quinta-feira, 29 de abril de 2021

Justiça decide que filme do Porta dos Fundos sobre Jesus gay não ataca o Cristianismo



O filme da produtora Porta dos Fundos que apresenta Jesus como homossexual não apresenta ataques ao Cristianismo e, portanto, “não ocorreu qualquer intolerância religiosa”, decidiu a Justiça carioca. A juíza Adriana Sucena Monteiro Jara Moura julgou no último dia 21 de abril improcedentes os pedidos da Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura (CDB) em Ação Civil Pública ajuizada contra o Porta dos Fundos e a plataforma de streaming Netflix por causa do “Especial de Natal do Porta dos Fundos: A Primeira Tentação de Cristo”, que estreou em 2019.

O filme, lançado pela Netflix com legendas em inglês, italiano e francês, além de mostrar Jesus como homossexual, retrata a Virgem Maria como prostituta e os apóstolos como alcoólatras.

A Associação Centro Dom Bosco de Fé e Cultura (CDB), que ajuizou a ação civil pública, diz que recorrerá.

O Centro Dom Bosco entrou com a ação pedindo a retirada do filme do ar, bem como a indenização por danos morais no valor do faturamento das empresas com o vídeo, em um total de R$ 2 milhões (correspondentes a cerca de R$0,02 por brasileiro que professa a fé católica).

Em sua decisão, a juíza Jara Moura considerou que o filme está disponível na Netflix para exibição “para os seus assinantes. Ou seja, não se trata de exibição em local público e de imagens que alcancem àqueles que não desejam ver o seu conteúdo”. Assim, afirma que resta “assegurada a plena liberdade de escolha de cada um de assistir ou não ao filme e mesmo de permanecer ou não como assinante da plataforma”.

Ao julgar improcedentes os pedidos do CDB, a magistrada afirmou ainda que “não ocorreu no caso em julgamento qualquer intolerância religiosa, sendo que esta não pode ser confundida com a crítica religiosa, realizada por meio de sátira, a elementos caros ao Cristianismo”.

Para ela, “a sátira em questão, um esquete humorístico que utiliza figuras históricas e religiosas como pano de fundo, não possui o condão de vilipendiar ou abalar os valores da fé cristã, que são muito mais profundos”.

Além disso, considerou que “não merece amparo o pedido de indenização por dano moral”, por considerar que “para a configuração do dano moral coletivo” é preciso “ter uma conduta antijurídica a afetar intoleravelmente e injustamente os valores e interesses coletivos fundamentais ou a tranquilidade social, mediante a ocorrência de conduta maculada de grave lesão”.

No seu julgamento, a juíza se mostrou em linha com posicionamento adotado pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no mesmo caso.

3 padres são detidos por ataque a bispo no Sudão do Sul


Doze pessoas, entre elas três clérigos católicos, foram presas como suspeitas do ataque ao bispo eleito da diocese de Rumbek, no Sudão do Sul, padre Christian Carlassare.

Na noite de 25 de abril, desconhecidos balearam o padre Carlassare, que estava em seu quarto no prédio onde moram os sacerdotes da catedral da Sagrada Família da diocese de Rumbek.

Padre Carlassare, um missionário comboniano de 43 anos, foi baleado nas pernas e levado para um centro de saúde em Rumbek para atendimento imediato. Em seguida, foi transferido para Nairóbi, capital do Quênia, para tratamento especializado.

Fontes locais disseram à ACI Africa, serviço em inglês para o continente africano do grupo ACI, que três membros do clero da diocese de Rumbek estão entre os presos na investigação do ataque ao padre Carlassare.

Uma das fontes disse que os seguranças encarregados da investigação do caso estão analisando um celular encontrado na cena do crime.

“Quando os dois homens atiraram no bispo eleito, um deles deixou cair o telefone. É esse telefone que a segurança usou para localizar os suspeitos”, disse a fonte.

Os 12 suspeitos presos, entre eles "importantes leigos da diocese", foram detidos por sua ligação com a "prova física do telefone celular encontrado no local onde o bispo eleito foi baleado", acrescentou.

As prisões dos suspeitos obedecem à ordem do Presidente do Sudão do Sul, Salva Kiir, que pediu uma "investigação rápida do atentado que leve à captura dos criminosos que cometeram este crime".

Em sua declaração de 16 de abril, o presidente afirmou que a notícia do ataque ao padre Carlassare o deixou consternado e destacou que este “ato de violência” é inaceitável.

