Em primeiro lugar, gostaria de avisar aos irmãos carismáticos que este quem vos fala também já foi um dia servo da RCC e tenho conhecimento do que acontece nos GO e infelizmente, existe muito sentimentalismo e nenhum conhecimento teológico entre eles.
Utilizar de chavões não irá adiantar [O Papa aceita a RCC / O Papa disse que ama os carismáticos / A RCC trouxe muitos jovens para a Igreja etc.] porque o foco da questão é doutrinário. Por isso a intenção do artigo é apresentar a efusão como ensina a Igreja Católica e esperamos esclarecer os amigos que tem o entendimento errado do que seja realmente a ação do Espírito Santo através dos dons e carismas. Nada como ler de acordo com o Magistério aliado ao conhecimento prático do assunto.
O Dom SEMPRE existiu, e é tal como ensina Santo Tomás, mas NUNCA foi 'shalalá'.
A doutrina ensinada pela RCC surgiu na década de 70. Como algo que surgiu há 40 anos pode ser teológico? O mesmo ocorre no repouso, fruto de uma experiência mística, como bem ensinada pelos santos místicos (São João da Cruz, Santa Teresa de Ávila, e afins) e por grandes teólogos (Garrigou-Lagrange, Royo Marín, Tanquerey e etc).
Verdadeiro dom de línguas: capacidade de falar outros idiomas sem os haver estudado. Recurso divino para facilitar a pregação do Evangelho aos estrangeiros.
Falso dom de línguas: “palavras” complicadas, esquisitas, incompreensíveis, proferidas por alguém em delírio, em transe, ou mesmo em estado normal (neste caso por pura vaidade, condicionamento da mente ou exibicionismo).
O orar em línguas do pentecostalismo que abrange as seitas pentecostais e a RCC são apenas uma caricatura do que foram os verdadeiros dons de línguas ocorridos na Era Apostólica. Que se tratava de um fenômeno linguístico para que novas línguas vernáculas fossem compreendias para o anúncio do Evangelho. Esperamos que seja apenas caricatura mesmo, mas alguns padres e estudiosos afirmam também que alguns casos possam ser uma peça pregada pelo próprio demônio para insultar a Deus.
Leiam o que diz Santo Agostinho, um dos maiores doutores da Igreja:
“Nos primeiros tempos, o Espírito Santo descia sobre os fiéis e estes falavam em línguas, sem as ter aprendido conforme o Espírito lhes dava a falar. Foram sinais oportunos para esse tempo... o sinal dado passou depois” (Comentário da Primeira Carta de São João, Tratado IV, 10).
E Santo Tomás de Aquino:
“Quanto ao dom de línguas, devemos saber que como na Igreja primitiva eram poucos os consagrados para pregar ao mundo a Fé em Cristo, a fim de que mais facilmente e a muitos se anunciasse a palavra de Deus, o Senhor lhes deu o dom de línguas” (S. Tomas de Aquino, Comentário a la primera espistola a los Conrintios, Tomo II, pag 178.).
Os teólogos dividem a graça em santificante ou habitual e atual.
A graça santificante ou habitual nós a recebemos e é a vida de Deus em nós, que nos faz filhos d'Ele, partícipes da própria natureza d'Ele.
A graça atual todos os seres humanos recebem a todo o momento. É uma iluminação à inteligência para que se abrace a verdade e se repudie a mentira e uma sugestão à vontade para que se faça o bem e se evite o mal.
Já a fé é uma virtude teologal, pela qual aderimos de modo sobrenatural à revelação de Deus.
Graça santificante e fé, recebemos no batismo, junto com as outras duas virtudes teologais, a caridade e a esperança.
O que se entende por "efusão do Espírito Santo" uma renovação da graça batismal, daí a referência à iniciação cristã (renovação das promessas) e à santificação (que não pode ocorrer se a pessoa não permanece na graça).
Na realidade, a RCC utiliza de todos os versículos referentes ao Sacramento do Batismo, para explicar esta efusão, que é lícita e que de fato acontece. Este erro existe sim. Outro erro é condicionar a renovação espiritual e mesmo a atuação do Espírito Santo, somente ou quase que somente a partir desta oração, delegando quase que exclusivamente ao grupo de oração esta função de santificar as pessoas, através desta mesma efusão.
O erro a meu ver, não é o desejo de se santificar pela descoberta do Divino Espírito, que para ela estava esquecido e relegado a segundo plano. O erro é condicionar ao grupo, a oração de pedi-lo, afirmando categoricamente que ali, naquele momento, aconteceu, de fato, a efusão. E pior, dizem que os frutos desta efusão é a manifestação de carismas, ao invés de afirmarem que o Espírito Santo, mais do que nos dar carismas , deseja a santificação das almas, que muitas vezes passa pelo ordinário e pela cruz, não pelo extraordinário.
A questão a meu ver é de foco e ensinamento correto dentro da verdadeira pedagogia do Espírito Santo. Ali muito se tem de contaminação de estudos fora Igreja Católica, por isso a confusão.
