Thomas Hobbes escreveu o livro Leviatã, em 1651. Sua
tese principal é que o Contrato Social, que
fundamenta e justifica a existência da sociedade humana – que resta em
permanente estado de conflito -, precisa de um governante forte, um déspota
absoluto, que garanta a guarda e a vigência dos fundamentos mantenedores da
estrutura social. Para tal, é necessário que o Leviatã (figura do
governante monárquico) reúna todos os poderes em si. Por isso, tornou-se
célebre a capa do livro de Hobbes, que
representa o Leviatã como figura poderosíssima e gigantesca, formada por
todos e cada um dos cidadãos da pólis (o que já justifica sua autoridade e
domínio), mas também traz, em cada uma das mãos, os símbolos do poder dos
governantes: numa mão o Báculo, sinal do
poder religioso; noutra a Espada, símbolo
do poder civil. E assim, arqueando-se sobre a cidade e tendo os próprios
citadinos como estofo e garante de seu poder, o Leviatã reúne,
de uma só vez, todo o poder civil e religioso. Eis que um
dos mais importantes políticos modernos estende sua influência até os dias
atuais por meio de um artigo persecutório, pleno de ódio e ressentimento, contra o
Arcebispo do Rio de Janeiro.
O pesquisador Jorge Alexandre Alves, sociólogo e
professor do IFRJ e do Colégio Pio XII, membro do Movimento
Fé e Política, em seu artigo de 06/04 para o site Humanitas levanta sérias
acusações e algumas calúnias acerca do trabalho pastoral e de governo do Arcebispo
do Rio de Janeiro, Dom Orani João Tempesta. O texto do
sociólogo é bastante cheio de meias verdades, além de informações realmente
equivocadas sobre diversos assuntos. Além de ser muito genérico e impreciso nas
críticas com alguma relevância.
O texto do professor
aponta 3 temas, os quais, segundo ele, demonstram como o fundamentalismo tem
ganho novas faces em nossos dias. Além de argumentos fracos e imprecisos, a
relação desses eventos precisa antes ser demonstrada, mas sigamos. Os eventos
são 3: a morte de Marisa Letícia da Silva, a
querela com a CNBB e o assassinato
de Marielle
Franco. A análise dessas três acusações, segundo ele, faz com
que se perceba como o fundamentalismo católico tem
surgido e porque ele tem relações com a Arquidiocese do Rio de Janeiro.
Ocorre, contudo, que o autor não consegue demonstrar o que ele pretende. E a pressa
com que vai passando de ponto a ponto revela outro objetivo para seu texto, que
vamos abordar no final. Mas vamos acompanhá-lo na sua análise apressada.
Veja o caso da ex-primeira
Dama. O
autor diz que criou-se baderna e ataques nas redes porque um Frei foi celebrar
exéquias da falecida. Ora, se isso é verdade, o que tem a ver com a
Arquidiocese do Rio de Janeiro? E o que tem a ver com o Arcebispo, Dom Orani? Se um
leigo tem um dia mau e vai às redes lançar chorume contra a figura da
ex-primeira Dama, como responsabilizar a estrutura da Igreja do Rio ou a pessoa
do Cardeal? Percebe-se já que o autor não está assim com
muito boa vontade… Não cabe a um cristão fazer isso, mas daí a colocar na conta
do Arcebispo a grosseria e falta de tato do leigo ou do sacerdote vai um enorme
espaço. E veja que o articulista passou pelo assunto bastante ligeiro. Até
parece que tem outros fins em mente.
O outro assunto é a CNBB. Nesse ponto,
porém, o autor foi mais audacioso. Chegou mesmo a divulgar sua Fake
News, coisa da qual acusa os fundamentalistas
inimigos (comme
il faut). Ele diz que a disputa desse grupo de leigos e clérigos
fundamentalistas difamando a Conferência se dá por causa da proximidade da
totalidade da CNBB a partidos de
matiz comunista. Ora, isso é Fake News! O mais
absoluto embuste! A CNBB é uma associação multiforme, não é possível nem
como exercício acadêmico reuni-la sob um só ponto comum, a não ser quando
efetivamente reunida e lançando documento por unanimidade. Além
disso, o momento crítico da tal disputa foi o uso de dinheiro de doação dos fiéis para
financiar ONG’s que defendem a morte do inocente por aborto,
não o apoio de grupos comunistas. Mas isso o sociólogo não diz ao seu
público.
