1. Quando foi que começou o Movimento
Protestante?
Depois de afixar, a 31 de outubro de 1517, as suas teses
atacando o ensino tradicional do Cristianismo, a 18 de abril de 1520, Martinho
Lutero rompeu com a Igreja Católica, e começou a edificar uma nova Igreja de
acordo com as suas ideias.
2. Protestantes não são aqueles
que protestam contra os erros de Roma?
Muitos protestantes hoje em dia aceitariam essa descrição da sua
posição. Mas aquilo que eles acreditam ser erros de Roma não são realmente
erros, se na verdade são ensinamentos da Igreja Católica. Acrescento esta
última condição porque muitas doutrinas têm sido atribuídas à Igreja Católica,
as quais ela nunca ensinou, ao passo que outras têm sido interpretadas de um
modo que ela mesma condenaria. Por mal-entendido, muitos escritores
protestantes têm gasto o seu tempo e o dos seus leitores refutando
laboriosamente aquilo que a Igreja Católica absolutamente não ensina! E a sua
linha de aproximação aos problemas do Catolicismo mal necessita de revisão.
3.
Qual foi exatamente a origem do termo “Protestante”?
A palavra deriva do célebre “Protesto” tido pelos príncipes
germânicos na Dieta de Espira em 1529. Grande número de príncipes alemães
haviam-se aproveitado da revolta religiosa de Martinho Lutero para conseguir a
independência política dos seus Estados. Naturalmente, em troca, eles
apoiaram o Luteranismo como uma grande força entre o seu povo para os
desprender de antigos laços, e começaram suprimindo a religião católica dentro
dos seus territórios. Ora, o Decreto da Dieta de Espira concedia liberdade religiosa
a todo aquele que já houvesse abraçado o Luteranismo nos Estados dos príncipes
germânicos, mas exigia tolerância para com os católicos residentes dentro dos
limites deles. Os príncipes luteranos protestaram não conceder tolerância
aos católicos, e disseram que a religião do povo deve ser a mesma que a dos
seus príncipes. “Cujus regio, illus religio”, diziam aqueles príncipes. “Seja
qual for o governante, dele deve ser a religião”. Por outras palavras, os
príncipes germânicos exigiam o direito de impor ao seu povo qualquer religião
que lhes aprouvesse. E o protesto deles era contra qualquer obrigação de
tolerar os católicos. A palavra “Protestante”, portanto, de acordo com o seu
significado histórico e religioso, nasceu de uma denegação de liberdade de
consciência; e os que assim protestaram contra a liberdade de culto para os
católicos foram denominados Protestantes.
4. Quais as causas que em primeiro lugar
levaram à Reforma Protestante?
A Reforma Protestante não foi realmente uma reforma. Foi
antes uma revolução. Ela tirou reinos inteiros à Igreja Católica, e introduziu
ideias inteiramente novas sobre as relações religiosas entre os cristãos e
Cristo. Quanto às causas que levaram a essa revolução, é certo que não houve
coisa alguma errada na religião católica em si mesma. Houve, porém, muita coisa
errada em grande número de católicos, do contrário Lutero nunca teria alcançado
o êxito que alcançou. Não é uma só e simples causa que pode explicar isto.
Podemos dizer que aqueles que deixaram a Igreja Católica o fizeram por
infidelidade à graça de Deus nas suas vidas pessoais. Mas que tantos devessem
provar-se infiéis, isto reclama maior explicação; e essa maior explicação deve
ser achada nas condições religiosas, culturais, políticas e sociais do tempo.
5. Qual era então o estado de
coisas religioso e cultural?
Devemo-nos lembrar de que, durante o século anterior à Reforma, o Renascimento
trouxera a revivescência dos clássicos pagãos gregos e latinos, e estes não só
desviavam as mentes dos homens do estudo da filosofia católica, mas levavam à
corrupção da vida entre as classes educadas. Ademais, muitos bispos e
sacerdotes, grandemente desviados de Roma, haviam sido demasiado subservientes
à autoridade secular, e haviam descurado reforçar a disciplina da Igreja,
enfraquecendo-lhe assim a influência sobre o povo. O relaxamento no seio do
clero produzira grande desedificação; e a demora na reforma dele preparara o
caminho para uma reforma errônea, pelo rompimento com a Igreja. Sacerdotes
descuidados haviam deixado o povo sem instrução e incrivelmente ignorante da
sua religião; e, não conhecendo a sua própria fé, grande número de simples
católicos não discerniam o verdadeiro mal contido no movimento separatista. Não
conhecendo a verdade, eram manejados pelas ideias dos reformadores, que
denunciavam Roma sem exigir qualquer padrão mais alto de virtude do que o que
até ali prevalecera.
6.
Então você admite que a queda da Igreja Católica se deveu á sua própria
depravação?
A Igreja
Católica não caiu. Muitos dos seus membros haviam caído dos seus padrões
de virtude, e multidões faziam disto pretexto para abandonarem a fé pela
heresia. Um dos grandes opositores de Martinho Lutero foi Tomás More, na
Inglaterra. Tomás More estava tão cônscio do triste estado das coisas como
Lutero, mas não cometeu o erro de censurar a Igreja por causa dos membros
relapsos nela existentes. Nem seria correto imaginar que só havia relaxamento
na Igreja imediatamente antes da Reforma. Havia Santos naqueles dias tanto como
havia pecadores. Leia esse maravilhoso livrinho A Imitação de Cristo, por Tomás
a Kempis. Esse tesouro espiritual foi escrito por um monge católico durante
aqueles anos de suposta corrupção universal. E esse livro reflete os
verdadeiros ideais da Igreja Católica.
