domingo, 30 de novembro de 2014

Discurso do Papa no encontro com autoridades na Turquia


DISCURSO
Viagem do Papa Francisco à Turquia
Encontro com as Autoridades
Palácio Presidencial de Ancara
Sexta-feira, 28 de novembro de 2014


Senhor Presidente,
Senhor Primeiro-Ministro,
Ilustres Autoridades
Senhoras e senhores!

Sinto-me feliz por visitar o vosso país, rico de belezas naturais e de história, repleto de vestígios de civilizações antigas e ponte natural entre dois continentes e entre diferentes expressões culturais. Esta terra é amada por todo o cristão por ser o berço de São Paulo, que fundou aqui diversas comunidades cristãs; por ter acolhido os primeiros sete Concílios da Igreja e pela presença, perto de Éfeso, daquela que uma veneranda tradição considera a «casa de Maria», o lugar onde a Mãe de Jesus viveu durante alguns anos, meta da devoção de muitos peregrinos vindos de todos os cantos do mundo, não só cristãos, mas também muçulmanos.

Todavia as razões da consideração e apreço pela Turquia não se acham unicamente no seu passado, nos seus monumentos antigos, mas encontram-se na vitalidade do seu presente, na laboriosidade e generosidade do seu povo, no seu papel no concerto das nações.

Para mim é motivo de alegria a oportunidade que me é dada de prosseguir convosco um diálogo de amizade, estima e respeito, na senda traçada pelos meus antecessores, o Beato Paulo VI, São João Paulo II e Bento XVI; diálogo esse, preparado e favorecido por sua vez pela acção do então Delegado Apostólico Mons. Ângelo José Roncalli, mais tarde São João XXIII, e pelo Concílio Vaticano II.

Precisamos de um diálogo que aprofunde o conhecimento e valorize, com discernimento, as inúmeras coisas que temos em comum e que nos permita, ao mesmo tempo, considerar com ânimo sábio e sereno as diferenças para podermos também aprender com elas.

É preciso levar por diante, com paciência, o compromisso de construir uma paz sólida, assente no respeito pelos direitos fundamentais e deveres ligados com a dignidade do homem. Por esta estrada, é possível superar os preconceitos e falsos temores, deixando, ao contrário, espaço à estima, ao encontro, ao desenvolvimento das melhores energias em proveito de todos.

Para isso, é fundamental que os cidadãos muçulmanos, judeus e cristãos – tanto nas disposições legais, como na sua efectiva actuação – gozem dos mesmos direitos e respeitem os mesmos deveres. Assim, hão-de mais facilmente reconhecer-se como irmãos e companheiros de viagem, afastando cada vez mais as incompreensões e favorecendo a colaboração e o acordo. A liberdade religiosa e a liberdade de expressão, eficazmente garantidas a todos, estimularão o florescimento da amizade, tornando-se um sinal eloquente de paz.

O Médio Oriente, a Europa, o mundo aguardam este florescimento. O Médio Oriente, de modo particular, é há demasiado tempo teatro de guerras fratricidas, que parecem nascer uma da outra, como se a única resposta possível à guerra e à violência tivesse de ser sempre uma nova guerra e outra violência.

Quanto tempo deverá sofrer ainda o Médio Oriente por causa da falta de paz? Não podemos resignar-nos com a continuação dos conflitos, como se não fosse possível mudar a situação para melhor! Com a ajuda de Deus, podemos e devemos sempre renovar a coragem da paz! Esta atitude leva a lançar mão, com lealdade, paciência e determinação, de todos os meios da negociação e, assim, alcançar objectivos concretos de paz e de desenvolvimento sustentável.

Senhor Presidente, uma contribuição importante para se alcançar meta tão elevada e urgente pode vir do diálogo inter-religioso e intercultural, a fim de banir toda a forma de fundamentalismo e de terrorismo, que humilha gravemente a dignidade de todos os seres humanos e instrumentaliza a religião.

Ao fanatismo e ao fundamentalismo, às fobias irracionais que incentivam incompreensões e discriminações, é preciso contrapor a solidariedade de todos os crentes – que tenha como pilares o respeito pela vida humana, pela liberdade religiosa, que é liberdade do culto e liberdade de viver segundo a ética religiosa –, o esforço por garantir a todos o necessário para uma vida digna, e o cuidado do meio ambiente. Têm necessidade disto, com particular urgência, os povos e os Estados do Médio Oriente, para poderem finalmente «inverter a tendência» e levar por diante um processo de pacifica ção bem-sucedido, mediante a rejeição da guerra e da violência ea busca do diálogo, do direito, da justiça.

Com efeito, nos dias de hoje, infelizmente somos ainda testemunhas de graves conflitos. Na Síria e de modo particular no Iraque, a violência terrorista não dá sinais de diminuir. Regista-se a violação das normas humanitárias mais elementares contra prisioneiros e grupos étnicos inteiros; verificaram-se, e continuam ainda, graves perseguições contra grupos minoritários, especialmente – mas não só – cristãos e yazidis: centenas de milhares de pessoas foram obrigadas a abandonar as suas casas e a sua pátria, para poderem salvar a sua vida e manter-se fiéis ao próprio credo.

A Turquia, acolhendo generosamente um grande número de refugiados, é directamente afectada pelos efeitos desta situação dramática nas suas fronteiras, e a comunidade internacional tem a obrigação moral de a ajudar a cuidar dos refugiados. Juntamente com a assistência humanitária necessária, não se pode permanecer indiferente àquilo que provocou estas tragédias. Enquanto reitero que é lícito deter o injusto agressor– sempre porém no respeito pelo direito internacional – quero lembrar também que não se pode confiar a resolução do problema somente à resposta militar.

É preciso um forte compromisso comum, assente na confiança recíproca, que torne possível uma paz duradoura e permita destinar finalmente os recursos, não aos armamentos, mas às verdadeiras lutas dignas do homem: contra a fome e as doenças, pelo desenvolvimento sustentável e a defesa da criação, em socorro de tantas formas de pobreza e marginalização que não faltam sequer no mundo moderno.

A Turquia, pela sua história, em virtude da sua posição geográfica e devido à importância de que se reveste na região, tem uma grande responsabilidade: as suas decisões e o seu exemplo possuem uma valência especial e podem ser de significativa ajuda no sentido de favorecer um encontro de civilização e identificar as vias praticáveis de paz e de autêntico progresso.

Que o Altíssimo abençoe e proteja a Turquia e a ajude a ser uma válida e convicta artífice de paz!
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Santa Sé

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