«Tenho
sede». «Tudo está consumado».
Nestas duas frases, Jesus confia-nos, com um olhar
voltado para a humanidade e outro para o Pai, o desejo ardente que envolveu a
sua pessoa e a sua missão: o amor ao homem e a obediência ao Pai. Um amor
horizontal e um amor vertical: eis o desenho da Cruz! E do ponto de encontro
deste duplo amor, lá onde Jesus inclina a cabeça, brota o Espírito Santo,
primeiro fruto do seu regresso ao Pai.
Neste sopro vital da consumação, vibra a lembrança
da obra da criação agora redimida; mas vibra também o apelo a todos nós,
crentes n’Ele, para «completarmos aquilo que falta, das tribulações de Cristo,
na nossa carne». Até que tudo esteja consumado! Senhor Jesus, morto por nós!
Eis o nosso maior inimigo, a morte! Parece vencedora,
mas vencida no silêncio e na dor de um Deus que soube se fazer igual a nós para
nos salvar. Morreu a nossa morte para nos dá a Sua Eterna Vida. Olha para essa
cruz e para esse crucificado e diz para toda situação de morte e fracasso de
sua vida, para os seus pecados e franquezas, para a morte: Eu sou vencedor! O
amor venceu o amor sempre vencerá, em Cristo eu sou mais que vencedor. Não
murmurarei mais sobre minha cruz, minhas dores e sofrimentos, farei deles o
altar de minha vitória. “A cruz sagrada seja minha luz, não seja o dragão o meu
guia, retira-te satanás. Nunca me aconselhes coisas vãs, é mal o que tu me
ofereces bebe tu mesmo os teus venenos”…
“Meu
Deus, Meu Deus, porque Me abandonaste?”
No cimo da cruz de Jesus – nas duas línguas do
mundo de então, o grego e o latim, e na língua do povo eleito, o hebraico –
está escrito quem é: o Rei dos Judeus, o Filho prometido a David. Pilatos, o
juiz injusto, tornou-se profeta sem querer. Perante a opinião pública mundial é
proclamada a realeza de Jesus. O próprio Jesus não tinha aceitado o título de
Messias, enquanto poderia induzir a uma ideia errada, humana, de poder e de
salvação. Mas, agora, o título pode estar escrito ali publicamente sobre o
Crucificado. Ele, assim, é verdadeiramente o rei do mundo. Agora foi
verdadeiramente «elevado». Na sua descida, Ele subiu. Agora cumpriu
radicalmente o mandamento do amor, cumpriu a oferta de Si próprio, e
precisamente deste modo Ele é agora a manifestação do verdadeiro Deus, daquele
Deus que é amor. Agora sabemos quem é Deus. Agora sabemos como é a verdadeira
realeza. Jesus reza o Salmo 22, que começa por estas palavras: «Meu Deus, meu
Deus, porque Me abandonaste?» (Sal 22/21, 2). Assume em Si mesmo todo o Israel,
a humanidade inteira, que sofre o drama da escuridão de Deus, e faz com que
Deus Se manifeste precisamente onde parece estar definitivamente derrotado e
ausente. A cruz de Cristo é um acontecimento cósmico. O mundo fica na
escuridão, quando o Filho de Deus sofre a morte. A terra treme. E junto da cruz
tem início a Igreja dos pagãos. O centurião romano reconhece, compreende que
Jesus é o Filho de Deus. Da cruz, Ele triunfa sem cessar.
Senhor Jesus
Cristo, na hora da vossa morte, o sol escureceu. Sois pregado na cruz sem
cessar. Precisamente nesta hora da história, vivemos na escuridão de Deus. Pelo
sofrimento sem medida e pela maldade dos homens o rosto de Deus, o vosso rosto,
aparece obscurecido, irreconhecível. Mas foi precisamente na cruz que Vos
fizestes reconhecer. Precisamente enquanto sois Aquele que sofre e que ama, sois
aquele que é elevado. Foi precisamente lá que triunfastes. Ajudai-nos a
reconhecer, nesta hora de escuridão e confusão, o vosso rosto. Ajudai-nos a
crer em Vós e a seguir-Vos precisamente na hora da escuridão e da privação.
Mostrai-Vos novamente ao mundo nesta hora. Fazei com que a vossa salvação se
manifeste.
No cimo da Cruz, está escrita a causa da
condenação: Jesus Nazareno, Rei dos Judeus (Jo XIX, 19). E todos os que passam
por ali O injuriam e O escarnecem.
- Se é o rei
de Israel, desça agora da Cruz (Mt XXVII, 42).
Um dos ladrões vem em Sua defesa:
- Este não
fez nenhum mal (Lc XXIII, 41).
Depois, dirige a Jesus uma petição humilde, cheia
de fé:
- Senhor,
lembra-Te de mim, quando entrares no Teu Reino (Lc XXIII, 42).
- Em verdade
te digo que, hoje mesmo, estarás contigo no Paraíso (Lc XXIII, 43).
Maria, Sua Mãe, está junto da Cruz, com outras
santas mulheres. Jesus olha-a e olha, depois, para o discípulo que ama e diz a
Sua Mãe:
- Mulher, aí
tens o teu filho.
Depois, diz ao discípulo:
- Aí tens a
tua Mãe (Jo XIX, 26-27).
Apaga-se a luminária do céu e a terra fica
mergulhada em trevas. São cerca das três, quando Jesus exclama:
- Elí, Elí,
lamma sabachtani?! Isto é: Meu Deus, Meu Deus, por que Me abandonaste (Mt
XXVII, 46)?
Depois, sabendo que todas as coisas estão prestes a
ser consumadas, para que se cumpra as Escrituras, diz:
- Tenho sede
(Jo XIX, 28).
Os soldados embebem uma esponja em vinagre e,
atando-a a uma cana de hissope, aproximam-Lha da boca. Jesus sorve o vinagre e
exclama:
- Tudo está
consumado (Jo XIX, 30).
O véu do templo rasga-se e a terra treme, quando o
Senhor brada com voz forte:
- Pai, nas
Tuas mãos entrego o Meu espírito (Lc XXIII, 46). E expira. Ama o sacrifício
que é fonte de vida interior. Ama a Cruz que é altar do sacrifício. Ama a dor
até beber, como Cristo, as fez do cálice.