terça-feira, 6 de fevereiro de 2018

Homilética: 7º Domingo do Tempo Comum - Ano B: "Jesus, o Pecado e a Confissão".


Neste domingo, o Senhor convida-nos a refletir sobre o perdão dos pecados, que se obtém através do Sacramento da Penitência ou Reconciliação.

Quatro amigos levam à presença do Senhor um paralítico desejoso de ver-se livre da doença que o mantém preso ao leito. Depois de inúmeros esforços para consegui-lo, ouvem as palavras dirigidas ao amigo enfermo: “Filho, os teus pecados estão perdoados” (Mc 2, 5). É muito possível que não fossem essas as palavras que esperavam ouvir do Mestre; mas Cristo indica-nos que a pior de todas as opressões, a mais trágica das escravidões que um homem pode sofrer é o pecado, pois este não é apenas mais um dentre os males que podem afligir as criaturas, mas é o único mal absoluto.

Os amigos que levaram o paralítico à presença de Jesus compreenderam que acabava de ser-lhe concedido o maior de todos os bens: a libertação dos seus pecados! E nós não podemos esquecer a grande cooperação para o bem que significa empregarmos todos os meios ao nosso alcance para desterrar o pecado do mundo. Muitas vezes, o maior favor, o maior benefício que podemos fazer a um amigo, ao irmão, aos pais, aos filhos, é ajudá-los a ter muito em conta o sacramento da misericórdia divina (a confissão). É um bem para a família, para a Igreja, para a humanidade inteira, ainda que aqui na terra muito pouca gente se aperceba disso.

Cristo liberta do pecado com o seu poder divino: Quem pode perdoar pecados senão só Deus? Ele veio à terra para isso: “Deus, porém, rico em misericórdia, pelo grande amor com que nos amou, e estando nós mortos pelos nossos pecados, deu-nos a vida por Cristo” (Ef. 2, 4-5). Depois de perdoar ao paralítico os seus pecados, o Senhor curou-o também dos seus males físicos. Este homem não deve ter demorado a compreender que a sua grande sorte fora a primeira: sentir a sua alma trespassada pela misericórdia divina e poder olhar para Jesus com um coração limpo.

O paralítico ficou curado de alma e de corpo! E os seus amigos são hoje um exemplo para nós de como devemos estar dispostos a prestar a nossa ajuda para o bem das almas – sobretudo mediante um apostolado pessoal de amizade – e a potenciar o bem humano da sociedade por todos os meios ao nosso alcance: oferecendo soluções positivas para anular o mal, colaborando com qualquer obra a favor do bem, da vida, da cultura…

A cura do corpo testemunha o perdão dos pecados; é sinal externo, ao alcance de todos, do perdão concedido e, ao mesmo tempo, demonstra a grandeza do perdão de Deus, que não destrói somente os pecados do homem, mais também o cumula de maravilhosos bens.

O perdão dos pecados é uma iniciativa da misericórdia de Deus que procura todos os caminhos para salvar o homem, criatura do Seu amor.

O poder de perdoar pecados, que Jesus tinha, continua na Igreja a quem foi entregue, na primeira aparição do Cristo Ressuscitado, na tarde do dia de Páscoa (Jo 20, 19-23): “Recebam o Espírito Santo, a quem perdoardes… serão perdoados…”. Os apóstolos foram enviados a perdoar em nome de Deus… Daí a beleza e a grandeza do Sacramento da Reconciliação ou Penitência (Confissão). É o Sacramento da Alegria: Nasceu no dia de Páscoa, num clima de alegria e vitória (sobre a morte e o pecado). A alegria de experimentar o Perdão do Senhor e a Comunhão com os irmãos; sentir-se perdoado e aceito por um Deus, Pai e Amigo, que nos repete: “Filho, teus pecados estão perdoados…”

Não podemos reduzir o Sacramento da confissão a apenas um ritualismo de contar os pecados ao padre. Precisa de um processo de conversão, pelo qual o cristão se reconhece pecador e deseja refazer sua vida cristã.