"Se aqueles que cometeram este ato vergonhoso o fizeram para intimidar a Igreja, eles estão lamentavelmente enganados", disse Kiir. Padre Carlassare “foi eleito para liderar e as autoridades do Lake State o apoiarão e não permitirão que a ação de uns poucos criminosos condicione os projetos da autoridade eclesiástica”, acrescentou.

“Oro para que Deus fortaleça a fé do padre Carlassare no serviço ao nosso povo e que ele possa retornar ao seu rebanho com uma determinação renovada de servir os fiéis da diocese. Desejo-lhe uma recuperação rápida”, disse.

O vice-governador do estado de Lake, Poth Madit, confirmou à ACI África que algumas pessoas foram detidas e que esperam ter informações substanciais sobre o caso em breve.

Madit qualificou o ataque ao bispo eleito de "incidente isolado" cometido por um grupo de criminosos cuja rede já foi identificada e ressaltou que atualmente estão interrogando algumas pessoas na Igreja.

Liberdade religiosa é direito fundamental, não concessão, diz presidente da CNBB


A liberdade religiosa “não é uma simples concessão”, mas um direito fundamental do ser humano “inegociável”, afirmou o presidente da Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB) e Arcebispo de Belo Horizonte (MG), Dom Walmor Oliveira de Azevedo durante apresentação do Relatório de Liberdade Religiosa no Mundo, da Fundação Pontifícia Ajuda à Igreja que Sofre (ACN).

O evento on-line ocorreu na terça-feira, 27, e contou com a participação dos arcebispos de São Paulo (SP), Cardeal Odilo Pedro Scherer, do Rio de Janeiro (RJ), Cardeal Orani João Tempesta, e de Salvador (BA), Cardeal Sérgio da Rocha.

O relatório foi lançado mundialmente no dia 20 de abril em seis idiomas. Trata-se do único estudo realizado por uma instituição católica que abrange todas as religiões e analisa a situação em 196 países do mundo.

Nesta sua 15ª edição, o Relatório observa que a liberdade religiosa tem sido violada em um de cada três países. O direito fundamental à liberdade religiosa não foi respeitado em 62 (31,6%) dos 196 países pesquisados, entre 2018 e 2020. De acordo com o estudo, em 26 desses países as pessoas sofrem perseguição e, em 95% deles, a situação ficou ainda pior durante o período analisado.

Para Dom Walmor, “a liberdade religiosa é garantia inegociável do direito que cada pessoa tem de buscar o seu caminho para encontrar e conectar-se com o sagrado, fazer a experiência do transcendente, no atendimento de uma necessidade constitutiva da condição humana”. Assim, trata-se de “uma necessidade humana, dimensão essencial à vida”, observou.

“A liberdade religiosa é fundamental para que todos tenham o direito de trilhar o próprio caminho na busca pela dimensão transcendente e encontrar respostas que sejam profundas para dar conta de dar sentido ao próprio viver. É uma questão de sentido. A vida é um dom que tem sentido. A dimensão religiosa é imprescindível para se reconhecer o sentido da vida, especialmente nos momentos de dificuldades, desafios e no confronto das adversidades”, disse.

Nesse sentido, o presidente da CNBB defendeu que “a liberdade religiosa não é uma simples concessão, mas uma fonte no mais profundo do ser humano e, portanto, fundamental nas relações comunitárias e familiares”. Trata-se, assinalou, de “respeito à sacralidade mais profunda de cada ser humano”. “É um dom, um direito, uma necessidade, um caminho inegociável”, reforçou.

Para Dom Odilo Scherer “é impressionante” verificar que “que no século XXI vivemos situações gravíssimas de limitação da liberdade religiosa, de manipulação da religião e de intolerância religiosa muitas vezes promovida oficialmente pelo Estado”.

Em seguida, lançando o olhar sobre o Brasil, ressaltou que “é um Estado laico” e que “a Constituição deixa muito claro o que se entende nesse caso”.

“O Estado laico não tem uma religião oficial, não adota uma religião, não impõe uma religião aos cidadãos, respeita a religião de cada um ou a não religião se alguém não tem”, disse, “isso é da liberdade individual de cada cidadão e o Estado respeita e zela por esta liberdade”.

Por outro lado, há o “Estado antirreligioso”, que é aquele que “usa do seu poder, da sua autoridade para cercear a liberdade religiosa, para impedir aos cidadãos o livre desempenho de sua ação religiosa, da sua crença religiosa; ou então, é um Estado que, de alguma forma, privilegia uma religião e pretende impô-la a todos ou pretende impor a todos o ateísmo, a não religião”.

