sexta-feira, 1 de julho de 2016

Devemos suportar tudo por amor de Deus, para que também Ele nos suporte a nós.


Inácio, também chamado Teóforo, saúda cordialmente a Policarpo, bispo da Igreja de Esmirna, que tem como seu bispo Deus Pai e o Senhor Jesus Cristo.

Presto homenagem à tua piedade, solidamente fundada sobre uma rocha firme, e dou graças ao Senhor, que me concedeu a graça de ver o teu rosto de bondade; oxalá possa eu vê-lo para sempre em Deus. Recomendo-te, pela graça de que estás revestido, que aceleres a tua carreira e exortes a todos para que se salvem. Desempenha o cargo que ocupas com toda a diligência de corpo e de espírito. Vela pela unidade, porque nada há mais precioso. Suporta todos os irmãos, como o Senhor te suporta a ti; tem paciência e caridade para com todos, como sempre fazes. Entrega-te continuamente à oração; pede uma sabedoria maior do que a que tens; conserva o teu espírito sempre vigilante. Fala a cada um em particular, segundo o modo de agir de Deus; toma sobre ti, como perfeito atleta, as fraquezas de todos. Onde maior é o trabalho, maior é o lucro.

Se amas somente os bons discípulos, não terás nisso mérito algum; o mérito está em ganhar pela bondade a confiança dos piores. Nem todas as feridas se curam com o mesmo remédio. Acalma a violência das febres com compressas suaves. Sê prudente em tudo como a serpente, mas sempre simples como a pomba. Sendo tu composto de alma e corpo, tens experiência das realidades materiais e espirituais. Exercita humildemente a tua sabedoria nas coisas visíveis e pede que se te revelem as coisas invisíveis, para que nada te falte e tenhas em abundância todos os bens espirituais. Como o navegante deseja ventos propícios e o que é surpreendido pela tempestade procura o porto, assim o tempo presente exige de ti que procures alcançar a Deus, juntamente com os que te foram confiados. Sê sóbrio, como atleta de Deus; o prémio prometido é a imortalidade e a vida eterna, como sabes perfeitamente. Por ti ofereço o sacrifício da minha vida e as minhas cadeias que tu veneraste.

Não te atemorizes com aqueles que parecem dignos de fé e ensinam doutrinas falsas. Mantém-te firme como a bigorna sob o martelo. um grande atleta é maltratado, mas vence. Com muito maior razão devemos nós suportar tudo por amor de Deus, para que também Ele nos suporte a nós. Sê cada vez mais diligente. Aprende a discernir o sinal dos tempos. Espera Aquele que é superior a todas as vicissitudes dos tempos, intemporal e invisível, e Se tornou visível por causa de nós; confia n’Aquele que é impalpável e impassível, e que por nós Se tornou passível e sofreu todo o género de tormentos.

As viúvas não sejam desprezadas; depois do Senhor, sê tu o seu protetor. Nada se faça sem o teu consentimento, e tu não faças nada sem Deus (de facto, já assim procedes); sê firme. A reuniões dos fiéis sejam mais frequentes; convida-os a todos pelo seu nome. Não trates altivamente os escravos e as escravas; procura também que eles se não encham de orgulho, mas antes prestem com maior dedicação o seu serviço para glória de Deus, a fim de alcançarem de Deus uma liberdade melhor; nem se deixem mover pelo desejo de serem resgatados com os bens da comunidade, para que não se tornem escravos da cobiça.


Início da Carta de Santo Inácio de Antioquia, bispo e mártir, a Policarpo
(1, 1 – 4, 3: Funk 1, 247-249) (Sec. I)

É possível milagre fora da Igreja Católica?

 
Põe-se aqui uma grave questão: pode haver milagre fora da Igreja Católica? Nossa resposta é que se pode, em verdade, sustentar a possibilidade e até a existência de verdadeiros milagres fora da religião católica. Isso não pode dar-se por uma lei ordinária, mas somente por exceção e em casos isolados, e jamais fora do fim que distingue a verdadeira religião de Jesus Cristo. Por isso dizemos que o milagre pode dar-se fora do corpo desta religião, mas não fora de sua alma. Como fato sistemático, que constitui, por assim dizer, um sistema, um todo harmonioso governado por princípios invariáveis e por uma lei fixa, o milagre existe somente na religião que se intitula universal ou católica, porque fundada pela Causa Primeira que reuniu tudo, e em favor da qual foram operados os milagres mesmos da antiga lei.

