Em que
momento de uma discussão é oportuno partir para a briga? Esta é a pergunta por
trás do grande debate entre os “iliberais” paternalistas (tanto da esquerda
quanto da direita) e os seguidores da tradição liberal clássica
norte-americana. A maioria dos conflitos da política pode se
resumir a esta questão. Quais são os bens sociais, morais e econômicos que
devem ser defendidos pela força policial e protegidos mediante a ameaça de
prisão?
A polêmica que discute se o Estado deve
ou não deve usar a força para promover a fé católica e desencorajar as outras
religiões é uma dentre as milhares que podem exemplificar esse tipo de querela,
embora o Concílio Vaticano II tenha tentado encerrar a discussão em favor da
liberdade. Os católicos que rejeitam o conceito de liberdade religiosa adotado
pelo Vaticano II devem estar cientes de que a Fraternidade Sacerdotal de São
Pio X (FSSPX) se mantém fora da comunhão com a Igreja devido a esta questão em
particular. As negociações entre esse grupo e o papa Bento XVI desandaram
reiteradamente quando a FSSPX se recusou a admitir a liberdade religiosa e
insistiu em dizer que a posição do Vaticano II não era compatível com a
tradição anterior da Igreja. Se você concorda com eles e acha que um concílio
da Igreja, o Catecismo subsequente e dezenas de afirmações de vários papas
representam uma heresia, você realmente deveria assumir as consequências das
suas ideias e se alinhar com a FSSPX. Num artigo futuro, aliás, pretendo falar
de como os ensinamentos do Concílio Vaticano II se relacionam com as
declarações papais anteriores sobre a liberdade religiosa.
Mas, voltando ao tema, é fato que tudo na política e na vida social abrange esta
pergunta: quando é que você deve chamar a polícia e ameaçar prender um vizinho
porque os atos dele não condizem com a visão que você tem do bem?
Em qualquer assunto (drogas, aborto, salários, poluição...), existem três
possíveis pareceres que uma pessoa pode emitir:
1. “Este assunto é moralmente indiferente: a lei natural não afirma que é
necessário adotar nem tal nem qual ação. Cada um é livre para agir do jeito que
achar prudente”.
2. “Neste outro caso, existe um jeito certo de agir e, por justiça e pelo bem
comum, o Estado tanto deve garantir que esse modo certo de agir seja praticado
quanto deve punir quem age de forma diferente”.
3. “Já neste terceiro caso, existe um jeito certo e um jeito errado de agir,
mas envolver o Estado seria imprudente porque violaria outros bens que são
profundamente importantes”.
Exemplos de questões que se encaixam na primeira categoria são fáceis de
imaginar. Os noivos devem se casar agora ou esperar mais um ano até juntar uma
poupança? Eu devo fazer a minha doação para as freiras contemplativas ou para
um abrigo de mães solteiras? O Dudu tem que fazer outra faculdade ou prestar
concurso para a polícia? E assim por diante. Grande parte dos dilemas da vida
entra nesta categoria, que poderíamos chamar de "neutra". Obviamente,
só um totalitarista iria
querer politizar decisões desse tipo.
Os problemas começam quando tentamos diferenciar o que pertence à segunda
categoria e o que pertence à terceira. A grande divisão entre os governos
“iliberais” paternalistas (feudais, teocráticos ou socialistas) e os governos
livres está no enquadramento que cada um dá a esta questão. Achamos evidente
que o Estado deve
promover o bem usando a força, apossando-se da nossa propriedade e mandando-nos
para a cadeia com uma arma apontada para a nossa nuca? Ou consideramos o uso da
força como um mal necessário e tentamos minimizá-lo ao máximo?
_________________________________
Disponível em: Aleteia
Autor:
John Zmirak
Nenhum comentário:
Postar um comentário