Hoje Cristo nos convida a ser bons negociantes
não só nas coisas materiais, mas também e, sobretudo nas espirituais
(evangelho). Para isso necessitamos o dom da sabedoria (primeira leitura). O
melhor negocio que podemos levar a término na nossa vida é reproduzir em nós a
imagem de Cristo (segunda leitura).
O Evangelho (Mt 13,44-52) continua a série de
parábolas sobre o Reino dos Céus. Jesus compara o Reino dos Céus “a um tesouro
escondido no campo. Um homem o encontra e o mantém escondido. Cheio de alegria,
ele vai, vende todos os seus bens e compra aquele campo” (Mt 13,44). Ou ainda,
“a um negociante que andava em busca de pérolas preciosas. Ao encontrar uma de
grande valor, ele vai, vende todos os seus bens e compra aquela pérola” (Mt 13,
45-46). Nas duas parábolas, mesmo sendo parecidas entre si, apresentam
diferenças dignas de nota: O tesouro significa a abundância de dons; a pérola,
a beleza do Reino. O tesouro apresenta-se de repente, a pérola supõe, pelo
contrário, uma busca esforçada; mas em ambos os casos o que encontra fica
inundado de uma profunda alegria. Assim é a fé, a vocação, a verdadeira
sabedoria, o desejo do céu: por vezes, apresenta-se de modo inesperado, outras
segue-se a uma intensa busca. Nos dois casos, por duas vezes se fala em vender:
vender significa desfazer-se do que é seu. Para possuir o Reino dos Céus as
pessoas deverão desfazer-se de si mesmas, dos valores falsos deste mundo, do
apego aos bens materiais. Vale apena vender tudo para possuir o tesouro do
Reino! O Reino dos Céus – o Evangelho, o cristianismo, a graça, a amizade com
Deus – é o tesouro escondido, mas presente no mundo; muitos o têm próximo, mas
não o descobrem, ou antes, mesmo descoberto, não sabem dar-lhe o respectivo
valor e descuidam-no, preterindo-o ao reino material: aos prazeres, às riquezas
e às satisfações de vida terrena. Somente quem dispõe de um coração
compreensivo para “distinguir o bem do mal” (1Rs 3,9), o eterno do transitório,
a aparência do que é essencial, saberá tomar a decisão de “vender tudo quanto
possui” para o adquirir. Jesus não pede pouco a quem quer alcançar o Reino;
pede-lhe tudo. Mas também é certo que não lhe promete pouco; promete-lhe tudo:
a vida eterna e a eterna e beatificante comunhão com Deus. Se o homem, para
conservar a vida terrena, está disposto a perder a todos os seus bens, porque
não se dispõe a fazer outro tanto, ou mais ainda, para conseguir para si a vida
eterna?
“O Reino dos Céus é ainda como uma rede
lançada ao mar que apanha peixes de todo o tipo” (Mt 13,47). Esta rede lançada
ao mar é imagem da Igreja. A Igreja é
fonte de santidade e causa da existência de tantos santos ao longo dos séculos.
Todos os membros da Igreja são chamados à
santidade, “quer pertençam à Hierarquia, quer sejam por ela apascentados” (LG,
39).
Peçamos ao Senhor que nós, membros do Povo de
Deus, do seu Corpo Místico, cresçamos em santidade pessoal e sejamos assim bons
filhos da Igreja. “São precisos – diz
São João Paulo II – arautos do Evangelho, peritos em humanidade que conheçam a
fundo o coração do homem de hoje, participem das suas alegrias e esperanças,
das suas angústias e tristezas e ao mesmo tempo, sejam contemplativos,
enamorados de Deus. Para isto, são precisos novos santos. Os grandes
evangelizadores da Europa foram os santos. Devemos suplicar ao Senhor que
aumente o espírito de santidade na Igreja e nos envie novos santos para
evangelizar o mundo de hoje” (Discurso ao Simpósio de Bispos Europeus, 1985).
Amemos, cada vez mais, a Igreja de Cristo! Se
amamos a Igreja, nunca surgirá em nós esse interesse mórbido em ventilar, como
culpa da Mãe, as misérias de alguns dos filhos.
COMENTÁRIO
DOS TEXTOS BÍBLICOS
Textos: 1 Rs 3, 5.7-12; Rm 8, 28-30; Mt 13, 44-52
Caros irmãos e irmãs, para este domingo a
Liturgia da Palavra nos convida a refletir sobre as nossas prioridades e os
valores sobre os quais fundamentamos a nossa existência. Lançando um olhar
inicial para a primeira leitura (cf. 1Rs 3,5.7-12), encontramos a figura e o
exemplo de Salomão, rei de Israel que sucedeu ao trono o seu pai, o rei David,
falecido por volta do ano 972 a.C.