7. Você diria que Lutero errou
declarando necessária uma reforma?
Não nego que era necessária uma reforma. Havia muitos abusos a ser corrigido.
Mas Lutero não introduziu um movimento de real reforma. Fez dos abusos
reinantes pretexto para ao mesmo tempo deixar a Igreja, ao invés de ficar nela
e procurar efetuar a conversão dos seus membros relapsos para melhores
caminhos. Ademais, ele manteve muitos dos próprios abusos, apenas procurando
justificá-los pela negação de que eles fossem errados, e ainda sancionou ulteriores
renúncias às normas do verdadeiro Cristianismo.
8.
Você disse que, além dos fatores religiosos e culturais, condições políticas
contribuíram para o sucesso de Lutero.
E assim foi. O prestígio do Papado em negócios de Estado através da Europa
diminuíra sensivelmente durante os dois séculos anteriores à Reforma, e a
autoridade do Imperador também havia sido grandemente minada. No tocante ao
prestígio do Papado, importa lembrar que, na maior parte do século quatorze, os
Papas tinham sido forçados a viver fora de Roma, em Avinhão, na França,
expondo-se à acusação, por outras nações, de estarem sob influência política da
França. Quase imediatamente após o regresso deles a Roma, teve lugar aquilo que
é conhecido como “Grande Cisma do Ocidente”, quando, além do Papa legal, houve
dois antipapas, cada qual pretendendo possuir a autoridade suprema sobre a
Igreja. No seu reconhecimento desses papas as nações se dividiram sobre linhas
políticas, e isto enfraqueceu grandemente a influência do Papado na Europa.
Depois que esse desastre foi sanado pela eleição do Papa Martinho V, em 1417, e
pela supressão de todos os Papas rivais, surgiram dificuldades de dinheiro. O
Papado estava empobrecido. Era preciso dinheiro para a construção da basílica
de S. Pedro em Roma, e neste sentido foram feitos apelos a toda a cristandade,
concedendo-se indulgências a todos os que contribuíssem para a causa. A
acusação de traficância nessas indulgências veio a ser a razão imediata para a
revolta de Lutero; mas, se ele alcançou tamanho êxito foi porque Roma, havia
muito, perdera em grande extensão o amor e o respeito. Enquanto isso, a
autoridade imperial era apenas uma sombra do que tinha sido. O feudalismo
estava desmoronando na Europa. Vassalos governantes nas províncias estavam-se
tornando cada vez mais rebeldes e independentes. Lutero teve apenas de soprar
sobre chamas já ateadas; e fê-lo explorando a ambição e o espírito de
independência reinantes entre os príncipes germânicos, excitando à revolta
contra o Imperador. E lisonjeou-lhes a cupidez e o orgulho aconselhando-os a
esbulharem a Igreja da sua propriedade nos domínios deles, e a tomarem sobre si
o controle da doutrina e da moral dos seus súditos.
9. Como foi que o estado da
sociedade contribuiu para o êxito de Lutero?
Pelo simples fato de haver o descontentamento permeado cada
camada dela. A sociedade sofre quando grande número de pessoas estão
descontentes com a sua sorte. Além disto, clero, príncipes e camponeses estavam
igualmente insatisfeitos. Os bispos eram mundanos, desfrutando ricos
benefícios, ao passo que sacerdotes ignorantes e acossados pela pobreza
abundavam como um “proletariado clerical”. Os mosteiros, igualmente,
ressentiam-se da interferência e das exações dos bispos; e, por sua vez, eram
de frouxa observância, com consequentes dissensões internas. Por isto, muitos
membros do clero, tanto diocesano como regular, estavam prontos para jogar fora
as suas batinas e para seguir o ainda mais atenuado Evangelho de Lutero. Entre
os pequenos príncipes alemães reinava o ciúme e a anarquia, e eles estavam mais
do que prontos para as guerras de religião que em breve deviam seguir-se. Os
camponeses, espezinhados e miseráveis, pensavam também poder ganhar muito com a
revolução protestante, embora na realidade viessem a achar-se logrados e
trucidados.
10.
O poder do Romanismo não foi quebrado por Martinho Lutero, de imoral memória?
Martinho Lutero é, sem dúvida, uma figura saliente na história. Mas, conforme o
expliquei, a situação toda constituía o momento histórico em que um homem podia
desencadear à tempestade. Enquanto isso, a memória imortal de Lutero
tornar-se-á cada vez menos grata à medida que os fatos a ele concernentes forem
sendo mais conhecidos. Os que o idealizam só podem fazê-lo ignorando uma imensa
soma de informação inconveniente.
11. Sem dúvida os historiadores
católicos têm pintado Lutero com as cores mais negras.
Estou de pleno acordo em admitir que muitos escritores católicos
deram uma informação deturpada sobre Lutero, tal qual como livros escritos por
protestantes têm dado uma visão deturpada da posição católica – e em extensão
muito maior. Mas, ainda assim, digo que um estudo imparcial da história só pode
é desacreditar Lutero como reformador religioso.