Em Seu notório “Sermão da Montanha”, Nosso Senhor Jesus Cristo, o Novo Moisés, tal e qual ao Moisés do Antigo Testamento, que ao subir o Monte Sinai recebeu de Deus os Dez Mandamentos, subiu o Monte Tabor e deu-nos as Bem-Aventuranças, uma espécie de Dez Mandamentos do Novo Testamento. Pelas Bem-aventuranças Ele revelou à toda a gente, de modo mais íntimo, a descrição de Seu rosto, deixando-nos um modelo concreto para a imitação de Sua caridade.
Há cerca de um ano atrás, eu visitei ambos o Monte Sinai, no Egito e o Monte Tabor, em Israel, na Terra Santa. Santo é justamente o adjetivo mais apropriado para descrever ambos os lugares, não pelo simbolismo de tudo aquilo que representam, mas porque em ambos os casos, pelo amor e misericórdia de Deus, fomos instruídos no caminho seguro para alcançarmos a verdadeira felicidade, que é perene e nos conduz à Deus.
Foi um programa de rádio que me inspirou a escrever a entrada de hoje, mas também porque nos dias atuais tanto se fala em felicidade que, por vezes, já nem sabemos mais definí-la. A confusão é tamanha que felicidade virou sinônimo de riqueza, prosperidade, etc… Assim, no mundo de hoje, para amar e ser amado, para ser feliz e fazer alguém feliz ou demonstrar amor, parece que é necessário o dinheiro ou algum meio material. Acerca disso, o Bem-aventurado John Henry Newman escreveu:
«A riqueza é a grande divindade deste tempo: é a ela que a multidão, toda a massa dos homens, presta instintiva homenagem. Mede-se a felicidade pela fortuna, como pela fortuna se mede a honorabilidade […] Tudo provém desta convicção: com a riqueza, tudo se pode. A riqueza é, pois, um dos ídolos actuais: outro, é a notoriedade. […] A notoriedade, o facto de se ser conhecido e de dar brado no mundo (a que poderia chamar-se fama de imprensa), acabou por ser considerada como um bem em si mesma, um bem soberano, objecto, até, de verdadeira veneração»
Mas de que modo este pensamento dos nossos dias reconcilia-se com o ensinamento de Cristo: «Bem-aventurados os pobres em espírito, porque deles é o Reino dos céus »?
Afinal, o que é ser “pobre em espírito”?
A palavra pobre parece representar “Anya” em Aramaico (em hebraico ‘Ani’), e significa rebaixado, aflito, miserável, pobre, enquanto manso é sim um sinônimo da mesma raiz, “ánwan” (hebraico ‘Anaw’), que convém “curvado” para baixo, humilde, manso, delicado. Alguns estudiosos atribuiriam à antiga palavra também o senso de humildade, outros pensam em “mendigos diante de Deus”, humildemente reconhecendo sua necessidade de ajuda divina. Mas a oposição à “ricos” nas “Bem-aventuranças” do Evangelho de Lucas (Lucas 6,24) aponta especialmente para o significado comum e óbvio, que, no entanto, não deve ser limitado à necessidade econômica e de socorro, mas pode compreender o conjunto da dolorosa condição dos pobres: seu baixo patrimônio, a sua dependência social, a sua exposição à injustiça, indefesos dos ricos e poderosos.
Apesar da bênção do Senhor, a promessa do reino celestial não é agraciada na real condição externa de tal pobreza. Os verdadeiros bem-aventurados são os pobres “em espírito”, aqueles que por sua livre vontade estão dispostos a suportarem por amor de Deus esta condição dolorosa e humilde, apesar de, no presente, eles serem talvez realmente ricos e felizes, enquanto por outro lado, o homem realmente pobre pode ficar aquém desta pobreza “em espírito”, por ressentir sua condição, desejando para si sempre a riqueza material que não possui.
Mas ai de vós, os ricos, porque já tendes a vossa consolação! (Lucas 6,24)
Mas, então a Igreja Católica ensina que devemos ser pobres?