O Sacramento da Confissão constitui uma forma especial de ação de graças pelo mistério do Cristo que perdoou ou que manifestou à humanidade a misericórdia do Pai através do perdão aos pecadores. Como Deus, Ele pode perdoar pecados e deseja perdoá-los, bastando que as pessoas, arrependidas, reconheçam o seu pecado. Para que esta reconciliação adquira uma forma perceptível ou sacramental, Jesus transmitiu o seu poder de perdoar os pecados aos apóstolos e seus sucessores.

Demos graças a Deus por todas as vezes que fomos perdoados no Sacramento da Penitência (Confissão) e por toda graça que já recebemos através desse sacramento.

COMENTÁRIO DOS TEXTOS BÍBLICOS

Leituras: Is 43, 18-19.21-22.24b-25; 2 Cor 1, 18-22; Mc 2, 1-12

Jesus está em Cafarnaum. A multidão está pendente dos seus lábios. Cada uma das suas palavras ressoa no silêncio expectante do povo sedento da Palavra de Deus. De repente rompe-se o silêncio e se começa a ouvir um barulho estranho no teto. Incrível! Os primeiros raios de sol perpassam o pequeno buraco até que se vai fazendo maior e a casa fica totalmente iluminada, naturalmente iluminada. Mas, desde quando os tetos se abrem sozinhos? Há algo por trás.

Verdade é que algumas daquelas pessoas, acostumadas a andar com Jesus, não se assustariam tanto, pois sabiam que quando este novo Rabi fala algo acontece. Ordinária ou extraordinariamente, as suas palavras sempre se fazem críveis pelas obras. De todas as maneiras, seja para essas pessoas seja para aquelas que vieram ao encontro de Jesus pela primeira vez, é preciso dizer que nem todos os dias se vê uma cama descendo pelo telhado! É algo verdadeiramente estranho! Mas, como se não bastasse, extremamente estranhas ressoam aquelas palavras ditas com excelente dicção e força extraordinária: “Filho, perdoados te são os pecados” (Mc 2,5).

Imagino como estaria o pobre paralítico! Num momento se vê descoberto diante de Jesus de Nazaré. Bem que ele tinha dito aos seus quatro amigos que o deixassem quieto, que ele não queria ser incomodado nem queria incomodar o Rabi, que já fazia muitos anos que ele estava paralítico e que já estava conformado com a situação! A meu ver e segundo a minha fluente imaginação, foram os amigos que insistiram com ele para que fosse ao encontro de Jesus. Quando o paralítico lhes objetara que ele não podia andar, os amigos, em sua prudente teimosia, pegaram o leito do homem e, não sei se entre um querer e um não querer, o paralítico foi carregado ao encontro de Jesus.

Mas, nova dificuldade! Quando chegam à casa de Simão, onde Jesus estava, “não podiam encontrar lugar nem mesmo junto à porta” (Mc 2,2). Tal era a multidão! Mas, desistir agora? Depois de tantos esforços para convencer o paralítico e do suor para trazer-lhe no próprio leito… Desistir agora? Não. O que fazer? Simples, se não se pode entrar pela porta, vamos entrar pelo teto. É lógico! Mas não segundo a lógica humana!

Que trabalhão! Subir com uma cama contendo um enfermo pelo teto de uma casa! Ainda bem que eram quatro… mas, ainda assim! Aqueles caras eram amigos do paralítico, valiam diamantes, pois somente uma pessoa que se interessa pelos outros de verdade pode fazer tal coisa. Neste momento, cresce em mim a convicção de que devemos imitar os amigos do paralítico: não podemos deixar que os nossos amigos continuem paralíticos em seus pecados, em seus vícios e numa vida sem sentido, temos que levá-los ao encontro com Jesus. E se eles disserem que não querem e que os deixemos em paz, tenhamos uma santa teimosia e insistamos para que esse encontro se dê, pois Jesus é a verdadeira paz (cf. Ef 2,14). E se for preciso, subiremos aos telhados! É preciso que sejamos teimosamente apostólicos, evangelizadores aferrados, homens e mulheres que não desistem perante as dificuldades, pessoas dispostas a “comer o mundo” visto desde o amplo panorama do apostolado!

“Filho, perdoados te são os pecados!” O paralítico e seus amigos se interessavam pela cura corporal e escutam palavras que vão à raiz de todos os males, o pecado. Ainda que não exista uma conexão necessária entre paralisia e pecado, existe uma conexão necessária entre pecado e paralisia: todo pecado nos paralisa!

