quinta-feira, 21 de abril de 2016

O novo mandamento


O Senhor Jesus afirma que dá um novo mandamento a seus discípulos, isto é, que se amem mutuamente: Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros (Jo 13,34).

Mas este mandamento já não estava escrito na antiga lei de Deus, onde se lê: Amarás o teu próximo como a ti mesmo? (Lv 19,18). Por que então o Senhor chama novo o que é evidentemente tão antigo? Será um novo mandamento pelo fato de nos revestir do homem novo, depois de nos ter despojado do velho? Na verdade, ele renova o homem que o ouve, ou melhor, que lhe obedece; não se trata, porém, de um amor puramente humano, mas daquele que o Senhor quis distinguir, acrescentando: Como eu vos amei (Jo 13,34).

É este amor que nos renova, transformando-nos em homens novos, herdeiros da nova Aliança, cantores do canto novo. Foi este amor, caríssimos irmãos, que renovou outrora os antigos justos, os patriarcas e os profetas e, posteriormente, os santos apóstolos. Ainda hoje é ele que renova as nações e reúne todo o gênero humano espalhado pelo mundo inteiro, formando um só povo novo, o corpo da nova esposa do Filho unigênito de Deus. É dela que se diz no Cântico dos Cânticos: Quem é esta que sobe vestida de branco?(cf. Ct 8,5). Vestida de branco, sim, porque renovada; e renovada de que modo, senão pelo mandamento novo?

Por isso os membros desta esposa sentem uma solicitude mútua. Se um membro sofre, todos sofrem com ele; se um membro é honrado, todos os outros se alegram com ele. Pois ouvem e praticam a palavra do Senhor: Eu vos dou um novo mandamento: amai-vos uns aos outros. Não como se amam aqueles que vivem na corrupção da carne; nem como se amam os seres humanos apenas como seres humanos; mas como se amam aqueles que são deuses e filhos do Altíssimo. Deste modo, se tornam irmãos do Filho unigênito de Deus, amando-se uns aos outros com aquele mesmo amor com que ele os amou, e por ele serão conduzidos à plenitude final, onde os seus desejos serão completamente saciados de bens. Então nada faltará à sua felicidade, quando Deus for tudo em todos.

Quem nos dá este amor é o mesmo que diz: Amai-vos uns aos outros como eu vos amei. Foi para isto que ele nos amou, para que nos amássemos mutuamente. E com o seu amor, deu-nos a graça, para que, vivendo unidos em recíproco amor, como membros ligados por tão suave vínculo, formemos o Corpo de tão sublime Cabeça.



Dos Tratados sobre o Evangelho de São João, de Santo Agostinho, bispo
(Tract. 65,1-3:CCL36,490-492) (Séc.V)

O Modernismo e os tradicionalistas paranóicos


Vários sites da Internet, em nome de certa visão estreita e equivocada do catolicismo, da Tradição e do próprio Magistério, têm feito graves acusações ao Concílio Vaticano II, além de mais ou menos veladas críticas aos últimos papas, de João XXIII a Bento XVI. Esses sites são de orientação mais ou menos próxima à Fraternidade São Pio X, do falecido Arcebispo cismático Dom Marcel Lefebvre, que faleceu excomungado: são todos eles tradicionalistas (não tradicionais, no sentido correto e sadio do termo e da Tradição católica), reacionários (não simplesmente conservadores, o que não seria mal nenhum. Reacionários porque seu estado de espírito é destrutivo, inquisitorial, de retranca, de visão estreita, arcaica e hostil a qualquer progresso na teologia, no dogma e na vida da Igreja).

O refrão desses referidos sites é individuar em todos os níveis e ambientes da vida da Igreja erros e perigos à reta fé, espalhar anátemas e condenações e fomentar uma estranha e ultrapassada guerra apologética, própria do início do século XX, em nome da ameaça onipresente da heresia modernista. Para eles, paranoicamente, todo mundo é modernista: os últimos papas, os teólogos atuais, o episcopado em geral, o clero como um todo, os vários movimentos leigos…

