MENSAGEM
Mensagem ao Encontro para a Amizade entre os Povos
Domingo, 18 de agosto de 2013
Excelência Reverendíssima,
Com alegria transmito a cordial saudação do Santo Padre Francisco a Vossa Excelência, aos organizadores e a todos os participantes do Encontro para a Amizade entre os Povos, que chegou à sua 34ª edição. O tema escolhido – “Emergência homem” – intercepta a grande urgência da evangelização da qual muitas vezes o Santo Padre falou, na esteira de seus predecessores, e suscitou nele profundas considerações que reporto a seguir.
O homem é o caminho da Igreja: assim o beato João Paulo II escrevia na sua primeira Encíclica,Redemptores hominis (cfr n. 14). Esta verdade permanece válida também e sobretudo no nosso tempo em que a Igreja, de modo sempre mais globalizado e virtual, em uma sociedade sempre mais secularizada e privada de pontos de referência estáveis, é chamada a redescobrir a própria missão, concentrando-se no essencial e buscando novos caminhos para a evangelização.
O homem permanece um mistério, irredutível a qualquer imagem que sobre isso se forme na sociedade e o poder econômico procure impor. Mistério de liberdade e de graça, de pobreza e de grandeza. Mas o que significa que o homem é “caminho da Igreja”? E sobretudo, o que quer dizer para nós hoje percorrer este caminho?
O homem é caminho da Igreja porque é o caminho percorrido pelo próprio Deus. Desde o alvorecer da humanidade, depois do pecado original, Deus coloca-se à procura do homem. “Onde estás?” – pergunta a Adão que se esconde no jardim (Gen 3, 9). Esta pergunta, que aparece no início do Livro do Gênesis, e que não cessa de ressoar ao longo de toda a Bíblia e em cada momento da história que Deus, ao longo dos milênios, construiu com a humanidade, alcança na encarnação do Filho a sua expressão mais alta. Afirma Santo Agostinho em seu comentário ao Evangelho de João: “Permanecendo junto ao Pai, [o Filho] era verdade e vida; revestindo-se da nossa carne, transformou-se caminho” (I, 34, 9). É, portanto, Jesus Cristo “o caminho principal da Igreja”, mas porque Ele “é também o caminho para cada homem”, o homem transforma-se “o primeiro e fundamental caminho da Igreja” (cfr Redemptores hominis, 13-14).
“Eu sou a porta”, afirma Jesus (Jo 10, 7): eu sou, isso é, a porta de acesso para todo homem e para toda coisa. Sem passar através de Cristo, sem concentra Nele o olhar do nosso coração e da nossa mente, não entenderemos nada do mistério do homem. E assim, quase inadvertidamente, seremos forçados a tomar emprestado do mundo os nossos critérios de juízo e de ação, e toda vez que nos aproximarmos dos nossos irmãos em humanidade seremos como aqueles “ladrões e salteadores” de que fala Jesus no Evangelho (cfr Jo 10, 8). Mesmo o mundo, na verdade, é, ao seu modo, interessado no homem. O poder econômico, político, midiático precisa do homem para perpetuar a si mesmo. E por isto muitas vezes procura manipular as massas, induzir desejos, apagar aquilo que de mais precioso o homem possui: o relacionamento com Deus. O poder teme os homens que estão em diálogo com Deus porque isso os torna livres e não assimiláveis.
Eis, então, a emergência-homem que o Encontro para a Amizade entre os Povos coloca este ano no centro da sua reflexão: a urgência de restituir o homem a si mesmo, à sua altíssima dignidade, à singularidade e preciosidade de toda a existência humana desde a concepção até o término natural. É preciso voltar a considerar a sacralidade do homem e ao mesmo tempo dizer com força que é somente no relacionamento com Deus, isso é, na descoberta e adesão à própria vocação, que o homem pode alcançar a sua verdadeira estatura. A Igreja, à qual Cristo confiou a sua Palavra e os seus Sacramentos, protege a maior esperança, a mais autêntica possibilidade de realização para o homem, em qualquer latitude e em qualquer tempo. Que grande responsabilidade temos! Não seguremos para nós este tesouro precioso do qual todos, conscientemente ou não, estão à procura. Vamos com coragem ao encontro dos homens e mulheres do nosso tempo, das crianças e dos idosos, dos ‘cultos’ e das pessoas sem instrução, dos jovens e das famílias. Vamos ao encontro de todos, sem esperar que sejam os outros a nos procurar! Imitemos nisso o nosso divino Mestre, que deixou o seu céu para fazer-se homem e estar próximo a cada um. Não somente nas igrejas e nas paróquias, mas em cada ambiente levemos o perfume do amor de Cristo (cfr 2 Cor 2, 15). Nas escolas, nas universidades, nos locais de trabalho, nos hospitais, nos presídios; mas também nas ruas, nas estradas, nos centros esportivos e nos locais onde as pessoas se encontram. Não sejamos mesquinhos em doar aquilo que nós mesmos recebemos sem mérito algum! Não devemos ter medo de anunciar Cristo nas ocasiões oportunas bem como naquelas inoportunas (cfr 2 Tm 4, 2), com respeito e com franqueza.
É esta a tarefa da Igreja, é esta a tarefa de cada cristão: servir o homem indo buscá-lo nos labirintos sociais e espirituais mais escondidos. A condição de credibilidade da Igreja nesta sua missão de mãe e mestre é, no entanto, a sua fidelidade a Cristo. A abertura para o mundo é acompanhada, e em um certo sentido se torna possível, a partir da obediência à verdade da qual a própria Igreja não pode se desfazer. “Emergência homem”, então, significa a emergência de voltar a Cristo, de aprender Dele a verdade sobre nós mesmos e sobre o mundo, e com Ele e Nele ir ao encontro dos homens, sobretudo dos mais pobres, pelos quais Jesus sempre manifestou predileção. E a pobreza não é só material. Existe uma pobreza espiritual que agarra o homem contemporâneo. Somos pobres de amor, sedentos de verdade e justiça, mendicantes de Deus, como sabiamente o servo de Deus Dom Luigi Giussani sempre destacou. A maior pobreza, de fato, é a falta de Cristo, e até não levarmos Jesus aos homens, teremos feito sempre muito pouco por eles.
Excelência, espero que estes breves pensamentos possam ser de ajuda para aqueles que participam do Encontro. Sua Santidade Francisco assegura a todos a sua proximidade na oração e o seu afeto; deseja que os encontros e as reflexões destes dias possam acender nos corações de todos os participantes um foco que alimente e apoie o seu testemunho do Evangelho no mundo. E de coração envia ao Senhor, aos responsáveis e aos organizadores do evento, bem como a todos os presentes, uma particular Benção Apostólica.
Acrescento também eu uma cordial saudação e aproveito a circunstância para confirmar-me com sentido de respeito da Excelência Vossa Reverendíssima no Senhor.
Cardeal Tarcisio Bertone
Secretário de Sua Santidade
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Fonte: Boletim da Santa Sé
Tradução: Jéssica Marçal