Dá pra acertar? Creio que sim, desde que a liderança queira mesmo entender e aprender o que nos ensina a Igreja.
Eu sei que é muito difícil mostrar às pessoas da RCC o verdadeiro ensino católico, por conta do que aconteceu na vida de muitos deles. Vejam, muitos ali vieram de seitas, estavam afastados da Igreja e ao se depararem com o louvor, a oração, a palavra de Deus e porque não dizer, o acolhimento, - coisas eminentemente católicas - viram suas vidas transformadas e acharam mesmo que a RCC é quem fez esta transformação. Aliada aos ensinos errados, de que a Igreja precisa se renovar - eu mesmo acreditei nisso, como se renovar fosse mudar tudo.. rsrs -, batem o pé quanto ao que sentiram e aprenderam. Por isso a dificuldade de falar com eles.
Acho eu que o caminho certo é mostrar a verdade, o ensino correto, porque ele é que poderá mudar todo o conceito de doutrina do Espírito Santo, podendo assim dar muito mais fruto em suas vidas. Não acho que deva tentar mudar algo, mostrando só erros, temos que dar oportunidade de mudança.
Pelas apostilas da EPA, que é a escola de formação da RCC, na parte onde trata da identidade do movimento, temos visto um grande equívoco quando ensina sobre este batismo. De fato, e você analisou bem, se é utilizado para respaldar este “batismo” - (uso este termo apesar de ser errado, já que foi pedido para dizer efusão, mas a RCC o utiliza e você o utilizou, por isso abri esta exceção) -, os versículos - e até o catecismo -, que são utilizados para explicar o Sacramento do Batismo e do Crisma, além de condicionar a vinda e a plenitude do Espírito Santo neste dito batismo. Ora, vimos que a vinda e a plenitude ocorrem através dos Sacramentos, onde recebemos por sinais visíveis a graça invisível de Deus, e não somente através de uma oração pedindo esta nova efusão. E quem não passou por esta oração e não pertence à RCC, não tem os frutos e os dons do Espírito Santo?
Todos nós somos chamados a viver e sermos conduzidos pelo Espírito, e a efusão pode acontecer e muitas vezes acontece mesmo, na oração silenciosa. A alma em contato com Deus, aquela que busca a santidade, recebe do Espírito Santo muitas inspirações e auxílios para crescer cada dia mais. Não se pode dizer que só acontece na RCC e no momento da oração em que se pede a vinda do Espírito Santo, que Ele de fato tenha vindo. E não se pode dizer que mesmo na RCC se dá Sua vinda exatamente no momento da oração.
Sabemos que devemos pedi-lo sempre. “Se Ele é aquele que guia, santifica e que habita no Batizado, deve ser então “nosso” Mestre e nosso guia. – “É pela “intimidade”da Sua união com Ele que medem os seus progressos de santidade”- (La Divinisation du Chrétien – Pe. P. Ramiére, pag. 218).
E Santo Tomás nos ensina que é possível esta nova vinda do Espírito:
"Que o Espírito Santo seja enviado ou venha de novo, não quer dizer que se tenha ido embora mas que surge na criatura um relacionamento novo com o Espírito: ou porque nunca estivera ali ou talvez porque começa a estar de maneira diferente que estivera antes." (S. Th., I, q. 43, a. 1)".
O que não podemos dizer que é a partir da oração de efusão como ocorre na RCC que acontece de fato esta vinda, assim como somente depois dela é que estaremos cheios para manifestar os carismas, que notoriamente nas apostilas, dizem que fora da RCC eles não passam para muitos católicos de mera teoria. Ora, muitas vezes estamos praticando os dons e os carismas sem ao menos nos darmos conta, já que é algo interior e é o Senhor quem nos conduz a praticá-los.
Veja, não é um acontecimento mágico. O que concluí do que acontece na RCC é que as pessoas por estarem em contato com os elementos católicos: oração, louvor, Palavra de Deus - e desejosas de recebê-lo, recebem de Deus graças atuais para que acordem para a vida de santidade. Muitos se convertem ao Senhor, mas a partir daí devem necessariamente buscar crescer espiritualmente na maneira que o próprio Espírito ensinou à Igreja. Nada, mas nada é mágico e todos, - os que são da RCC e os que não são -, devem buscar a santidade para ver a Deus.
Um erro da apostila neste sentido está expresso quando dizem: “O dado novo que tem ocorrido na Renovação, em relação ao Batismo no Espírito Santo, é que no seu seio essa graça tem sido dinâmica e se renova continuamente, como acontecia na Igreja Primitiva. Assim, essa renovação constante do batismo, bem como o seu dinamismo, nos tem dado uma identidade ímpar, em se tratando de Igreja Católica; infelizmente única, pois o ideal é que todos os católicos, senão todas as pessoas vivam essa graça”.