É mais que patente para qualquer pessoa de bom senso que esse pessoal vai rapidamente tomando o caminho do cisma. Primeiro dá-se o cisma psicológico, afetivo, que faz ver com suspeita a Igreja e seus pastores; depois, vem o cisma de fato, a incompatibilidade entre a fé do grupelho de “iluminados” e a percepção da Grande Igreja, aquela composta pelo Povo Santo de Deus em comunhão com seus legítimos pastores com Pedro e sob Pedro. Em geral – mesmo quando não diz – esse pessoal somente considera como papas sem nenhuma restrição os pontífices até Pio XII. A fidelidade deles é ao papado do passado ou, melhor falando, ao papado da cabeça deles. Os papas atuais são por essa gente julgados, crivados de crítica e manipulados nas suas intenções e magistério; se alguns deles citam Bento XVI, é de modo unilateral e desonesto, sempre manipulando o Magistério pontifício para tentar fazer o Papa dar razão às próprias irracionalidades. Que ninguém se iluda pela linguagem engomada e afetada que utilizam, cheia de “V. Revma.”, “V. Excia. Revma”, “Senhor Padre”, etc. Toda essa afetação, na verdade, somente revela um apego doentio ao arcaico e tudo que os segure no final do século XIX e início do século XX, final do pontificado de Pio IX e pontificado de Pio X.

Como muitas pessoas perguntam-me sobre esses sites e pedem-me uma avaliação sobre eles, pois que estranham a animosidade em relação à Igreja e ao Episcopado, aos teólogos e a muitas sãs manifestações da vida eclesial, resolvi descrever de modo esquemático e bem simples a crise modernista, suas conseqüências e o atual estado da questão, para que o leitor possa compreender o quanto essas pessoas nominalmente católicas, mas às portas do cisma, aparentemente tão fiéis à Tradição e ao Magistério, mas deles tão distantes de fato, estão equivocadas e distantes do reto sentir da Igreja de Cristo. Como me dirijo ao grande público, procurei ser sucinto e evitar detalhes aprofundados sobre questões teológicas que escapariam de modo geral às pessoas. Meu intento é somente fazer com que se compreenda a posição da Igreja e o erro dos tradicionalistas reacionários.

Não nutro nenhum desejo de polemizar ou dialogar com esses grupos, que, de tão radicais, fechados e fundamentalistas, são impenetráveis a qualquer argumentação que não se enquadre em seus estreitos e pobres horizontes. Tentar dialogar com eles é como tentar dialogar com os protestantes fundamentalistas, sem tirar nem pôr. Nem mesmo freqüento tais sites, pois de modo algum valem a pena. Meu interesse é somente prevenir de modo argumentado e metódico aqueles que se sentem perplexos ante a aparente solidez da argumentação desses reacionários. Assim, cumpro somente com meu dever de defender a fé católica e ajudar o rebanho de Cristo para que não caia nas armadilhas que tantas vezes aparecem na sua peregrinação terrestre. 

Santo Anselmo


Anselmo nasceu em Aosta, no norte da Itália, em 1033. Seu pai queria projetar seu filho na vida da nobreza e sonhava para ele uma carreira promissora. Quando soube do desejo de Anselmo em fazer padre, opõe-se radicalmente. Como Anselmo perdera a mãe muito cedo, e tinha um coração doce e manso, fez a vontade do pai até os vinte anos.

Mas na flor da juventude, Anselmo fugiu de casa, para poder se tornar um religioso. Ele queria dedicar-se de corpo e alma à sua fé, contrária à vida mundana de festas em meio ao luxo e à riqueza.

Viajou pela França até chegar à Normandia, onde se entregou aos estudos religiosos, sob a orientação do monge Lanfranco. Em pouco tempo ordenou-se e formou-se teólogo. Logo foi eleito abade do mosteiro e professor.

Passou então a pregar pelas redondezas e, como o cargo o permitia, começou a implantação de uma grande reforma monástica. Foram tantos os escritos deixados por ele que é considerado o fundador da ciência teológica no ocidente. Anselmo defendia a capacidade da razão humana para investigar os mistérios divinos. Propôs a prova da existência de Deus: se temos a ideia de um ser perfeito, a perfeição absoluta existe, logo o ser perfeito existe. A essência da redenção acha-se na união do indivíduo com Cristo na eucaristia. E o batismo abre o caminho para essa união.

