O
termo “coração” faz-nos pensar em afetos, sentimentos, paixões. Mas, para o
autor bíblico, é muito mais do que isso: o coração, juntamente com o espírito,
é o centro da vida e da pessoa, o lugar das decisões, da interioridade, da vida
espiritual. Um “coração de carne” é dócil à Palavra de Deus, deixa-se guiar por
ela e tem “pensamentos de paz” para com os irmãos. Pelo contrário, um “coração
de pedra” está fechado em si mesmo, sendo incapaz de dar atenção e ter
misericórdia.
Precisamos
mesmo de um coração novo e de um espírito novo? Basta olhar ao nosso redor. As
violências, as corrupções, as guerras nascem de corações de pedra, que se
fecharam ao projeto de Deus sobre a Criação. E até nós, se olharmos
sinceramente para dentro de nós, não nos sentimos muitas vezes arrastados por
desejos egoístas? Será que as nossas decisões são sempre orientadas pelo amor e
pelo bem dos outros?
Ao
olhar para esta nossa pobre humanidade, Deus enche-se de compaixão. Ele, que
nos conhece melhor do que nós próprios, sabe que precisamos de um coração novo.
E promete-o ao profeta Ezequiel, pensando não apenas em algumas pessoas, mas em
todo o seu povo. O sonho de Deus é voltar a criar uma grande família de povos,
como Ele a idealizou desde as origens, moldada pela lei do amor recíproco. A
nossa história mostrou muitas vezes, por um lado, que, individualmente, não
somos capazes de realizar esse projeto, e, por outro, que Deus nunca se cansou
de “jogar este jogo”, até ao ponto de nos prometer dar um coração e um espírito
novos.
E
ele cumpre plenamente a sua promessa quando envia o seu Filho à Terra e infunde
o seu Espírito, no dia de Pentecostes. Aí nasce uma comunidade – a primeira
comunidade de Jerusalém –, ícone duma humanidade caracterizada por «um só
coração uma só alma» (1).