Quase todos os que conversaram com o National Catholic Reporter falaram da
dor sentida nestes últimos anos, e todos expressaram a necessidade de a diocese
adentrar um tempo de cura.
O Pe. Pat Rush, pároco da Paróquia Visitation,
lembrou a mensagem de Dom Naumann (da Arquidiocese de Kansas City, no Kansas)
esperando que esta nova fase “seja um
momento de graça e cura para todos da diocese”.
“Todos nós
sabemos que o Vaticano pode trabalhar lentamente, e eu espero que ele não
trabalhe assim na nomeação do novo bispo porque estamos à deriva. Acho que
iremos continuar sem rumo até o momento em que pudermos sentir que o novo bispo
tenha como meta o apoio e o fortalecimento da comunhão da Igreja”, disse o
padre.
Rush foi um dos aproximadamente 10 sacerdotes e
paroquianos – apoiadores, críticos e neutros – entrevistados em setembro de
2014 durante uma Visitação Apostólica sobre a condução da diocese por parte de
Dom Robert Finn. Estas entrevistas levaram à produção de um relatório, que foi
submetido à Congregação para os Bispos.
A liderança de Finn há muito estava sendo
questionada, pelo menos desde a sua condenação, em setembro de 2012, por
contravenção em não relatar um suspeito de abuso infantil. Era o caso de um,
hoje, ex-padre diocesano que estava produzindo pornografia infantil, mantendo
imagens em seu computador pessoal de crianças da diocese.
Do lado de fora da Igreja de Nossa Senhora do Bom
Conselho, no centro de Kansas City, alguns paroquianos que saíam da missa da
tarde, nessa terça-feira (21 de abril) manifestaram uma profunda tristeza em
ver Finn ir embora. A paróquia foi designada como o Santuário Diocesano para a
Divina Misericórdia, em 2005, em um dos primeiros movimentos do bispo como
ordinário da diocese. Finn participou dos serviços religiosos na segunda-feira
nessa comunidade às 15h do dia 12 de abril, sendo este provavelmente o seu
último ato de adoração público antes de voar a Roma para se encontrar com o
Cardeal Marc Ouellet, prefeito da Congregação para os Bispos, e discutir a sua
renúncia.
“Confio em
minha fé, na Igreja e no Santo Padre. Esta situação é triste porque eu o
conheço bem, e ele é um homem muito bom e santo”, disse Claude Sasso, que,
como vice-chanceler de Finn para a catequese e evangelização desde 2006, era um
dos colaboradores mais antigos do bispo.
“Eu acho que
ele fez muitas coisas boas para a Igreja neste seu serviço. Ele é uma pessoa
muito humilde. É um ser humano, não é perfeito. Ninguém é perfeito. Todos somos
pecadores”, contou Sasso.
Um paroquiano disse que Finn foi “traído”. Bob Vogt, paroquiano há mais
de 30 anos, chamou-o de um bom bispo e pastor numa longa “perseguição aos
cristãos feita pela imprensa”. Ele também elogiou Finn por trazer à diocese 30
novos seminaristas, cerca de 10 outros somente este ano – o maior número que se
viu nos últimos tempos.
Steve Connelly, membro do “Justice for Bishop Finn”
– iniciativa online para defender o bispo ao longo do seu “indiciamento
injusto”, segundo se lê no sítio eletrônico mantido pelos defensores –, disse
que não sabia de todos os meandros envolvendo a renúncia Finn, mas afirmou que “esta situação não deveria ter sido
solicitada pelas pessoas que o queriam fora”.
“Porque então
isto faz parecer que a Igreja é uma democracia, e a Igreja não é uma
democracia. As pessoas não ditam quem é o bispo. Não estou dizendo que este
seja o caso, mas, concretamente, esta situação faz parecer que as pessoas
conseguem o que querem se gritarem alto o suficiente”, disse.
Connelly disse que o maior ponto positivo de Finn
era a sua devoção ao ensinamento tradicional da Igreja, que era, ao mesmo
tempo, o maior seu desafio na diocese. Disse que Finn se deparou com a
resistência de uma diocese que “por muitos anos não esteve no caminho certo em
termos de fé”.
“Conheço um
monte de pessoas que gostam dele de verdade, mas elas nunca chegaram a
conhecê-lo. Estas pessoas apenas conheciam aquilo que liam na internet ou nos
jornais, e essa não é uma boa maneira de se conhecer alguém”, acrescentou.
A Irmã Jeanne Christensen, que serviu como
promotora das vítimas diocesanas de 2000 a 2004, era a diretora do Departamento
de Paz e Justiça da diocese de 2000 até 2006, quando renunciou depois que Finn
reduziu o número de funcionários deste setor e cortou o orçamento pela metade.
Ela disse que, por causa do estilo “de divisão”
adotado em sua forma de liderar a diocese, “muitas
pessoas sofreram durante estes anos aqui na diocese”.