“Nós temos que estar muito atentos em nossa sociedade brasileira, como em todo lugar, quando muitas vezes se entende Estado laico como Estado antirreligioso”, advertiu dom Odilo e chamou a atenção para o fato de que a “garantia da liberdade religiosa, naturalmente, tem seus desdobramentos na garantia da livre expressão religiosa, da livre prática religiosa, da livre manifestação religiosa”.

Por isso, afirmou que o Estado não pode “pretender cercear a livre manifestação religiosa e também a livre participação dos cidadãos que têm fé e manifestam que são religiosos na vida pública”. 

Dom Walmor afirmou que “a comunidade católica é convidada cada vez mais a testemunhar o Evangelho com autenticidade no campo da política”, com respeito à “laicidade do Estado, à liberdade religiosa”, e compreendendo que “a política é uma vocação de serviço”.

“Sublinho ainda que o respeito constitucional à liberdade religiosa obriga o Estado laico a não se arvorar em juízo a serviço essencial intrínseco ao próprio da religião, único e inigualável da experiência religiosa no seu sentido indispensável”, declarou.

De acordo com o arcebispo de Belo Horizonte, “espera-se que, longe, mas muito longe de manipulação extremista e interesseira por parte de qualquer tipo de ideologia político-partidária”, o Estado “esteja à altura de dialogar como Estado laico com as confissões religiosas a fim de respeitar, não como concessão benévola arvorando-se no direito de fazer decretos ou legislar invasivamente nas esferas do religioso”, mas a “abrir-se dialogalmente para receber da riqueza humanística própria de toda autêntica experiência religiosa”.

Bispo critica teóloga que chamou de racismo oposição à ordenação de mulheres


O bispo de Passau (Alemanha), Stefan Oster, confrontou a professora de teologia e defensora da ordenação de mulheres ao sacerdócio, Johanna Rahner, que chamou os católicos que rejeitam o conceito de “igualdade de gênero” dentro da Igreja de “racistas”. Dom Oster repreendeu Rahner, chamando-a de "desavergonhada" em um texto publicado em seu site em 19 de abril e pediu um diálogo atencioso em vez de confrontos verbais.

Durante o "fórum das mulheres" organizado pela diocese de Rottenburg-Stuttgart, em 17 de abril, a professora alemã disse que qualquer pessoa que não defendesse "a igualdade de direitos para as mulheres” na Igreja era um “racista”, informou a CNA Deutsch, agência em alemão do grupo ACI. “É importante levantar a bandeira e assumir uma posição política ativa contra a discriminação contra as mulheres. Quem não fizer isso e permanecer calado é um racista,” disse a teóloga.

Rahner, de 58 anos, é professora de Dogmática, História do Dogma e Teologia Ecumênica na Faculdade de Teologia Católica da Universidade Eberhard Karls, em Tübingen.

Dom Stefan Oster, que trabalhou como jornalista por vários anos, denunciou a escalada e o discurso de ódio na mídia, criticou o site oficial dos bispos alemães pela cobertura das afirmações de Rahner e convocou um debate sobre como lidar com as provocações.

Para o bispo, esse escândalo não foi apenas uma acusação "descarada", mas também uma tentativa de negar que outros sejam católicos.

Oster não foi o único que criticou as acusações de Rahner.

Helmut Hoping, professor de dogmática em Freiburg, escreveu em no jornal católico "Die Tagespost" que a declaração de Rahner já não tem nada a ver com debate teológico.

“Isso é agitação política e imputação”, escreveu Hoping. Para ele, Rahner não apenas levantou uma acusação de racismo misógino, mas também afirmou que a Igreja Católica, incluindo sua constituição legal, não está de acordo com a lei constitucional alemã.

Hope também afirmou que Rahner é "uma teóloga muito influente e bem relacionada" que "não apenas aconselha os bispos [alemães] em questões de fé, mas também participa de todos os tipos de comitês acadêmicos".

Em sua Carta Apostólica Ordinatio sacerdotalis de 1994, São João Paulo II declarou que “a Igreja não tem absolutamente a faculdade de conferir a ordenação sacerdotal às mulheres, e que esta sentença deve ser considerada como definitiva por todos os fiéis da Igreja”.

Em declarações aos jornalistas durante uma conferência de imprensa que deu no voo de regresso da Suécia a Roma em 2016, o Papa Francisco disse: “Sobre a ordenação de mulheres na Igreja Católica, a última palavra é clara, foi dada por São João Paulo II e permanece.”.