O que ela faz é condicionar esta efusão somente aos membros da RCC, como se os católicos em geral não renovassem os efeitos da graça do Batismo que receberam.
Apesar de a apostila dizer que Sacramento do Batismo é uma coisa e o Batismo no Espírito ser outra coisa,* se confunde quando na hora de explicá-los:
“Visto que o Batismo no Espírito Santo não é uma repetição do Batismo Sacramental, vejamos o que ele é: Para isso partiremos de uma ideia apresentada por Jesus no principal dia de uma das Festas dos Tabernáculos, realizada em Jerusalém, quando Ele, de pé, proclamava: “Se alguém tiver sede, venha a mim e beba. Quem crê em mim, como diz a Escritura: Do seu interior manarão rios de água viva" (João 7,37-38). O Evangelista segue esclarecendo o significado destas palavras de Jesus, dizendo: “(Jesus) Dizia isso, referindo-se ao Espírito que haviam de receber os que cressem nele" (João 7,39).
Veja que Jesus falava aqui exatamente do que acontece naquele que recebe o Batismo Sacramento, - e não da efusão -, onde recebemos nossa filiação através da recepção da graça perdida pelo pecado. A partir daí temos o poder de Deus que age em nós e por nós, mesmo que muitos não tenham esta consciência. A RCC a meu ver, acende esta consciência da presença do Espírito Santo, mas a custa de ensinos equivocados.
A santidade deve ser buscada a todo custo e esta deve ser nossa meta – enquanto a RCC exortar neste sentido está correta, o que não se pode é ensinar que basta encontrar-se com Jesus e o Espírito Santo faz o resto ( palavras da apostila). Exortar a crescer na graça é um pedido da própria Igreja e do próprio Cristo e todos nós somos chamados a ela.
Quanto aos dons extraordinários, como dom de línguas, milagres, profecias, e os carismas que são "gratis datae", carismáticos, - conforme Tanquerey. -, em que o Senhor dá a quem Ele quer e na hora que Ele quer para que esta pessoa possa servir à sua Igreja, mas não são condicionados ao estado de graça, não devemos pedir por conta de sermos enganados por ditas experiências e que podemos muito bem julgá-las erroneamente. Cabe à Igreja o discernimento dos dons que ocorrem em seu seio e não os próprios membros que analisam se são ou não são de Deus.
Vejam o quer diz sobre isto a Lúmen Gentium:
“Não se devem porém, pedir temerariamente, os dons extraordinários nem deles se devem esperar com presunção os frutos das obras apostólicas; e o juízo acerca da sua autenticidade e recto uso, pertence àqueles que presidem na Igreja e aos quais compete de modo especial não extinguir o Espírito mas julgar tudo e conservar o que é bom” (cfr. 1 Tess. 5, 12. 19-21).
São Vicente Ferrer, continuando o ensino de Santo Tomás e de São João da Cruz sobre o assunto, diz:
“Os que queiram viver na vontade de Deus não devem desejar obter [...] sentimentos sobrenaturais superiores ao estado ordinário daqueles que têm um temor e um amor a Deus sinceros. Tal desejo, de fato, só pode vir de um fundo de orgulho e de presunção de uma vã curiosidade em relação a Deus e de uma fé demasiada frágil. A graça de Deus abandona o homem que está preso a este desejo e o deixa à mercê de suas próprias ilusões e das tentações do diabo que o seduz com revelações e visões enganosas”.
A efusão se dá, via de regra, na oração e na recepção dos Sacramentos e nunca deixou de fazer parte da Igreja ou da vida dos fiéis, pois é Ele mesmo o Autor da nossa santificação.
Só gostaria de alertar para uma coisa - o resultado da presença do Espírito e de Sua ação na nossa vida se percebe pela nossa conversão, fidelidade aos Mandamentos e cumprimento da Vontade de Deus - não é pelos sentimentos, entusiasmo, coração palpitante, pois se nos apegarmos a estas coisas e achamos que são sinal de Sua presença,o que faríamos quando esses sentimentos desaparecessem?
Nossa vida religiosa e espiritual não se mede de forma alguma por eles, corre-se o risco de achar que “se não estou sentindo nada, não estou na unção” como dizem.
Sábios conselhos de nossos mestres espirituais.
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* A palavra "Batismo" significa tradicionalmente o sacramento da iniciação cristã. Por isso, será melhor evitar o uso da expressão "Batismo no Espírito”, ambíguo, por sugerir uma espécie de sacramento. Poderão ser usados termos como "efusão do Espírito Santo", "derramamento do Espírito Santo". Do mesmo modo, não se utilize o termo "confirmação" para não confundir com o sacramento da crisma (Cf. Comissão Episcopal de Doutrina, Comunicado Mensal, Dez. de 1993, 2217). - Orientações Pastorais sobre a Renovação Carismática Católica, CNBB - Documento 53, nº 54.
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Fonte: Efusão do Espírito Santo - o que realmente é?.: David A. Conceição 05/2013
Disponível em: Tradição em Foco com Roma.