Celebrando o 4º Domingo da Quaresma, o Evangelho (Jo 9, 1-41) nos
apresenta o tema da Luz.
Jesus unge os olhos do cego de nascença com lama feita a partir da
saliva. Jesus como que inicia com um rito. Toca os olhos do cego,
concedendo-lhe a visão. E, aos poucos no diálogo com ele, vai- lhe despertando
a fé. E o cego acaba vendo, à luz da fé, que Jesus é o Filho do Homem. Acaba
dando testemunho dele.
A cura do cego descreve o processo da fé de um homem, que vai passando
das trevas da cegueira, para a luz da visão, e desta para a Luz da fé em
Cristo. O “Cego” é um símbolo de todos os homens que renascem pela fé, acolhendo
Jesus (no Batismo) e deixando-se conduzir pela sua palavra.
Tudo começa por uma pergunta dos discípulos a Jesus: “Por que esse homem
nasceu cego?” ”Quem pecou para que nascesse cego: ele ou seus pais ?” (Jo 9,2).
Jesus responde: “Nem ele, nem seus pais pecaram…” (Jo 9,3). Com essa resposta
Jesus lembra o que os profetas já combatiam que era uma crença popular antiga
que pensavam que o cego estava pagando pelos seus pecados ou dos seus
antepassados. Trata-se de uma crença errada, semelhante ao absurdo da
reencarnação. Esta é uma crença espírita, não é cristã. A Palavra de Deus nos
diz: “os homens morrem uma só vez, depois vem o juízo” (Hb 9,27). A
reencarnação é uma injustiça! É negar a obra redentora de Cristo e afirmar que
é o próprio homem que se salva, por etapa, cada vez mais que se reencarna. É a
onda do reciclável, como lixo.
“Nem ele, nem seus pais pecaram…”. Com isso Jesus quer nos ensinar que
os segredos da vida pertencem a Deus! Se crermos no seu amor, se nos
abandonarmos nas suas mãos, a maior dor, o mais inexplicável sofrimento pode
ser confortado pela certeza de que Deus está conosco e nos fortalece. “Se Deus
é por nós, quem será contra nós ?” Até na dor e no sofrimento Deus está
presente.
O Papa Bento XVI dizia que “o domingo do cego de nascença apresenta
Cristo como luz do mundo. O Evangelho interpela cada um de nós: «Tu crês no
Filho do Homem?». «Creio, Senhor» (Jo 9, 35.38), afirma com alegria o cego de
nascença, fazendo-se voz de todos os crentes. O milagre da cura é o sinal que
Cristo, juntamente com a vista, quer abrir o nosso olhar interior, para que a
nossa fé se torne cada vez mais profunda e possamos reconhecer n’Ele o nosso
único Salvador. Ele ilumina todas as obscuridades da vida e leva o homem a
viver como «filho da luz»” (Bento XVI, Mensagem para a Quaresma de 2011).
O mundo hedonista, consumista e superficial não compreende isso! O cego
é questionado pelas autoridades sobre a origem de Jesus. E ele mostra-se livre
(diz o que pensa…); corajoso (não se intimida); sincero (não renuncia à
verdade); suporta a violência ( é expulso da Sinagoga). Antes de se encontrar
com Jesus, o cego é um homem prisioneiro das “trevas”, dependente e limitado.
“Não sabe quem o curou…” Finalmente, encontrando-se com Jesus, que lhe
pergunta: “Acreditas no Filho do Homem”, manifesta a sua adesão total: “Creio,
Senhor”. Prostra-se e O adora. O caminho de fé do cego é um itinerário para
todo cristão! São Josemaria Escrivá, em Amigos de Deus, nº 193, diz: “Que exemplo de firmeza na fé nos dá este cego!
Uma fé viva, operativa. É assim que te comportas com as indicações que Deus te
faz, quando muitas vezes estás cego, quando a luz se oculta por entre as
preocupações da tua alma? Que poder continha a água, para que os olhos ficassem
curados ao serem umedecidos? Teria sido
mais adequado um colírio misterioso, um medicamento precioso preparado no
laboratório de um sábio alquimista. Mas aquele homem crê, põe em prática o que Deus lhe ordena, e volta com
os olhos cheios de claridade”. Nesta Quaresma, somos convidados a viver a
experiência catecumenal, renovando o nosso Batismo, mediante o Sacramento da
Penitência (Confissão).
