Durante o XXX Encontro da Sociedade Brasileira de
Canonistas -SBC (Campinas, 6 a 11 de julho de 2015), o magnífico reitor da
Pontifícia Universidade Santo Tomás de Aquino, de Roma, proferiu uma palestra
acerca das propostas de mudança do processo de nulidade do sacramento do
matrimônio. Sua magnificência, pe. dr. Miroslav Adam, OP, é membro da comissão
nomeada pelo papa Francisco para estudar as possíveis alterações da legislação
canônica com vistas à maior celeridade e à simplificação do procedimento de
nulidade matrimonial. O eminente canonista detalhou sete propostas, de
conhecimento público, já entregues ao santo padre. Ei-las:
1.ª) Derrogação da norma que determina o reexame
obrigatório da sentença de nulidade de casamento (cânon 1682, § 1.º do CIC).
Não será mais compulsória a chamada “dupla sentença
conforme”, porquanto o veredicto de primeira instância, por si só, tornará
possível um “novo” matrimônio. É óbvio que não se extinguiu o recurso de
apelação, instituto de direito natural; o defensor do vínculo ou uma das partes
poderá apelar da sentença que declarar a nulidade do casamento.
2.ª) Juiz monocrático.
Seguindo o esquema do direito estatal ou civil, a
comissão de reforma propõe que a primeira instância seja composta por um único
juiz, não um tribunal (“tribunal” = etimologicamente: três juízes). Este
magistrado, de preferência um clérigo, apreciará o libelo e, após o trâmite
processual regular, decidirá se o casamento em exame é nulo ou não.
3.ª) Possibilidade de um leigo [ou uma leiga] atuar
como juiz monocrático.
Se se tratar de um fiel com formação canônica
comprovada, isto é, que apresente ao bispo o diploma de doutorado (igual
obrigação têm os clérigos), nada obsta que a primeira instância da justiça
canônica, nos casos de nulidade matrimonial, seja ocupada por um leigo.
4.ª) Procedimento breve ou sumário.
Em algumas situações, em que o “fumus boni iuris”
(fumo do bom direito) revelar a provável nulidade do sacramento, como, por
exemplo, o exíguo tempo de convivência ou a gravidez que conduziu à convolação
das núpcias, o juiz de primeiro grau, seguindo um rito mais simples, sempre com
a intervenção do defensor do vínculo, declarará a nulidade do matrimônio, numa
sentença que não terá mais que cinco páginas.
5.ª) Tribunais interdiocesanos.
Embora no Brasil haja bastantes tribunais
interdiocesanos, a comissão sugere o incremento desse tipo de corte canônica
nas várias regiões do mundo. A medida visa a racionalizar os recursos humanos e
materiais, porque o poder judiciário da Igreja carece de número suficiente de
clérigos e leigos especialistas em direito canônico.
6.ª) Igualdade de competência dos tribunais.
Pretende-se criar uma competência mais abrangente
para a apreciação dos pedidos de nulidade, dando maior liberdade às partes na
escolha do tribunal adequado, conforme as regras de celebração do casamento ou
domicílio, mas sem a necessidade do beneplácito de uma corte canônica em favor
de outra.
7.ª) Reconhecimento do depoimento das partes como
prova plena.
Esta é, sem dúvida, uma grande novidade e um avanço
enorme. O que as partes disserem em juízo será aceito como verdade, com
presunção “iuris tantum”, quer dizer, relativa, cabendo ao defensor do vínculo
demonstrar a inverdade do afirmado. Desta feita, o depoimento das partes não
terá de ser necessariamente corroborado pelas declarações das testemunhas.
Penso que se estas propostas virarem lei canônica,
reformando os códigos latino e oriental, o defensor do vínculo terá um papel
relevantíssimo na nova configuração processual. Como não existirá mais a
necessidade de a sentença de primeiro grau ser confirmada ou homologada pelo
tribunal superior, o múnus de salvaguardar a indissolubilidade do casamento
válido terá de ser exercido com o máximo rigor pelo defensor do vínculo.
Outro ponto relevante diz respeito à premência de
se conferir estabilidade aos cargos de juiz e, principalmente, de defensor do
vínculo. Estes operadores do direito deverão ser provisionados pelo bispo ou
pelo moderador, e não apenas indicados oficiosamente, como sói ocorrer nalguns
lugares. É fundamental que o juiz e o defensor do vínculo disponham de
independência para desempenhar seu ofício, sem temer a remoção ou a destituição
do cargo. A referida estabilidade, tal como ocorre no âmbito do direito
estatal, não é um benefício pessoal do juiz ou do defensor do vínculo, mas uma
garantia para o povo de Deus, porque um defensor do vínculo passível de ser
intimidado obviamente não cumprirá a contento seu extraordinário papel de zelar
pela indissolubilidade do matrimônio válido.
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ZENIT
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