Como todos lembram, em 2010, a solenidade do Natal foi celebrada num sábado. Portanto, dois dias seguidos de festas. E o que é que chamou a atenção de um site de Dourados, que acessei no final do dia 25? Eis as manchetes mais incisivas: “Véspera de natal termina com 47 mortos nas rodovias federais”. “Condutor embriagado é aprendido”. “Casal é vítima de tentativa de homicídio”. “Indígena é encontrada morta em aldeia”. “Homem assassina sogra e fere sogro”. “Mulher-bomba mata ao menos 41 em ataque no Paquistão”.
Por isso, talvez ninguém se admirou ou espantou ao se deparar, na segunda-feira, dia 27 de dezembro, com a manchete que um jornal da cidade encontrou para falar dos dois dias de festa: “Violência marca Natal em Dourados: polícia registrou seis tentativas de homicídio e o corpo de um jovem morto a tiros foi encontrado na Vila Valderez”.
No dia 12 de maio de 2007, Bento XVI visitou, em Guaratinguetá, a Fazenda da Esperança, uma organização presente em dezenas de países do mundo, a serviço da recuperação de dependentes químicos. Tocado pelo clima de serenidade e alegria que irradiava do rosto de milhares de jovens que se sentiam sanados pela comunhão fraterna que caracteriza as “Fazendas”, ele não hesitou em defini-los “embaixadores da esperança” num mundo que parece tê-la perdido. Significativo é que o Papa se dirige a pessoas que tinham acabado no fundo do poço. Mas, por acreditarem no amor de um Deus que é capaz de «mudar as pedras em filhos de Abraão» (Lc 3,8), eles se transformavam em embaixadores de uma esperança que não falha, porque alicerçada na «rocha, que é Cristo» (1Cor 10,4).
No dia anterior, durante o encontro com os bispos do Brasil na catedral de São Paulo, o Papa ressaltou a ligação profunda que existe entre a fé em Deus e a libertação humana: «Onde Deus e a sua vontade não são reconhecidos, onde não existe a fé em Jesus Cristo e na sua presença, falta também o essencial para a solução dos urgentes problemas sociais e políticos». Assim falando, ele repisava o que escrevera na Encíclica “A Caridade na Verdade”, em 2009: «O ser humano se desenvolve quando cresce no espírito, quando sua alma se conhece a si mesma e aprende as verdades que Deus nela imprimiu em gérmen, quando dialoga consigo mesma e com o seu Criador. Longe de Deus, o homem é inquieto e doente. Não há desenvolvimento pleno nem bem comum universal sem o bem espiritual e moral das pessoas, consideradas na sua totalidade de alma e corpo».
Distanciando-se de Deus, o homem também se distancia da felicidade pessoal e do desenvolvimento social e econômico da sociedade. Não terá sido por isso que o mesmo site douradense, entre as manchetes do dia 25 de dezembro, afirmava que “o sentimento de tristeza no Natal não é algo fora da normalidade”?
Contudo, verdade seja dita, tristeza no Natal é algo fora da normalidade, sim! Se ela existe, é porque, não poucas vezes, a festa se reduz a compras, viagens, farras e comilanças, onde o amor e o serviço aos irmãos nada significam: «Quem ama o seu irmão está na luz e não corre perigo de tropeçar; mas quem deixa seu irmão de lado caminha nas trevas e não sabe para onde vai» (1Jo 2, 10-11).
Não se pode negar: para que sejamos sustentados pela esperança, pela paz e pela alegria, precisamos viver em “estado de conversão” permanente. Foi o que lembrou Bento XVI, no dia 23 de maio de 2010, solenidade de Pentecostes: «A chama do Espírito Santo deve consumir as escórias que dificultam e corrompem o homem em suas relações com Deus e com o próximo. Este fogo divino, porém, nos assusta: com medo do fogo, preferimos permanecer no estado em que estamos. Isso acontece porque, muitas vezes, a nossa vida é governada pela lógica do ter e do possuir, ao invés do doar-se. Há pessoas que creem em Deus e admiram a figura de Jesus Cristo, mas quando se pede que abandonem algo de si mesmas, o medo das exigências da fé as faz recuar. Temem ter que renunciar a algo de bonito, ao que estão apegadas; temem que, seguindo a Cristo, se privem da liberdade, de certas experiências, de uma parte de si mesmas. Querem ficar com Jesus e segui-lo de perto, mas têm medo das conseqüências que o fato comporta».
Dom Redovino Rizzardo, cs
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