Hoje celebramos toda essa multidão inumerável
de pessoas, irmãos nossos, que já gozam de Deus e continuam em comunhão conosco
desde o céu. É uma festa que nos enche de alegria e otimismo: se eles puderam
ser santos, por que nós não? Qual foi o segredo da sua santidade?
A multidão dos fiéis seguidores de Jesus, filhos
e filhas amados pelo Pai, reúne-se numa celebração celestial. Ainda em vida são
proclamados felizes porque depositaram sua confiança em Deus.
Todos os que se mantém fiéis a Cristo serão
vitoriosos (Ap 7,2-4.9-14). As bem-aventuranças são o caminho da santidade
proposto por Jesus (Mt 5,1-12). Somos filhos e filhas de Deus, pois ele é nosso
Pai, e seremos semelhantes a ele (1Jo 3,1-3).
A Eucaristia transforma-nos, lenta e
progressivamente, em seres capazes de contemplar o Pai unidos a todos os que são
salvos” (Cf. Liturgia Diária de Novembro de 2011 da Paulus, pp. 26-29).
“Vinde a mim, todos vós que estais cansados e
penais a carregar pesado fardo, e descanso eu vos darei, diz o Senhor” (Mt
11,28).
Enquanto vivos, os santos não se consideravam
como tais, longe disso! Eles não esculpiam a sua efígie num fundo de
auto-satisfação…
Contrariamente àquilo que geralmente aparece
nas imagens ditas piedosas e nas biografias embelezadas, eles não foram
perfeitos, nem à primeira, nem totalmente, nem sobretudo sem esforço. Eles
tinham fraquezas e defeitos contra os quais se bateram toda a vida.
Alguns, como S. Agostinho, vieram de longe,
transfigurados pelo amor de Deus que acolheram na sua existência. Quanto mais
se aproximaram da luz de Deus, tanto mais viram e reconheceram as sombras da
sua existência.
Peregrinos do quotidiano, a maior parte deles
não realizaram feitos heróicos nem cumpriram prodígios. É certo que alguns têm
à sua conta realizações espetaculares, no plano humanitário, no plano
espiritual, ou ainda na história da Igreja. Mas muitos outros, a maioria, são
os santos da simplicidade e do quotidiano. Infelizmente, canoniza-se muito
pouco estas pessoas do quotidiano!
Pontos da ideia principal
Leituras: Ap 7, 2-4.9-14; 1Jo 3, 1-3; Mt 5, 1-12ª
Em primeiro lugar, a festa de todos os Santos
nos convida a celebrar, a principio, dois fatos. O primeiro é que,
verdadeiramente, a força do Espírito de Jesus age em todas partes, é uma
semente capaz de arraigar em todas partes, que não necessita condições
especiais de raça, ou de cultura, ou de classe social. Por isso esta festa é
uma festa gozosa, fundamentalmente gozosa: o Espírito de Jesus deu, e dá, e
dará fruto, e dará em todas partes. O segundo fato que celebramos é que todos
esses homens e mulheres de todo tempo e lugar têm algo em comum, algo que os
une. Todos eles “lavaram e alvejaram as suas vestes no sangue do Cordeiro”,
mediante o batismo (1 leitura). Todos eles foram pobres, famintos e sedentos de
justiça, limpos de coração, trabalhadores da paz (Evangelho). E isso os une.
Porque hoje não celebramos uma festa superficial, hoje não celebramos que “no
fundo, todo mundo é bom e tudo terminará bem”, mas celebramos a vitória
dolorosamente alcançada por tantos homens e mulheres no seguimento do Evangelho
(conhecendo-o explicitamente ou sem conhecê-lo). Porque existe algo que une o
santo desconhecido das selvas amazônicas com o mártir das perseguições de Nero
e com qualquer outro santo de qualquer outro lugar: une-os a busca e a luta por
uma vida mais fiel, mais entregada, mais dedicada ao serviço dos irmãos e do
mundo novo que Deus quer.
