No evangelho, o Salvador nos diz – diz aos cristãos, somente aos cristãos, aqueles que se aproximaram Dele quando Se sentou no alto da montanha (cf. Mt 5,1): "Vós sois o sal da terra, vós sois a luz do mundo".
Para compreendermos bem o que o nosso Senhor nos afirma, recordemos a Lei dos judeus, a Torá: “Salgará toda oblação que ofereceres e não deixarás de pôr na tua oblação o sal da aliança do teu Deus” (Lv 2,13).
O sal era a pitada que tornava a oferenda agradável a Deus. Sem a pitada de sal, a oferenda não poderia ser aceita, pois o sal simbolizava a própria aliança de Deus com o Seu povo!
Atenção: o sal não era toda a oferenda, mas a pitada, o tiquinho que tornava a oferta agradável ao Senhor, o pouquinho que fazia a oferenda ser aceita como expressão da Aliança sagrada entre Israel e o seu Deus.
E agora Jesus nos diz: “Vós sois o sal da terra”, vós sois o pouquinho de sal que, presente no mundo, torna-o oferenda agradável a Deus! O sal não é toda a oferenda, como os cristãos nunca serão a humanidade toda!
Mas, somos nós o pequeno rebanho, o resto fiel, que torna o mundo todo, a humanidade inteira, a criação completa, agradáveis a Deus, salvos em Cristo Jesus que, por Sua Morte e Ressurreição, selou a Aliança nova, eterna e definitiva entre Deus e toda a humanidade!
Pense bem, que responsabilidade, a nossa: sermos no mundo a pitada de sal que conserva e dá sabor, sermos o pequeno resto fiel que se torna uma alternativa, um modo diferente de ser e de viver. Por isso, o Senhor diz também que somos luz: luz do mundo! Não seremos luz se não formos sal!
Em muitos cristãos existe uma ilusão de que a humanidade inteira será cristã e a Igreja será mais Igreja e os cristãos serão mais fortes quando todos foram cristãos. Para isso muitos pregam um cristianismo fácil, ao sabor da moda do momento. Aí teriam a ilusão, com um cristianismo de consumo, de que todo o mundo tornara-se cristão; quando, na verdade o cristianismo apenas teria se tornado pagão, mundano, infiel ao Senhor!
Um exemplo? A agenda de certos cristãos que sentem segundo o mundo, e pensam numa reforma na Igreja, para “salvá-la”, para torna-la palatável e atraente ao mundo, livrando-a, assim, na visão deles, da crise em que se encontra no Ocidente... Quais seriam as mudanças? As de sempre: fim do celibato obrigatório, aprovação da contracepção artificial, ordenação de mulheres, admissão do divórcio, bênção de pares homossexuais, etc! Com este programa mundano, as pessoas achariam a Igreja simpática, moderna, humana, atraente, e nela ficariam... Quanto engano; que pensamentos tão distantes da lógica do Cristo Senhor e do Reino que Ele anunciou e inaugurou! Nesta mentalidade mundana, a palavra “conversão” – central, basilar, primordial, no Evangelho – desaparece!
Primeiro, a Igreja nunca deve tomar decisões pensando em atrair as pessoas! O único critério que deve mover os cristãos e orientar as decisões na vida da Igreja é a fidelidade ao Senhor – e tal fidelidade supõe escuta da Palavra de Deus, fidelidade à perene Tradição e ao constante e orgânico Magistério eclesial.
Em segundo lugar, o que faz com que a Igreja esteja em crise é o afrouxamento da vida cristã, o acomodamento de grande parte do clero e de tantos cristãos à mentalidade do mundo. O que atrai é a fidelidade generosa ao Senhor, é a coragem de levar, pascalmente, a própria cruz por amor a Jesus, é a proclamação da fé católica sem meios termos e sem descontos – em outras palavras, o caminho diametralmente oposto ao que esses cristãos mais entusiasmados com o mundo que com Cristo propõem.
É sempre útil recordar os primeiros cristãos e os Padres da Igreja nunca pensaram numa humanidade totalmente cristã; pensavam sim, que em todo o mundo houvesse comunidades verdadeiramente cristãs, que anunciassem e testemunhassem com alegria, radicalidade e jovialidade a beleza da novidade de Cristo, do Seu amor e da resposta radical e corajosa que os cristãos procuram dar a tão grande amor.
Sois o sal, sois a luz!
Não sejamos insossos quanto tantos que desejam um cristianismo pela metade, que já não sabe no que crê, que tem medo de proclamar Jesus nosso Senhor como o único Salvador e a única Vida da humanidade!
Não temamos ser o pequeno rebanho, aberto a todos, capaz de amar, de compreender de acolher, mas sem esconder ou negar ou negociar o que quer que seja da nossa fé e da certeza que habita em nosso coração!
Dom Henrique Soares da Costa
Bispo de Palmares, PE
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