Novamente a cidade de São Paulo, mais especificamente a Região Brasilândia voltou a ser manchete de jornais, nestes últimos dias, em razão do número de mortes, ocorridas nos bairros Carumbé, Cruz das Almas, Guarani, Damasceno, Morro Doce e adjacentes. A população sofre intensamente com a insegurança que se instalou, devido ao conflito entre facções criminosas e a Polícia Militar. Muitos bairros sofrem com o toque de recolher, já no período da tarde, e com os assassinatos que se dão pelas madrugadas adentro.
O temor maior é de que medidas arbitrárias venham a agravar ainda mais a triste realidade destas famílias que choram a perda de seus entes queridos e, sofrem com a onda da violência que se alastra sem poupar ninguém.
Nestes bairros estão muitas paróquias e comunidades que são obrigadas, a mudar os horários de celebrações e encontros, cancelar reuniões, devido a falta de segurança e ao clima de total ameaça que vive a população.
Lamentamos o fato de que esta situação já era prevista e não faltaram aqueles que advertiram as autoridades para medidas a serem tomadas para que fossem evitadas. Muitas comunidades, hoje, assistem “um festival de assassinatos”. É o caso das comunidades do Jardim Ângela, Campo Limpo, Capão Redondo e Jardim São Luiz que num prazo de uma semana, segundo a comunidade local, assistiram a morte de quarenta e nove jovens, entre quatorze e vinte e nove anos.
Quem convive nesses bairros sabe da precariedade em que vivem estas populações. Falta-lhes tudo! Os recursos dispensados para atender as necessidades destes bairros são irrisórios, tendo em vista a enorme demanda de saúde, educação, trabalho, moradia, lazer e segurança que estas comunidades necessitam!
Tememos pelo amanhã! Alguns episódios num passado recente nos deixam traumatizados, imaginando que poderemos assistir hoje, cenas de truculência contra a população mais pobre e desprotegida. Seria lamentável a criminalização das populações da periferia da cidade de São Paulo, ou seja, que os ‘culpados’ da barbárie que sofremos fossem os negros, os pobres e os jovens.
Nestes últimos meses, assistimos na cidade de São Paulo, algumas situações que nos fazem pensar, como por exemplo, a série de incêndio de favelas, situadas em bairros e terrenos cobiçados pela especulação imobiliária.
Já há algum tempo a Pastoral Carcerária vem chamando a atenção para a super população no sistema carcerário do Estado de São Paulo, que duplicou no primeiro semestre deste ano.
Não são menos graves também as denúncias que veem dos adolescentes, vítimas de espancamento, maus tratos, humilhações vexatórias em entidades criadas para garantir-lhes proteção e permitir-lhes a reintegração à sociedade.
Como se vê a “onda” de crimes na cidade de São Paulo, nestes últimos dias, é fruto do descaso, da falta de políticas públicas, investimentos nos serviços básicos, defesa dos direitos humanos, promoção da vida com dignidade para todos.
É lamentável ver que a Polícia Militar esteja tornando-se única vítima deste cenário, quando na verdade, não é! Lamentamos a morte das dezenas de policiais nestas últimas semanas. Muitos deles pais de família, preocupados com o bem estar das pessoas, mortos no exercício de sua missão.
Mas, fere-nos ouvir que há grupos de extermínio formados por policiais civis e militares, pagos para matar indiscriminadamente. Não são poucas as famílias que choram a morte de seus filhos inocentes, que morreram não por causa de uma bala perdida, mas por causa de policiais que matam pelo prazer de matar, sem escrúpulo algum!
Creio que precisamos unir esforços! Além da parceria dos governos federal e estadual no plano de combate à violência, anunciado nesta semana, creio que é urgente uma parceria entre Governo e Sociedade Civil para conter a violência e remediá-la nas suas causas.
Nos episódios da “Operação Sufoco” (Cracolândia), “Pinheirinho” (São José dos Campos) a queixa que mais se ouviu foi a falta de atenção às entidades envolvidas com as populações atingidas, o descaso com que foram tratadas as organizações populares, que convivem diuturnamente com a realidade das crianças, adolescentes e jovens; com a População de Rua, com a recuperação de jovens vítimas do crack e do álcool e outros mais.
O apelo mais veemente que podemos fazer neste momento é que todos os envolvidos nesta cruel realidade possam sentar-se e, criarem juntos estratégias para superar a dor e a insegurança em que vivem as populações atingidas pela violência exacerbada. Urge encontrarem-se Governo e Sociedade Civil; Polícia Militar e Entidades Sociais e as organizações populares para encontrar o melhor caminho para superar a barbárie que vivemos?
Oxalá o sangue dos muitos inocentes, derramado injustamente nestes dias, seja o clamor para que outras vidas não sejam ceifadas e famílias sejam poupadas de chorar a morte de seus filhos, vítimas de um mundo tão pouco irmão!
Dom Milton Kenan Júnior
Bispo-auxiliar de São Paulo (SP)
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