Rahner afirmou no portal de internet oficial dos bispos alemães em 2017 que a decisão "não é final".

terça-feira, 27 de abril de 2021

CNBB promove jornada de oração e missão dedicada à paz no Haiti



A Conferência Nacional dos Bispos do Brasil (CNBB), por meio da Comissão Episcopal Pastoral para a Ação Missionária e Cooperação Intereclesial e a Ajuda à Igreja que sofre (ACN), promovem neste sábado, 1º de maio – festa de São José Operário, uma Jornada de Oração e Missão dedicada à paz no Haiti.

O pequeno país, em meio à região do caribe, vem sofrendo desde o terremoto em 2010. As tesões, morte e pobreza aumentaram com a passagem fortíssimo furação Matthew, em 2016. Desde então, a população do Haiti está cada vez mais vulnerável e vivendo grandes conflitos e tensões internas.

E nestes últimos dias, uma onda de violência tomou conta da ilha e religiosos e religiosas católicos se tornaram vítimas, sendo sequestrados e mantidos em cárcere. Em entrevista ao portal da ACN, no dia 15 de abril, o bispo da diocese de Hinche, dom Jean Désinord disse que os religiosos católicos estão com medo de se tornarem vítimas no Haiti. A diocese fica cerca de 112 quilômetros ao norte da capital, Porto Príncipe.

“Estamos nos perguntando quem será o próximo? Serei eu ou um irmão padre? Os padres e religiosos estão realmente em perigo. Afinal vivemos em constante medo”, explicou o bispo.

A Jornada de Oração e Missão faz parte de uma série, na qual se sublinha o valor da oração como “agir missionário”. De acordo com o assessor da Comissão para a Ação Missionária e Cooperação Intereclesial da CNBB, padre Daniel Rocchetti, a ação é um convite para que, cada um, faça a sua oração pelo país e ou por uma determinada intenção particular.

“A iniciativa foi escolhida para ser realizada no dia primeiro de cada mês, em memória a Santa Teresinha, padroeira das missões”, destaca o padre.

A proposta do projeto é que no dia primeiro de cada mês a Jornada de Oração e Missão seja dedicada a um país que também estejam vivendo conflitos e aos cristãos que estão vivendo na localidade. A primeira edição do projeto aconteceu no dia 1º de abril dedicada  à paz no Mianmar.

Principais Conclusões do Relatório de Liberdade Religiosa no mundo


A liberdade religiosa é violada em quase um terço dos países do mundo (31,6%) onde vivem dois terços da população mundial. Num total de 196 países, 62 enfrentam violações muito graves da liberdade religiosa. O número de pessoas que vivem nestes países é próximo dos 5,2 bilhões, já que os piores infratores incluem alguns dos países mais populosos do mundo (China, Índia, Paquistão, Bangladesh e Nigéria). A classificação:

O Vermelho, que indica perseguição, inclui 26 países onde vivem 3,9 bilhões de pessoas, pouco mais da metade (51%) da população mundial. Esta classificação inclui 12 países africanos e 2 países onde estão em curso investigações sobre um possível genocídio: China e Mianmar.

O Laranja, que indica discriminação, inclui 36 países, onde vivem 1,24 bilhões de pessoas. Há ligeiras melhorias identificadas em 9 países, enquanto 20 pioraram.

A classificação “sob observação” inclui países onde foram observados novos fatores de preocupação emergentes com o potencial de causar uma deterioração fundamental na liberdade religiosa. Estes fatores são identificados nos mapas de Análise Regional com o símbolo de uma lupa.

Em todas as classificações ocorrem crimes de ódio (ataques por preconceitos contra pessoas e bens religiosos).

Os restantes países não são classificados, mas isso não significa necessariamente que tudo seja perfeito em questões relativas ao direito fundamental à liberdade religiosa.

Durante o período em análise, houve um aumento significativo na gravidade das principais categorias de perseguição e opressão.

1. As redes transnacionais jihadistas espalhadas ao longo da linha do Equador aspiram a ser “califados” transcontinentais. O grupo Estado Islâmico (EI) e a Al-Qaeda, com patrocínio ideológico e material do Oriente Médio, associam-se e radicalizam ainda mais as milícias armadas locais para estabelecer “províncias do califado” ao longo da linha do Equador, uma crescente violência jihadista que se estende do Mali a Moçambique na África Subsaariana, às Comores no Oceano Índico e às Filipinas no Mar do Sul da China.