Diante do milagre, os que ali estavam “ficaram admirados e glorificaram a Deus” (Mc 2,12). Jesus surpreende: perdoa o pecado e manda ir para casa (cf. Mc 2,11). Somente os reconciliados podem viver em casa. Estar em casa, em família, é característica intrínseca daquelas pessoas que estão na graça de Deus, que vivem uma vida segundo Deus porque o Senhor fez delas templos sagrados.

Vamos ajudar os nossos amigos – caso alguns deles estejam fora de casa ou dela afastado pelo pecado mortal – a retornar, a morar em casa, em família, na Igreja. Aqui, sim, se é feliz! E, se algum dia nós mesmos estivermos paralisados, peçamos ao Senhor que nos conceda um amigo, uma pessoa que, carinhosa e teimosamente, nos conduza novamente ao coração de Deus, à sua casa.

PARA REFLETIR

Quatro idéias dominam hoje a Liturgia da Palavra.

A primeira: a humanidade é pecadora. Claramente e de modo comovente, o Senhor se queixa do seu povo na primeira leitura: “Tu, Jacó, não me invocaste, e tu, Israel, de mim te fatigaste. Com teus pecados, trataste-me como servo, cansando-me com tuas maldades”. Não é esta, caríssimos em Cristo, a nossa situação? Quantas vezes não invocamos o Senhor, isto é, não nos abrimos para ele, vivemos e decidimos como se ele não existisse… Isto, porque somos auto-suficientes, porque, na prática, nos julgamos donos da nossa vida e senhores do nosso próprio destino. “De mim te cansaste” – queixa-se Deus. Será irreal, tal queixa? Será sem razão, tal reclamação? O mundo de hoje aborreceu-se de Deus, cansou-se dele. Pronto! Simplesmente virou-lhe as costas… E nós, na nossa existência, quantas vezes já não fizemos isto?

Caríssimos, se a Palavra tem insistido em nos mostrar nossos pecados, nossas lepras, nossas infidelidades, não é para nos deprimir ou humilhar inutilmente. É para que tomemos consciência de nossa situação de infidelidade e, arrependidos, voltemo-nos para o Senhor, que é bom, que enche nosso coração, que salva a nossa vida da falta de sentido e da morte eterna. Vivemos tanto mergulhados numa humanidade orgulhosa de si mesma, consigo mesma satisfeita, que corremos o grave risco de nem mais perceber que somos pecadores e infiéis. Tudo vai parecendo normal, lícito, aceitável, tudo tem uma desculpa psicológica, tudo vai sendo colocado na conta do inconsciente e no direito de ser feliz e não se reprimir… Esse discurso, essa conversa não serve para um cristão! Olhemo-nos à luz da Palavra de Deus, avaliemos nossa vida com os olhos e o coração fixos na cruz, que nos revela até onde Deus nos ama e nos leva a sério e, então, veremos que não amamos a Deus o bastante, que não lhe demos tudo, como ele tudo nos deu em Jesus; veremos que somos egoístas, incoerentes, presos pelas paixões, lentos para crer, tardos para nos abandonar nas mãos do Senhor. Então, diremos: Senhor, sou pecador! Piedade de mim!