Em verdade, pode admitir-se que, de maneira excepcional, e em casos isolados, o milagre se dê fora do corpo da religião católica, sendo livre o Espírito Santo para escolher seus instrumentos por onde quer que queira. Isso não deve constituir nenhuma dificuldade, sobretudo se o taumaturgo é um homem de vida santa e não busca outra coisa em suas obras que a honra de Deus.

Será bom, a este respeito, lembrar aqui o que lemos em São Marcos. Tendo dito a Jesus o Apóstolo João: 'Mestre, vimos um homem, que não vai conosco, expulsar os demônios em vosso nome, e lho impedimos', Nosso Senhor falou nestes termos: 'Não o impeçais, pois ninguém pode fazer milagre em meu nome e logo depois falar mal de mim. Quem não é contra vós é por vós'. Isto equivale a dizer que, se algum milagre se cumpre por um homem fora do corpo da Igreja de Jesus Cristo, tal fato é necessariamente ordenado à manifestação da verdade pregada pelo Salvador, e de modo algum em favor do erro.

É neste sentido que se devem explicar os milagres atribuídos, em tempos muito próximos dos nossos, a um padre ortodoxo grego de grande piedade, chamado Ivã ou João Serguief, da principal igreja de Cronstadt. A fama de santidade deste padre era tal que, no mês de outubro de 1894, o imperador Alexandre III, morrendo, o chamou na esperança de obter por sua intercessão um alívio para seus sofrimentos.

Tais milagres, supondo-os autênticos, seriam fatos isolados, cumpridos aparentemente fora da Igreja Católica, mas lhe pertenceriam de direito, porque não tinham por objeto a confirmação de uma falsa doutrina, mas antes a recompensa de uma santidade em harmonia com os princípios proclamados precisamente pela Igreja Católica. Tais milagres teriam tido pois por fim fornecer novas provas da existência da ordem sobrenatural.

São Galo





Filho de pais nobres e ricos, Galo nasceu na França no ano 489. Na sua época era costume os pais combinarem os matrimônios dos filhos. Por isto, ele estava predestinado a se casar com uma jovem donzela de nobre estirpe. Mas Galo desde criança já havia dedicado sua alma à vida espiritual. Para não ter de obedecer à tradição social, ele fugiu de casa, refugiando-se num convento.


Ele era tão dedicado às cerimônias da Santa Missa que se especializou nos cânticos. Contam os escritos que, além do talento para a música, era também dotado de uma voz maravilhosa que encantava e atraía fiéis para ouvi-lo cantar no coro do convento.


Sua atuação religiosa fez dele uma pessoa querida. Foi designado para atuar na corte de Teodorico. Em 527, quando morreu o bispo Quinciano, Galo era tão querido e respeitado que o povo o elegeu para ocupar o posto.


Se não bastasse sua humildade, piedade e caridade, para atender às necessidades do seu rebanho Galo protagonizou vários prodígios ainda em vida. Salvou sua cidade de um pavoroso incêndio que ameaçava transformar em cinzas todas as construções locais e livrou os habitantes de morrerem vítimas de uma peste que assolava a região.


Ele morreu em 01 de julho de 554, causando forte comoção na população, que logo começou a invocá-lo como santo nas horas de dor e necessidade.




Deus Pai de bondade, que criaste o ser humano para a felicidade e o dispuseste para cantar o seu louvor, alcançai-nos, pela intercessão de São Galo, uma fé capaz de louvar-te e agradecer-te todos os dias de nossa vida. Por Cristo nosso Senhor. Amém.
 

quinta-feira, 30 de junho de 2016

A misericórdia sem obras é morta, diz Papa




CATEQUESE DO ANO JUBILAR 
 Praça São Pedro – Vaticano 
 Quinta-feira, 30 de junho de 2016

Queridos irmãos e irmãs, bom dia!