O texto da primeira leitura nos traz o relato
do sonho de Salomão em Gabaon, onde temos o seu pedido, em forma de oração a
Deus, para obter a sabedoria (cf. 1Rs 3,5).
Tanto no Antigo como no Novo Testamento, o sonho normalmente aparece
como uma forma privilegiada de Deus comunicar com os homens e de lhes indicar
os seus caminhos (cf. Gn 20,3; Nm 12,6; Mt 2,13s). Utilizando este recurso
literário, o texto bíblico nos apresenta o rei Salomão como o escolhido de
Deus, a quem o Senhor comunica os seus projetos e a quem confia a condução do
seu Povo.
O sonho está estruturado na forma de um
diálogo entre Deus e Salomão. O jovem
Salomão pede ao Senhor: “Concedei, pois, ao vosso servo um coração sábio, capaz
de julgar o vosso povo e discernir entre o bem e o mal” (1Rs 3,9). Ao pedir a
Deus para lhe conceder um coração sábio, indica que Salomão deseja ter uma
consciência que sabe ouvir, que seja sensível à voz da verdade. Na Sagrada
Escritura o coração não indica apenas uma parte do corpo, mas o âmago da
pessoa, a sede das suas intenções e dos seus juízos.
No caso de Salomão, o pedido é motivado pela
responsabilidade de guiar uma nação, Israel, o povo que Deus escolheu para
manifestar ao mundo o seu desígnio de salvação. Portanto, o rei de Israel, deve
procurar estar sempre em sintonia com Deus e escutar sua Palavra, para orientar
o povo a dirigir os seus passos pelos caminhos do Senhor, pela vereda da justiça
e da paz.
No entanto, o exemplo de Salomão é válido para
cada um de nós. Precisamos da sabedoria e do bom discernimento, para
exercermos, com dignidade, o agir segundo a reta consciência, realizando o bem
e evitando o mal. A consciência moral pressupõe a capacidade de ouvirmos a voz
da verdade, de sermos pessoas dóceis às suas indicações. O rei Salomão tinha consciência de que a
autoridade é um serviço que deve ser exercido com sabedoria e que o objetivo
final desse serviço é a realização do bem comum. O texto sublinha que Salomão
não pede riqueza, nem glória, mas pede as aptidões necessárias e a capacidade
para cumprir bem a missão que Deus lhe confiou. Salomão aparece aqui como o
modelo do homem que sabe escolher e que sabe pedir.
Passando ao texto evangélico deste domingo,
Jesus continua recorrendo à linguagem das parábolas para nos exortar a fazer do
Reino de Deus a prioridade fundamental.
É propriamente a sabedoria que vem de Deus que nos faz compreender o verdadeiro
sentido da vida, em correspondência ao projeto de salvação de Deus.
Pelo terceiro domingo consecutivo, a liturgia
nos apresenta mais uma página de parábolas, breves narrações utilizadas por
Jesus para facilitar a compreensão ao mistério de Deus e para anunciar os
mistérios do Reino dos céus. Utilizando imagens e situações da vida quotidiana,
Jesus quer nos indicar o verdadeiro fundamento de todas as coisas para podermos
reconhecer a primazia de Deus. O tema
contido no Evangelho deste domingo é precisamente o Reino dos céus. O termo “céu”
não deve ser entendido unicamente no sentido da altura que nos ultrapassa,
porque tal espaço infinito possui também a forma da interioridade do
homem. Mas, Reino dos céus significa,
precisamente, senhorio de Deus, e isto quer dizer que a sua vontade deve ser
assumida como o critério e guia da nossa existência. A linguagem das parábolas é simples e
compreensiva, para melhor assimilar os profundos mistérios da nossa salvação!
Jesus começa dizendo: “O Reino dos céus é como
um tesouro escondido no campo. Um homem o encontra e o mantém escondido. Cheio
de alegria, ele vende todos os seus bens e compra aquele campo” (Mt 13, 44).
Somente quem é sábio consegue reconhecer no campo o tesouro escondido como um
dom de Deus, sinal de uma proposta e de um chamado para uma vida diferente. Daí
sua decisão de “vender todos os seus bens”, abandonar o que todo mundo acha
importante para o sucesso da vida, para “comprar aquele campo”, seguir o
chamado interior, mesmo correndo o risco
no investimento.
É interessante ressaltar que ao “vender tudo
que tem” a pessoa o faz com “alegria”. Deus nos seduz ainda porque fala a
linguagem da alegria, que move, apressa, faz decidir. A alegria é um sintoma, é
o sinal de que se está caminhando na estrada justa. O homem vendeu o que tinha para comprar este
campo. O termo da comparação aqui é o
valor do tesouro, comparado com o valor de todas as coisas que o homem vendeu
para poder adquirir o campo. Em tempos
antigos, as pessoas tinham o costume de esconder objetos preciosos, cavando um
buraco na terra, sobretudo por medo dos imprevistos da guerra.
