Caros
irmãos e irmãs em Cristo da Diocese de Madison:
As últimas semanas
trouxeram muito escândalo, cólera justificada e um apelo por respostas e ações
de muitos fiéis católicos aqui dos EUA e do exterior, dirigidos à hierarquia da
Igreja em relação aos pecados sexuais de bispos, padres e até cardeais. Cólera
ainda maior é dirigida justamente àqueles que foram cúmplices em impedir que
alguns desses pecados sérios viessem à luz.
De minha parte – e sei
que não estou sozinho –, estou cansado disso. Estou cansado de pessoas sendo
feridas, gravemente feridas! Estou cansado da ofuscação da verdade. Estou
cansado do pecado. E, como alguém que tentou – apesar de minhas muitas
imperfeições – entregar minha vida por Cristo e por Sua Igreja, eu me cansei da
violação regular dos deveres sagrados por parte daqueles a quem o Senhor
conferiu imensa responsabilidade para o cuidado de Seu povo.
Os relatos que vêm sendo
trazidos à luz e exibidos em detalhes macabros a respeito de alguns sacerdotes,
religiosos, e agora inclusive daqueles colocados em lugares de liderança mais
alta, são repugnantes. Ouvir um só desses relatos literalmente basta para
deixar alguém doente. Mas a minha própria doença em face desses relatos é
rapidamente colocada em perspectiva quando eu me lembro de que muitas pessoas
passaram por isso durante anos. Para elas, esses não são relatos mas, de fato,
realidades. Para elas eu me volto, e digo novamente: sinto muito pelo que vocês
sofreram e continuam a sofrer na mente e no coração.
Se ainda não o fez,
peço-lhe que estenda a mão, por mais difícil que seja, e procure ajuda para
começar a curar. Além disso, se você foi ferido por um padre da nossa diocese,
eu o encorajo a se apresentar, a fazer um relatório à polícia e ao nosso
Coordenador de Assistência à Vítima, para que possamos começar, com você como
indivíduo, a tentar e definir as coisas direito na maior medida possível.
Não há nada sobre esses
relatos que esteja bem. Essas ações, cometidas por mais do que alguns, só podem
ser classificadas como mal, mal que clama por justiça e pecado que deve ser
expulso de nossa Igreja.
Confrontado com relatos
da depravação de pecadores no seio da Igreja, fui tentado a desesperar. E por
quê? A realidade do pecado – até mesmo o pecado na Igreja – não é nova. Somos
uma Igreja feita de pecadores, mas somos pecadores chamados à santidade. Então,
o que é novo? O que é novo é a aparente aceitação do pecado por alguns na
Igreja, e os aparentes esforços deles e de outros para encobrir o pecado. A
menos e até que levemos a sério nosso chamado à santidade, nós, como
instituição e como indivíduos, continuaremos a sofrer o “salário do pecado”.
Por muito tempo nós
diminuímos a realidade do pecado – recusamo-nos a chamar um pecado de pecado –
e temos desculpado o pecado em nome de uma noção equivocada de misericórdia. Em
nossos esforços para nos abrirmos ao mundo, tornamo-nos todos muito dispostos a
abandonar o Caminho, a Verdade e a Vida. A fim de evitar ofender, oferecemos a
nós mesmos e a outras pessoas sutilezas e consolação humana.
Por que fazemos isso? É
por um desejo sincero de mostrar uma sensação equivocada de ser “pastoral?” Nós
encobrimos a verdade por medo? Estamos com medo de sermos antipatizados por
pessoas neste mundo? Ou estamos com medo de sermos chamados de hipócritas
porque não estamos nos esforçando incansavelmente pela santidade em nossas
próprias vidas?
Possivelmente são essas
as razões, mas talvez seja mais ou menos complexo do que isso. No final, as
desculpas não importam. Nós devemos dar um basta no pecado. Ele deve ser
erradicado e considerado novamente inaceitável. Ama os pecadores? Sim. Aceita o
verdadeiro arrependimento? Sim. Mas não diga que o pecado está bem. E não finja
que violações graves do ofício e da confiança não vêm sem consequências graves
e duradouras.
Para a Igreja, a crise
que enfrentamos não se limita ao caso McCarrick, nem ao Relatório do Grande
Júri da Pensilvânia ou a qualquer outra coisa que possa vir. A crise mais
profunda que deve ser enfrentada é a licença para o pecado ter um lar nos
indivíduos em todos os níveis da Igreja.
Existe certo nível de
conforto com o pecado que veio permear nosso ensino, nossa pregação, nossa
tomada de decisão e nosso próprio modo de viver.