2. O “cyber-califado”, em expansão global, é agora um instrumento estabelecido de recrutamento e radicalização online no Ocidente. Os terroristas islamistas usam tecnologias digitais sofisticadas para recrutar, radicalizar e atacar. Embora não sejam capazes de neutralizar as comunicações terroristas online, as unidades antiterroristas conseguiram impedir ataques em vários países ocidentais.

3. Minorias religiosas culpadas pela pandemia. Os preconceitos sociais pré-existentes contra as minorias religiosas em países como a China, o Níger, a Turquia, o Egito e o Paquistão levaram a um aumento da discriminação durante a pandemia de COVID-19 através, por exemplo, da recusa do acesso a ajuda alimentar e médica.

4. Governos autoritários e grupos fundamentalistas têm intensificado a perseguição religiosa. Os movimentos de nacionalismo religioso majoritário, manipulados por governos e líderes religiosos associados, levaram à ascensão da supremacia étnico-religiosa em países de maioria hindu e budista na Ásia. Estes movimentos oprimiram ainda mais as minorias religiosas, reduzindo-as ao estado de cidadãos de segunda classe.

5. Violência sexual utilizada como arma contra minorias religiosas. Em um número crescente de países foram registrados crimes contra crianças e mulheres sequestradas, violadas e obrigadas a mudar a sua fé por meio de conversões forçadas. As questões sobre o número crescente dessas violações, que são frequentemente cometidas com impunidade, alimentam as preocupações de uma estratégia fundamentalista para acelerar o desaparecimento de certos grupos religiosos a longo prazo.

Análise Global sobre a Liberdade Religiosa

Com base na nossa avaliação dos relatórios de país e das análises regionais, catalogamos onde quase todas as proteções à liberdade religiosa desapareceram (países em vermelho); onde estas proteções estão ameaçadas (países em laranja); e uma nova classificação, “sob observação”, onde novos fatores emergentes de preocupação foram observados, potencialmente pondo em perigo o direito do indivíduo à liberdade religiosa.

Embora a perda de direitos fundamentais como a liberdade religiosa possa ocorrer subitamente, por exemplo através de conflitos e guerras, em muitos casos não acontece do dia para a noite, mas é, sim, frequentemente um processo de erosão que ocorre ao longo de anos. Assim como as telhas individuais de um telhado são danificadas uma a uma, ou algumas de cada vez, por ventos cada vez mais fortes, o observador acaba reconhecendo que já não existe qualquer cobertura, e que está exposto aos ventos. Estes ventos assumem a forma de governos autoritários, redes terroristas transnacionais ou líderes religiosos fundamentalistas que incitam multidões prontas a fazer linchamentos.

As razões para a erosão do direito à liberdade religiosa são patentes, mas também podem ocorrer como consequência do atrito criado pela introdução de novas leis e regulamentos que, tendo identificado a religião como parte do problema, forçam gradualmente as identidades religiosas para fora do espaço público. O Estado, como guardião da lei, é obrigado a permitir ao indivíduo “manifestar a sua religião ou crença em público ou privado”, mantendo a esfera pública aberta para todas as religiões e para os sem religião. Sem estas proteções estatais, porém, o direito humano inalienável torna-se vulnerável e corre o risco de desaparecer.

Com base na nossa avaliação dos relatórios de país e das análises regionais, apresentamos um mapa que destaca onde quase todas as proteções à liberdade religiosa desapareceram (países em vermelho); onde estas proteções estão ameaçadas (países em laranja); e uma nova classificação, “sob observação”, onde novos fatores emergentes de preocupação foram observados, potencialmente pondo em perigo o direito do indivíduo à liberdade religiosa.

Lamentavelmente, a retrospectiva confirma as observações acima mencionadas. Indícios sobre violações da liberdade religiosa observadas no nosso relatório de 2018 aceleraram e ampliaram-se à situação atual, onde os ataques sistemáticos e flagrantes vêm de governos, seja da China ou da Coreia do Norte, e de grupos terroristas internacionais como o Boko Haram ou o grupo Estado Islâmico e outros grupos fundamentalistas. Estes contextos têm sido exacerbados pela pandemia de COVID-19. Os Estados têm utilizado a insegurança para aumentar o controle sobre os seus cidadãos, e os participantes não estatais têm aproveitado a confusão para recrutar, expandir e provocar crises humanitárias mais vastas.

O período de dois anos em análise, contudo, revelou também progressos significativos, especialmente no diálogo inter-religioso, bem como no papel cada vez mais importante dos líderes religiosos na mediação e resolução das hostilidades e da guerra.

