Duzentos e setenta e seis náufragos chegam à
costa de uma ilha do Mediterrâneo, depois de duas semanas à deriva. Estão
encharcados, esgotados, aterrorizados: experimentaram a impotência perante as
forças da natureza e sentiram-se perto da morte.
Entre eles, está um prisioneiro com destino a
Roma, para ser julgado pelo Imperador.
Sim, porque esta crônica não saiu de um
noticiário da atualidade, mas é a narração de uma experiência do apóstolo
Paulo, conduzido a Roma para coroar a sua missão de evangelização, através do
testemunho do martírio.
Ele, sustentado pela sua fé inabalável na
Providência, apesar da condição de prisioneiro, conseguiu dar alento aos outros
companheiros de infortúnio, até desembarcarem numa praia de Malta.
Ali, os habitantes vêm ao encontro deles,
acolhem-nos ao redor duma grande fogueira para restaurarem as forças e, depois,
cuidam deles. Passados três meses, no final do inverno, dão-lhes o necessário
para continuar a viagem em segurança.
“Trataram-nos com invulgar humanidade”
Paulo e os outros náufragos experimentam a
humanidade calorosa e concreta daquela população que ainda não tinha sido
tocada pela luz do Evangelho. É um acolhimento que não é apressado nem
impessoal, mas que sabe pôr-se ao serviço do hóspede, sem preconceitos
culturais, religiosos ou sociais. Para o fazer, é indispensável o envolvimento pessoal
e de toda a comunidade.
A capacidade de acolher o outro faz parte do
ADN de qualquer pessoa, como criatura que traz gravada em si a imagem do Pai
misericordioso, mesmo quando a fé cristã não foi ainda acesa ou esmoreceu. É
uma lei inscrita no coração humano, que a Palavra de Deus ilumina e valoriza,
desde Abraão até à surpreendente revelação de Jesus: «Era estrangeiro e
acolhestes-me».
O próprio Senhor oferece-nos a força da sua
graça, para que a nossa vontade frágil chegue à plenitude do amor cristão.
Com esta experiência, Paulo ensina-nos também a confiar na intervenção providencial de Deus, a reconhecer e a apreciar o bem recebido através do amor concreto de tantos que se cruzam no nosso caminho.