Era 1827 e as multidões que chegavam à aldeia de
Ars vinham de toda parte. A fama do Padre Vianney já havia se espalhado pelos
quatro cantos da França. Barões, clérigos, camponeses, curiosos; todos queriam
conhecer aquela figura a qual tinham por santo. Um médico, tomado pelas
intrigas dos colegas, decidira visitar o sacerdote, a fim de confirmar suas
injustas suspeitas. De volta à capital, Paris, não pôde dizer aos amigos outra
coisa sobre o pobre cura senão: "eu
vi Deus num homem".
A santidade de João Maria Vianney causava
constrangimentos. Apegado desde cedo à oração, agia em tudo conforme à vontade
divina, fazendo de sua vida um perpétuo louvor a Deus. Tinha um fervor
imensurável. Passava horas à frente do sacrário, gastando-se em severas
penitências e na meditação dos santos mistérios: "O meu terço vale mais que mil sermões". Por isso, não
poupou esforços no combate às blasfêmias e à libertinagem. Era o zelo pela casa
do Pai que o consumia.
Os primeiros anos de Vianney em Ars foram de
grandes desafios. A pequena aldeia estava atolada no indiferentismo.
Trabalhava-se no domingo, blasfemava-se no campo, a falta de modéstia e os
divertimentos profanos reinavam no coração daquela gente. A situação era
desesperadora. E para uma alma apaixonada como a do Cura D'Ars, assistir àquele
espetáculo de imoralidades era como ver a Cristo sendo crucificado. Com efeito,
tratou logo de agir.
Sem fazer concessões, apressou-se em instruir os
mais novos na catequese e nas práticas piedosas. Vianney estava convencido de
que a ignorância religiosa era a causa de todos os males: "Este pecado
condenará mais almas do que todos os outros juntos, porque uma pessoa ignorante
quando peca não conhece nem o mal que faz, nem o bem que perde". Do alto
do púlpito, atacava a todos pulmões as tabernas e o trabalho no domingo.
Começava uma guerra sem tréguas, e o santo não iria recuar enquanto não visse a
sua paróquia, de joelhos, diante do Senhor.
"Ah! Os taberneiros, o demônio não os
importuna muito, pelo contrário, despreza-os e cospe-lhes em cima". Com
essas palavras, o humilde cura fustigava a bebedeira, para desespero daqueles
que se lançavam a tão vergonhoso vício. E assim também procedia com o trabalho
nos dias de guarda. "Se perguntássemos aos que trabalham nos domingos:
'Que acabais de fazer?' - repreendia o Cura D'Ars - "eles bem poderiam
responder: 'Acabamos de vender a nossa alma ao Demônio e de crucificar a Nosso
Senhor… Estamos no caminho do inferno". Pouco a pouco, as blasfêmias foram
desaparecendo e as tabernas se fechando. Pesava-lhes a maldição de um homem
santo. "Vós vereis, profetizava,
vereis arruinados todos aqueles que aqui abrirem tabernas". Mas um
derradeiro combate ainda estava por vir.
Em 1823, erguia-se na pequena paróquia de Ars uma
segunda capela. Atendendo à vontade do pároco, ela seria dedicada a São João
Batista, santo que tomara por patrono no dia de sua Confirmação. A cerimônia de
inauguração foi de grande júbilo. Contudo, para os amantes dos prazeres
profanos, motivo de despeito. Vianney mandara esculpir no arco do pequeno
oratório a seguinte inscrição: "A
sua cabeça foi o preço de uma dança". Uma alusão ao martírio de São
João Batista e uma clara reprimenda aos bailes.
A luta de Vianney contra os serões durou cerca de
dez anos. A ele se opunha grande parte da comunidade, sobretudo os rapazes
apegados aos encantos da luxúria. À medida que o povo se afastava das danças,
com efeito, mais raiva tinham do sacerdote os fanfarrões. Chegaram a organizar
encontros a fim de puni-lo, mas o brado de Vianney foi tão forte que a eles não
restou outra alternativa senão ceder. "O demônio rodeia um baile como um
muro cerca um jardim… As pessoas que entram num salão de baile deixam à porta o
seu Anjo da Guarda e o Demônio substitui-o, de tal modo que há tantos Demônios
quantos são os dançadores." Era o fim dos bailes em Ars.
Os hereges também não tinham vez com o santo. Certo
dia, um jovem de espírito petulante resolveu atacá-lo na frente da multidão.
"Quem é o senhor, meu amigo?" questionou Vianney. O rapaz disse que
era protestante. Com a firmeza de um verdadeiro pastor, retorquiu-lhe o santo padre:
"Oh! meu pobre amigo, o senhor é pobre e muito pobre: Os protestantes nem
sequer possuem santos cujos nomes possam dar aos filhos. Veem-se obrigados a
pedir nomes emprestados à Igreja Católica". Foi o suficiente para que o
sujeito se colocasse no seu lugar.
A santa intransigência de Vianney tinha um motivo
igualmente santo: ele amava a seus paroquianos com amor de predileção. Por isso
faria tudo que estivesse a seu alcance para lhes assegurar a salvação eterna. E
seus esforços foram recompensados. Após poucos anos de ministério, Ars não era
mais Ars. O povo havia se convertido, já não se trabalhava mais aos domingos e
a igreja permanecia sempre cheia. Vencera a santidade do pobre cura. Os
paroquianos compreenderam o que há tanto lhes ensinava o São Cura D'Ars: "Tão
grande é o amor de Deus, é um fogo que queima na alma sem, contudo, a consumir.
Ter Jesus no coração é já possuir o céu".
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Disponível em:
Equipe Christo Nihil Praeponere
Referências: TROCHU,
Francis. O Cura D'Ars. Ed. Theologica. Braga. 1987.
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