Perseguição extrema
(Mapa: países destacados de vermelho)

Perto de quatro bilhões de pessoas vivem nos 26 países classificados como sofrendo as mais intensas violações da liberdade religiosa. Constituem pouco mais de metade (51%) da população mundial.

Quase metade destes países encontra-se na África. Na África Subsaariana, as populações têm sido historicamente divididas entre agricultores e criadores de gado nômades, sofrendo ocasionalmente surtos de violência resultantes de conflitos de longa duração por motivos étnicos e de luta por recursos, mais recentemente exacerbados pelas alterações climáticas, pobreza crescente e ataques de grupos criminosos armados. Apesar destes conflitos, na sua maioria, comunidades e diferentes grupos religiosos têm vivido juntos em relativa paz. Na última década, contudo, a violência irrompeu em toda a região com uma inimaginável ferocidade.

Este auge do conflito libertou a frustração reprimida de muitas gerações de jovens desfavorecidos que sofreram pobreza, corrupção e poucas oportunidades de educação e trabalho. Estas frustrações, por sua vez, alimentaram a ascensão de grupos armados, incluindo militantes islamistas, tanto locais como, mais recentemente, estrangeiros, grupos jihadistas transnacionais empenhados numa perseguição seletiva e sistemática de todos aqueles, tanto muçulmanos como cristãos, que não aceitam a ideologia islamista extrema. Nos últimos dois anos, os grupos jihadistas consolidaram a sua presença na África Subsaariana e a região tornou-se um paraíso para mais de vinte grupos ativos e cada vez mais cooperantes em 14 países, incluindo filiados do grupo Estado Islâmico e da Al-Qaeda. O desenvolvimento destes filiados ocorreu num período de tempo alarmantemente curto e o padrão é familiar. Ataques de grupos criminosos locais, impulsionados por pregadores jihadistas salafitas, passam de ataques esporádicos e arbitrários a ataques ideológicos e específicos. Em certos casos, os esforços de um grupo culminam numa distinção sinistra, a “filiação” como província de um autoproclamado califado de uma rede islâmica transnacional (ver Contexto sobre a África no Sumário Executivo).

Milhões de pessoas fugiram das regiões em conflito, quer como deslocados internos, quer como refugiados para os países vizinhos. Foram relatadas graves violações dos direitos humanos, sendo vítimas frequentes as mulheres as crianças. Milhões de pessoas na África Subsaariana enfrentam a miséria com o abandono forçado dos campos e dos pequenos negócios tradicionais. A fome surge então, uma vez que grupos armados impedem o acesso à ajuda humanitária, mulheres e crianças são escravizadas e os homens são recrutados à força para as fileiras dos extremistas. Como evidenciado no relatório, em países como o Burkina Faso, segundo a Organização Mundial de Saúde, no final de 2020, mais de 60% do território não estava acessível aos membros de ajuda humanitária.

Os governos são incapazes de abordar a questão ou em alguns casos aparentemente não estão dispostos a fazê-lo. Consideravelmente mais bem equipadas do que as forças armadas locais, as milícias jihadistas financiam as suas atividades através de sequestros, roubos e tráfico ilícito de seres humanos, minerais preciosos e drogas. Só recentemente foram criadas forças de trabalho multinacionais para ajudar os governos locais (ver Análise Regional e Contexto sobre a África).

Enquanto a liberdade religiosa na África sofre de violência intercomunitária e jihadista, na Ásia a perseguição de grupos religiosos provém principalmente de ditaduras marxistas. Na China e na Coreia do Norte, que são os piores infratores na categoria vermelha, a liberdade religiosa é inexistente, tal como a maioria dos direitos humanos.

Na Coreia do Norte não são reconhecidos direitos humanos fundamentais e a perseguição visa qualquer grupo que desafie o culto da personalidade do Governo de Kim Jong-un, embora o tratamento dos Cristãos seja particularmente severo. O regime, a este respeito, pode ser definido como “exterminador”.

