VIAGEM
DO PAPA FRANCISCO AO MÉXICO
Santa
Missa com as comunidades indígenas de Chiapas
em San Cristóbal de Las Casas
Segunda-feira,
15 de fevereiro de 2016
«Li smantal Kajvaltike toj lek – a lei do Senhor é
perfeita, reconforta a alma» (Sal 19/18, 8): assim começa o salmo que
escutámos. A lei do Senhor é perfeita; e o salmista encarrega-se de enumerar
tudo o que esta lei gera de bom em quem a escuta e segue: reconforta a alma,
torna sábios os simples, alegra o coração, é luz para iluminar o caminho.
Esta é a lei que o povo de Israel recebera das mãos
de Moisés, uma lei que ajudaria o povo de Deus a viver na liberdade a que fora
chamado. Lei que queria ser luz para os seus passos e acompanhar o peregrinar
do seu povo; um povo que experimentara a escravidão e a tirania do Faraó, que
experimentara a amargura e os maus-tratos, até que Deus disse «basta», até que
Deus disse: «mais não». «Eu vi a aflição, ouvi o clamor, conheci a sua
angústia» (cf. Ex 3, 9). Manifesta-se aqui o rosto do nosso Deus, o rosto do
Pai que sofre com a dor, os maus-tratos, a injustiça na vida de seus filhos; e
a sua Palavra, a sua lei torna-se símbolo de liberdade, símbolo de alegria,
sabedoria e luz. Experiência, realidade que ecoa numa frase nascida da
sabedoria criada nestas terras desde os tempos antigos e assim transcrita no
Popol Vuh: «a aurora veio sobre todas as tribos reunidas. E logo a face da terra
foi purificada pelo sol» (33). A aurora veio para os povos que sucessivamente
caminharam sob as mais variadas trevas da história.
Nesta frase, há um anseio de viver em liberdade; um
anseio que tem o sabor da terra prometida, onde a opressão, os maus-tratos e a
degradação não sejam moeda corrente. No coração do homem e na memória de muitos
dos nossos povos, está inscrito o anseio por uma terra, por um tempo em que o
desprezo seja superado pela fraternidade, a injustiça seja vencida pela
solidariedade e a violência seja cancelada pela paz.
O nosso Pai não só compartilha este anseio, mas Ele
mesmo o suscitou e suscita dando-nos o seu Filho Jesus Cristo. N’Ele
encontramos a solidariedade do Pai, que caminha ao nosso lado. N’Ele vemos como
aquela lei perfeita assume uma carne, assume um rosto, assume a história, para
acompanhar e sustentar o seu povo; faz-se Caminho, faz-se Verdade, faz-se Vida,
para que as trevas não tenham a última palavra e a aurora não cesse de vir
sobre a vida dos seus filhos.
De muitas formas e maneiras se procurou silenciar e
cancelar este anseio, de muitas maneiras procuraram anestesiar-nos a alma, de
muitas formas pretenderam pôr em letargo e adormecer a vida das nossas crianças
e jovens com a insinuação de que nada pode mudar ou trata-se de sonhos
impossíveis. Contra estas formas, a própria criação sabe levantar a sua voz:
«Esta irmã clama contra o mal que lhe provocamos por causa do uso irresponsável
e do abuso dos bens que Deus nela colocou. Crescemos a pensar que éramos seus
proprietários e dominadores, autorizados a saqueá-la. A violência, que está no
coração humano ferido pelo pecado, vislumbra-se nos sintomas de doença que
notamos no solo, na água, no ar e nos seres vivos. Por isso, entre os pobres
mais abandonados e maltratados, conta-se a nossa terra oprimida e devastada,
que “geme e sofre as dores do parto” (Rm 8, 22)» (Enc. Laudato si’, 2).