A costumeira conversa do papa com os jornalistas durante o voo de retorno
a Roma, desta vez a partir da América Latina, durou cerca de uma hora. Foram
muitas as perguntas. O papa respondeu às primeiras três perguntas em espanhol e
as seguintes em italiano. E brincou que também poderiam ser feitas até em
guarani, uma das línguas oficiais do Paraguai.
Aníbal
Velásquez (ABC Color) – Santidade. Sou Aníbal Velázquez, do Paraguai. Nós lhe
agradecemos porque elevou o Santuário de Caacupé como basílica. Mas, no
Paraguai, as pessoas se perguntam: por que o Paraguai não tem cardeal? Qual é o
pecado do Paraguai, para que não tenha cardeal? Ou, em todo o caso, ainda está
longe de ter um cardeal?
Bem, não ter
cardeal não é um pecado (risos). A maioria dos países do mundo não tem
cardeais. A maioria. Ou seja, as nacionalidades dos cardeais, não me recordo
quantas são, mas são uma minoria em relação com o todo o conjunto. É verdade, o
Paraguai não teve nenhum cardeal até agora. Eu não saberia lhe
dar a razão. Às vezes, para a escolha de cardeais, equilibram-se, leem-se,
estudam-se os arquivos de cada um, vê-se a pessoa, o carisma, sobretudo do
cardeal, que deveria ser o de aconselhar o papa e ajudar o papa no governo
universal da Igreja. O cardeal, embora pertença a uma Igreja particular, é – e
daí a palavra – incardinado na Igreja de Roma e tem que ter
uma visão universal. Isso não quer dizer que no Paraguai não existem bispos que
a tenham. Podem tê-la, mas, como sempre, é preciso escolher até um certo número
– não se pode designar mais do que 120 cardeais eleitores – então, deve ser por
isso. A Bolívia teve dois. O Uruguai teve
dois – [Antonio María] Barbieri e o atual [Daniel
Sturla]. Alguns países centro-americanos também não tiveram.
Mas não é nenhum
pecado, e tudo depende das circunstâncias, das pessoas, do carisma para ser
incardinado. E isso não quer dizer um menosprezo ou que os bispos paraguaios
não têm valor. Há bispos paraguaios geniais. Eu me lembro dos dois Bogarín
que fizeram história no Paraguai [Juan Sinforiano
Bogarín (1863-1949) e Ramón Bogarín Argaña (1911-1976)].
Por que não foram cardeais? Bem, não foram. Não é uma ascensão, não é verdade?
Eu me faço outra pergunta: o Paraguai merece ter um cardeal, se olharmos para a
Igreja do Paraguai? Eu diria: mereceria ter dois, mas é pela outra razão, não
tem nada a ver com os méritos. É uma Igreja viva, uma Igreja alegre, uma Igreja
lutadora e com uma história gloriosa.
Priscila
Quiroga (Cadena A) e Cecilia Dorado Nava (El Deber, Bolívia) – Vossa Santidade,
por favor, interessa-nos conhecer o seu critério sobre se considera justo o
anseio dos bolivianos de ter uma saída soberana para o mar, de voltar a ter uma
saída soberana ao Oceano Pacífico. E, Santo Padre, no caso de o Chile e a
Bolívia pedirem a sua mediação, o senhor aceitaria?
A questão da
mediação é uma coisa muito delicada e seria como um último passo. Isto é, a Argentina
viveu isso com o Chile e foi realmente para evitar uma guerra.
Foi uma situação muito limite e muito bem conduzida por aqueles que a Santa
Sé encarregou – por trás dos quais sempre estava São João
Paulo II se interessando – e com a boa vontade dos dois países, qye
disseram: "Tentemos se isso vai dar certo". E é curioso, houve um
grupo, ao menos na Argentina, que nunca quis essa mediação, e, quando o
presidente Alfonsín fez o plebiscito sobre se se aceitava a
proposta de mediação, obviamente, a maioria do país disse que sim, mas houve um
grupo que resistiu. Sempre quando se faz uma mediação, dificilmente todo o país
estaria de acordo, mas é a última instância. Sempre há outras figuras
diplomáticas que ajudam nesse caso, facilitadores etc.
Neste momento,
eu tenho que ser muito respeitoso com isso, porque a Bolívia
fez um recurso a um tribunal internacional. Então, se eu, neste momento, faço
um comentário – eu sou chefe de um Estado –, poderia ser interpretado como
intromissão ou uma pressão, ou algo assim. Tenho que ser muito respeitoso com a
decisão tomada pelo povo boliviano que fez esse recurso. Eu também sei que
houve instâncias anteriores de querer dialogar. Não tenho muita clareza. A
pessoa que me disse algo desse estilo, que se estava perto de uma solução, foi
nos tempos do presidente chileno Lagos, mas disse sem ter dados
exatos. Foi um comentário que me foi feito pelo cardeal Errázuriz.
Assim, eu não gostaria de dizer uma 'bobagem' [macana] sobre isso.