Em um mundo
cada vez menor, o cumprimento do processo iniciado com João XXIII é a condição
sine qua non para que a Igreja Católica seja fator de paz e não de divisão. O
Papa Francisco sabe disso e age em conformidade. Mas muitos, dentro da Igreja,
ou não sabem disso ou não o desejam. Entre inimigos internos e inimigos
externos, há até alguns que não hesitam em se transformar em abutres e a cercar
sinistramente o corpo do papa.
Há um ditado de Jesus desde sempre inquietante, que
nestas horas assume uma dimensão ainda mais sinistra. "Onde estiver o
corpo, aí se reunirão os abutres" (Lucas 17, 37). O ditado também se
encontra em Mateus 24, 28, e em ambos os Evangelhos a frase está totalmente
fora de contexto, aparece como uma espécie de marreta errática caída do céu,
completamente independente daquilo que vem antes e daquilo que vem depois. Não
se sabe a ocasião concreta que levou Jesus a pronunciar essas palavras, mas, na
sua força icônica, elas fotografam uma experiência concreta da vida natural,
naqueles tempos diante dos olhos de todos.
Nos nossos dias, porém, mudadas as formas, também
não falta a presença dos abutres. Especialmente quando o que está em jogo é o
corpo do papa. E ainda mais quando se trata do corpo "deste" papa. O
fato de que o Papa Francisco é, no mínimo, incômodo para uma parte nada pequena
dos poderes políticos, econômicos, financeiros e, obviamente, eclesiásticos é
uma simples questão de fato, bem documentada em um livro recente de um
jornalista do Avvenire, Nello Scavo, intitulado I nemici di Francesco [Os
inimigos de Francisco], subtítulo: "Quem quer desacreditar o papa, quem
quer calá-lo, quem o quer morto".
Mas agora a notícia do tumor no cérebro, divulgada pelo jornal Quotidiano Nazionale, falando de
"uma mancha, um pequeno tumor no cérebro", destina-se a aumentar
drasticamente o voo ameaçador dos abutres. O porta-voz papal, padre Lombardi,
logo desmentiu secamente a notícia. E o jornal L'Osservatore Romano falou de
"poeirama levantada com intenção manipuladora".
O certo é que seria difícil hoje esconder por muito
tempo uma notícia sobre a saúde do pontífice: o corpo do papa, ao contrário dos
séculos passados, quando era velado à vista de muitos e vivia em uma dimensão
sagrada que levava a pensá-lo como quase divino, totalmente desprovido das
deficiências dos reles mortais, agora é cotidianamente exposto ao olhar das
telecâmeras de todo o mundo.
Isso aconteceu cerca de 15 anos atrás com João
Paulo II, cujo mal de Parkinson, antes sistematicamente negado pelo porta-voz
vaticano, depois se tornou evidente aos olhos de todos. A saúde do corpo de um
papa nunca foi apenas uma questão privada, e hoje o é menos do que nunca. O
verdadeiro ponto, porém, não diz respeito à saúde de Jorge Mario Bergoglio, mas
aos abutres. O que chama a atenção, de fato, é que a notícia foi publicada
apenas ontem (a dez meses de distância da hipotética visita especializada) e,
principalmente, a poucas horas do encerramento do estratégico Sínodo sobre a
família.
Uma combinação casual? Obviamente não; ao
contrário, o levantar voo de um bando de abutres. Naturalmente, não me refiro
aos jornalistas que, de posse da notícia, fizeram apenas o seu trabalho, assim
como teria feito qualquer outro jornalista do mundo; ao contrário, refiro-me
àqueles que, justamente agora, vazaram a notícia no momento talvez mais
delicado do pontificado de Francisco.