A indignação de religiosos de diferentes cultos
contra a decisão do juiz federal Eugênio Rosa de Araújo vai engrossar o
protesto planejado pela Comissão de Combate à Intolerância Religiosa.
Representantes católicos já estão garantidos.
O frei franciscano David Raimundo dos Santos diz
que o magistrado demonstrou desconhecer as religiões afro-brasileiras. “A
definição de religião que o juiz tem na cabeça revela total desconhecimento das
teses teológicas”. Ele avalia que o texto justifica a mobilização dos adeptos
do candomblé e umbanda. “Caso os membros das religiões afro façam protestos,
terão o apoio de nós, católicos”, afirmou o frei.
O pastor batista Henrique Vieira também pretende
apoiar possíveis manifestações contrárias à decisão. “Essa decisão desrespeita
a identidade cultural e religosa que é legítima. É uma violência que se dá no
âmbito do discurso”, observou.
O babalorixá Marcio Jagun, autor da denúncia à
procuradoria, considerou que o juiz reforçou o preconceito contra as religiões.
“O magistrado acabou fundamentando as agressões. Se ele, enquanto autoridade,
desconsidera como manifestação legítima, acaba referendando as
agressões”,desabafou.
Juiz disse que cultos
afro-brasileiros não são religião
Os adeptos das religiões afro-brasileiras, que
lutam há tempos para garantir respeito à sua fé, sofreram duro golpe na
Justiça. Uma decisão do juiz Eugênio Rosa de Araújo, da 17ª Vara Federal do
Rio, considerou que a umbanda e o candomblé não são manifestações religiosas. O
posicionamento gerou revolta e um protesto está sendo programado.
O texto polêmico é do dia 28 de abril, quando o
juiz negou liminar de uma ação proposta pelo Ministério Público Federal que
pedia a retirada da internet de 15 vídeos tidos como ofensivos às crenças de
matriz africana. “As manifestações religiosas afro-brasileiras não se
constituem em religiões”, escreveu. O magistrado considerou que os vídeos
apenas manifestavam a livre expressão de opinião. O MPF recorreu contra a
decisão.
Em outro trecho, opinou que cultos afro “não contêm
os traços necessários de uma religião, a saber, um texto-base (Corão, Bíblia
etc) ausência de estrutura hierárquica e de um Deus a ser venerado”. Isso
revoltou os seguidores dessas crenças.
“Ele ofende a lei quando decide com uma opinião
preconceituosa”, questionou o babalaô Ivanir dos Santos, representante da
Comissão de Combate à Intolerância Religiosa. “O Papa Francisco me recebeu como
líder religioso e o juiz não me reconhece como tal?”. Membros da Igreja
concordam com Ivanir. “A tradição africana é oral, o que não impede que o
candomblé tenha uma teologia sistematizada”, explica o frei franciscano David
Raimundo dos Santos.
Babalaô Ivanir dos Santos foi recebido pelo Papa Francisco, na visita ao Brasil, como líder religioso |
Ivanir pretende representar contra o magistrado no
Conselho Nacional de Justiça, além de chamar uma manifestação que terá também
representantes católicos , evangélicos e integrantes de outras religiões.
A decisão do juiz surpreendeu o procurador Jaime
Mitropoulo, responsável pela ação, que até esperava alguma resistência, mas
nada parecido. “Nos causou ainda mais espanto que na decisão ele se sentiu no
direito de dizer o que é ou não religião”, afirmou Mitropoulo.
De acordo com o MPF, a decisão fere a Declaração
Universal dos Direitos Humanos, a Constituição Federal e o Estatuto de
Igualdade Racial. Mitropoulo critica também a manutenção dos vídeos
considerados ofensivos e preconceituosos: “O poder público é obrigado a coibir
o uso abusivo dos meios de comunicação social a fim de evitar que sejam
propagadas mensagens com conteúdos que caracterizem discriminação de cunho
religioso”.
Procurado, o juiz federal informou, por meio da
assessoria, que não faria comentários sobre o caso.
Procuradoria: há uma intenção de
associação ao ‘mal’
A maioria dos vídeos expõe cultos com práticas de
exorcismo. Em um deles, um homem supostamente possuído por uma entidade diz que
é homossexual e que está com o vírus HIV. “Você está vendo que ele está falando
em linguagem, em dialeto de Candomblé”, diz o pastor que conduz a conversa com
o homem.
Em outro vídeo, um pastor afirma que não existe
como alguém ser de bruxaria e de magia negra, ou ter sido, e não falar em
dialeto africano. Para a procuradoria, há nos vídeos intenção de estabelecer
uma associação ao ‘mal’ e do ‘demônio’ com as manifestações religiosas de
matriz africana.
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Disponível em: Portal Araçagi
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