E aqui nos deparamos com a segunda idéia deste Domingo: Deus é carinho, é misericórdia, é vontade e desejo de nos perdoar. Basta que nos reconheçamos pecadores, basta que lhe estendamos as mãos e ele está disposto a apagar os pecados que mancham nosso passado. Ouvi que palavras comoventes, que declaração de amor o Senhor nos faz: “Não relembreis coisas passadas, não olheis para fatos antigos. Eis que eu farei coisas novas! Sou eu, eu mesmo, que cancelo tuas culpas por minha causa e já não me lembrarei de teus pecados!”. Eis como o Senhor age conosco: desde que nos reconheçamos pecadores e lhe imploremos o perdão, ele nos perdoa! Se formos cínicos, se dissermos: “Não tenho pecado”, ficaremos sem o perdão; mas, se, humildemente, reconhecermos o que somos, pecadores, o Senhor inclina-se para nós com o bálsamo do seu perdão. Notai bem: Deus não desculpa o nosso pecado; ele o perdoa! Tem diferença? Muita! Qual? Ei-la: desculpar seria fazer de conta que não pecamos, seria passar a mão na nossa cabeça. Primeiro, seria uma falta de verdade, um mascaramento da nossa realidade. Depois, seria nos desvalorizar, não acreditar que somos capazes de nos superar, de caminhar para o melhor, de crescer sempre mais em direção a uma plenitude, a uma maior humanização. Quanto ao perdão, é diferente da desculpa, é de Deus: perdoar é dizer: Você errou, mas eu continuo acreditando em você; dou-lhe a oportunidade de melhorar, de crescer de ser mais maduro, ser mais livre em relação às suas incoerências; eu perdôo porque espero muito de você e sei que você poderá crescer! Eis aqui, caríssimos, o modo de agir de Deus: ele perdoa, ele é perdão. É assim também que ele espera que façamos com os outros. De modo particular, assim os pais deveriam fazer com seus filhos…

Agora, sim, podemos entrar na terceira idéia deste hoje. É em Cristo – e somente em Cristo – que podermos ver toda gravidade do nosso pecado e toda força do perdão de Deus. Na segunda leitura, São Paulo nos disse que “o Filho de Deus, Jesus Cristo, nunca foi ‘sim-e-não’, mas somente ‘sim’. Com efeito, é nele que todas as promessas de Deus têm o seu ‘sim’ garantido”. Caríssimos, que idéia tão profunda! Tudo quanto Deus preparou e prometeu no Antigo Testamento encontra sua realização plena em Cristo morto e ressuscitado! Contemplemos Jesus, cravemos os olhos na sua cruz! Aí veremos o quanto somos pecadores, aí compreendemos o quanto nosso pecado é grave, o quanto nossa infidelidade fere o coração de Deus! O homem nunca descobrirá a gravidade do pecado se não olhar para a cruz, fruto do pecado meu e do mundo! Mas, também na cruz, todas as promessas de amor de Deus encontram seu “sim”, sua verdade, sua confirmação! A cruz nos mostra a dimensão da gravidade do pecado, mas nos revela simultaneamente, a profundidade e magnitude da misericórdia de Deus. Na cruz, Deus não esqueceu nosso pecado; antes, mostrou sua gravidade – tão grande a ponto de provocar a morte do Senhor! Mas, também na cruz, o Senhor mostra toda a seriedade do seu amor, do seu perdão e da sua misericórdia. Se o Senhor Jesus disse hoje ao paralítico: “Filho, tem confiança, teus pecados te são perdoados”, é porque estava disposto a morrer por ele, para que ele tivesse o perdão e, curado, pudesse caminhar, caminhar na vida, caminhar para Deus! Eis, portanto: na cruz, Cristo, o “Sim” do Pai para nós, torna-se também nosso “sim” ao Pai, desde que, unidos a ele, nos deixemos por ele curar, por ele perdoar, como o paralítico do Evangelho de hoje.

Finalmente, a quarta idéia que a Palavra nos apresenta. Por que Jesus curou o paralítico? Que diz o Evangelho? Escutai: “Quando viu a fé daqueles homens, Jesus disse ao paralítico…” É surpreendente: é pela fé dos homens que carregavam o paralítico que Jesus vai perdoar e curar! Eis o mistério da comunhão dos santos! Nós somos fruto não somente da cruz do Senhor, mas também da oração e da santidade de tantos irmãos que formam a Igreja do Senhor! Por isso, podemos dizer: “Senhor, não olhes os meus pecados, mas a fé da tua Igreja!” Quando fraquejamos, quando estamos em  crise, é a fé da Igreja, é a santidade e a força de tantos irmãos que, misteriosamente, na comunhão dos santos, nos mantêm! – Obrigado, Jesus, por sermos membros do teu Corpo, que é a Igreja! Obrigado porque nesse Corpo encontramos o perdão e a paz, nesse Corpo encontramos a força para nos levantarmos do pecado que nos paraliza!

Eis, caríssimos as lições que o Senhor hoje nos dá! Saberemos aproveitá-las? Saberemos vivê-las? Que o Senhor no-lo conceda pela sua graça. Amém.

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