Duas igrejas
históricas de Raqa ficaram livres das minas a tempo para o Natal, mas nenhum
cristão ficou para as festas neste que foi o principal reduto dos extremistas
islâmicos na Síria. Todos fugiram dos combates.
Antes
de perder Raqa, em outubro, os extremistas do grupo Estado Islâmico (EI)
plantaram minas em toda a cidade, transformada em ruínas pelos bombardeios
aéreos da coalizão liderada pelos Estados Unidos.
Seis
sapadores (militares especializados em trabalhos diversos, como a retirada de
minas) da organização especializada ROJ concluem a espinhosa tarefa em dois
edifícios desfigurados: a Igreja dos Mártires e a da Anunciação. Eles levam
detectores consigo e usam uniformes beges e uma braçadeiras vermelhas adornadas
com caveiras.
Os
dois prédios em ruínas estão livres de minas, mas não haverá missa de Natal,
afirmam líderes religiosos. A imensa maioria dos moradores partiu de Raqa,
tanto cristãos quanto muçulmanos.
“Como
as festas se aproximam, nosso objetivo é permitir aos nossos irmãos cristãos
que voltem para praticar seus ritos religiosos”, afirma o assessor técnico da
ROJ, Abdelhamid Ayo.
Da
igreja armênia católica dos Mártires, no centro da cidade, restou apenas o
esqueleto de cimento. Os extremistas derrubaram a cruz no topo e transformaram
o templo em uma prisão, após conquistarem a cidade, em 2014. Também cavaram um
túnel subterrâneo para se deslocarem.
“Há
milhares de minas. Terminamos a metade de Raqa e até agora retiramos 1.300”,
reforça Ayo, de 33 anos.
As
Forças Democráticas Sírias (FDS), uma coalizão curdo-árabe, apoiada pelos
Estados Unidos, expulsaram o EI de Raqa. Mas apenas uns poucos moradores se
arriscaram a voltar.
“Não
há absolutamente nada previsto em Raqa”, afirma Butros Mariati, da diocese
armênia católica de Aleppo (norte), à qual a igreja dos Mártires é subordinada.
“A
igreja está em ruínas”, lamenta.
Os
milhares de cristãos armênios e sírios que viviam em Raqa representam cerca de
1% da população local, muçulmana sunita em sua grande maioria.
Quando
o EI chegou, em 2014, os cristãos e outras minorias religiosas fugiram por medo
do terror imposto pelos extremistas, com os quais tinham três opções: se
converter, pagar um imposto ou morrer.
Entre
os poucos civis que decidiram voltar, um ou vários morrem diariamente na
explosão acidental de minas. Uma mensagem nos muros de Raqa adverte: “Perigo!
Minas”.
Nayef
al Madfaa é um dos poucos que se aventurou. Ele o fez para checar o estado de
sua casa, situada atrás da igreja dos Mártires.
“Em
Raqa não havia diferença entre muçulmanos e cristãos. Todos vivíamos juntos,
felizes”, garante este muçulmano, que suspira apontando para várias casas
abandonadas.
“Todos
os cristãos fugiram de Raqa. Antes, havia alegria em todas as partes, mas
expulsaram a todos nós”, lamenta.
“O
pinheiro de Natal era colocado neste canto e as crianças entravam na igreja com
seus pais”, lembra o sexagenário. “Quando vejo apenas destruição ao meu redor,
fico triste”.