Visita de Dom Orani à família de Marielle – 26/03 |
E o caso Marielle Franco é o mais
grave. De fato, o sociólogo omitiu a informação de que o Cardeal
Orani visitou ambas
as famílias, tanto da vereadora como a de seu motorista, Anderson. O articulista
diz que não se respeitou a dor da família da vereadora e que alguns católicos
quiseram capitalizar politicamente sobre seu cadáver, mas não se pode falar
isso da Arquidiocese do Rio ou de seu Arcebispo,
cujas atitudes não visam recompensa política pois não disputam cargos públicos. Depois dessas
inverdades, meias verdades e desinformações, aqui começa o festival de calúnias
contra o tipo de cristão que o sociólogo Jorge não gosta. Primeiramente, ele
tenta começar com um chiste, uma gracinha, para deixar o texto mais leve. E eis
que o horror acontece rotundamente:
Ele acusa alguns cristãos do Brasil de se
parecerem com talibãs e acha isso engraçado. Uma picardia, ele disse.
Como se fosse divertido e bastante comum identificar grupos de
pessoas comuns assim, aleatoriamente, a assassinos sanguinários e
crudelíssimos, como são os talibãs. Verdade é que picardia também pode
ser entendida por acinte, engano. Nesse caso, o substantivo feminino alcançaria
seu melhor sentido, considerando o teor do artigo do professor. Mas a verdade é
que, num ato de ódio contra aqueles que discordam dele, o professor de
sociologia iguala assassinos, estupradores, genocidas aos cristãos brasileiros,
e com mais razão, aos cariocas. Ao afirmar que os cristãos dos quais não gosta
são talibãs (ele cunha o neologismo “catolibãs”), o sociólogo torna-se mais um
exemplar do já frequente “Ódio do Bem”. Trata-se daquela mania descolada,
daquele jeito doce, de se assassinar a reputação de alguém sem corar as fauces.
Trata-se daquele modo sutil e refinado de destruir a fama de alguém em nome da
bondade. E é assim que o sociólogo, que brada contra o
ódio sobre os telhados, identifica numa canetada os cristãos dos quais não
gosta com torturadores, terroristas e sequestradores. Assim, tendo
de si uma autoimagem satisfatória. Mas o que esses fundamentalistas fazem para
tanto incomodarem esse professor? Deixemos que o próprio pesquisador fale.
Talibã atirando na cabeça de uma mulher |
No artigo, o professor de
Filosofia e Cultura Religiosa de um colégio católico afirma que tais cristãos
fundamentalistas mantêm “práticas medievais”, como a reza do Terço, a
adoração ao Santíssimo Sacramento, a devoção à Virgem
Maria e a obediência ao Papa e esses são
motivos mais que suficientes para chamar-lhes jocosamente de catolibãs. Em razão da prática desses atos de
piedade medievais é que se justifica o epíteto de “fundamentalistas cristãos”
ou “talibãs católicos”, segundo o sociólogo. Mas não
parece ser só isso.
Mais adiante o texto vai
lançar alguma luz acerca da visão de mundo do sociólogo e porque essas práticas
parecem-lhe inúteis. Isso fica claro quando, incontinente, põe às claras o
que ele realmente pensa sobre o comunismo. A seu ver,
e num ato falho revelador, esses movimentos rejeitam a visão de mundo comunista
“como
se fosse pejorativo“. E é então que o articulista passa a
descrever os temas inegociáveis para a filosofia, para a teologia, e para o debate
político do Rio de Janeiro, a seu entender: descriminalizar o assassinato por aborto, descaracterizar
o sacramento do Matrimônio e da Eucaristia e tornar inconteste a questão de
gênero. E algo novo do Movimento Fé e Política se apresenta aqui.
Ao revelar aqui o seu coração político, aquilo que
é mais importante a seus olhos, um dado relevante pode ajudar a entender porque
o sociólogo faz esse longo esforço para enquadrar Dom
Orani e os bispos do Brasil. Em 2014, um grupo de leigos e
sacerdotes do Rio de Janeiro tentou emplacar o embuste de afirmar, em carta
aberta, que a Igreja Católica no Rio de Janeiro estava apoiando oficial ou
oficiosamente o candidato a Prefeito da cidade do PSOL. Mas a Igreja
Católica, capitaneada pelo Arcebispo, lançou uma nota desmentindo a armadilha,o que
pode ter sido a causa de tanto revanchismo e ódio direcionado ao líder dos
católicos no Rio de Janeiro nesse artigo recente.
Mas a paixão cega! O desconhecimento do
articulista sobre o que ocorre de fato na Arquidiocese do Rio de Janeiro chega
a ser ridículo. O autor fala de extremismo e intolerância religiosa da parte do
Arcebispo, de seus auxiliares, do clero, do seminário, etc., mas ignora – ou
omite – que o Centro Dom Vital (CDV),
associação de leigos que reflete sobre os desafios do cristianismo em nossos
tempos, oferece aos leigos cariocas, com conhecimento e apoio do Cardeal
Dom Orani João Tempesta, uma pós-graduação em intolerância
religiosa, que conta com professores de diversas denominações religiosas. Fala
de violência e ódio, mas a paixão faz desconhecer que as vítimas que foram
cuspidas, esmurradas, chutadas, ofendidas, xingadas na frente da PUC-Rio por
divulgarem um jornal de opinião foram católicas do Centro
Dom Bosco (CDB) e não o contrário. Sem
falar que não há no Rio de Janeiro pessoa que mais se dedique ao trabalho e
resgate social e humano que o Arcebispo, que visita todos os
dias em que está na cidade uma comunidade, onde convive com as pessoas, as
ouvindo e ajudando.
