A Rede Ecumênica da Juventude (REJU) trabalhará este ano, por ocasião da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos (SOUC), o tema do direito à vida e à segurança da juventude, levantando o debate da redução maioridade penal. Defendida por alguns setores e criticada por outros, a redução da maioridade penal, na verdade, apenas maquia um problema de âmbito muito mais profundo, varrendo para debaixo do tapete questões importantes como as desigualdades sociais, a ausência e ineficiência do Estado em muitas comunidades onde a vulnerabilidade social é regra, e até mesmo a temática do aumento da criminalidade.
Para falar sobre o assunto o CONIC foi falar com o facilitador nacional da REJU, Daniel Souza, formado em Teologia e Filosofia e mestre em Ciências da Religião. Confira:
Olá, Daniel, seja muito bem vindo!
Como surgiu a ideia de trabalhar a questão da maioridade penal no âmbito da Semana de Oração?
O debate sobre a redução da maioridade penal está sendo divulgado amplamente nas redes sociais e na grande mídia. É um assunto que tem recebido uma grande visibilidade, mas sempre a partir de uma única ótica, uma perspectiva que apresenta a redução como uma solução. Dentro deste debate, nos causou estranheza um fato. Durante a aprovação do Estatuto da Juventude no Senado Federal - ironicamente - alguns senadores fizeram discursos de criminalização da juventude, colocando-se favoráveis à redução da maioridade penal como um caminho de diminuição da violência. No mesmo dia - não por coincidência - o governador de São Paulo, Geraldo Alckmin, entregou ao congresso a proposta que traz alterações ao ECA. Isso não é um fato isolado, mas ecoa cada vez mais algumas perspectivas da sociedade, da mídia, do judiciário e de tantos outros espaços. Nessa realidade, resolvemos nos colocar no debate de maneira mais enfática, marcando posição e denunciando as falsas soluções para problemas crônicos. Escolhemos começar - numa sugestão de João Paulo Pucinelli, facilitador da REJU-CO - com um diálogo entre as igrejas cristãs por meio da Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos. Queremos levantar a temática do direito à vida e à segurança da juventude, contra o extermínio e assassinato de jovens, em sua maioria negros e pobres, e contra a redução da maioridade penal. Esperamos que essa atividade aconteça no âmbito nacional a partir de temáticas locais, por isto propomos que cada contexto levante as suas questões e apresente-as durante a SOUC e depois nos relate!
A REJU tem um trabalho histórico de conscientização acerca desse tema. Por isso, seria interessante que você explicasse ao nosso leitor quais têm sido as frentes de atuação da Rede nesse sentido.
A REJU, desde o seu começo, aborda a temática da superação da violência à juventude, por meio de campanhas nacionais e ações locais, mais regionalizadas. Um exemplo disto foi a campanha realizada em 2008, com cinejuventudes em todo o país, que resultou em um documento - "Carta contra toda violência à juventude" - entregue a espaços do legislativo, judiciário e executivo. Neste ano, sobre a redução da maioridade penal, especificamente, estabelecemos cinco pontos de atuação: 1) a construção de uma nota pública, lançada em 7 de maio; 2) a incidência na Semana de Oração pela Unidade dos Cristãos; 3) a realização de encontros e rodas de diálogo sobre o tema (já existem atividades marcadas em São Paulo (SP), Serra (ES), Goiânia (GO) e São Leopoldo (RS)...); 4) participação e construção de uma mobilização via Conselho Nacional de Juventude (CONJUVE); e 5) a colaboração e o apoio com o Movimento 18 razões que tem levantado a temática contra a redução da maioridade penal a partir de uma confluência de distintas organizações.
Em sua opinião, por quais motivos muitos ainda defendem a redução da maioridade penal?
Os motivos são diversos. Arrisco-me a apontar alguns: o desejo em favor do tratamento de adolescentes em conflitos com a lei igual ao de indivíduos adultos, no imaginário da população em geral, pode estar relacionado à busca pela diminuição da violência em muitas cidades. Isto se vincula diretamente com a desinformação e a cultura do medo, exploradas pela grande mídia, basta olharmos os noticiários policiais no fim da tarde, em que a redução mostra-se como uma solução rápida para os dilemas da violência. Um horror! Mas esta proposta também ganha força em discursos de certos políticos que, depois de casos de assassinato cometidos por/ou com a participação de adolescentes e divulgados pelos noticiários, aproveitam a sensação de insegurança e lançam como solução a proposta de redução da maioridade penal. Uma resposta rápida assumida por muitas pessoas. Um casamento entre medo, espetacularização da vida e oportunismo político. Junto a estes motivos que listei, o que mais nos assusta é o grande sentimento de vingança que paira nos discursos favoráveis à redução. Não se deseja a ressocialização de adolescentes e uma nova vivência em comunidade, mas o encarceramento violento, marcado por distintas violações de direitos humanos. Além do mais, seguindo os passos do atual estado, quem é que vai ser encarcerado? Ou: que é que mais morre por meio de violência policial? A redução da maioridade penal ampliará cada vez mais a criminalização de uma classe, de uma cor e etnia, e de um território nas cidades: a população pobre, negra e periférica.
E o que podemos fazer para esclarecer essas pessoas sobre os perigos de se achar que, com a redução da maioridade penal, todos os problemas da violência no Brasil estarão resolvidos?
Os caminhos são diversos, mas não são fáceis. Há um acordo nada silencioso entre setores da sociedade favoráveis a redução, que envolvem empresários, juristas, políticos, intelectuais e a grande impressa. Vozes dissonantes a essas carregam o peso da denúncia e profetismo, mas também carregam o peso da ameaça de silenciamento e exclusão. Neste sentido, as igrejas (e outras vivências religiosas) possuem um papel fundamental em pautar a sociedade em favor da vida e da segurança da juventude e contra a redução da maioridade penal, em levantar diálogos nas comunidades de fé, em participar de audiências públicas e movimentos que articulem experiências que sinalizam caminhos alternativos a este dado pela mídia e por determinados políticos. Sei que esta tarefa não é algo leve em tempos de bancada evangélica (e também católica) aliadas numa unidade que desejar reduzir direitos e bloquear a ampliação de tantos outros. Mas quem disse que seria fácil? Por isto, nós da REJU convidamos a quem desejar abraçar este compromisso contra a redução a se juntar nestas redes que vamos criando em cada lugar e espaço, resultando em uma mobilização ampla e irmanada.
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Fonte: Conselho Nacional de Igrejas Cristãs do Brasil - CONIC
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