As três
leituras de hoje nos mostram a condição do discipulado de Cristo: encarnar o
próprio Jesus e agir em conformidade com ele. Só assim podemos dar sabor ao
mundo e iluminá-lo.
Paulo, em
sua primeira carta aos cristãos de Corinto, com sua teologia da cruz, sustenta
que a salvação provém da gratuidade do Pai. Não há mérito em nós que faz com
que mereçamos a salvação. Diante da cruz de Cristo, toda pretensão humana de
julgar conhecer Deus e, através desse saber, poder salvar a si mesmo
encontra-se destruída. A cruz nos remete à nossa situação de criatura
totalmente dependente do seu criador. Permitir que a graça de Deus aja em mim:
eis a misericórdia divina operando em mim a salvação!
Na primeira
leitura, o profeta Isaías apresenta-nos o jejum que agrada a Deus: atos de
misericórdia totalmente voltada ao nosso irmão! Repugna a Deus atos intimistas
com o coração carregado de interesses próprios: deixo de comer, mas me alimento
todos os outros dias do suor do meu irmão; faço longas orações a Deus, mas, em
vez de dialogar com o outro, ordeno; mostro-me totalmente dependente do
Criador, mas nego o direito de viver dignamente aos meus semelhantes. O ouvido
de Deus volta-se para aqueles que se voltam para os pobres! Não esqueçamos: os
pobres que nos procuram fazem isso porque Deus nos recomendou a eles!
Cristo deixou-nos a sua
doutrina e a sua vida para que os homens encontrassem o sentido da sua
existência e achassem a felicidade e a salvação. “Assim brilhe a vossa luz
diante dos homens…” E para isso é necessário, em primeiro lugar, o exemplo de
uma vida reta, a pureza de conduta, o exercício das virtudes humanas e cristãs
na vida simples de todos os dias. A luz, o bom exemplo, deve abrir caminho.
Perante a onda de
materialismo e de sensualidade que sufoca os homens, o Senhor “quer que das
nossas almas saia outra onda – branca e poderosa, como a mão do Senhor –, que
afogue com a sua pureza a podridão de todo o materialismo e neutralize a
corrupção que inundou o mundo: é para isso que vêm – e para mais – os filhos de
Deus”: para levar Cristo a tantos que convivem conosco, para que Deus não seja
um estranho na sociedade.
Transformaremos
verdadeiramente o mundo – a começar por esse pequeno mundo em que se desenvolve
a nossa atividade – na medida em que o ensinamento começar com o testemunho da
nossa própria vida.
O exemplo prepara a
terra em que a palavra frutificará. Sem cairmos em atitudes grotescas,
impróprias de um cristão corrente, podemos mostrar ao mundo o que significa
seguir verdadeiramente o Senhor na tarefa cotidiana, tal como fizeram os
primeiros cristãos. São Paulo dizia aos cristãos de Éfeso: “Eu vos exorto a que
leveis uma vida digna da vocação à qual fostes chamados…” (Ef 4, 1).
Devemos ser conhecidos
como homens e mulheres leais, simples, verazes, alegres, trabalhadores, otimistas;
devemos comportar-nos como pessoas que cumprem retamente os seus deveres e que
sabem atuar a todo o momento como filhos de Deus, que não se deixam arrastar
por qualquer vento. A vida do cristão constituirá então um sinal claro da
presença do espírito de Cristo na sociedade.
Por isso devemos
refletir e perguntar-nos com frequência se os nossos colegas de trabalho, os
nossos familiares e amigos se vêem levados a glorificar a Deus quando
presenciam as nossas ações, porque vêem nelas a luz de Cristo. Seria um bom
sinal de que em nós há luz e não escuridão, amor a Deus e não tibieza.
Outro aspecto importante
em que os cristãos devem ser sal e luz é a temperança, a sobriedade. A nossa
época “caracteriza-se pela busca do bem-estar material a qualquer custo, e pelo
correspondente esquecimento — melhor seria dizer medo, autêntico pavor— de tudo
o que possa causar sofrimento. Com esta perspectiva, palavras como Deus,
pecado, cruz, mortificação, vida eterna…, são incompreensíveis para um grande
número de pessoas, que desconhecem o seu significado e o seu conteúdo” ( Beato
Álvaro del Portillo, Carta, 25-12-1985, n. 4 ).
Por isso é urgente dar
testemunho generoso de temperança e de sobriedade, que manifestam o espírito
senhoril dos filhos de Deus e levam a utilizar os bens “segundo as necessidades
e deveres, com a moderação de quem os usa, e não de quem os valoriza
excessivamente e se vê arrastado por eles” ( Santo Agostinho ).
As nossas boas obras!
Não vamos fazer o bem para nos orgulhar, mas para a glória de Deus.
As boas ações, este
colocar-se a serviço do próximo, passa pelo mistério da Cruz (1Cor 2, 1-5).