Caro
professor, li seu artigo em um Site e, uso, pois os mesmos caminhos para
expressar minha opinião a respeito.
Seu artigo faz algumas
observações objetivas, mas falha ao tentar explicar a gênese do problema
abordado.
Não sei se o senhor é um católico
praticante, de confissão e comunhão ao menos uma vez pela Páscoa da
Ressurreição e de missa e comunhão dominicais. Como também, não sei se o senhor
participa ativa e assiduamente de sua comunidade paroquial.
Em caso positivo de sua vivencia
cristã, como alguém que ama verdadeiramente a Igreja, nela vive e sofre por
seus pecados (Igreja santa e pecadora), o caminho para apontar e corrigir seus
(dela) possíveis erros e falhas é apontado pelo próprio Jesus, no Evangelho de
Mateus, nos versículos 15 a 18 do capítulo 18: Se acontecer que teu irmão
peque, vai ter com ele e faze-lhe suas admoestações a sós. Se ele te ouvir,
terás ganho o teu irmão. Se ele não te ouvir toma consigo mais uma ou duas
pessoas para que toda questão seja resolvida sob a palavra de duas ou três
testemunhas. Se ele recusar ouvi-las, dize-o à Igreja, e se ele recusar a ouvir
a própria Igreja, seja para ti como o pagão e o pecador público. Em verdade eu
vo-lo declaro: tudo o que ligardes na terra será ligado no céu, e tudo o que
desligardes na terra será desligado no céu.
Caro professor, o senhor tomou o
caminho errado. Fez uma crítica picaresca – conforme
sua palavra – à Arquidiocese do Rio de Janeiro e ao seu Cardeal Arcebispo.
Imagino um aluno reprovado no ENEM a criticar suas preleções de professor de
sociologia... Aí, a distância entre o crítico e o criticado seria bem menor...
Em caso negativo, de sua não
vivência como católico praticante – de missa e comunhão dominical – por que se
interessar pela Igreja Católica, se para Ela o senhor não tem tempo ou amor?
São 430 000 sacerdotes no mundo.
Desses a Igreja seleciona 5 000 bispos. Sobre esses a nova seleção de 500
arcebispos, aproximadamente e, finalmente dentre esses últimos ela seleciona
120 Cardeais! Nenhuma empresa ou organização no mundo tem um tal crivo de
seleção para a escolha de seus dirigentes... A simplicidade de vida e a
proximidade permanente junto ao seu rebanho, do Senhor Cardeal Arcebispo
do Rio de Janeiro (bem distante dos costumes principescos pré-conciliares
dos bispos de então) não oferece, ao senhor professor, a oportunidade da
inocente presunção de sentir-se um seu par! Aprendi nos meus dez anos de idade: non licet
bove quod licet Iove!
Em qualquer hipótese, vejo seu
artigo desprovido das virtudes da fé e do amor a Cristo e a sua Igreja! Que
pena! Lamento, também, a linguagem vulgar, incompatível com a dignidade de um
professor de curso superior e com a dignidade da pessoa ofendida: sair do armário
(duas vezes).
Aprendi, ainda, que “ninguém se
volta contra ninguém, a menos que se sinta prejudicado!”
Na sexta linha da apresentação de
seu artigo classifica-se de Catolibãs os católicos com
elevado grau de intolerância e agressividade a ponto de os tornarem comparáveis
aos talibãs afegãos. Mas ao final da leitura de
seu artigo, cheio de intolerância e agressividade contra quem tem uma opinião
diferente, vi queo senhor poderia, também, ser um, na facção dos catolibãs.
Tomo, primeiro, algumas questões
de fundo, para depois ocupar-me de algumas inverdades ou desinformação no seu
texto.
O que o senhor entende por conservadores,
conservador, ou conservadorismo católico brasileiro?E,
também, o que o senhor entende por pastoral ou perspectivas pastorais e, ainda,
por teologia da libertação?
A Igreja deve evangelizar a
política e não fazer política partidária. A missão da Igreja é a de unir. Os
partidos: partem, dividem a comunidade. Não assumir um partido político ou uma
ideologia política não é ser conservador. A Igreja para ser fiel ao Evangelho
não pode assumir ou priorizar um determinado partido político, por mais que ele
se aproxime de algumas máximas do Evangelho. O Evangelho tem que ser assumido
no seu todo, sem uma leitura fundamentalista.