Contudo, a questão principal abordada nesta
primeira parábola é a da descoberta do valor e da importância do Reino. A lição
de Jesus é clara: não há valor algum que possa superar o valor do reino do Céu,
esse reino no qual Deus é o Senhor absoluto; e onde floresce a graça, a
redenção, a vida eterna. Todos os bens da terra são desprezíveis diante desse
reino.
A outra parábola nos fala que o reino dos céus
assemelha-se ao encontro de uma pérola de grande valor. O comprador vende todos
os seus bens para adquiri-la (cf. Mt 13,45-46). A ideia básica consiste no fato
de que somente Deus conhece o que pode preencher o nosso coração.
No entanto, o resultado final é o mesmo: a
descoberta de algo valioso. O agricultor e o comerciante vendem tudo, mas para
ganhar tudo, para ter tudo. Para um, o tesouro; para outro, a pérola de grande
valor. Ambos também estão unidos por um sentimento comum: a surpresa e a
alegria de terem encontrado a realização de todos os desejos. A alegria é o
sentimento de quem encontrou o verdadeiro tesouro, a verdadeira pérola, o
tesouro do Reino de Deus. O tesouro e a pérola devem ser o Cristo para nós, e
segui-lo é o que de melhor podemos empreender na vida.
A partir dessas reflexões pode-se perceber a
analogia entre a primeira leitura e o Evangelho. O rei Salomão não pediu a Deus
riqueza, e sim sabedoria, isto é, o dom de distinguir entre o bem e o mal (cf.
1Rs 3,5ss). Neste sentido, ele prefigura
o negociante da parábola da pérola, homem de bem, mas sábio e perspicaz:
arrisca tudo o que tem num investimento melhor (cf. Mt 13,45ss). A lição de todos estes textos é: investir
tudo naquilo que é mais importante. Esta
é uma sabedoria humana, mas aplica-se também à realidade divina, ao Reino do
Céu, que é concretamente o tesouro da parábola.
Ora, para discernir bem isto, vamos precisar da sabedoria que Salomão
pediu, e que lhe propiciou pronunciar juízos sábios em favor de quem merecia
(1Rs 3,16-28).
Peçamos ao Senhor Jesus, Ele que é o mais
sábio de todos os sábios, que também nos conceda este dom, o dom da sabedoria,
à semelhança do pedido feito por Salomão, para que possamos fazer a escolha
certa, e trilhar com o coração dilatado, pelos caminhos que nos levam ao Reino
de Deus. Assim seja.
PARA
REFLETIR
Continuamos, neste hoje, a escutar Jesus
falando-nos do Reino dos Céus. Saído do barco à beira-mar, chegado em casa, ele
nos conta ainda três parábolas: o Reino dos Céus é como um tesouro escondido
num campo; um homem o encontra e, cheio de alegria, vende tudo e o adquire! O
Reino dos Céus é como uma pérola de grande valor; o homem vende tudo e,
fascinado por sua beleza, vende tudo e a adquire… Observem, irmãos, que Jesus
nos quer fazer compreender que quem encontra o Reino, sai de si! Encontra o
sentido da vida, encontra aquilo por que vale a pena viver. Quem de verdade
encontra o Reino, quem o experimenta, muda para sempre sua existência: vai
ligeiro, vende tudo, fica cheio de alegria! Encontrar o Reino é encontrar
Jesus, e encontrar Jesus de verdade é encontrar a razão de viver, o sentido da
existência… é encontrar-se consigo mesmo! Quem encontra o Reino assim, se
encontra, parte de si mesmo e vai viver de verdade! Quantos cristãos experimentaram
isso, quantos fizeram-se loucos, pareceram loucos, por amor de Cristo! Quantos
jogaram fora amores, família, projetos, bens materiais… O que os levou a isso?
O que aconteceu com Santo Antão, que vendeu todos os bens e deu aos pobres e
foi viver no deserto, sozinho? O que aconteceu com Francisco de Assis? O que
aconteceu com a Beata Madre Teresa de Calcutá ou com a Ir. Dulce? O que
aconteceu com aquele moço que largou tudo e foi ser religioso, com aquela moça
sem juízo que entrou numa comunidade de vida? O que aconteceu com aquele casal,
que mudou seu modo de viver, seu círculo de amizade, que deixou suas
badalações? O que aconteceu com São Maximiliano Kolbe, que entregou a vida no
lugar de um pai de família? Com o Bem-aventurado Anchieta, que deixou sua
pátria e se embrenhou no Brasil selvagem para anunciar Cristo aos índios? O que
aconteceu com todos esses? Eles descobriram o tesouro, eles encontraram uma
pérola de valor imensurável, eles experimentaram a paz, a doçura, a verdade do
Reino dos Céus!
