Em síntese: Os Coptas são os cristãos do Egito, que no século V adotaram o monofisismo condenado pelo Concilio de Calcedônia (451). No século XVI uma parte da população copta reuniu-se à Igreja Católica, reconhecendo o primado de Pedro. Os dissidentes já não professam a heresia que lhes ocasionou a origem. Estenderam sua pregação até a Etiópia, onde também existem comunidades coptas.
A palavra copta deriva-se do árabe Qoubt, que é a deformação do grego Aigyptioi. Designa as habitantes do Egito anteriores à invasão árabe (século VIII) aderiram ao Evangelho no início da era cristã, mas no século V abraçaram a heresia monofisita, que o Concilio de Calcedônia (451) condenara. Formaram assim a Comunhão Egípcia Copta com ramificações na Etiópia (Abissínia). A partir do século XVI muitos dos dissidentes se uniram à Sé de Pedro em Roma de modo que há atualmente coptas separados da Igreja Católica e outros (em menor número e somente no Egito) unidos à Santa Sé.
Veremos, a seguir, a história e a doutrina de fé dos coptas.
1. Coptas monofisistas: histórico
Desde os primeiros séculos do Cristianismo registrou-se certa rivalidade entre a sé de Alexandria e a de Bizâncio (Constantinopla) aquela podia fazer valer sua origem no tempo dos Apóstolos (fundada por São Marcos?), ao passo que esta era uma cidade pequena promovida em 330 a capital do Império Romano e sede do poder imperial, muitas vezes despótico e pouco simpático. Tal rivalidade se acentuou por ocasião da controvérsia ariana: S. Atanásio de Alexandria (+ 373) defendia a reta fé contra a heresia ariana tutelada de certo modo pelos imperadores bizantinos; com Atanásio estavam os monges do Egito, que eram os guias espirituais da população local.
No fim do séc. IV o bispo Teófilo de Alexandria esteve em posição hostil a São João Crisóstomo de Constantinopla, sendo o alexandrino apoiado pelo poder imperial.
Em meados do século V o bispo Dióscoro de Alexandria propôs a teoria monofisita: em Cristo havia uma só pessoa (divina) e uma única natureza (divina), pois a natureza teria sido absorvida pela divina. Tal teoria foi rejeitada pelo Concilio de Calcedônia (451), pois destruía o conceito mesmo de Encarnação. Os cristãos do Egito separaram-se então da Igreja Católica. O governo imperial, usando de violência, impôs a Alexandria o bispo ortodoxo Protério, donde resultou um tumulto popular e a morte do prelado. O monofisismo foi-se implantando cada vez mais no Egito, apesar das intervenções do governo imperial, que para lá enviava bispos ortodoxos.
Em 617 os persas invadiram o Egito e reconheceram tão somente a hierarquia monofisita. Doze anos mais tarde, sobreviveram os árabes muçulmanos, que confirmaram o predomínio do monofisismo: este passou a constituir como que um Estado dentro do Estado muçulmano, sendo o Patriarca copta chefe religioso e civil, com sua legislação e seus tribunais próprios Em breve, porém, começou a pressão árabe os cristãos foram submetidos a vexames e pesados impostos – o que redundou na apostasia de muitos, a tal ponto que já não convinha aos muçulmanos, pois os convertidos deixavam de pagar impostos. Os monofisitas fiéis foram tratados como parias, de modo que a população monofisita do Egito perdeu quase todo o seu significado no país.
Tal situação se pro traiu até o século XIX, quando o governo egípcio resolveu conceder liberdade religiosa a todos os cidadãos. – Eis, porém, que a péssima administração eclesiástica copta provocou uma revolta de leigos influentes na Igreja: a rebelião durou dez anos, ou seja, de 1882 a 1892. Somente em 1928 a situação na comunidade copta se normalizou, estando porém a Igreja muito enfraquecida: restavam poucos dos numerosos mosteiros de outrora. O cidadão copta no Egito ainda é considerado de categoria inferior. Não obstante, os fiéis se sentem membros de uma grande família unida e solidária em torno do seu Patriarca que é como um pai para todos.
2. Coptas monofisitas: doutrina
O ponto crucial é a Cristologia. Verifica-se, porém, que, embora os coptas guardem grande estima por Dióscoro, o arauto do monofisismo, condenado em Calcedônia, já não professam a mesma heresia. Com efeito, na segunda metade do século V o Patriarca Timóteo Eluro, de Alexandria, tomou posição contra o rígido monofisismo e confessou ter permanecido em Cristo toda a substância de autêntico ser humano, em virtude da qual o Emanuel é consubstancial com a Virgem Maria; todavia, dizia Timóteo Eluro, não é lícito falar de duas naturezas em Cristo, pois isto poderia implicar o erro de Nestório, que admita duas naturezas e duas pessoas em Cristo (em suma as discussões teológicas da época eram alimentadas, muitas vezes, pela polivalência dos vocábulos do que pela diferença dos conceitos). A concepção cristológica de Timóteo é ortodoxa; foi reafirmada pelos Patriarcas Sanúcio (século IX) e Menos (século X), que professavam haver em Cristo tudo o que é de Deus e tudo o que é do homem sem mistura nem deterioração do Divino e do humano. Tal profissão de fé perdura até hoje entre os coptas, todavia sem referência a Calcedônia.
No tocante à SSma. Trindade, os teólogos coptas reconhecem um só Deus em três pessoas, mas não entram no debate do Filioque existente entre latinos e gregos; no Credo professam: “Creio no Espírito Santo” sem acrescentar … “o qual procede do Pai”. Recentemente, porém registra-se a atitude de escritores coptas que apoiam os bizantinos na sua recusa do Filioque.