Na população chinesa de 1,4 bilhões de habitantes, quase 900 milhões identificam-se como adeptos de alguma forma de espiritualidade ou religião, e o controle do Estado é implacável. A vigilância em massa, incluindo a tecnologia de inteligência artificial refinada, um sistema de crédito social que recompensa e pune o comportamento individual, e a repressão brutal de grupos religiosos e étnicos, fazem cumprir a supremacia do Estado. Como revela a Análise Regional, “o Partido Comunista Chinês (PCC) tem um dos motores de controle religioso mais difundidos e eficazes do Estado, atualmente em funcionamento em qualquer parte do mundo”. Isto é particularmente evidente através dos “campos de reeducação” em massa e dos “programas de reeducação” coerciva que afetam mais de um milhão de uigures, na sua maioria muçulmanos, na província de Xinjiang (ver Contexto sobre a China no Sumário Executivo). Embora existam aproximadamente 30 milhões de muçulmanos na China, incluindo cerca de 13 milhões de uigures que aderem a um ramo sunita do Islamismo (ver box de fatos sobre os ramos do Islamismo), em vez de tentarem proteger os outros fiéis, alguns países muçulmanos sunitas cooperam com as autoridades chinesas, deportando de volta os uigures que neles procuram refúgio. De todos os países membros da ONU, apenas os Estados Unidos e o Canadá descreveram as ações da China como genocídio.

Ao longo do período em análise, Mianmar evoluiu rumo ao pior crime contra a humanidade, o genocídio. Os ataques contínuos contra cristãos e hindus no estado de Kachin ocorreram à sombra de um ataque maciço e multifásico dos militares e outros grupos armados contra a população rohingya, majoritariamente muçulmana, no estado de Rakhine. Empurrados sistematicamente para o vizinho Bangladesh, calcula-se que um milhão de rohingyas estão abrigados em campos sujeitos a doenças, miséria, abuso sexual e assassinato. Ao contrário da China, o Tribunal Internacional de Justiça ordenou ao Governo de Mianmar que implementasse medidas para prevenir o genocídio, enquanto prossegue uma investigação.

Ciente das restrições religiosas impostas por ditaduras marxistas e regimes militares, um grave desafio à liberdade religiosa na Ásia vem de movimentos de nacionalismo étnico-religioso cada vez maiores. Talvez o exemplo mais explícito seja a Índia, onde vive uma maioria hindu de quase 1,4 bilhão de habitantes, embora com populações significativas de minorias religiosas, incluindo muçulmanos e cristãos. Com um setor econômico com baixo desempenho e uma necessidade de reforçar os votos, o Partido Bharatiya Janata (BJP) no poder projeta uma visão cada vez mais nacionalista destinada a fazer eco na população majoritária, com a ideia de que a Índia é inerentemente hindu. A Índia não está sozinha. Esta tendência afeta bilhões no continente asiático, predominantemente em contextos democráticos ou semidemocráticos que favorecem a ascensão do nacionalismo religioso majoritário no Paquistão de maioria muçulmana, no Nepal de maioria hindu e no Sri Lanka, Mianmar, Tailândia e Butão de maioria budista (ver Análise Regional da Ásia Continental e Contexto sobre nacionalismo étnico-religioso no Sumário Executivo).

Comum a todos os países destacados de vermelho, mas mais evidente no Paquistão, é o profundo impacto sobre os mais vulneráveis, mulheres e crianças com a “religião errada” que são sequestradas, estupradas e obrigadas a mudar a sua fé, nas chamadas conversões forçadas. Enquanto minorias e, portanto, cidadãos de fato de segunda classe, têm poucas ou nenhuma hipótese de justiça e reparação, apesar de serem vítimas de crimes puníveis ao abrigo do direito comum. Os direitos destas crianças e mulheres são negados de forma tão abrangente que se tornam escravas, prostitutas e trabalhadoras manuais (ver Estudo de Caso do Paquistão e relatórios de país sobre a Nigéria e a Índia).

Relatório da Liberdade Religiosa 2021: Países da OSCE

Com base na nossa avaliação dos relatórios de país e das análises regionais, catalogamos onde quase todas as proteções à liberdade religiosa desapareceram (países em vermelho); onde estas proteções estão ameaçadas (países em laranja); e uma nova classificação, “sob observação”, onde novos fatores emergentes de preocupação foram observados, potencialmente pondo em perigo o direito do indivíduo à liberdade religiosa.

A região da Organização para a Segurança e Cooperação na Europa (OSCE) é frequentemente dividida através das expressões a “leste de Viena” e a “oeste de Viena”. Também tem sido descrita como “de Vancouver a Vladivostok”, o que denota não só a distribuição geográfica dos estados participantes, mas também o vasto leque de etnias, religiões e estruturas políticas.

A região é composta por 57 países, entre eles o EUA, Canadá, Europa e Rússia ao Báltico, Balcãs, antiga Europa Oriental soviética, Ásia Central e Cáucaso. Os estados participantes incluem alguns dos países mais poderosos ou influentes do mundo: os EUA, a Rússia, a Alemanha, a França, o Reino Unido e a Turquia. Outros países da região estão entre os mais pobres ou menos poderosos, incluindo o Tajiquistão, o Quirguistão e o Uzbequistão.