Meus caros, estejamos atentos! Quem é mole nas
coisas de Deus, quem é pouco generoso no seguimento de Cristo, quem sente como
um fardo os apelos do Senhor, não experimentou ainda, não encontrou o tesouro,
não viu a pérola de grande valor, não descobriu de verdade o Reino dos Céus!
Cristãos cansados, cristãos sem entusiasmo, cristãos pouco generosos, cristãos
com uma lógica igual à do mundo são cristãos que nunca – nunca! –
experimentaram a paz do Reino, a beleza do Reino, a doçura do Reino, a
plenitude do Reino que Jesus nos mostra e nos dá! Atentos, irmãos: pode-se ser
cristão e nunca ter experimentado o Reino! Pode-se ser padre ou religioso sem
nunca ter descoberto o Reino… Aí, já não há alegria, já não há entusiasmo, já
não se corre, se arrasta, se rasteja! O Reino tem pressa, o Reino faz vibrar, o
Reino nos impele porque descobrir o Reino e experimentar o amor de Deus em
Jesus Cristo! Quantos de nós se entusiasmam com tantas coisas e são tão lerdos
quando se trata do Senhor e do seu Reino… Não seríamos nós um desses?
E, no entanto, o sonho de Deus é que todos
possam encontrar o seu Reino; para isso ele nos criou, para isso nos destinou.
Escutemos o Apóstolo: “Pois aqueles que Deus contemplou com seu amor desde toda
eternidade, a esses ele predestinou a serem conformes à imagem do seu Filho… E
aqueles que Deus predestinou, também os chamou. E aos que chamou também os
tornou justos, e aos que tornou justos também os glorificou”. Isso nos coloca
diante de duas realidades, caríssimos. Primeiro: o dever que temos de anunciar
o Reino a toda a humanidade! A Igreja é missionária, anunciadora do Reino dos
Céus! Uma Igreja que não tenha o desejo, que não sinta a necessidade de levar
Jesus aos que ainda não o conhecem, é uma Igreja morta, uma Igreja que já não
experimenta a alegria de crer! Estejamos atentos: há tantos em terras distantes
e tantos bem próximos de nós que não tiveram ainda a alegria do Reino dos Céus,
pois que não encontraram o tesouro, na viram a pérola de grande valor! Ai de
nós se não anunciarmos a esses a Boa Nova do Reino dos Céus! Nunca esqueçamos:
quem encontra algo de muito bom, sente o desejo de comunicar, de partilhar, de
tornar conhecido aos demais. Se em nós não há ímpeto missionário, é porque não
encontramos, de verdade, a o Reino e sua alegria! Pensemos bem!
Mas, há uma segunda realidade, que precisamos
levar em conta. Descobrir o Reino exige um olhar iluminado pela graça de Deus.
Sozinhos, com nossas próprias forças, somos incapazes de discernir essa
presença do Reino! Por isso é necessário suplicar, como Salomão, um coração
para compreender: “Dá ao teu servo um coração compreensivo – um coração que
escute!” No Evangelho de hoje, Jesus termina perguntando: “Compreendeste essas
coisas?” – Senhor, pedimos nós, dá-nos um coração capaz de compreender! Sem
vosso auxílio ninguém é forte, ninguém é santo! Mostra-nos o tesouro, que é o
teu Reino! Faz-nos encontrar a pérola de grande valor, pela qual vale a pena
perder tudo e todo nela encontrar! Faz-nos sentir que, pelo Reino, vale a pena
deixar redes, barcos, a vida perder; deixar a família e dinheiro não ter!
Concluamos, agora, com a última, das sete
parábolas: O Reino dos Céus é como uma rede jogada no mar deste mundo… Ela
apanha todo tipo de peixe – apanhou a mim, a você… Olhem a Igreja, olhem a
nossa comunidade: há de tudo! Todo tipo de gente, todo tipo de cristão! Mas, um
dia, a rede será puxada para a margem… e os peixes bons serão recolhidos nos
cestos do Senhor e os peixes ruins serão lançados fora, para o fogo queimar…
Eis como Jesus termina! Prevenindo-nos que é necessário decidir-se pelo Reino,
que nossa vida valerá ou não a pena, terá ou não sentido dependendo de nossa
atitude em relação ao Reino que ele veio anunciar…
Irmãos, irmãs! “Compreendestes tudo isso?” Que
o Senhor no-lo conceda, ele que Reina para sempre. Amém.
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