O primado de Pedro foi aceito pelos coptas antigos, cujo porta-voz seja ibn Saba ao escrever “Os nossos pais, os Apóstolos, foram edificados sobre a pedra que é Pedro, chefe universal”. Contudo não se encontram explícitos testemunhos do primado dos sucessores de Pedro. A Teologia copta moderna rejeita o primado romano sob a influência dos escritores bizantinos.
Os coptas admitem a doutrina do purgatório, mas as suas concepções sobre o além não são claras, mescladas como estão com noções de antiga religião egípcia. Além do sacramento da Unção dos Enfermos, têm um óleo bento no sábado santo e ministrado aos adultos que gozam de boa saúde, mas vivem em estado de pecado grave. O sacramento da Ordem, segundo os mestres coptas, não imprime caráter indelével. Aceitam o divórcio para os casos de adultério e de total incompatibilidade de gênios. Praticam a confissão auricular.
3. No Egito os coptas católicos
No Egito – e somente no Egito – existe uma comunidade copta católica.
Com efeito. No século XVI os franciscanos missionários no Egito deram início a uma pregação mais sistemática entre os coptas – o que foi redundando na conversão de certo número à fé católica. Em 1739 o bispo copta de Jerusalém chamado Atanásio, tendo ido ao Cairo, converteu-se à fé católica e em 1741 foi por Bento XIV nomeado Vigário Apostólico dos coptas católicos, que eram então cerca de dois mil. Tal prelado, porém não assumiu atitudes claras perante os monofisitas, pelo que foi substituído por Mons. Giusto Manghim, que recebeu o título de Vigário Geral.
Somente no século XIX foi decretada plena liberdade religiosa no Egito; para aproveitar a oportunidade de maior expansão, o Papa Leão XIII quis organizar melhor a Igreja Católica no Egito, dando-lhe uma hierarquia; foi nomeado Patriarca de Alexandria Mons. Cirillo Nacário, o qual apostou em 1908, causando grave dano à comunidade católica. Esta foi-se reerguendo aos poucos, principalmente após a guerra de 1914-18; de 1927 a 1937 o número de fiéis passou de 20.000 a 47.000. Pouco após a segunda guerra mundial (1939-45) eram 63.000, com 88 presbíteros e 70 igrejas. Aos 9/08/1947 foi de novo nomeado um Patriarca católico para Alexandria e foi criada a diocese de Assiut, que, com a de Minia (criada em 1938) constituía a Igreja católica copta do Egito.
4. Na Etiópia os coptas
Os etíopes ou abissínos foram evangelizados por missionários provenientes do Egito em meados do século IV; o Patriarca de Alexandria se encarregava de lhes mandar um Bispo ou abuna que os governasse (costume que persistiu durante séculos).
No século V passaram-se, com os coptas, para o monofisismo.
No decorrer dos tempos os cristãos sofreram perseguição por parte de pagãos e muçulmanos, o que lhes causou danos e perdas, principalmente quando o Patriarca de Alexandria não lhes podia mandar um abuna. Apesar do clima hostil, os cristãos etíopes traduziram seus livros litúrgicos para o gheez, língua do Tigre, e os monges se dedicaram à vida intelectual.
No século XVII os jesuítas portugueses converteram à fé católica, o rei Susnéos e uma parte da população; estes frutos missionários tiveram pouca duração; o abuna Salma se distinguiu na recusa a qualquer ulterior tentativa de conversão. No começo do século XX os cristãos da Etiópia pleitearam sua independência frente a Alexandria. O Patriarca se mostrou contrário a esta perspectiva, mas finalmente concedeu ordenar cinco bispos para aquele país em 1929 e 1930. Quando os italianos ocuparam a região em 1935, empenharam-se por obter a independência da comunidade copta etiópica frente ao Egito. Nada tendo conseguido, em 1937 convocaram um Concilio nacional abissínio, que elegeu como abuna um os bispos locais. A isto respondeu a autoridade religiosa egípcia com um decreto de excomunhão para o eleito. Não obstante, as aspirações dos etíopes não esmoreceram. Após a partida dos italianos em 1942, um congresso nacional etíope empreendeu conversações com os egípcios. Estas, tendo durado seis anos, terminaram num acordo, segundo o qual, após a morte do então abuno seria nomeado um arcebispo nativo, que governaria a Igreja, ordenado porém pelo Patriarca de Alexandria. Os monges desempenharam papel muito importante nessa grande família religiosa.
Ao lado dos etíopes monofisitas, existe no país uma pequena comunidade católica, devida ao trabalho missionário dos padres lazaristas que foram para a Abissínia em 1839 sob a orientação do Bem-aventurado Justino de Jacobis. Os católicos abissínios expandiram-se pela Eritréia, sempre como minoria sofrida sob os regimes do governo local.
5. Conclusão
Como se pôde perceber, as diferenças doutrinárias entre coptas e católicos não são de grande monta; os coptas são guardas fiéis da tradição com seus valores perenes. Isto se compreende ainda melhor se se leva em conta que o Egito foi o berço do monaquismo, tanto do eremítico (Santo Antão foi o pioneiro), quanto do cebobitico (com São Pacômio). Possam estes títulos superar os preconceitos nacionalistas que dificultam a volta à unidade!
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Fonte: Revista: “PERGUNTE E RESPONDEREMOS”
D. Estevão Bettencourt, Osb
Nº 504, Ano 2004, p. 242
Disponível em: Central Católica
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