166. A sexta-feira seguinte ao segundo domingo depois de Pentecostes a Igreja celebra a solenidade do Sagrado Coração de Jesus. Além da celebração litúrgica, muitas outras expressões de piedade têm por objeto o Coração de Cristo. Não tem dúvida de que a devoção ao Coração do Salvador tem sido, e continua a ser, uma das expressões mais difundidas e amadas da piedade eclesiástica. Entendida à luz da Sagrada Escritura, a expressão “Coração de Cristo” designa o mesmo mistério de Cristo, a totalidade do seu ser, a sua pessoa considerada no seu núcleo mais íntimo e essencial...
167. Como o têm lembrado freqüentemente os Romanos Pontífices, a devoção ao Coração de Cristo tem um sólido fundamento na Escritura. Jesus, (...) apresenta-se a si mesmo como mestre “manso e humilde de Coração” (Mt. 11, 29). Pode dizer-se que a devoção ao Coração de Jesus é a tradução em termos cultuais do reparo que, segundo as palavras proféticas e evangélicas, todas as gerações cristãs voltaram para aquele que foi atravessado (cfr. Jo. 19, 27; Zc. 12, 10), isto é, o costado de Cristo atravessado pela lança, do qual brotou sangue e água, símbolo do “sacramento admirável de toda a Igreja”.
O texto de São João que narra a ostentação das mãos e do costado de Cristo aos discípulos (Cfr. Jo. 20, 20) e o convite dirigido por Cristo a Tomás para que estendesse a sua mão e a introduzisse no seu costado (Cfr. Jo, 20 27), tiveram também um influxo notável na origem e no desenvolvimento da piedade eclesiástica ao Sagrado Coração.
168. Estes textos, e outros (...) foram objeto de assídua meditação por parte dos Santos Padres que desvendaram as riquezas doutrinais e com freqüência convidaram aos fiéis a penetrar no mistério de Cristo pela porta aberta de seu costado. Assim, santo Agostinho diz: “A entrada é acessível: Cristo é a porta. Também se abriu para ti quando o seu costado foi aberto pela lança. Lembra o que dali saiu; portanto olha por onde podes entrar. Do costado do Senhor pendurado que morria na Cruz saiu sangue e água quando foi aberto pela lança. Na água está a tua purificação, no sangue a tua redenção.”
169. A Idade Média foi uma época especialmente fecunda para o desenvolvimento da devoção ao Coração do Salvador. Homens insignes pela sua doutrina e santidade, como São Bernardo (+1153), São Boaventura (+1274) e místicos como Santa Lutgarda (+1246), Santa Matilde de Magdeburgo (+1282), as Santas Irmãs Matilde (+1299) e Gertrudes (+1302) do Mosteiro de Helfta, Ludolfo de Saxónia (+1378), Santa Catarina de Siena (+1380), aprofundaram o mistério do Coração de Cristo no qual percebiam o “refúgio” aonde acolher-se, a sé da misericórdia, o lugar de encontro com Ele, a fonte do amor infinito do Senhor, a fonte da qual brota a água do Espírito, a verdadeira terra prometida e o verdadeiro paraíso.
170. Na época moderna o culto ao Sagrado Coração do Salvador teve novo desenvolvimento. No momento em que o jansenismo proclamava os rigores da justiça divina, a devoção ao Coração de Cristo foi um antídoto para suscitar nos fiéis o amor ao Senhor e a confiança na sua infinita misericórdia, da qual o Coração é prenda e símbolo. São Francisco de Sales (+1622), que adotou como norma de vida e apostolado a atitude fundamental do Coração de Cristo, ou seja, a humildade, a mansidão, (Cfr. Mt. 11, 29), o amor terno e misericordioso; Santa Margarida Maria Alacoque (+1690), a quem o Senhor mostrou repetidas vezes as riquezas do Seu Coração; São João Eudes (+1680), promotor do culto litúrgico ao Sagrado Coração; São Cláudio de la Colombière (+1682), São João Bosco (+1888) e outros santos têm sido apóstolos insignes da devoção ao Sagrado Coração.
171. As formas de devoção ao Coração do Salvador são muito numerosas; algumas têm sido explicitamente aprovadas e recomendadas pela Sé Apostólica. Entre elas devem ser lembradas: A Consagração pessoal, que, segundo Pio XI, “entre todas as práticas do culto ao Sagrado Coração é sem dúvida a principal”; a Consagração da família (...); as Ladainhas do Sagrado Coração de Jesus (...); o Ato de Reparação (...); a prática das Nove Primeiras Sextas-feiras (...).
É preciso, porém, que se instrua de maneira conveniente os fiéis: sobre o fato de que não se deve pôr nesta prática uma confiança que se converta em vã credulidade que, na ordem da salvação, anule as exigências absolutamente necessárias de Fé operante e do propósito de levar uma vida conforme ao Evangelho; sobre o valor absolutamente principal do domingo, a “festa primordial”, que deve caracterizar-se pela plena participação dos fiéis na celebração eucarística.
173. A piedade popular tende a identificar uma devoção com a sua representação iconográfica. Isto é algo normal, e tem sem dúvida elementos positivos, mas pode dar ensejo a certos inconvenientes: (...) imagens ás vezes adocicadas, inadequadas para manifestar o conteúdo teológico robusto, não favorecem a aproximação dos fiéis ao Mistério do Coração de Jesus. (...)
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Extraído do "Diretório sobre a Piedade Popular" da Congregação para o Culto Divino, Vaticano, dezembro de 2001.
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