MENSAGEM DO PAPA FRANCISCO
PARA O DIA MUNDIAL DO MIGRANTE E DO REFUGIADO
Forçados, como Jesus Cristo, a fugir.
Acolher, proteger, promover e integrar os deslocados internos
No discurso que dirigi, nos primeiros dias
deste ano, aos membros do Corpo Diplomático acreditado junto da Santa Sé,
mencionei entre os desafios do mundo contemporâneo o drama dos deslocados
dentro da própria nação: «Os conflitos e as emergências humanitárias, agravadas
pelas convulsões climáticas, aumentam o número dos deslocados e repercutem-se
sobre as pessoas que já vivem em grave estado de pobreza. Muitos dos países
atingidos por estas situações carecem de estruturas adequadas que permitam
atender às necessidades daqueles que foram deslocados» (9/I/2020).
A Secção «Migrantes e Refugiados» do
Dicastério para o Serviço do Desenvolvimento Humano Integral publicou as
Orientações Pastorais sobre as Pessoas Deslocadas Internamente (5/V/2020), um
documento que visa inspirar e animar as ações pastorais da Igreja nesta área em
particular.
Por tais razões, decidi dedicar esta Mensagem
ao drama dos deslocados dentro da nação, um drama – muitas vezes invisível –
que a crise mundial causada pela pandemia do Covid-19 exacerbou.De facto, esta
crise, devido à sua veemência, gravidade e extensão geográfica, redimensionou
tantas outras emergências humanitárias que afligem milhões de pessoas,
relegando para um plano secundário, nas Agendas políticas nacionais,
iniciativas e ajudas internacionais, essenciais e urgentes para salvar vidas.
Mas, «este não é tempo para o esquecimento. A crise que estamos a enfrentar não
nos faça esquecer muitas outras emergências que acarretam sofrimentos a tantas
pessoas» (Francisco, Mensagem Urbi et Orbi, 12/IV/2020).
À luz dos acontecimentos dramáticos que têm
marcado o ano de 2020 quero, nesta Mensagem dedicada às pessoas deslocadas
internamente, englobar todos aqueles que atravessaram e ainda vivem
experiências de precariedade, abandono, marginalização e rejeição por causa do
vírus Covid-19.
E, como ponto de partida, gostaria de tomar o
mesmo ícone que inspirou o Papa Pio XII ao redigir a constituição apostólica
Exsul Familia (1/VIII/1952): na sua fuga para o Egito, o menino Jesus
experimenta, juntamente com seus pais, a dramática condição de deslocado e
refugiado «marcada por medo, incerteza e dificuldades (cf. Mt 2, 13-15.19-23).
Infelizmente, nos nossos dias, há milhões de famílias que se podem reconhecer
nesta triste realidade. Quase todos os dias, a televisão e os jornais dão
notícias de refugiados que fogem da fome, da guerra e doutros perigos graves,
em busca de segurança e duma vida digna para si e para as suas famílias»
(Francisco, Angelus, 29/XII/2013). Em cada um deles, está presente Jesus,
forçado – como no tempo de Herodes – a fugir para Se salvar. Nos seus rostos,
somos chamados a reconhecer o rosto de Cristo faminto, sedento, nu, doente,
forasteiro e encarcerado que nos interpela (cf. Mt 25, 31-46). Se O
reconhecermos, seremos nós a agradecer-Lhe por O termos podido encontrar, amar
e servir.
As pessoas deslocadas proporcionam-nos esta
oportunidade de encontrar o Senhor, «mesmo que os nossos olhos sintam
dificuldade em O reconhecer: com as vestes rasgadas, com os pés sujos, com o
rosto desfigurado, o corpo chagado, incapaz de falar a nossa língua»
(Francisco, Homilia, 15/II/2019). É um desafio pastoral ao qual somos chamados
a responder com os quatro verbos que indiquei na Mensagem para este mesmo Dia
de 2018: acolher, proteger, promover e integrar. A eles, gostaria agora de
acrescentar seis pares de verbos que traduzem ações muito concretas, interligadas
numa relação de causa-efeito.
É preciso conhecer para compreender. O
conhecimento é um passo necessário para a compreensão do outro. Assim no-lo
ensina o próprio Jesus no episódio dos discípulos de Emaús:«Enquanto [estes]
conversavam e discutiam, aproximou-Se deles o próprio Jesus e pôs-Se com eles a
caminho; os seus olhos, porém, estavam impedidos de O reconhecer» (Lc 24,
15-16). Frequentemente, quando falamos de migrantes e deslocados, limitamo-nos
à questão do seu número. Mas não se trata de números; trata-se de pessoas! Se
as encontrarmos, chegaremos a conhecê-las. E conhecendo as suas histórias,
conseguiremos compreender. Poderemos compreender, por exemplo, que a
precariedade, que estamos dolorosamente a experimentar por causa da pandemia, é
um elemento constante na vida dos deslocados.