Em segundo lugar, celebramos, portanto, esses
dois fatos: que com Deus vivem já homens e mulheres de todo tempo e lugar, e
que esses homens e mulheres lutaram com esforço no caminho do amor, que é o
caminho de Deus. Mas ai podemos acrescentar também um terceiro aspecto: Santo
Agostinho, na homilia que a Liturgia das Horas oferece para o dia de São
Lourenco, explica isso deste modo: “Os santos mártires imitaram Cristo até o
derramamento de seu sangue, até a semelhança da sua paixão. Imitaram-no os
mártires, mas não só eles. A ponte não caiu depois deles terem passado; a fonte
não se secou depois deles terem bebido nela”. Santo Agostinho se dirigia a uns
cristãos que acreditavam que talvez só os mártires, os que nas perseguições
tinham derramado o sangue pela fé, compartilhariam a gloria de Cristo. E às
vezes nós também pensamos a mesma coisa: que a santidade é um heroísmo próprio só
de alguns. E ano é assim. A santidade, o seguimento fiel e esforçado de Jesus
Cristo, é também para nós: para todos nós e para cada um de nós. É algo
exigente, sem dúvida; é algo para gente entregada, que leva as coisas à serio,
não para gente superficial e que se limita a ir empurrando as coisas com a
barriga. Porém somos nós, cada um de
nós, os chamados a essa santidade, a esse seguimento. Como dizia Santo
Agostinho na homilia citada antes: “Nenhum homem, seja qual for o seu gênero de
vida, deve desesperar da sua vocação” (…). “Entendamos, pois, de que maneira o
cristão tem que seguir Cristo, ademais do derramamento de sangue, ademais do
martírio”. E hoje, na festa de Todos os Santos, somos convidados a celebrar que
também nós podemos entender e descobrir a nossa maneira de seguir Cristo.
Finalmente, portanto, a festa de hoje é um
chamado à santidade para todos nós. Ser santos não é fazer necessariamente
milagres, nem deixar obras surpreendentes para a história. É difícil definir o
que é a santidade, mas todos esses santos que hoje celebramos nos demonstram
que seguir Cristo é possível, e que isso é santidade. Tiveram defeitos. Não
eram perfeitos. Cometeram pecados. Foram “normais”. Porém creram no Evangelho e
o cumpriram. Alguns deixaram uma pegada profunda. Outros passaram
despercebidos. E hoje honramos todos. E aceitamos o seu convite para seguir o
seu caminho. Aqui também recomendaria ler a “Lumen Gentium” do Concilio
Vaticano II, nos seus números 39-41, que faz um chamamento à santidade aos cristãos
de todos os estados: jerarquia, leigos, religiosos.
Para refletir
Meus caros amigos, a solenidade de todos os
santos, que celebramos neste domingo, é um dia em que lembramos não apenas os
santos canonizados, muitos deles já têm a sua festa própria ao longo do ano,
mas, sobretudo, os santos anônimos e desconhecidos. Abrange todos aqueles que
foram justificados pela fé em Cristo. Neste dia recordamos todos aqueles que
vivem para sempre diante de Deus.
A leitura evangélica deste dia nos traz o
texto das bem-aventuranças (cf. Mt 5,1-12), cuja vivência é o melhor caminho e
sinal de santidade. A prática das
bem-aventuranças é a marca e o selo dos santos, porque constituem a lista
daqueles que alcançam o Reino. Ao proclamar as bem-aventuranças, Jesus descreveu
a dinâmica da santidade.
Portanto, santos são os pobres em espírito,
porque têm o coração centrado em Deus. Pobres de espírito são os humildes,
porque são desapegados dos bens terrenos.
Para isso, não é necessário ter nada, mas é preciso usar o que se tem
conforme o espírito do Evangelho. A
verdadeira riqueza não consiste nos tesouros desta terra, mas na graça, na
virtude, nos merecimentos e na amizade com Deus.
Santos são os mansos, por não responderem à
violência com violência. Os mansos são
aqueles que, conformados com a vontade de Deus, suportam com paciência as
adversidades desta vida. São aqueles que
usam de mansidão, que tratam o próximo com bondade, tolerando pacientemente
suas impertinências, sem queixas ou atitudes de vingança.
Santos são os aflitos, os impotentes diante de
situações dramáticas. Há muitas pessoas que não entendem a razão dos
sofrimentos e se revoltam contra Deus.
Jesus diz que os aflitos são felizes.
De fato, se souberem aceitar com resignação as provas que Deus envia, se
souberem sofrer com ânimo as misérias e dificuldades da vida, a recompensa será
a consolação de Deus.
Santos são os famintos e sedentos de justiça,
que não pactuam com a maldade, nem se deixam levar pela lógica da
dominação. Deus mesmo haverá de realizar
seu ideal e fazê-los contemplar o reino da justiça. Trata-se daquela justiça
interior que torna o homem agradável a Deus, quando se esforça por cumprir
sempre a vontade de Deus. O primeiro
passo para conseguir a santidade é desejá-la.
Por isso, Jesus diz que são felizes os que têm fome e sede de justiça,
isto é, aqueles que realmente desejam ser santos. Mas é necessário que este desejo seja
eficaz. Isto é, que empreguemos os meios
necessários para consegui-lo.
