aberto a todas as
realidades autenticamente humanas (cf. Fl. 1, 27; 2, 3-4; 2, 15; 4,4).
É algo verdadeiramente humano e nobre: ninguém quer morrer, ninguém quer
ser enganado. E porque tantas pessoas se empenharam em saber a data do fim do
mundo? A curiosidade também é algo assaz humana. Viver e conhecer a verdade são
dois grandes desejos que estão no coração de cada ser humano. Nisso se pode ver
que o céu será a realização de tudo isso: viveremos para sempre conhecendo e
amando a Verdade, que é Deus. Quando? Para cada um, logo após a sua morte
haverá um juízo na qual já se decidirá a sua sorte eterna (cfr. Hb 9,27). Para
todos, na consumação dos tempos, haverá um juízo universal que reafirmará a
sentença do juízo particular tendo em conta as consequências das nossas ações
(cfr. Mt 25,31-46). Ambos os eventos são desconhecidos quanto ao tempo de sua
realização.
De todas as maneiras, e contra qualquer teoria que pretenda saber mais
que os desígnios do Altíssimo, no Evangelho, Jesus nos deixa de sobreaviso:
“vede que não sejais enganados. Muitos virão em meu nome, dizendo: Sou eu; e
ainda: O tempo está próximo. Não sigais após eles” (Lc 21,8). É verdade: Jesus
voltará, ressuscitaremos com os nossos corpos, seremos julgados, há prêmio
(céu) e castigo (inferno), haverá um novo céu e uma nova terra. Essas são
verdades da nossa fé. Mas, quando acontecerá? Em primeiro lugar, o Senhor nos
diz que tenhamos cuidado para não sermos enganados e depois nos diz que não
sigamos os falsificadores da verdade. Em outra passagem lemos: “vigiai, pois,
porque não sabeis a hora em virá o Senhor. (…) Por isso, estai também vós de
preparados porque o Filho do homem virá numa hora em que menos pensardes” (Mt
24,42-44). O importante é vigiar e estar preparado sempre, isto é, em graça de
Deus e praticando as obras da fé.
Diante das catástrofes Jesus exorta à esperança: não ter medo… Esses
sinais de desagregação do mundo velho não devem assustar, pelo contrário são
anúncio de alegria e esperança, de que um mundo novo está por surgir. “Quando
essas coisas começarem a acontecer, levantem-se, ergam a cabeça, porque a
libertação está próxima” (Lc 21, 28). A vida do discípulo no mundo assume, de
repente, um aspecto novo: é vida de espera, por isso de vigilância; é vida de
peregrinos a caminho, não de domiciliados e de sedentários.
Quanto aos “presságios” do Novo Testamento sobre o fim – difusão do
Evangelho, anticristo, conversão dos judeus –, parece que é preciso entendê-los
como sinais enigmáticos presentes na história entre a primeira e a segunda
vinda de Cristo que ajudam os cristãos a manter-se em estado de vigilância
continua e a desejarem a vinda do Senhor. Há uma presença permanente de Cristo
na história que se culminará com a sua Parusia gloriosa na consumação desses
últimos tempos que estamos vivendo. Em efeito, já estamos nos últimos tempos
desde a Encarnação do Filho de Deus: “Quando veio plenitude dos tempos, Deus
enviou o seu Filho, que nasceu de uma mulher e nasceu submetido a uma lei” (Gl
4,4).
“É permanecendo firmes que ireis ganhar a vida” (Lc 21, 19).
Aproveitemos o tempo! Diante das dificuldades não nos deixemos levar pelo
desânimo! Acreditemos na Vitória final do Reino de Cristo.