Durante
sua exposição na audiência pública sobre o aborto, realizada pelo Supremo
Tribunal Federal (STF), no início de agosto, o médico Raphael Câmara Medeiros
Parente, explicou que, de fato, o aborto pode se tornar tema de saúde pública,
mas isso ocorrerá porque sua possível legalização aumentaria o índice de
mortalidade materna. Para ele, que é especialista em Gestão em Saúde, mestre em
Saúde Pública e doutor em Ginecologia, além de médico ginecologista da
Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), a redução no número dessas
mortes depende principalmente da melhora de condições dos hospitais públicos no
país, que há anos estão sucateados. Sua fundamentação está baseada em números
divulgados pelo DataSUS, o departamento de informática do Sistema Único de
Saúde do Brasil, e em pesquisas, conforme pode ser visto na entrevista abaixo e
no vídeo da audiência:
Sempre
Família: Um
número que é bastante usado na defesa da legalização do aborto, é o de que no
Brasil são feitos entre 500 mil e 1 milhão de abortos por ano. Qual a origem
desses números?
Raphael
Câmara: Esses números vêm do estudo da Revista Reprodução e
Climatério, que foi baseado em estudo prévio de 1994, da ONG defensora da
liberação do aborto, Guttmacher Institute. O que eles fazem nesse estudo é
multiplicar o número de abortos por cinco ou seis para fazer uma estimativa.
Como no Brasil o número que consta no DataSUS é de quase 200 mil, quando fazem
essa multiplicação vem o número de 1 milhão. Já o outro dado, que é de 500 mil,
sai de um estudo de 2016, da antropóloga Débora Diniz, feito com 2 mil mulheres
e que mostra que de cada cinco, uma abortou. Então eles fazem uma multiplicação
e resulta em algo em torno de 503 mil abortos.
SF: Os
números que comumente são usados para apresentar a quantidade de abortos no
país, não se referem somente ao ilegal, como você explicou na audiência
pública. Pode nos explicar a que tipos de aborto se referem e porque é um
equívoco usá-los para essa questão?
Raphael
Câmara: O que acontece é que os números oficiais, do DataSUS,
englobam todos os tipos de aborto: aquele que é natural, o que está previsto na
lei, o ilegal, o de gravidez ectópica, etc. Não é possível saber quantos são
ilegais, justamente pela ilegalidade do ato. E sendo ilegal a paciente
comumente não relata que foi provocado o aborto. É por causa disso que não se
pode dar crédito aos números usados pela Revista Reprodução e Climatério. Ao
fazerem aquela multiplicação estão apenas chutando.