Santos são também os misericordiosos, cujo
destino consistirá em viver a comunhão definitiva com o Deus, que também é
misericórdia. Os misericordiosos são, de
modo geral, aqueles que têm sentimentos de compaixão para com os aflitos e os
miseráveis de toda espécie. São
misericordiosos os que são caridosos e se compadecem das misérias do próximo e
também que perdoam. Quem for misericordioso receberá também a misericórdia
divina. E Deus será misericordioso
conosco à medida que o formos com nosso próximo.
Santos são ainda os puros de coração, que não
agem com segundas intenções nem falsidade, mas sim, com transparência. São os que fogem de todo pecado e praticam a
pureza. Ser puro é ter uma alma livre de
afetos desordenados e puro de coração. Por isso, serão recompensados com a
visão de Deus, em todo seu esplendor.
Santos são os promotores da paz, que procuram
criar laços de amizade e banir toda espécie de ódio, a fim de que o mundo seja
mais fraterno. Promover a paz consiste
em esquecer as injúrias. A paz, que gera
a felicidade, não é aquela que está apenas nos lábios, mas a que repousa no
coração. Os promotores da paz serão chamados filhos de Deus.
Santos são também os perseguidos por causa da
justiça, os que lutam para fazer valer o projeto de Deus para a humanidade. São
eles humilhados, agredidos, marginalizados, por parte daqueles que praticam a
injustiça e fomentam a opressão e a morte. Nesta última bem-aventurança, os
perseguidos são convidados a resistir ao sofrimento e à adversidade.
Assim sendo, todos os seres humanos são
chamados à santidade que, em última análise, consiste em viver como filhos de
Deus, naquela semelhança com ele segundo a qual foram criados. Todos os seres
humanos são filhos de Deus, e todos devem tornar-se aquilo que são, através do
caminho exigente da liberdade. Deus nos convida a fazer parte do seu povo
santo. O caminho é Cristo e ninguém chega ao Pai senão por meio dele (cf. Jo
14,6).
Entretanto, somente o Cristo Senhor é o
Bem-aventurado por excelência, pois Ele é o verdadeiro pobre em espírito, o
aflito, o manso, aquele que tem fome e sede de justiça, o misericordioso, o
puro de coração, o pacificador, o perseguido. As bem-aventuranças nos revelam a
fisionomia espiritual de Jesus e assim exprimem o caminho que nos leva a Ele.
Na medida em que aceitamos a sua proposta e nos colocamos no seu seguimento,
podemos participar das bem-aventuranças.
As oito bem-aventuranças são os sinais que
indicam a direção a seguir e traçam o mapa deste caminho. Foi este o primeiro
caminho que Jesus percorreu. E certa ocasião ele disse: “Quem me segue não andará nas trevas” (Jo
8,12). E noutra ocasião acrescentou: “Digo-vos isto para que a minha alegria
esteja em vós e a vossa alegria seja completa” (Jo 15,11).
Veneramos precisamente neste dia uma
inumerável comunidade de Todos os Santos que, através dos seus diferentes
percursos de vida, nos indicam vários caminhos de santidade, associados por um
único denominador comum: o seguimento a Cristo Senhor.
Uma das respostas próprias dos fiéis no
momento da Oração Eucarística é esta: “Caminhamos na estrada de Jesus”. É este o convite que a Igreja nos faz
cotidianamente. Os santos caminharam na
estrada de Jesus e souberam seguir o Cristo.
É por esse caminho que caminhamos para o céu. E é por isso que eles estão na Casa de Deus
para sempre. É um apelo solene e
luminoso lançado à terra dos homens, para que sigamos este mesmo caminho.
Caminhando com Cristo, podemos conquistar a alegria, a verdadeira alegria.
Esta deve ser também a nossa atitude, se
quisermos estar entre os santos, devemos caminhar na estrada de Jesus. É esta estrada que nos leva à santidade, que
nos leva ao Pai. Como ressalta o texto evangélico, a nossa atitude é a das
bem-aventuranças. Somente este caminho nos levará ao encontro definitivo com
Deus.
Peçamos a Virgem Maria, aquela que todas as gerações a proclamam como
“bem-aventurada”, porque acreditou na boa nova que o Senhor lhe anunciou (cf.
Lc 1,48), que nos guie neste caminho que nos leve ao seu filho Jesus e que
possamos sempre reconhecer que temos necessidade de Deus, da sua misericórdia e
do seu perdão, para um dia entrarmos no seu Reino, Reino de justiça, de amor e
de paz. Assim seja.
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