Se me permitirem, o que
a Igreja precisa agora é de mais ódio! Como já disse anteriormente São Tomás de
Aquino, o ódio à maldade pertence realmente à virtude da caridade. Como diz o
Livro de Provérbios: “A minha boca meditará a verdade, e os meus lábios odiarão
a impiedade” (Provérbios 8, 7). É um ato de amor odiar o pecado e chamar os
outros a se afastarem do pecado.
Não deve haver espaço,
nenhum refúgio, para o pecado – seja dentro de nossas próprias vidas, seja
dentro das vidas das nossas comunidades. Para ser um refúgio dos pecadores (que
deveríamos ser), a Igreja deve ser um lugar onde os pecadores possam se voltar
para se reconciliar. Nisso eu falo de todo pecado. Mas, para ser claro, nas
situações específicas em questão, estamos falando de atos sexuais desviantes –
quase exclusivamente homossexuais – praticados por clérigos. Também estamos
falando de proposições homossexuais e abusos contra seminaristas e jovens
sacerdotes por poderosos sacerdotes, bispos e cardeais. Estamos falando de atos
e ações que não só violam as promessas sagradas feitas por alguns, em suma,
sacrilégio, mas que também violam a lei moral natural para todos. Chamar isso
de outra coisa seria enganoso e apenas ignoraria o problema.
Tem havido um grande
esforço para manter separados atos que se enquadram na categoria de atos de
homossexualidade, agora culturalmente aceitáveis, dos atos publicamente
deploráveis de pedofilia. Quer dizer, até recentemente os problemas da Igreja
eram pintados puramente como problemas de pedofilia – isto apesar de clara
evidência em contrário. É hora de ser honesto [e reconhecer] que os problemas
são ambos e ainda outros. Cair na armadilha de analisar os problemas de acordo
com o que a sociedade pode achar aceitável ou inaceitável é ignorar o fato de
que a Igreja nunca sustentou QUALQUER um deles como aceitável – nem o abuso de
crianças, nem qualquer uso da sexualidade fora do casamento, nem o pecado de
sodomia, nem absolutamente a entrada de clérigos em relações sexuais íntimas,
nem abuso e coerção por parte daqueles que possuem autoridade.
Nesta última consideração,
deve-se mencionar especialmente o caso mais notório e mais alto no ranking, que
são as acusações (amiúde sussurradas, agora muito públicas) de pecados sexuais,
predação e abuso de poder do antigo Cardeal Theodore McCarrick. Os detalhes bem
documentados deste caso são vergonhosos e seriamente escandalosos, como o é
qualquer encobrimento de tais ações aterradoras por parte de outros líderes da
Igreja que sabiam disso com base em sólidas evidências.
Embora as recentes e
verossímeis acusações de abuso sexual infantil por parte do arcebispo McCarrick
tenham trazido à luz uma série de questões, o problema do seu abuso de poder
por causa do prazer homossexual era muito ignorado.
É hora de admitir a
existência na hierarquia da Igreja Católica de uma subcultura homossexual que
está causando grande devastação na vinha do Senhor. O ensinamento da Igreja é
claro de que a inclinação homossexual não é em si mesma pecaminosa, mas
intrinsecamente desordenada, de modo a tornar incapaz para o sacerdócio
qualquer homem afligido estavelmente por ela. E a decisão de agir de acordo com
essa inclinação desordenada é um pecado tão grave que clama ao céu por
vingança, especialmente quando se trata de atacar os jovens ou os vulneráveis.
Tal maldade deve ser odiada com um ódio perfeito. A própria caridade cristã
exige que odiemos a maldade, assim como amemos o bem. Mas ao mesmo tempo em que
odiamos o pecado, nunca devemos odiar o pecador, que é chamado à conversão, à
penitência e à renovada comunhão com Cristo e Sua Igreja, através de sua
inesgotável misericórdia.
Ao mesmo tempo, porém, o
amor e a misericórdia que somos chamados a ter, até mesmo para o pior dos
pecadores, não exclui responsabilizá-los por suas ações através de uma punição
proporcional à gravidade de sua ofensa. De fato, uma punição justa é um
exercício importante de amor e misericórdia, porque, enquanto serve
principalmente como retribuição pela ofensa cometida, também oferece ao culpado
uma oportunidade de expiar seu pecado nesta vida (se ele aceitar de bom grado sua
punição), poupando-lhe assim a pior punição na vida futura. Motivado, portanto,
pelo amor e preocupação pelas almas, permaneço com aqueles que pedem que se
faça justiça aos culpados.
