Já no início da missa da noite de Natal, a atenção dos fiéis se viu atraída para a procissão. Vinha à frente o crucifixo, seguido das velas carregadas pelos coroinhas. Após um breve intervalo e precedendo os sacerdotes, veio uma criança carregando outra menor que ela: o Menino Jesus, que seria colocado na manjedoura.
À medida que a procissão avançava, eu me lembrava do versículo da profecia de Isaías: "um Menino os guiará a todos". O profeta prevê tempos em que o leão se deitará ao lado do cordeiro. A paz repousará sobre todos e virá a reconciliação a um mundo esfacelado. Ao falar do rei vindouro, ele proclama: "... a justiça e a fidelidade serão os seus cintos. O lobo há de habitar com o cordeiro e o leopardo há de deitar-se ao lado do cabrito; o bezerro, o leãozinho e o filhote do bezerro estarão juntos e um menino a todos guiará".
No Natal, Jesus Cristo é o menino que conduz o mundo à paz e à harmonia.
Ele vem para reconciliar e renovar o mundo e o faz tornando-se pequeno. Como escreve São Paulo, "embora fosse igual a Deus, Ele não se aferrou à igualdade com Deus, assumindo, em vez, a forma de escravo". Este exemplo de humildade nobre reverbera em todo o evangelho e pelas vidas dos santos. Jesus pedirá aos seus discípulos que não impeçam as crianças de virem a ele, e, tomando uma criança sobre o joelho, recorda aos adultos que, se não se tornarem como crianças, não poderão entrar no reino dos céus.
Estamos tão acostumados a ouvir os ensinamentos de Jesus sobre as crianças que nos esquecemos do quanto eles são radicais. No primeiro século, as pessoas não tinham a visão sentimental que temos hoje sobre as crianças. Naquele tempo, uma criança era tida por inferior a um escravo e só estava um grau acima dos animais. Jesus declarar que todos tinham de ser como as crianças deve ter soado absurdo e desconcertante. Eram os sábios anciãos os que ocupavam o lugar mais alto. Como é que alguém ia ter que se tornar como as crianças para entrar no reino dos céus?
Só depois de longa reflexão é que a Igreja entenderia que Jesus nos pedia ser como as crianças porque ele próprio se tornou uma criança. E ele não nos pede “ser crianças”, mas “ser como as crianças”. Há uma diferença. Uma “pessoa criança” é imatura, centrada no próprio umbigo e tem a mente estreita. Uma pessoa “que é como as crianças” revela as boas características da infância: a inocência, o coração aberto, o maravilhamento, a genuína curiosidade e uma mente aberta. Ser como as crianças, neste sentido, é ser... mais maduros. Esse tipo de “infância” é o resultado do crescimento adulto, que nos leva a descobrir uma nova inocência combinada com a experiência, uma nova maravilha combinada com o conhecimento e uma nova curiosidade combinado com a certeza. Ser como as crianças é conquistar a liberdade pela disciplina e a abnegação pelo serviço ao outro. É conquistar a liberdade da mestria e o desapego que se consegue através do sacrifício do próprio eu.
Santa Teresinha de Lisieux é uma das santas mais queridas do mundo porque ensinou um novo jeito de viver a infância espiritual. Ela permaneceu criança morrendo à tenra idade de vinte e quatro anos, mas alcançou, naquele espaço curto de vida, uma grande medida de maturidade e de sabedoria.
São Bento nos mostra o tipo de infância espiritual que vem com a idade. Ele é retratado como o velho sábio que realcança a inocência. A regra de São Bento transborda de uma espiritualidade pé-no-chão, de uma simplicidade e confiança que evoca a alegria da criança nas coisas comuns, nos prazeres simples e na gratidão do coração inocente.
O Natal lembra a nós todos que precisamos voltar para a simplicidade e para a confiança da infância. Como a pequena Teresa de Lisieux, nós podemos colocar toda a nossa confiança em nosso Pai celestial, para então, como Bento, "correr pela estrada dos mandamentos de Deus, com o coração transbordante de indizível alegria".
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Fonte: Aleteia
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