A Quaresma é um tempo que nos convida a fazermos uma boa Confissão dos
nossos pecados, pois eles são a causa da nossa cegueira espiritual. O pecado
nubla e ofusca a nossa mente, mancha a
nossa afetividade, debilita a nossa vontade. E assim adoecemos de cegueira
espiritual, como este cego de nascença ( Evangelho ), que estava jogado fora do
templo, pedindo esmola. Jesus exige que nos aproximemos dEle com fé que
gritemos com confiança e que obedeçamos quando nos manda descer para banhar na
piscina de Siloé da Confissão.
Quanto mais buscamos Jesus como Luz, mais nossa vida terá sentido! O
nosso comportamento de cristão deve ser testemunho do Batismo recebido; devemos
testemunhar com as obras que Cristo é para nós, não apenas luz da mente, mas
também luz da vida. Não são as obras das trevas – o pecado – as que
correspondem a um batizado, mas sim as obras da luz.
Deus conceda que a nossa fé seja mais profunda. Nós, como aquele que
fora cego, começamos a ver somente pela iniciativa e pelo poder de Jesus;
também foi pela ação misteriosa da graça que nós continuamos a buscar a Cristo
e a adorá-lo. Há uma antiga oração da Igreja que pede a Deus que as nossas
ações sejam precedidas, ajudadas e terminadas com o auxilio divino mostrando,
dessa maneira, a nossa dependência total do Senhor. Seria terrível se algum dia
nos invadisse uma espécie de autossuficiência espiritual. Seria o momento no
qual Jesus nos diria, como outrora aos fariseus, que a nossa pretensão é o que
nos cega (cfr. Jo 9,41).
Não nos consideremos grande coisa só porque participamos de uma
determinada pastoral ou de determinado grupo; nem pensemos que seremos salvos
porque somos desse ou daquele movimento; tampouco nos apoiemos numas obras que
sabemos que são boas, mas que frequentemente estarão manchadas pelo egoísmo e
pelo orgulho. A caminhada junto ao Senhor, as contínuas quedas no caminho rumo
à santidade, a aparente repetição das lutas interiores que nós não sabemos
explicar, deveriam levar-nos a uma profunda humildade, a confiar sempre mais na
iniciativa de Jesus, a combater os nossos próprios defeitos em total
dependência da ação divina e a adorar a Deus com todo o nosso ser.
Livre-nos Deus de toda pretensão. Ao contrário, devemos reconhecer
constantemente que Jesus é o nosso único Salvador. É esse reconhecimento que
nos faz fortes e audaciosos, não por nossa própria virtude, mas confiando em
Jesus. Aprofundar na fé nos fará ver, cada vez mais, a importância de sermos
pequenos diante de Deus. Essa pequenez é totalmente compatível com a visão de
águia, ampla e audaciosa, que nós devemos ter.
Não podemos ficar lamentando-nos: “sou um pobre pecador”, “não posso
nada”, “pobre de mim”. Não podemos paralisar-nos! Enquanto isso os inimigos de
Deus e de sua Igreja trabalhariam para dominar. Não! Sabedores das nossas
fraquezas, confiaremos na graça de Deus; conscientes da nossa pobreza, nos
enriqueceremos com os tesouros imperecíveis do nosso Pai do céu. O cristão deve
ser uma pessoa de fé cada vez mais profunda, humilde, simples; deve ser pequeno
diante de Deus. Mas um filho de Deus deve ser também alguém que anda com a
cabeça erguida, consciente da sua nobre condição e do seu dever de “comer o
mundo”. Um maior crescimento na fé implica uma visão mais ampla das coisas e
uma audácia antes não experimentada. Deus conta conosco!
Como o cego, após o encontro com Jesus, iluminado, manifestemos a
alegria de sermos cristãos! “A alegria do discípulo não é um sentimento de bem
estar egoísta, mas uma certeza que brota da fé, que serena o coração e capacita
para anunciar a boa nova do amor de Deus. Conhecer a Jesus é o melhor presente
que qualquer pessoa pode receber; tê-lo encontrado foi o melhor que ocorreu em
nossas vidas e fazê-lo conhecido com nossa palavra e obras é a nossa alegria”
(DA, 29).