Chegou a arcebispo-primaz da Inglaterra. Conta-se que enfrentou duras perseguições do rei Guilherme, o Vermelho, e de Henrique Primeiro. Mas, tinha a fala tão mansa e argumentos tão pacíficos que com eles desarmava seus inimigos e virava o jogo a seu favor.

Anselmo morreu em Cantuária, com setenta e seis anos, em 1109 e foi declarado "Doutor da Igreja" pelo Papa Clemente XI, em 1720.  


Verdadeiramente, Senhor, é inacessível a luz em que habitas; verdadeiramente ninguém pode penetrar nessa luz e ver-te de modo perfeito ... Peço-te, meu Deus, que te conheça, que te ame, para que encontre em ti meu gozo ... Que minha alma sinta fome dessa felicidade, que meu corpo sinta sede dela, que a deseje todo meu ser, até que chegue a penetrar no gozo do Senhor, ó Deus trino e uno, que é bendito pelos séculos. Amém.

quarta-feira, 20 de abril de 2016

Política hoje: procurando o Messias no lugar errado

 
Observando os bizarros cultos à personalidade que estão sendo construídos em torno dos candidatos políticos, eu fico me perguntando: “será que o nosso país ficou louco?”.

Longe vão os dias de candidatos maçantes, mas decentes, que colocavam para fora posições políticas sem glamour. Se duvidávamos que a nossa era tenha alcançado o pico do “pão e circo”, nós somente precisamos olhar o conflito dos gritos dos demagogos que povoam nossos debates enquanto a multidão e a imprensa dão sinais positivos ou negativos.

Quase uma década após sua publicação, o livro de Bento XVI Jesus de Nazaré pode nos ajudar a compreender a doença que infectou nossa política, por meio de uma discussão sobre a terceira tentação sofrida por Cristo. É a tentação onde o diabo tenta seduzir Jesus com promessas de poder político ilimitado, o controle sobre todo o reino na Terra. Com tal poder, o mundo poderia ser refeito e aperfeiçoado: um fim ao sofrimento, guerra e pobreza; o estabelecimento de um reino de tranquilidade e justiça.

Nosso humor político atual parece-me uma encarnação desta mesma tentação diabólica, destinada aos eleitores.

Bento diz: O império cristão e o poder secular do Papa já não constituem tentações hoje, mas há uma nova forma da mesma tentação que consiste em explicar o cristianismo como receita para o progresso e reconhecer como objetivo próprio da religião, e assim também do cristianismo, o bem-estar geral. Ela se veste hoje na questão: o que é que Jesus trouxe, se não introduziu um mundo melhor? Não deve ser este o conteúdo da esperança messiânica? (Jesus de Nazaré, pág. 53)

Para muitos americanos na tradição protestante, a América é suposta como uma Nova Israel, a Terra Prometida onde os crentes encontram segurança, prosperidade e liberdade. Enfrentando reforma econômica e social, diminuída aos olhos de outras nações, há a tentação de identificar um salvador e instalá-lo no poder, a fim de “salvar a América!” – e como os judeus do primeiro século, o salvador desejado deve ser um líder político, aquele que vai “expulsar os estrangeiros, subjugar nossos inimigos e voltar-nos para a grandeza” À direita vemos demagogos que acreditam nesses impulsos, prometem uma América com menos imigrantes, mais força e respeito no exterior.

À esquerda, é claro, vemos demagogos a serviço das preocupações sociais. Eles representam o Messias ideal para pessoas que acreditam que nossa dor e sofrimento vêm de uma simples falta de recursos, o que pode ser vencido, se apenas for dado ao governo o poder de redistribuir as receitas que julgar necessário. Esse ideal também levou Judas a criticar a mulher penitente que ungiu Jesus com óleo caro, (e Jesus por permitir isso), sugerindo que os atos de fé não tinham valor, a menos que servisse para necessidades sociais específicas.

Quando uma nação está à procura de um Messias, eleições às vezes transbordam componentes religiosos com apaixonado fervor, mas isso é falsa religião: se o seu candidato é o salvador da nação, seu oponente deve ser um contraponto, o mal, levando as pessoas ao erro. O rumo desagradável que o nosso processo eleitoral tem tido nas últimas décadas é simplesmente o que acontece quando as pessoas estão procurando um messias com poderes ligados à terra.