Quantas vezes, durante esses primeiros meses do Jubileu, ouvimos falar das obras de misericórdia! Hoje, o Senhor nos convida a fazer um sério exame de consciência. Quantas vezes, durante esses primeiros meses no Jubileu, ouvimos falar das obras de misericórdia! Hoje, o Senhor nos convida a fazer um sério exame de consciência. É bom, de fato, nunca esquecer que a misericórdia não é uma palavra abstrata, mas é um estilo de vida: uma pessoa pode ser misericordiosa ou pode ser não-misericordiosa; é um estilo de vida. Eu escolho viver como misericordioso ou escolho viver como não misericordioso. Uma coisa é falar de misericórdia, outra é viver a misericórdia. Parafraseando as palavras de São Tiago apóstolo (cfr 2, 14-17) poderemos dizer: a misericórdia sem as obras é morta em si mesma. É justamente assim! O que torna viva a misericórdia é o seu constante dinamismo para ir ao encontro aos necessitados e às necessidades de quanto estão em dificuldade espiritual e material. A misericórdia tem olhos para ver, orelhas para ouvir, mãos para levantar…

A vida cotidiana nos permite tocar com a mão tantas exigências que dizem respeito às pessoas mais pobres e necessitadas. A nós é pedido aquela atenção particular que nos leva a perceber o estado de sofrimento e necessidade de tantos irmãos e irmãs. Às vezes passamos diante de situações dramáticas de pobreza e parece que não nos tocam; tudo continua como se nada fosse, em uma indiferença que no fim nos torna hipócritas e, sem que nos demos conta, resulta em uma forma de inércia espiritual que torna a alma insensível e a vida estéril. As pessoas que passam, que vão adiante na vida sem perceber a necessidade dos outros, sem ver tantas necessidades espirituais e materiais, são pessoas que passam sem viver, são pessoas que não servem aos outros. Lembrem-se bem: quem não vive para servir, não serve para viver.

Quantos são os aspectos da misericórdia de Deus para nós! Do mesmo modo, quantas faces se dirigem a nós para obter misericórdia. Quem experimentou na própria vida a misericórdia do Pai não pode permanecer insensível diante da necessidade dos irmãos. O ensinamento de Jesus que ouvimos não permite vias de fuga: tive fome e me destes de comer; tive sede e me destes de beber; estava nu, prófugo, doente, na prisão e me assististes (cf Mt 25, 35-36). Não se pode vacilar diante de uma pessoa que tem fome: é preciso dar-lhe de comer. Jesus nos diz isso! As obras de misericórdia não são como teorias, mas são testemunhos concretos. Obrigam a arregaçar as mangas para aliviar o sofrimento.

Por causa das mudanças do nosso mundo globalizado, algumas pobrezas materiais e espirituais se multiplicaram: demos, portanto, espaço à criatividade da caridade para identificar novas modalidades de ação. Deste modo, a via da misericórdia se tornará sempre mas concreta. A nós, portanto, é pedido para permanecer vigilantes como sentinelas, para que não aconteça que, diante das pobrezas produzidas pela cultura do bem-estar, o olhar dos cristãos se enfraqueça e se torne incapaz de olhar para o essencial. Olhar ao essencial. O que significa? Olhar Jesus, ver Jesus naquele que tem fome, no preso, no doente, no nu, naquele que não tem trabalho e precisa levar adiante uma família. Olhar Jesus naqueles nossos irmãos e irmãs; ver Jesus naquele que está sozinho, triste, naquele que erra e precisa de conselho, naquele que tem necessidade de fazer caminho com Ele em silêncio, para que se sinta em companhia. Estas são as obras que Jesus pede a nós! Ver Jesus neles, nestas pessoas. Por que? Porque assim Jesus olha para mim, olha para todos nós.
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Irei ao tabernáculo admirável


Como suspira o veado pelas correntes das águas, assim minha alma suspira por Vós, Senhor. Assim como aqueles veados suspiram pelas correntes das águas, também os nossos veados, ao fugirem do Egito e do mundo, aniquilaram nas águas do baptismo o Faraó com todo o seu exército. E depois de destruírem o poder do demónio, buscam as fontes da Igreja, que são o Pai e o Filho e o Espírito Santo.

Que o Pai seja fonte, está escrito em Jeremias: Abandonaram-Me a Mim, fonte de águas vivas, e escavaram para si cisternas, cisternas rotas que não podem conservar a água. Sobre o Filho, lemos noutro lugar: Abandonaram a fonte da sabedoria. Finalmente sobre o Espírito Santo: Se alguém beber da água que Eu lhe der, nascerá nele uma fonte de água que jorra para a vida eterna. E o Evangelista explica, logo a seguir, que as palavras do Salvador se referiam ao Espírito Santo. As passagens citadas provam claramente que as três fontes da Igreja são o mistério da Trindade.