“É triste ver
que a nossa diocese é motivo de notícias assim”, disse Christensen. “A cidade de Kansas costumava ser um lugar
onde todo mundo gostava de vir e participar na diocese, e isso não acontece
mais. Eu acho que precisamos começar a reconstruir este ambiente, precisamos
construir um futuro de esperança e cura”.
Para muitas das vítimas de abusos sexuais na
Igreja, este foi um “dia de fechamento”, disse Rebecca Randles, advogada que
representou mais de 100 casos de abuso sexual contra a diocese.
“Dom Robert
Finn era o símbolo dos bispos que não conseguiram proteger as crianças de sua
diocese. Nesse sentido, ter o Papa Francisco pedido para ele renunciar foi um
movimento muito importante, e esperamos que este caso seja um indicativo de que
este pontífice vá ser proativo quando se tratar da segurança das crianças”,
disse Randles.
O caso envolvendo o ex-padre Shawn Ratigan, falou a
entrevistada, exemplificou uma situação em que as políticas e os procedimentos
para a proteção das crianças estavam valendo, mas que não eram aplicados. Em
maio de 2011, Ratigan foi preso por possuir e produzir pornografia infantil, e
em setembro de 2013 foi condenado a 50 anos de cadeia.
Connelly, da Justice for Bishop Finn, chamou o caso
Ratigan de um “incidente infeliz”.
Numa coletiva de imprensa na terça-feira, na cidade
de Kansas, cinco sobreviventes de abusos sexuais clericais expressaram
sentimentos mistos sobre a renúncia de Robert Finn. Enquanto alguns
demonstraram alegria, outros falavam de uma “reação estranha” à notícia.
Phil Pisciotta, um dos coordenadores locais da Rede
de Sobreviventes de Pessoas Abusadas por Padres, considerou o dia da renúncia
de Dom Robert Finn como uma “vitória para os católicos que vão às missas”.
“Os católicos
não podem eleger quem deve liderá-los (...), mas eles podem se manifestar
perguntando por quanto tempo aquela pessoa ficará aí, na dianteira da diocese.
Elas podem se manifestar abertamente e podem cortar as suas doações, fechando
suas carteiras, até que alguma mudança aconteça”, disse Pisciotta.
Já para Teresa White e Bill Kopp, o que eles viram
foi a oportunidade de um novo começo. “Para
mim, isto representa o começo de uma longa caminhada e uma longa batalha que
foi difícil de ser lutada e vencida, mas que é apenas o começo do que precisa
ser feito para protegermos as crianças no futuro”, disse White.
Depois de Christensen dizer que este era um dia
“importantíssimo” para as vítimas e os que trabalhavam com elas, acrescentou
que espera que Finn “encontre o que for
necessário para se dar bem na vida, mas que jamais seja bispo de outra diocese
novamente”.
Daniel Fowler, advogado entrevistado como parte da
Visitação Apostólica, disse que a notícia da renúncia de Finn era como se uma “grande nuvem fosse removida de cima da
diocese”. O foco agora, diz ele, está em “curar e ir avançar em caminhos onde não poderíamos percorrer quando Dom
Robert Finn estava aqui”.
Rush falou que a renúncia mandou um sinal de que “o Vaticano quer mudar a forma como a
diocese estava sendo liderada”. Quanto ao que a diocese precisa, ele disse
ser um “líder que tenha uma sensibilidade
pastoral (...) que acredite nos ensinamentos do Concílio Vaticano II (...) que
saiba escutar”.
Os esforços no sentido da cura e comunhão já
começaram.
O Pe. Charles Rowe, vigário geral da diocese,
convidou todos os sacerdotes locais para uma reunião com Dom Naumann na
quinta-feira de tarde, na chancelaria.
“Dom Naumann
reconhece que vivemos um momento crítico em nossa Igreja local e a colaboração
de vocês é fundamental para o bem-estar dos fiéis. Ele considera o envolvimento
de vocês uma prioridade”, escreveu Rowe.
Enquanto os sacerdotes vão se reunir na quinta-feira,
na sede da chancelaria, os fies estão convidados a se reunirem, às 14h30min em
suas comunidades locais, para simplesmente “rezar
juntos por nossa diocese e nossas paróquias”, disse Chuck Tobin, padre da
diocese, por email transmitindo o convite.
Ele sugeriu que pequenos grupos leiam o “belo Evangelho do próximo domingo sobre ‘Eu
sou o Bom Pastor’, talvez cantando uma música de reconciliação” e ofereçam,
em conjunto, as orações dos fiéis, “talvez
mesmo algumas orações pelo processo de escolha do novo bispo”.
“Este parece
ser um momento sagrado para nós como Povo de Deus, para orarmos uns pelos
outros, pelos nossos líderes, pedindo que a graça do Espírito Santo recaia
sobre nós durante este período crítico”, escreveu Tobin em seu email.
“Que um Deus
de amor ande conosco durante estes próximos dias”, escreveu.
Por Brian Roewe e Soli Salgado
Fonte: National Catholic Reporter
Disponível em: Unisinos
Tradução: Isaque Gomes Correa.