Hoje a liturgia gira em torno do serviço, do serviço que Jesus veio inaugurar com a sua vida e o seu ministério.
A leitura de Isaías nos leva a refletir sobre a missão de Deus de assumir os pecados da humanidade escravizada pelo pecado original. Jesus assumirá nossos pecados, carregará nossos pecados inaugurando um tempo novo, o tempo da salvação. No quarto canto do Servo de Javé, Deus não segue a lógica dos homens. O justo esmagado é que assume e resgata as faltas dos “muitos”. Por isso, Deus o exalta, na figura de Nosso Senhor Jesus Cristo, no Evangelho.
A primeira leitura demostra, uma vez mais, como os valores de Deus e os valores dos homens são diferentes. Na lógica dos homens, os vencedores são aqueles que tomam o mundo de assalto com o seu poder, com o seu dinheiro, com a sua ânsia de triunfo e de domínio, com a sua capacidade de impor as suas ideias ou a sua visão do mundo; são aqueles impressionam pela forma como vestem, pela sua beleza, pela sua inteligência, pelas suas brilhantes qualidades humanas…
Na lógica de Deus, os vencedores são aqueles que, embora vivendo no esquecimento, na humildade, na simplicidade, sabem fazer da própria vida um dom de amor aos irmãos; são aqueles que, com as suas atitudes de serviço e de entrega, trazem ao mundo uma mais valia de vida, de libertação e de esperança.
Irmãos e irmãs, o cenário do Evangelho de hoje(cf. Mc. 10,35-45) é a estrada para Jerusalém. Jesus e os Apóstolos se aproximam da cidade Santa. Dois discípulos queriam sentar-se, um à direita e outro à esquerda, de Jesus. Puro engano! Ainda não haviam compreendido o projeto de salvação de Jesus, que era morrer na Cruz pela salvação da humanidade.
Tiago e João cometeram o pecado de querer ser iguais ao Deus Salvador. Isso é um grave pecado, querer usurpar o lugar do Redentor, porque Tiago e João não poderiam morrer na cruz pela nossa salvação: essa era uma missão privativa do Filho de Deus, que depois subirá ao Céu e se sentará à direita do Pai. Jesus se humilha, fazendo-se servidor e morrendo pelos nossos pecados, para ser glorificado, ou seja, irromper a morte e anunciar a vida eterna. Jesus nos ensina hoje a amar e esperar com fé e esperança a morte.
A Morte de Jesus é para nós muito cara, principalmente quando relembramos que todos nós bebemos do mesmo cálice da salvação e recebemos o mesmo batismo, ou seja, a porta de entrada para sermos associados ao Senhor Ressuscitado, pela salvação.
Todos nós temos muito de João e Tiago: queremos o Reino de Deus, mas não trabalhamos para isso, não fazemos jus a este prêmio eterno. Hoje os homens procuram o poder, a glória, o ter, a honra. O que nós devemos ter é uma atitude de desprendimento, de renúncia, de serviço, é humilhar-se como Cristo, para subir ao céu depois de nossa peregrinação neste mundo!
Caros irmãos, na lógica da “mundanidade” os primeiros são os que têm dinheiro, os que têm poder, os que frequentam as festas badaladas nas revistas da sociedade, os que vestem segundo as exigências da moda, os que têm sucesso profissional, os que sabem colar-se aos valores politicamente corretos…
Em geral como concebe o nosso mundo social e político o uso da autoridade, dos ministérios, dos papéis e das funções? Promoção e honra, ambição e prestígio, domínio e tirania. Megalomania, arbitrariedade, tirania: eis ai a definição de muitos reinos e impérios da história passada: Nero, Sérvio Sulpicio Galba, Vespasiano... Isto é, “quantos súditos tenho para mandar, quantas bombas para disparar, quanto dinheiro para gastar”. Ambição, megalomania, exploração (ditatorial, republicana, democrática...): eis ai a definição de alguns Estados e nações na história contemporânea. Isto é: “quantos tenho que pisar para subir, que impostos impor para emagrecer os que têm e cevar os confrades do partido, quantos azulejos tenho que quebrar e corromper de religião, moral, matrimônio, família, filhos para me manter na poltrona”. E, desgraçadamente, não só no campo social e político, mas também familiar ou comunitário, isto pode acontecer. Está sempre ai a tentação de dominar e tiranizar os outros, se eles se deixam.
E na comunidade cristã? Quem são os primeiros? As palavras de Jesus não deixam qualquer dúvida: “quem quiser ser o primeiro, será o último de todos e o servo de todos”. Na comunidade cristã, a única grandeza é a grandeza de quem, com humildade e simplicidade, faz da própria vida um serviço aos irmãos.
Na comunidade cristã não há donos, nem grupos privilegiados, nem pessoas mais importantes do que as outras, nem distinções baseadas no dinheiro, na beleza, na cultura, na posição social… Na comunidade cristã há irmãos iguais, a quem a comunidade confia serviços diversos em vista do bem de todos. Aquilo que nos deve mover é a vontade de servir, de partilhar com os irmãos os dons que Deus nos concedeu.
Olhemos para Cristo, o nosso exemplo supremo. Não quis prerrogativas, nem ambições. Rebaixou-se, fez-se nada, arregaçou as mangas e lavou os pés. Veio para servir, e não para ser servido. Serviu o seu Pai celestial. Serviu Maria e José, os seus pais aqui na terra. Serviu a humanidade, curando, consolando, dando de comer, pregando a mensagem da salvação. Não quis nada em troca. Veio para dar a vida em resgate por todos. Onde resgate equivale à libertação do pecado e do cativeiro do demônio, mas também libertação das estruturas sociais, políticas, econômicas, religiosas, sindicais... opressoras do homem. Cristo não é um líder divino que abre caminho vencendo inimigos e instaurando um Reino de Deus político, não é um dominador, mas um servidor; não um vencedor, mas um vencido e rendido por amor.