Os pecados e crimes de
McCarrick e de muitos outros na Igreja provocam suspeitas e desconfianças em
sacerdotes, bispos e cardeais muito bons e virtuosos, suspeita e desconfiança
em seminários grandes e respeitáveis, e em tantos seminaristas santos e fiéis.
O resultado do primeiro exemplo de desconfiança prejudica a Igreja e o
excelente trabalho que fazemos em nome de Cristo. Faz com que outros pequem por
pensamentos, palavras e ações – o que é a própria definição de escândalo. E a
segunda desconfiança prejudica o futuro da Igreja, uma vez que nossos futuros
sacerdotes estão em jogo.
Eu disse que estava
tentado a desesperar-me diante de tudo isso. No entanto, essa tentação passou
rapidamente, graças a Deus. Por maior que seja o problema, sabemos que somos
chamados a seguir adiante com fé, confiar nas promessas de Deus, e trabalhar
duro para fazer toda a diferença que pudermos, dentro de nossas esferas de
influência.
Recentemente, eu tive a
oportunidade de conversar diretamente com os nossos seminaristas sobre esses
assuntos muito prementes, comecei e continuarei a conversar com os sacerdotes
da diocese, assim como com os fiéis, pessoalmente e através de minha coluna
semanal e nas homilias, tornando as coisas tão claras quanto me for possível,
desde a minha perspectiva. Agora, ofereço aqui alguns pensamentos aos meus
diocesanos:
Em primeiro lugar,
devemos continuar o bom trabalho que vimos realizando para proteger os jovens e
os vulneráveis da nossa diocese. Este é um trabalho em relação ao qual nunca
podemos descansar em nossa vigilância, nem em nossos esforços para melhorá-lo.
Devemos continuar em nosso trabalho de educação para todos e manter as
políticas efetivas que foram implementadas, exigindo exames psicológicos de
todos os candidatos ao ministério, bem como verificações gerais de antecedentes
para quem trabalha com crianças ou indivíduos vulneráveis.
Declaro novamente aqui,
como temos feito de modo consistente, que se você tiver conhecimento de
qualquer tipo de abuso criminal de crianças por parte de alguém na Igreja,
entre em contato com a polícia. Se você precisar de ajuda para entrar em
contato com a polícia, entre em contato com o nosso Coordenador de Assistência
à Vítima, que o ajudará a conectar-se com os melhores recursos. Se você é
adulto que foi vítima de abuso sexual desde a infância, nós ainda o encorajamos
a entrar em contato primeiro com a lei, mas mesmo se você não quiser, por
favor, entre em contato conosco.
Aos nossos seminaristas:
Se você recebeu proposta impura, foi abusado ou ameaçado (não importa por
quem), ou se você testemunha diretamente comportamento impuro, relate-o a mim e
ao reitor do seminário. Vou cuidar [do assunto] com rapidez e vigor. Não
suportarei isso em minha diocese ou em qualquer lugar que eu envie homens para
formação. Confio em que os seminários escolhidos muito criteriosamente por mim
para ajudar a formar nossos homens não irão ignorar esse tipo de comportamento
escandaloso, expectativa que continuarei a verificar.
Aos nossos sacerdotes:
Simplesmente, cumpra as promessas que fez no dia da sua ordenação. O senhor é
chamado a servir o povo de Cristo, começando com a oração diária da Liturgia
das Horas. Isso é para mantê-lo muito perto de Deus. Além disso, prometeu
obedecer e ser fiel ao seu bispo. Em obediência, esforce-se para viver o seu
sacerdócio como sacerdote santo, sacerdote trabalhador e sacerdote puro e feliz
– como o próprio Cristo o está chamando a fazer. E, por extensão, viva uma vida
casta e celibatária, para que possa entregar completamente sua vida a Cristo, à
Igreja e às pessoas a quem Ele o chamou para servir. Deus lhe dará as graças
para fazer isso. Peça-Lhe a ajuda de que precisa diariamente e durante todo o
dia. E se vier a ser objeto de proposta impura, abusado, ou ameaçado (não
importa por quem), ou se testemunhar diretamente comportamento impuro, relate-o
para mim. Não suportarei isso em minha diocese mais do que em nossos
seminários.
Aos fiéis da diocese: Se
você é vítima de abuso de qualquer tipo por um padre, bispo, cardeal ou
qualquer funcionário da Igreja, revele-o. Ele [o caso] será abordado de forma
rápida e justa. Se você presenciou diretamente avanços sexuais ou qualquer tipo
de abuso, apresente-o também. Tais ações são pecaminosas e escandalosas e não
podemos permitir que alguém utilize sua posição ou poder para abusar de outra
pessoa. Novamente, além de ferir indivíduos, essas ações prejudicam o próprio
Corpo de Cristo, Sua Igreja.