Embora todos os países da região tenham alguma forma de proteção constitucional da liberdade religiosa, a aplicação efetiva destas proteções e o respeito delas por parte da sociedade variam muito.

Pandemia de COVID-19

Em 2020 observou-se um fenômeno extraordinário relacionado com as regulamentações pandêmicas da COVID-19 e o seu impacto na liberdade religiosa em toda a região da OSCE. Muitos países na Europa, bem como os EUA e o Canadá, impuseram medidas para proibir ou restringir severamente o culto público, incluindo durante a Semana Santa, o Yom Kippur e o Ramadã. Nos EUA, o Juiz do Supremo Tribunal Samuel Alito declarou que a pandemia tinha conduzido a limites à liberdade “anteriormente inimagináveis”, particularmente à liberdade religiosa: “nunca antes tínhamos visto restrições tão duras, extensas e prolongadas como as experimentadas durante a maior parte de 2020”.

Em alguns casos, estas restrições às práticas religiosas foram vistas como desiguais e, portanto, discriminatórias. Apesar do aumento da regulamentação das atividades de culto, foram permitidos outros encontros, incluindo comícios políticos, manifestações públicas e a reabertura de comércio. Um exemplo foi a diretiva do governador Sisolak do Nevada que limitava a frequência dos cultos religiosos a um máximo de 50 pessoas (independentemente da dimensão da igreja e das medidas de distanciamento social), enquanto os estabelecimentos de comércio, os restaurantes e os casinos eram autorizados a reabrir com 50% da sua capacidade.

Mais preocupante, porém, foi o crescente mal-estar de que muitos governos ocidentais pareciam estar classificando a prática religiosa como inferior à liberdade de expressão numa “hierarquia de direitos”. Nos EUA, o líder da maioria do Senado, Mitch McConnell, constatou que os legisladores de vários estados e grandes cidades proibiam ou limitavam duramente os serviços religiosos, ao mesmo tempo que permitiam protestos públicos, afirmando: “a liberdade de expressão, reunião e religião ‘têm o mesmo estatuto constitucional’ e por isso devem ser tratadas da mesma forma”. Inúmeros processos foram instaurados nos EUA em nome de comunidades religiosas que alegavam que as restrições sanitárias impunham “encargos injustos sobre a religião não sentidos pelas entidades seculares”.

No início de junho de 2020, enquanto Madrid e Barcelona ainda estavam sob restrições COVID-19 que limitavam os locais de culto a 30% de capacidade e os funerais em espaços fechados a um máximo de 10 pessoas, milhares puderam reunir-se em marchas antirracismo autorizadas.

Na província canadense de Quebec, os bispos católicos solicitaram que as restrições impostas à ocupação nas igrejas fossem pelo menos iguais às impostas a outros espaços interiores, tais como teatros e salas de concertos. O Arcebispo do Quebec e primaz do Canadá também expressou a sua frustração pela falta de tratamento equitativo das comunidades de fé (ver relatório do país).

Em muitos países da região da OSCE foram impostos decretos que restringiam o culto público ignorando a objeção das comunidades religiosas. Em novembro de 2020, os líderes religiosos da Inglaterra enviaram uma carta conjunta ao Governo na qual “discordam fortemente da decisão de suspender o culto público”. O Arcebispo de Westminster e presidente da Conferência Episcopal Católica de Inglaterra e País de Gales disse que “ainda não tinha visto quaisquer provas” para justificar a proibição do culto. O presidente do Conselho Consultivo Nacional de Mesquitas e Imãs disse que a proibição da oração comunitária nos locais de culto era “desanimadora” e que a comunidade muçulmana estava procurando “uma oração comunitária limitada nas mesquitas, que são efetivamente indivíduos que rezam em uníssono na sequência de medidas de distanciamento social”. Constatou que a “diferença fundamental entre as mesquitas e alguns outros locais de culto é que as mesquitas são, antes de mais nada, utilizadas para a oração comunitária”.

Na Grécia, o Santo Sínodo da Igreja Ortodoxa disse que “não aceita” uma restrição de uma semana aos cultos presenciais e ordenou aos sacerdotes que ignorassem as ordens de fechamento do Governo em janeiro de 2021 para permitir que os fiéis assistissem aos cultos na festa da Epifania. E em Chipre, o Bispo de Morfou Neophytos realizou uma Missa pública para celebrar o Domingo de Ramos, violando os regulamentos governamentais (ver relatório do país).