Uma vida sem sofrimento é o desejo geral do ser humano. Mas, só pelo fato de sermos criaturas de Deus nos reportamos a Ele para encontrar, com sua ajuda, plena realização. Não somos deuses para tirar todo limite que nos incomoda. Mas no Criador encontramos respaldo suficiente para encontrarmos a fonte de realização plena. Enquanto não entrarmos nesse verdadeiro segredo da vida, labutamos sem percebermos o porquê de tantos limites que nos causam insatisfação.
Em Cristo encontramos o significado do sofrimento para que este se torne instrumento de superação de nossos limites. A doação de si causa alívio da dor ao outro. Somente superamos o nosso próprio sofrimento no amor. A oblatividade pessoal em benefício do outro é um verdadeiro trampolim para superarmos nossos limites e irrealização. A felicidade não se encontra puramente no ter prazeres e bem estar momentâneos. O ideal da vida do amor humano, perpassado pelo divino, faz-nos atingir um objetivo maior de vida. Este leva-nos a superar a dor advinda do sacrifício de si. Viver no maior conforto sensível sem a busca de um objetivo elevado não realiza plenamente o ser humano. A chamada “Teologia da Prosperidade” não focaliza adequadamente a vida com os parâmetros de Cristo. Estes exigem a pobreza do ser, isto é, o esvaziamento dos ídolos para a colocação do amor de Deus, que nos leva a introduzir, no que é material, o enfoque de instrumento e não de finalidade de vida. Uma coisa é a miséria material em que vivem muitos seres humanos, devendo ser superada com a fraternidade, a solidariedade e justiça. Outra é o encaminhamento de vida na perspectiva do amor de Deus, que nos faz relativizar o que é material e sensível, para fazê-lo ser instrumento bem utilizado para a realização do projeto divino.
A superação da dor, dos sofrimentos e da falta de meios para uma vida digna deve-se fazer. Mas não à custa do sacrifício causado ao semelhante, com a concentração de oportunidades para uns em detrimento de outros. Mas, mesmo com a prática da justiça e da solidariedade, haverá sempre o sofrimento humano. No cadinho da prática da alteridade, com um ideal de vida buscado no amor, o sofrimento na vida vem compensado com redundância. Este, aliás, se torna regenerador para uma realização pessoal na prática da promoção do outro. É o que vem caracterizado no exemplo e no ensinamento de Jesus: “Eu vos dou um novo mandamento: Amai-vos uns aos outros” (João 13, 14).
Para termos um “novo céu e uma nova terra” (Apocalipse 21, 1) valem a pena o sacrifício e a luta pela implantação dos valores éticos, humanos, morais e espirituais. Caso contrário, vamos favorecer, pela mentalidade materialista e laicista ao extremo, a prática e a legislação favorecedoras dos apetites instintivos, que podem levar ao egocentrismo. Vai-se paganizar a tal ponto a convivência humana que ela se tornará cada vez mais animalesca, sem perspectivas da grandeza da dignidade humana, criada à imagem de Deus. Todo sofrimento, não buscado, mas inerente à situação humana, no ato da oblatividade de si para melhorar a convivência realmente humana, vale a pena. Cristo o fez de forma totalmente exemplar. Na sua trilha consertaremos nossa convivência. Aí haverá mais solidariedade, respeito aos valores e à dignidade humana. A felicidade rondará melhor nosso convívio. Cada um vai ser valorizado e a natureza será mais respeitada.
Dom José Alberto Moura
Arcebispo Metropolitano de Montes Claros
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