Sem entrar nas inverdades ou
desinformações iniciais, ponto de partida de sua reflexão, quero lembrar-lhe o
óbvio: nesta nova época da história, presenciamos uma mudança radical do modus
vivendi de todos, independentemente de povo, raça, nação ou
religião. Vivemos uma nova cultura. Acabou-se a privacidade, todos tem acesso a
todas as informações e a emitir suas opiniões. Ninguém controla ninguém. Nem os
pais conseguem um domínio absoluto de seus filhos no uso da mídia. Vivemos na
decantada aldeia global. Bispo algum conseguirá controlar o que escrevem na
mídia os católicos que se esforçam por viver à luz das orientações de seus
pastores; nem poderá controlar aqueles que se dizem católicos, e o são dentro
das oportunidades de catequese que tiveram em sua formação religiosa, bem como
outros cristãos, de boa vontade que buscam o bem a sua maneira. Surge, pois, na
mídia todo tipo de informação ou opinião.
A sabedoria e o discernimento,
dons do Divino espírito Santo, nos ajudam a separar, no tempo oportuno, o trigo
do joio. Se de um lado há aqueles que bem intencionados defendem um imobilismo
cômodo, na prática da religião, há, em número bem maior, os que trilham pelos
retos caminhos e se sacrificam na evangelização das camadas mais pobres e
sofridas do nosso povo, levando a eles com o Pão da Palavra o pão de
cada dia. Se todos os católicos vivessem o Pão da
Palavra, não faltaria o pão de cada dia na mesa do
pobre. Seria bom se o senhor acompanhasse o Senhor Cardeal do Rio de Janeiro
(que se levanta todos os dias às 04h da manhã e se deita perto das 24h – já me
hospedei em sua casa por diversas vezes) em alguma de suas visitas às
comunidades mais pobres do Rio, às Favelas (ele já foi assaltado duas vezes!),
aos presos, aos doentes nas enfermarias dos hospitais.
Em vinte e oito anos de exercício
do episcopado, em três dioceses diferentes, nunca pretendi controlar,
vigiar, policiar os sacerdotes. Não os vigiei nem os carreguei
no colo. Quando surgiram dificuldades ou problemas procurei a melhor solução à
luz da caridade cristã. Tive como lema de episcopado a frase de Paulo aos
coríntios: Só o amor constrói! A calma e a prudência
na correção das falhas de pessoas ou comunidades são a garantia de um bem
maior. E a correção caridosa e oportuna não pode ser entendida como omissão em
suas obrigações.
Ao meu tempo de pároco, aprendi
com um venerando sacerdote que me auxiliava, que todos os acontecimentos na
pastoral, de fundo e motivação emocional, não têm estabilidade, não permanecem,
passam com o tempo e a moda. O Bispo não pode se desgastar na busca da
uniformidade. Ele deve defender a unidade, o essencial. Disse-me um Arcebispo:
na Igreja há espaço para muitas seitas, desde
que se mantenha a fidelidade ao essencial.
Nem sempre um Bispo pode agir
apelando para sua autoridade. Tem que ser pai. Ele sabe o que ninguém ou poucos
sabem. Sabe a hora de agir. Lembro-me quando alguém de uma paróquia veio falar
comigo reclamando de seu padre, que estava mesmo errado. Disse-lhe: - O Senhor
coloca isso no papel? E ele: Não. Respondi-lhe: Dom João Bosco
sabe. No dia em que o senhor colocar no papel, o Bispo ficará sabendo. Vieram
depois duas pessoas, outras quatro, depois oito e por fim onze que
aceitaram colocar sua queixa no papel. Eu passei a ter um documento em mãos.
Havia quem se responsabilizava pela informação. Chamei o padre, resolvi o
problema sem usar o papel. O silêncio do Bispo, é, muitas vezes, sabedoria. O maior
sofrimento de um Bispo é a solidão da decisão; nem sempre ele pode justificar
suas atitudes, disse-me um Bispo Gaúcho.
A teologia da libertação não é
nem pode ser comunista. A essência do marxismo é o ateísmo, o materialismo
histórico ateu. Uma universidade americana pediu uma vez a Dom Helder
Câmara uma conferência: Seria possível batizar Marx, assim como Santo
Agostinho batizou Platão e São Tomás de Aquino batizou Aristóteles? A
resposta de Dom Helder, assessorado pelo filósofo Jesuíta, Padre José de Lima
Vaz, foi: Se batizarmos Marx, acaba-se o Marxismo, que por sua
natureza é ateu.
Na segunda quinzena de dezembro
de 1990, participei de um almoço, com o Papa São João Paulo II. Na conversa, um
bispo de origem italiana, perguntou: Santo Padre, o que V.
Santidade diz da Teologia da Libertação. Sua resposta: Se a teologia
da Libertação não existisse, ela deveria existir. Aqueles que são
contra a legítima Teologia da Libertação, conforme o documento da Congregação
para a Doutrina da Fé, assinado pelo então Cardeal Ratzinger e aprovado pelo
Papa São João Paulo II (Instrução sobre alguns aspectos da Teologia da
Libertação – 6.8.1984), não conhecem a Teologia da Libertação. Não se preocupe
professor: o emocional passa!