Papa: distinguir entre pecado e pecador




PAPA FRANCISCO

AUDIÊNCIA GERAL

Quarta-feira, 20 de Abril de 2016

A palavra de Deus ensina-nos a distinguir entre o pecado e o pecador: com o pecado, não devemos descer a compromissos, ao passo que os pecadores – isto é, nós todos – são como doentes que necessitam de ser curados e, para isso, o médico precisa de se encontrar com eles, visitá-los, tocá-los. É claro que o doente, para ser curado, tem de reconhecer que tem necessidade do médico. Ouvimos narrar o caso daquela mulher pecadora que veio chorar seus pecados aos pés de Jesus, quando Ele Se encontrava à mesa em casa de um fariseu chamado Simão. Este, embora tenha convidado Jesus, não se quer comprometer nem arriscar a reputação com o Mestre, enquanto a mulher se confia plenamente a Jesus com amor e veneração. Pois bem! Entre o comportamento do fariseu e o da pecadora, o Senhor toma partido por esta. Livre de preconceitos que impeçam a misericórdia de se expressar, o Mestre deixa-a fazer o que lhe dita o coração: Ele, o Santo de Deus, deixa-Se tocar por ela, sem medo de ficar contaminado. Mais ainda, dirigindo-Se à mulher, diz-lhe: «Os teus pecados estão perdoados». E assim põe termo àquela condição de isolamento a que pecadora fora condenada pelos juízos impiedosos de Simão e seus correligionários fariseus. Agora a mulher pode ir «em paz». O Senhor viu a sinceridade da sua fé e da sua conversão. Por isso, acrescenta diante de todos: «A tua fé te salvou». Ressalta à vista de todos a conversão da pecadora, demonstrando que, em Jesus, habita a força da misericórdia de Deus, capaz de transformar os corações.

Jubileu 150 anos: "Mãe do Perpétuo Socorro: ícone do amor".



 
O Ícone de Nossa Mãe do Perpétuo Socorro é, sem dúvida, o Ícone universalmente mais amado na Igreja. Tem um apelo a todas culturas, línguas e mesmo a outras diferentes tradições religiosas. Em 26 de abril de 2016 será celebrado o aniversário de 150 anos da restauração pública do Ícone original de Nossa Mãe do Perpétuo Socorro na Igreja de Santo Afonso em Roma, entregue aos Redentoristas pelo Papa Pio IX, como estas palavras: “Faça-a conhecida no mundo inteiro”.

Este Jubileu de 150 anos pretende ser uma ocasião especial para reacender o amor e a devoção dos redentoristas para com a Mãe do Perpétuo Socorro, “pois ela nos acompanha na missão evangelizadora. Deve também ser um revigoramento do mandato dado aos Redentoristas para ‘Fazê-la conhecida’.

Já são 6 as igrejas católicas destruídas no Chile em 2016

 
Somente durante este ano, seis igrejas católicas e dois templos evangélicos foram destruídos por ocasião do intenso conflito mapuche ocorrido na região sul do Chile.

O último ataque ocorreu na madrugada do dia 12 de abril, na capela da Assunção da Virgem Maria, na cidade de Cañete, onde um grupo de indivíduos ficou completamente queimado.

Nesse mesmo momento, denunciaram o incêndio em uma cabana particular a 43 quilômetros de distância do templo.

O sacerdote encarregado da capela, Pe. Oscar García, comentou à AraucoTV que quando há uma atitude como esta “é o mal o que prevalece na mente”, por isso “temos que continuar procurando o bem e a paz de todos os cidadãos”.

Dom Fernando Chomali, Arcebispo de Concepción – arquidiocese à qual pertence a capela – lamentou o ataque e exortou a “dizer não à violência” para “abrir caminhos de diálogo”.

O Prelado pediu para “gerar maiores e mais reais laços com o povo mapuche, porque é a região mais deprimida do Chile. Os habitantes são pessoas que tiveram escasso acesso ao desenvolvimento do qual nosso país teve”.

 
“Se as pessoas que cometeram este lamentável atentado, que não aprovo sob nenhum ponto de vista, tivessem tido educação e oportunidades de trabalho, não estariam nisto”, acrescentou.

Por sua parte, Dom Jorge Concha Cayuqueo, primeiro Bispo de origem mapuche no Chile e Auxiliar da Arquidiocese de Santiago, disse ao jornal ‘La Terceira’: “O problema é que os afetados são do povo mapuche, são comunidades cristãs aos quais suas capelas foram queimadas”.