Busca estas fontes a alma do crente, por elas suspira a alma do batizado, dizendo: A minha alma tem sede de Deus, fonte viva. Não se trata de um simples desejo de ver a Deus, mas de um desejo ardente, de uma sede abrasadora. Antes de receberem o baptismo, falavam uns com os outros e diziam: Quando irei contemplar a face de Deus? Agora conseguiram o que desejavam: vieram à presença de Deus, aproximaram-se do altar e do mistério do Salvador.

Admitidos a formar parte do Corpo de Cristo e regenerados na fonte da vida, podem dizer, cheios de confiança: Irei ao tabernáculo admirável, à casa de Deus. A casa de Deus é a Igreja, seu tabernáculo admirável, porque nele ressoam as vozes de louvor e de alegria, da multidão em festa. Vós que acabais de revestir-vos de Cristo e que, seguindo a nossa orientação, pela palavra de Deus fostes tirados do mar deste mundo como peixes com o anzol, dizei: Em nós mudou-se a ordem natural das coisas. Porque os peixes tirados do mar morrem; a nós, porém, os Apóstolos tiraram-nos do mar deste mundo e pescaram-nos para que passássemos da morte à vida. Enquanto vivíamos no mundo, os nossos olhos olhavam para o fundo do abismo e a nossa vida arrastava-se no pântano; mas depois que fomos tirados das ondas, começámos a ver o sol, começámos a contemplar a verdadeira luz e, inebriados de alegria, dissemos à nossa alma: Espera em Deus: ainda O hei de louvar, meu Salvador e meu Deus.    


Homilia de São Jerónimo, presbítero, aos neófitos, sobre o Salmo 41
(CCL 78, 542-544) (Sec. V)

Deus castiga?


Muitos dizem que o Deus do Antigo Testamento foi sanguinário e irado. Atribuem a Deus uma espécie de esquizofrenia ao tentarem contrapor o Deus do Novo Testamento com o do Antigo. Como se houvesse uma alteração em Sua personalidade, de repente, o Deus sanguinário se tornou o Deus misericordioso. Não! Deus não muda. Ele é perfeito desde toda eternidade. É o mesmo Deus que se apresenta, ora com sua face irada e ciumenta, ora com sua face misericordiosa e salvífica. O que inicialmente pode parecer contraditório está em perfeita sintonia com toda a história da salvação. A verdade é que SIM, Deus castiga. E o faz, não porque seja um Deus mau, pelo contrário, é justamente por ser um Deus de amor que corrige os seus filhos. A questão a ser entendida é em que consiste a correção divina.

O grande doutor da Igreja, Santo Tomás de Aquino, em sua famosa obra Suma Teológica, ao falar sobre a vingança explica o que significa o castigo divino. Para ele, a vingança tem uma conotação diversa daquela que é compreendida atualmente, enquanto, na linguagem moderna vingança representa um ato de fúria contra alguém que nos faça o mal, para Santo Tomás, adaptando para a nossa linguagem, trata-se de um castigo infligido para a conversão de um pecador.

Sabemos que Deus ama o homem e quer salvá-lo (conf. Jo 3,16), assim, como um pai amoroso, permite o sofrimento para que o filho se volte para Ele, pois nisto consiste a salvação. São inúmeros os casos de conversão ocorridas após um grande sofrimento, perda ou doença. É verdade também que Deus procura atrair o homem com vínculos humanos de amor, mas nem sempre funciona, nem sempre a linguagem do carinho é entendida e, nesses casos, é preciso que o reto caminho seja ensinado por meio da disciplina.

Santo Tomás afirma que Deus administra a questão do sofrimento da humanidade quase da mesma forma que o homem administra um sistema penal, ou seja, penalizando as pessoas primeiro para que se convertam e segundo para evitar dificuldades na sociedade. Para ele, o que justifica o castigo é a intenção.

"A vingança se consuma quando se inflige ao pecador um mal de pena. Por conseguinte, na vingança deve-se levar em conta o ânimo daquele que a exerce. Porque se a intenção dele recai principalmente sobre o mal daquele de quem se está vingando, e nisto se compraz, então isto é absolutamente ilícito, porque o fato de se comprazer com o mal de outrem é da ordem do ódio, que repugna à caridade, pela qual devemos amar todos os homens. E ninguém se desculpa alegando querer o mal daquele que injustamente lhe fez mal; da mesma forma que ninguém se desculpa de odiar aqueles que o odeiam." (Suma Teológica II-II, q. 108, a. 1).