As temáticas da moral cristã não
são questão de plebiscito. A Igreja tem seu Magistério com posição sólida e
firme nos ensinamentos de São João XXIII, Paulo VI e São João Paulo II. Cito as
palavras de São João Paulo II em sua Encíclica: O Evangelho da Vida,
N o 57: Portanto,
com a autoridade que Cristo conferiu a Pedro e aos seus Sucessores, em comunhão
com os Bispos da Igreja Católica, confirmo
que a morte direta e voluntária de um ser humano inocente é sempre gravemente
imoral. Esta doutrina, fundada naquela lei não escrita que todo
homem, pela luz da razão, encontra no próprio coração (cf Rm 2,14-15), é
confirmada pela Sagrada Escritura, transmitida pela Tradição da Igreja e
ensinada pelo Magistério ordinário e universal. Assim, caro
professor, ser contra a descriminalização do aborto não é ser tradicionalista
mas fiel ao Magistério Universal da Igreja. A ideologia do gênero é realmente
ideologia: tomar a parte pelo todo: subverter a Criação Divina que criou o
homem: homem e mulher. Quanto à Comunhão para os casais em segunda união temos
as orientações da Amoris laetitia. Sua interpretação e
aplicação pastoral corresponde aos Bispos e não aos aventureiros em campo de
uma sadia pastoral familiar.
Quero lembrar-lhe, caro
professor, que Pio XII nunca deixou de ser Papa e que seus ensinamentos não
caducaram com o tempo e pertencem ao Magistério da Igreja.
Criticar a organização da Jornada
Mundial da Juventude, post factum, é como o comentarista
de futebol que ensina como o jogador deveria ter feito, mas que na
prática, ele comentarista, não teria condições de entrar em campo e fazer
a metade do que o atleta fez!
Chamar a reza do terço
e a adoração ao Santíssimo, na devoção mariana de
práticas medievais, é desconhecer os documentos da Igreja como
a Carta Encíclica de Paulo VI: A oração do Rosário à Mãe de Cristo – 15 de
setembro de 1966; a Exortação Apostólica do mesmo Papa: O Culto à Virgem Maria
– 2 de fevereiro de 1974; a Encíclica Redemptoris Mater de São João Paulo II,
em 25 de março de 1987. Seria bom, caro professor, ler o capítulo XI: A
solidariedade e mediação universal de Maria, sobretudo os subtítulos: O fundamento
antropológico e ontológico da mediação; O único mistério cristológico e
pneumático como base da mediação de Maria; Como Maria concretamente se
solidarizou; páginas 186 a 195 de um belíssimo livro O Rosto
Materno de Deus, de Leonardo Boff, O.F.M. –: Vozes 1979. Penso
que Leonardo Boff não pode ser chamado de tradicionalista.
Cito, ainda, A Mensagem de
Fátima, texto publicado pela Congregação para a Doutrina da
Fé, no ano 2000, com a assinatura do ainda Cardeal Ratzinger. Lê-se à
página37: O colóquio termina com uma troca de terços: à Irmã Lúcia foi
dado o terço oferecido pelo Santo Padre, e ela, por sua vez, entrega alguns
terços confeccionados pessoalmente por ela.
Ano 2000, Mensagem de Fátima e
Papa São João Paulo II não cabem em seu apelativo de práticas medievais...
Como esquecer as palavras do Papa
Bento XVI, por ocasião da V Conferência Geral do Episcopado Latino-Americano e
do Caribe, em Aparecida, no ano de 2007?
Acabamos de recitar o rosário. Através dos ciclos
meditativos, o Divino Consolador quer nos introduzir no conhecimento de um
Cristo que brota da fonte límpida do texto evangélico. ... Maria Santíssima, a
Virgem pura e sem mancha, é para nós escola de fé destinada a conduzir-nos e a
fortalecer-nos no caminho que leva ao encontro com o Criador do céu e da terra.
O Papa veio à Aparecida com a viva alegria para vos dizer primeiramente:
“Permanecei na escola de Maria”. Inspirai-vos nos seus ensinamentos, procurai
acolher e guardar dentro do coração as luzes que ela, por mandato divino, vos
envia lá do alto. (Documento de Aparecida, pag. 258).
Senhor professor, o senhor vai
concordar que o Papa Bento XVI, tido pela Mídia americana como a maior cultura
viva no mundo, ao rezar o terço em Aparecida com os Cardeais, Bispos,
Sacerdotes, religiosos e seminaristas não estava resgatando uma prática
medieval!