“Isto nos causa dor, não só pelo que significa a perda de um templo, mas também porque isto mostra uma situação centenária que não foi resolvida. É um sintoma de um problema mais profundo”, indicou.

Nesse sentido, Dom Francisco Javier Stegmeier, Bispo de Villarrica, disse ao Grupo ACI: “É claro que nossas comunidades cristãs estão sofrendo perseguição religiosa por causa de Jesus Cristo. Ele continuará sendo a nossa fortaleza, alegria e esperança. Ele também nos capacita para sempre perdoar e responder com o bem ao que nos faz mal”.

Antes deste último atentado, no documento da 111ª Assembleia Plenária da Conferência Episcopal do Chile, realizada em abril de 2016, os bispos afirmaram que “quando não se respeitam valores tão essenciais para a existência de um povo crente, como são o direito à vida humana, sua segurança e seus espaços sagrados, estão ferindo a própria alma mesma deste povo”.

“Estes fatos, que são rechaçados pela imensa maioria da população, correm o risco de estigmatizar todo o povo mapuche e desacreditar sua busca de reconhecimento e reparação”, sustentaram.

A união natural dos fiéis em Deus pela encarnação do Verbo e pelo sacramento da Eucaristia


Proclamamos como uma verdade que a Palavra se fez carne (Jo 1,14) e que na ceia do Senhor nós recebemos esta mesma Palavra que se fez carne. Então, como se pode negar que permaneça naturalmente em nós aquele que, ao nascer como homem, não só assumiu a natureza da nossa carne como inseparável de si, mas também uniu sua natureza humana à natureza divina no sacramento em que nos dá a comunhão do seu corpo? Deste modo todos somos um só, porque o Pai está em Cristo e Cristo está em nós. Portanto, ele está em nós pela sua carne e nós estamos nele; e através dele, o que nós somos está em Deus.

Em que medida estamos nele pelo sacramento da comunhão com sua carne e com seu sangue, o próprio Cristo o afirma quando diz: Pouco tempo ainda, e o mundo não mais me verá, mas vós me vereis, porque eu vivo e vós vivereis, pois eu estou no meu Pai e vós em mim e eu em vós (Jo 14,19.20). Se com estas palavras o Senhor pretendia apenas significar uma unidade de vontade, por que então estabeleceu uma certa gradação e ordem na realização de tal unidade? Assim procedeu para acreditarmos que ele está no Pai pela natureza divina, e que nós estamos nele pelo seu nascimento corporal; além disso, ele também está em nós pelo mistério dos sacramentos. Ensina-nos desta forma a perfeita unidade estabelecida por meio do único Mediador. Nós estamos unidos a Cristo, que é inseparável do Pai, e Cristo, sendo inseparável do Pai, permanece unido a nós. Deste modo, temos acesso à unidade com o Pai. Porque se Cristo está por natureza no Pai, por ter sido gerado por ele, e se nós por natureza estamos em Cristo, então de certa maneira, também nós estamos por natureza no Pai através de Cristo. 

Até que ponto esta unidade é natural em nós, o mesmo Senhor o declara: Quem come a minha carne e bebe o meu sangue, permanece em mim e eu nele (Jo 6,56). Realmente, ninguém poderá estar em Cristo, se Cristo não estiver nele; isto é, Cristo somente assume em si a carne daquele que recebe a sua.

O Senhor já havia ensinado antes o mistério desta perfeita unidade, dizendo: Assim como o Pai, que vive, me enviou, e eu vivo por causa do Pai, assim o que me come viverá por causa de mim (Jo 6,57). Vive, portanto, pelo Pai; e do mesmo modo que vive pelo Pai, também nós vivemos pela sua carne.

Toda a comparação deve ser adaptada à inteligência de tal modo que o exemplo proposto nos ajude a compreender o mistério de que tratamos. Esta é, portanto, a causa da nossa vida: Cristo, pela sua carne, habita em nós, seres carnais, para que nós vivamos por ele como ele vive pelo Pai.


Do Tratado sobre a Trindade, de Santo Hilário, bispo
(Lib. 8,13-16: PL10,246-249)         (Séc.IV)