Acontece que um abismo atrai outro abismo e o
texto persecutório não se limita a atacar o Arcebispo do Rio de Janeiro.
Ele também repete o clichê esquerdista contra alvos já bastante conhecidos,
como são a Renovação Carismática Católica, além do Pe.
Paulo Ricardo e do Prof. Olavo de Carvalho (critica-os,
mas de forma covarde e oblíqua, sem citá-los nominalmente, mas apontando-os em
links externos). Mas qual é o objetivo real do articulista? A
pulverização das vítimas aponta para um objetivo maior que apenas as ideias.
Ele ataca a tudo e a todos! O segredo é compreender que está em jogo algo muito
importante: a batalha é pela exclusividade da narrativa.
O fim último do texto do
sociólogo é fazer com que os tomadores de decisão, na tentativa de se
distanciarem dessa descrição intolerante e vexaminosa (mesmo que absolutamente
fictícia!), comecem a agir de modo contrário a falsa acusação que lhes fazem.
Assim, os detratores de Dom Orani, dos bispos do Brasil e todo o
clero engendram-nos em uma armadilha de vaidade e
incompreensão, da qual o homem desatento não consegue sair. Ao dizer, por
exemplo, que os bispos estão “emparedados” por leigos violentos, mesmo que não
seja verdade e o bispo saiba disso, essa acusação poderá fazer com que, numa
próxima oportunidade, ele queira provar que não se pode “emparedar” um bispo e,
por isso, prefira um grupo mais modernoso só para provar para si mesmo ou para
outros que o detrator estava errado. E assim o bispo se torna refém
do discurso do detrator. O sociólogo quer “pautar o discurso” da Igreja a
partir dessas acusações. O mesmo aconteceria se, por exemplo, Dom
Orani precisasse de um novo evento na Arquidiocese e, na hora de escolher,
desse à Pastoral da Juventude a organização só para provar que não é
intolerante como o professor o acusou. E assim, refém da crítica do detrator, o
Arcebispo faria tudo o que de fato pretende o detrator, preterindo
movimentos mais à direita enquanto a esquerda aparelha todos os níveis
eclesiais.
Eis a pretensão do professor Jorge: pautar
a ação do clero brasileiro, e especialmente de Dom Orani João Tempesta,
contra os movimentos e os indivíduos católicos que ousam distanciar-se da visão de mundo
esquerdista. Mas o que o membro do Movimento Fé e Política
não entende – e não aceita – é que não é mais possível pautar o que o clero do
Brasil pensa ou aceita discutir, e muito menos os bispos! A formação do Laicato
brasileiro e carioca não aceita mais esse controle. Mas na cabeça
do sociólogo isso é impossível. E é impossível porque ele é Leviatã!
Leviatã exige que todos se
ajoelhem diante de si. A fera é ciumenta! Não basta que o monstro possua todos
os poderes civis e disponha de todas as ferramentas e mecanismos exclusivos de
controle social. Ela quer mais, ela quer tudo. A religião não pode resistir, os
cidadãos religiosos não podem ousar manter-se de pé diante da fera. Orani
precisa ajoelhar-se! E esse é o motivo mais importante do texto e por isso o
Arcebispo é o objeto preferencial do artigo. Todas as acusações infundadas, a
pulverização de ataques, as inverdades e meias verdades foram produzidas porque o
Leviatã perdeu a exclusividade da narrativa política, e isso
é não é negociável para ele. No Rio de Janeiro e em outros lugares
do Brasil, há pessoas que resistem ao discurso comunista. Há aqueles que ousam
afirmar, veja só, que o comunismo não é algo apenas pejorativo, mas é bem pior:
é destrutivo, desumano e violento. Pensam que assim como Auschwitz, os Gulags
soviéticos e cubanos precisam ser extirpados da história humana. Mas o
Leviatã não quer saber de contraditório. Ele não lida bem com
liberdade de expressão ou divisão de forças. Ao negar aos cidadãos religiosos o
direito de expressarem-se segundo seus próprios conceitos e linguagem, o
sociólogo não resiste à tentação totalitária. É então que vem uma vontade louca de
escrever um artigo para pautar o discurso do clero e dos leigos católicos para
reavivar a simpatia pelo comunismo.
Prof. Robson Oliveira
Cristão
convertido. Esposo, pai e filho. Professor de filosofia e catequista enrustido.
Entusiasta do matrimônio. Leitor compulsivo. Escritor incipiente. Livros
Publicados: - Analisando o Science Studies. Niterói: Humanitatis, 2009. - Mitos
sobre o matrimônio. Rio Bonito: Cenáculo Universal, 2015.
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