Também a adoração ao Santíssimo não é uma prática medieval. Leia o ensinamento de São João Paulo II, no dia 17 de abril de 2003, no Vaticano: "O culto prestado à Eucaristia fora da Missa é de um valor inestimável na vida da Igreja, e está ligado intimamente com a celebração do sacrifício eucarístico. A presença de Cristo nas hóstias consagradas que se conservam após a Missa – presença essa que perdura enquanto subsistirem as espécies do pão do vinho – resulta da celebração da Eucaristia e destina-se à comunhão, sacramental e espiritual.
Quanto à sua crítica à estrutura
do Seminário São José e à Arquidiocese do Rio de Janeiro como foco do conservadorismo católico
brasileiro, quero lhe dizer:
É necessário se levantar mais
cedo para ver o galo cantar e saber de onde ele está cantando... É necessário
levantar mais e melhor os olhos para ver para além dos muros do Rio de Janeiro
e do Brasil. Estamos em uma nova época, com problemas novos, como disse no
início destas páginas.
Existe, realmente, em algum setor
do clero jovem e de um ou outro seminário, uma busca de um certo exibicionismo
nos paramentos vistosos e nas cerimônias litúrgicas, com o uso de alguns
paramentos do passado, como o barrete e solidéu pretos, e pior ainda,
criatividades inusitadas nestas mesmas cerimônias litúrgicas. Mas o Bispo não
conserta isto no autoritarismo e a ferro e fogo. Encontrei alguns fatos em meu
ministério episcopal e tentei corrigir. Mas não coloquei investigadores na
paróquia, nem quis usar de autoridade ou advertências canônicas para questões
mais secundárias. Há outras, mais importantes, como a santidade e a
espiritualidade do clero que merecem a primazia no ministério episcopal. São
fenómenos emocionais, como disse e que passarão no tempo oportuno. Moda é moda! Passa.
Trabalhei em Seminário Maior por
dez anos. Como Bispo sempre me interessei pelos seminários e pela formação
sacerdotal. Posso lhe dizer que o fenômeno que o senhor cita está presente em
alguns países da Europa, como Alemanha, Itália e Espanha, para citar apenas
onde conversei sobre o tema. Não pesquisei na América Latina. Penso ter chegado
à causa do problema, mas isto não cabe ser exposto aqui.
Suas
inverdades:
O Senhor Cardeal Arcebispo do Rio
de Janeiro publicou no dia seguinte às mortes, uma nota de repúdio ao
assassinato e de solidariedade às famílias enlutadas de Marielli Franco e Anderson Gomes.
Fez, depois, uma visita às duas
famílias no dia 26 de março, buscando consolá-las na dor.
Os sacerdotes, ou Bispos
Auxiliares não são marionetes nas mãos de um Bispo. Quando há possíveis falhas
em suas posturas pastorais, a correção, quando necessária tem em mente os
parâmetros da caridade cristã e não é necessário humilhar ninguém.
A
Arquidiocese do Rio de Janeiro não vive uma ação pastoral de perfil
conservador, veja:
Mantém:
42 núcleos com a população de
rua;
Pastoral carcerária nas 31
unidades penitenciárias;
Ações na área da saúde;
Evangelização e atendimento
social, judiciário às famílias;
Pastoral do Menor: atividades
sócio educativas envolvendo prevenção em área de risco; Ação nas unidades do
Menor privado de liberdade;
Pastoral com mulheres
marginalizadas;
Escolas de perdão e
reconciliação;
7 núcleos de mediação
comunitária;
Pastoral com pessoas com
deficiências: cadeirantes, cegos, surdos;
Pastoral do trabalhador: presença
junto ao mundo do trabalho e nos sindicatos;
Pastoral junto aos domésticos;
Pastoral do meio ambiente;
Pastoral dst/aids
Pastoral da criança;
Pastoral das favelas;
Pastoral dos migrantes;
Apostolado do mar;
Pastoral da saúde;
Pastoral da sobriedade;
Pastoral da terceira idade.
Caro professor: seu artigo
pareceu-me injusto, equivocado, sem fundamentação em suas afirmações, simplista
e agressivo. O senhor não gostaria de ser tratado como publicamente tratou o
Senhor Cardeal Arcebispo do Rio de Janeiro. A quaresma já passou, mas um pouco
de oração e penitência lhe fariam bem e a Igreja ficaria melhor com o senhor
mais santo.
Jogar tinta na roupa branca
alheia é fácil.
Por esse caminho o senhor não
contribui para o crescimento espiritual da Igreja no Brasil. Procure conhecer
melhor a Arquidiocese do Rio de Janeiro que vem mantendo através dos anos, com
seus Cardeais Arcebispos, Bispos, Clero, Religiosas, Religiosos e agentes
leigos/as piedosos/as e dedicados/as uma esteira luminosa na história
da Igreja no Brasil.
Dom João
Bosco Óliver de Faria
Arcebispo
Emérito de Diamantina, Minas Gerais
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