Para entender melhor o que significa a festa
do Ramadã e toda a situação de guerra no Oriente Médio, no contexto muçulmano e
dos cristãos orientais, entrevistamos o Pe. Samir Khalil Samir, SJ, pró-reitor
e interim do Pontifício Instituto Oriental, que explicou aos leitores de ZENIT
o que publicamos abaixo.
***
ZENIT: O
que é o Ramadã?
- Padre Samir: o
Ramadã é um mês de jejum e oração que os muçulmanos fazem todos os anos,
durante um mês lunar como nos antigos calendários. Jejua-se desde o amanhecer,
pelas 5hs da manhã, até o anoitecer.
ZENIT: É
como o jejum quaresmal?
- Padre Samir:
Exatamente como os cristãos orientais fazem o jejum hoje, não só os monges, mas
também as famílias. No Egito, na Igreja Copta, os cristãos não colocam nada na
boca, nem de comer nem de beber, a partir da meia-noite até as duas da tarde, e
os monges até o anoitecer. E depois fazem um jantar muito leve, e nada de
carne, nem manteiga ou queijo, nada produzido com animais. Para os cristãos a quaresma
são uns 47 dias, porque o domingo não conta como jejum.
ZENIT:
Então, existe um significado muito semelhante?
- Padre Samir:
Sim, é muito parecido, uma penitência que é feita para purificar-se, e
normalmente a tradição espiritual muçulmana convida os fieis a utilizar a noite
para meditar o Corão. Na verdade poucas pessoas do povo o fazem, só alguns ímãs
sufis, que correspondem aos místicos.
Para os
muçulmanos e os cristãos, mas também para os judeus e outras religiões, é um
tempo para estar cada vez mais perto dos pobres e dos sofredores. A diferença
com o jejum cristão é que no Ramadã come-se mais do que em qualquer outro
período do ano, e é um período festivo. Em certo sentido, pode-se dizer que de
tarde se recupera o que não se pode comer durante o dia, também quando vai
dormir ou meia noite ou às duas da manhã. Este é o costume normal dos
muçulmanos nos países árabes que conheço.
ZENIT:
Os Muçulmanos veem a religião como uma mensagem de paz?
- Padre Samir:
No Alcorão existem fragmentos que falam de paz e outros que falam de guerra,
contra os inimigos da fé. Contra os incrédulos, o Alcorão diz: sejam rápidos e
matem-nos onde os encontrarem” "(Alcorão 4, 89) e"sejam rápidos e
matem-nos no local onde os encontrem” (Alcorão 4, 91).
Segundo a
tradição, na segunda parte de sua vida, entre 622 e 632, data de sua morte,
Maomé fez uns sessenta ataques contra as caravanas, de saques (a palavra vem do
árabe Ghazwa) por várias razões. O Alcorão também diz aos muçulmanos:
"Vocês têm no Mensageiro de deus um modelo perfeito (Uswatun
hasanatun)" (33,21).
A razão para
essa violência é variada: de um lado pode ser a de garantir a sobrevivência, ou
roubar, ou para comprar escravos e escravas, etc. Em uma palavra: pela
pilhagem. Portanto, foi ‘revelado’ a Maomé o capítulo 8, chamado de "A
pilhagem” (al-Anfal), pelo qual Deus revela ao Seu mensageiro que tem direito
ao quinto de todo o espólio na primeira eleição! (Alcorão 8, 41). Os ataques
podem ser destinados à conversão das tribos árabes que não acreditaram no único
Deus.
Temos duas
biografias muçulmanas de Maomé escritas por volta do 750: uma se intitula a
biografia do Profeta (al-Sīrah al-Nabawiyyah) de Ibn Ishaq, e a outra O Livro
dos saques (Kitab al-Maghazi) de al-Waqidi, onde descreve uns sessenta. Não é
possível dizer que o Islã não conheça a guerra e não convide para a guerra. Mas
não é possível dizer que o Islã seja somente guerra. Existe um e outro, de
acordo com o momento da vida de Maomé.
E este é um dos
grandes problemas dos nossos irmãos muçulmanos. Porque é fácil para alguns
dizer que o Islã é uma religião de guerra, para converter todos para a única e
verdadeira religião dentre as três reveladas (judaísmo, cristianismo e
islamismo) e fazer a guerra em nome disso. Infelizmente vemos com o ISIS, com o
Boko Haram, com o Al-Qaeda, e com muitos outros.