Além disso, acrescento
meu nome ao daqueles que pedem uma reforma real e sustentada no episcopado, no
sacerdócio, em nossas paróquias, escolas, universidades e seminários que extirpem
e responsabilizem qualquer pretenso predador ou cúmplice sexual; vou manter os
sacerdotes da diocese em sua promessa de viver uma vida casta e celibatária de
serviço a você e a sua paróquia, e as evidências de fracasso serão tratadas com
justiça;
Sustentarei da mesma
forma que todo homem que estiver estudando para o sacerdócio, que a nossa
diocese será responsável por ele viver uma vida casta e celibatária como parte
de sua formação. Não fazê-lo levará à cessação do patrocínio diocesano;
Continuarei exigindo
(com nossos homens e nossos fundos) que todos os seminários aos quais enviamos
homens para estudar estejam vigilantes para que os seminaristas sejam
protegidos dos predadores sexuais, e proporcionem uma atmosfera propícia à sua
formação holística, como santos sacerdotes, à imagem de Cristo;
Peço a todos os fiéis da
diocese que nos ajudem a prestar contas às autoridades civis, aos fiéis e ao
Deus Todo-Poderoso, não apenas para proteger as crianças e os jovens dos
predadores sexuais na Igreja, mas nossos seminaristas, estudantes
universitários, bem como todos os fiéis. Prometo colocar qualquer vítima e seus
sofrimentos diante da reputação pessoal e profissional de um padre, ou de
qualquer funcionário da Igreja culpado de abuso;
Peço a todos que leiam
isso para rezar. Reze fervorosamente pela Igreja e por todos os seus ministros.
Reze pelos nossos seminaristas. E reze por si e por suas famílias. Todos nós
devemos trabalhar diariamente para a nossa santidade pessoal, e responsabilizar
primeiramente a nós, e depois responsabilizar também os nossos irmãos e irmãs e,
por fim, peço a todos que se unam a mim e a todo o clero da Diocese de Madison
para fazer atos públicos e privados de reparação ao Sagrado Coração de Jesus e
ao Imaculado Coração de Maria por todos os pecados de depravação sexual que
foram cometidos pelos membros do clero e do episcopado. Eu oferecerei uma missa
pública de reparação na sexta-feira, 14 de setembro, Festa do Triunfo da Santa
Cruz, em Holy Nome Heights,
e peço a todos os pastores que façam o mesmo em suas próprias paróquias. Além
disso, peço que todos os sacerdotes, clérigos, religiosos e funcionários
diocesanos se juntem a mim observando as próximas Têmporas de outono (19, 21 e
22 de setembro) como dias de jejum e abstinência em reparação pelos pecados e
ultrajes cometidos por membros do clero e do episcopado, e convido todos os
fiéis a fazerem o mesmo. Alguns pecados, como alguns demônios, só podem ser
expulsos pela oração e pelo jejum.
Esta carta e estas
declarações e promessas não pretendem ser uma lista exaustiva do que podemos e
precisamos fazer na Igreja para começar a curar e afastar dela esta doença
profunda, mas sim os próximos passos que eu acredito que podemos dar
localmente.
Mais do que qualquer
outra coisa, nós, como Igreja, devemos cessar nossa aceitação do pecado e do
mal. Nós devemos expulsar o pecado de nossas próprias vidas e correr em direção
à santidade. Devemos nos recusar a ficar em silêncio diante do pecado e do mal
em nossas famílias e comunidades, e exigir de nossos pastores – inclusive eu –
que eles mesmos estejam lutando dia a dia pela santidade. Devemos fazer isso
sempre com respeito amoroso pelos indivíduos, mas com uma compreensão clara de
que o amor verdadeiro nunca pode existir sem a verdade.
Novamente, neste momento
há muita cólera e paixão justificadas, vindas de muitos leigos e clérigos
santos e fiéis em todo o país, exigindo uma reforma real e uma “limpeza
doméstica” desse tipo de depravação. Eu estou com eles. Ainda não sei como isso
vai acontecer nacional ou internacionalmente. Mas disto eu sei, e faço dele a
minha última consideração e última promessa para a Diocese de Madison: “Quanto
a mim e minha casa, serviremos ao Senhor”.
Fielmente vosso no
Senhor,
Reverendíssimo Dom Robert C. Morlino
Bispo de Madison
__________________________
Tradução: Hélio Dias Viana
Disponível em: Fratres In Unum
Nenhum comentário:
Postar um comentário